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ESTADO ISLÂMICO NA TURQUIA | Turquia: O massacre de Suruç e seu pano de fundo

Nesta segunda (20) morreram 32 militantes da Federação de Organizações Juvenis Socialistas (SGDF) na cidade curda de Suruç em um atentado com bomba, que deixou também centenas de feridos. Qual é o pano de fundo destes brutais atentados?

sexta-feira 24 de julho de 2015 | 00:11

A luta das milicias curdas YPG e YPJ, chamadas “Unidades de Proteção do Povo”, contra os bárbaros do Estado Islâmico (EI) pela cidade de Kobane tem sido uma questão de importância mundial há algum tempo.
Para além das numerosas campanhas de solidariedade, muitos militantes de diferentes organizações de esquerda da região têm se armado durante a resistência curda contra o Estado Islâmico para libertar Kobane. A heróica resistência das milícias curdas conseguiu que o Estado Islâmico fosse finalmente expulso da cidade. Porém Kobane está em ruínas, porque os duros combates e bombardeios por parte da OTAN destruíram grande parte da cidade.
É por isso que um grande número de ativistas, em solidariedade com Kobane, se juntou para reconstruir a cidade. A SGDF havia chamado a participação neste projeto, convocando jornadas de 19 à 24 de julho. De diferentes cidades chegaram mais de 300 pessoas ao centro cultural Amara em Suruç, para viajarem juntos até Kobane.
Os ativistas haviam chamado uma coletiva de imprensa para fazer a campanha ser conhecida.
Agora já está confirmado que foi um atentado suicida por parte do Estado Islâmico, a causa da explosão durante a coletiva.

O AKP financia, o EI massacra

Os hipócritas representantes do assassino Estado turco declararam suas condolências depois do massacre, porém suas mãos estão manchadas de sangue. Os principais responsáveis pelo massacre são o governo do AKP e o serviço secreto turco MIT.
Através do apoio financeiro e logístico, prepararam o terreno para os bandidos do EI. Em outubro do ano passado, escrevíamos sobre esta questão: “O papel da Turquia sob comando de Erdogan é especialmente obsceno. A Turquia presenteou nos últimos meses, mais uma vez, um refúgio para o EI, enquanto impede as milícias curdas e os refugiados de guerra de cruzarem a fronteira, e inclusive ataca violentamente os protestos contra a colaboração com o EI em seu próprio território. […] O Estado turco apoiou desde o começo as distintas forças opositoras na guerra civil síria, com financiamento e logística para acelerar a queda do regime de Assad e destroçar as tendências de auto-organização da nação curda, para impor seus próprios interesses. O fracasso deste plano na política exterior levou ao vergonhoso apoio ao EI”.
O apoio do Estado turco ao Estado Islâmico tem sido por vezes encoberto, e em outros momentos é feito abertamente. Quando o EI atacou o consulado geral turco em Mossul em 2014, e tomou de reféns 49 pessoas durante 101 dias, o governo de AKP negociou através do serviço secreto turco com o EI. Já nesta época o governo em Ankara negou um posicionamento concreto contra o EI – apesar da pressão por parte dos imperialismos – mas pelo contrário, se concentrou no combate contra Rojava. Quando terminou a troca dos reféns, o governo não publicou nenhum detalhe sobre as negociações.
A cidade de Hatay, na fronteira turco-siria, virou um refúgio para os bandidos do EI durante a guerra civil Síria. Em seu distrito de Reyhanli, assassinaram 52 pessoas, ferindo mais de cem, com um atentado a bomba em 11 de maio de 2013. Apesar disso, os seguidores do EI puderam seguir colocando seus estandes em Istambul, fundar associações e inclusive organizar manifestações.
Em novembro de 2013 e janeiro de 2014, a revista de quatro caminhões pertencentes ao serviço secreto turco na cidade de Adana, no sul da Turquia, colocou a dúvida sobre se o Estado Turco estaria repassando armas aos rebeldes sírios. Quando este escândalo fez aparecer cenas turbulentas nas redes sociais, o governo destituiu e processou os cinco advogados e fiscais que haviam ordenado a revista.
Durante a recente campanha eleitoral, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan se apresentou com um discurso agressivo e militar, depois dos êxitos dos curdos contra o EI: “Nós não permitiremos a fundação de um no Estado em nossa fronteira com a Síria. Seguiremos lutando contra isto, seja qual for o custo”.
Esta propaganda não se dirigia apenas contra Rojava, senão também contra o jovem partido curdo HDP, que está crescendo. Junto com o primeiro ministro Ahmet Davutoglu, Erdogan agitou diretamente contra o HDP nos atos eleitorais do AKP. Como consequência, centenas de sedes do HDP foram atacadas, e em 5 de junho houve um atentado com bomba do EI contra o ato eleitoral do HDP em Diyarbakir
O massacre em Suruç é também um subproduto do regime do AKP e está diretamente ligado aos massacres anteriores.

Efeito Bumerangue

Como temos analisado em artigos anteriores sobre o regime turco, o fracasso da política exterior do governo AKP tem consequências catastróficas: “Como membro da OTAN e aliado estratégico dos Estados Unidos, Turquia aspirava com o início da “primavera árabe” a extensão do seu “modelo turco” de democracia parlamentar sob a direção de um partido islâmico moderado para o Egito e outros países da região. Porém, este projeto fracassou e a Turquia agora só conta com relações de hostilidade com Síria, Egito, Iraque e Líbia”.
E sobre o pano de fundo disto, acrescentávamos: “Em relação à política exterior, a burguesia turca se encontrou em situações muito contraditórias na Síria e no Egito. Tentou apoiar as oposições locais para avançar em seus anseios de poder regional junto a aliados geopolíticos. Porém não teve a força econômica suficiente nem o apoio imperialista para derrotar Assad”.
O Estado turco vê o crescimento do HDP e o projeto de Rojava como um grande perigo, Já há mais de 30 anos que definia o PKK como a maior ameaça à segurança nacional.
Se o PKK e o HDP se adaptaram a seguir por um caminho reformista para a Turquia, as estruturas democráticas e de auto-organização na Siria do Norte se opõe à política turca para a Síria. É por isso que o Estado Turco se vê na necessidade de neutralizar e combater Rojava.
Durante o ascenso da “primavera árabe”, o governo turco tentou estender seu “modelo” de um islã moderado e um modelo neoliberal a países como o Egito. Porém, o êxito desta “exportação” não durou, e aliados estratégicos da Turquia como a Irmandade Muçulmana foram banidos pela onda contra-revolucionária.
Agora o Estado turco se encontra sob uma forte pressão pela situação econômica e política do regime. O apoio pragmático para o EI para acelerar a queda de Assad e destruir as estruturas de auto-organização em Rojava foi uma aposta arriscada que terminou em derrota e que aprofundou ainda mais a crise.
Se o AKP tem tentado se distanciar do Estado Islâmico por causa das fortes críticas internacionais, o EI se estabeleceu na Turquia e criou uma base material neste país.
É hora de reconhecer a cara sangrenta do “processo de paz”, que implica a capitulação completa do movimento curdo ao Estado turco. Mesmo quando surgem conflitos entre os diferentes atores, o processo é freado unilateralmente pelo Estado turco.
Não é possível uma “paz democrática” com a burguesia turca e o Estado ocupante turco. Estes têm responsabilidade principal sobre os massacres, a opressão nacional e a expulsão. Se se consegue um acordo de “paz”, beneficiaria somente a burguesia curda enquanto a grande maioria do povo curdo seguiria sofrendo opressão e exploração.
Os bandidos do EI são um perigo para as organizações de esquerda combativa, para os trabalhadores, para os curdos, os alevís e as mulheres. Nos últimos tempos tem-se multiplicado os atentados destes bárbaros.
Ao governo turco não importa a “segurança” da população no que é de mais elementar. A polícia turca interveio com violência, inclusive nas marchas contra o massacre em Suruç, que aconteceram em várias cidades.
É preciso formar comitês de autodefesa nos locais de trabalho e nas ruas, que não só defendam a população dos bandidos do EI, mas também contra as repressões do Estado turco.
Na Alemanha e na Europa temos que lutar pela anulação da proibição do PKK, que criminaliza os curdos e debilita sua resistência, pela liberdade de todos presos políticos, pelo reconhecimento de todos refugiados e para acabar com as exportações de armas. Para isto, os sindicatos e organizações de esquerda devem mostrar sua solidariedade com campanhas e manifestações massivas.




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