Em uma nota técnica divulgada em dezembro de 2021, a Mobilização Nacional Indígena (MNI), frente que reúne mais de uma centena de organizações de luta indígena e ambientalistas do país denuncia a públicação, no dia 09 de novembro de 2021, da “Minuta do Edital de Chamamento Público” destinada à seleção de entidades privadas sem fins lucrativos na área de saúde para “prestação de serviços complementares na área de atenção à saúde e saneamento ambiental no Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) e nas Casas de Saúde Indígena (CASAI) Nacionais”, por parte da Secretaria Especial de Saúde indígena (Sesai), pertencente ao Ministério da Saúde. A Sesai, entre suas atribuições, é responsável pela coordenação e execução do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (Sasi SUS).

No texto, apontam como o processo terceiriza funções estratégicas da saúde indígena para fora do Estado, avançando na privatização da saúde indígena. Conforme apontam:

O documento aponta indícios de aprofundamento da estratégia de privatização da saúde indígena

Com a terceirização de funções estratégicas, aspectos importantes da saúde nos chamados Distritos Sanitários Especiais Indígenas passaria a ficar a cargo de entidades que, como afirma o documento, “não possuem assento nas instâncias intergestoras do SUS e não terão respaldo para negociar a integralidade da atenção”.

Uma reportagem do Brasil de Fato apontou como, na saúde indígena entregue às entidades filantrópicas, o modelo de contratação é sinônimo de precarização do trabalho, levando, também à precariedade na cobertura e no atendimento. Falando ao BdF, um trabalhador reporta que “A gente observa uma carência muito grande de profissionais qualificados com leitura de perfil epidemiológico, com perfil mais resolutivo. O que a gente faz não é só atenção básica, mas em todos os níveis de complexidade”, enquanto outro aponta que “quando vamos para os territórios recebemos uma ajuda de custo no valor de R $35 que ainda é descontada. Já os servidores recebem diárias inteiras e superiores. O valor recebido por nós é para custear a comida e para manter a equipe durante os dias de trabalho, mas ele mal paga os gastos em alimentação”.

A ingerência privada na saúde indígena não é novidade. Na longa história de ataques diretos e indiretos ao direito de vida digna dos povos originários no Brasil, a presença de entidades privadas, geralmente religiosas, trazidas pelo Estado para “tomar conta” da prestação de direitos fundamentais das populações indígenas esteve intimamente ligado a práticas higienistas - pautadas em controle populacional e muitas vezes responsáveis pelo deslocamento de grandes parcelas de populações para fora de seus territórios originários - ou a tentativas mais ou menos explícitas de apagamento de práticas e culturas originárias, em favor de uma colonização cultural e religiosa avalizada pelo poder público.

Desde o golpe, e com a posse de Bolsonaro, inimigo declarado dos indígenas, que acumula declarações racistas contra os povos originários, se aprofundam fortemente os ataques estatais à vida e saúde indígenas, culminando em um renovado ímpeto genocida contra os territórios e reservas. Mas a resistência indígena igualmente se faz sentir, com o grande Acampamento Luta Pela Vida que reuniu milhares em Brasília no ano passado e ao qual nos somamos em luta contra o criminoso e genocida Marco Temporal como uma importânte referência de resistência e do potencial da luta dos povos indígenas contra os ataques e em defesa de sua terra e soberania.

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Nós, do Esquerda Diário, nos colocamos contra qualquer tentativa de entrega da saúde dos povos indígenas a mãos privadas, bem como qualquer ataque à soberania e autodeterminação dos povos. Colocamos nossas páginas abertas a denúncias e chamados à mobilização, e nos somamos à luta dos povos originários contra todos os ataques e por direito à vida, cultura e território.

O documento completo da MNI pode ser lido aqui