Os representantes políticos mais conservadores, tendo o candidato republicano à presidência, Donald Trump à frente, se apressaram em negar qualquer elemento de LGBTfobia na ação e a reduzir o massacre a um ato terrorista, se apoiando na declaração do assassino e na reivindicação do Estado Islâmico sobre o atentado. No Brasil, essa posição teve eco entre figuras como o Pastor Deputado Marco Feliciano (PSC), que chegou a dizer que “grupos de LGBT [estariam usando] o atentado em Orlando para se promover”.

Essas declarações escandalosamente LGBTfóbicas vem encontrando eco em parcela cada vez mais significativa da opinião pública e por isso devem ser categoricamente repudiadas. Mas não menos ofensivo com as LGBT’s é o discurso majoritário que outros tantos representantes políticos e religiosos têm propagado: a ideia de que a LGBTfobia existe, mas seria apenas fruto do extremismo islâmico, de grupos minoritários de ódio, ou de próprios LGBT’s que não saberiam lidar com sua sexualidade. Ou seja, tentam apagar a existência da LGBTfobia social e transformar suas vítimas em parte das estatísticas criminais de fanáticos ou doentes mentais.

O problema é que casos como o massacre de Orlando, ou as vítimas mortais diárias por esses crimes no Brasil (só esse ano duas pessoas trans tem sido assassinadas por dia), são apenas a expressão mais violenta de uma construção cotidiana de invisibilização, preconceito e ódio aos LGBT’s. Essa construção opressora se dá a partir de todas as instituições sociais – família, igreja, escola, trabalho, mídia – e com respaldo de todos os Poderes do Estado – Legislativo, Judiciário e Executivo.

Temos que evidenciar que a LGBTfobia não se limita aos casos extremos de violência e agressão. Quando não se discute educação sexual e de gênero nas escolas a sociedade avança para formar novos Omar Matten. Quando o Estado impede que as pessoas trans possam ter acesso ao nome social sem burocracia, quando os órgãos médicos caracterizam a transsexualidade como doença ou quando não existe centros de saúde referenciados para o cuidado e tratamento de mulheres lésbicas ou pessoas trans, a sociedade avança para uma legalização da inferioridade social das LGBT’s. Quando as leis do Estado punem ou criminalizam a homossexualidade ou impede a união estável, casamento e direitos iguais – como a adoção – para casais homossexuais, a sociedade avança para uma estigmatização e perseguição das LGBT’s.

Quando a mídia reproduz piadas e ironias com práticas sexuais e estereótipos relacionados as LGBT’s, quando os pais inibem as expressões naturais da infância dos seus filhos por pré-conceitos moralistas acerca de como deve se portar um menino e uma menina (tratando de maneira pejorativa aquilo que fuja da norma), a sociedade avança em construir sujeitos sexualmente reprimidos e politicamente reacionários. E o mais importante, quando as instituições religiosas se fundem totalmente com o Estado, toda essa opressão alcança um poder de polícia contra as LGBT’s, e o próprio Estado passa a atuar, na sua totalidade, como Omar Matten. Seja em países católicos, como Uganda, seja em países muçulmanos, como Arábia Saudita e Irã.

Quanto maior a vinculação entre a Igreja e o Estado, maior a opressão social contra as LGBT’s. É necessário exigir a separação da Igreja do Estado. Para isso, as LGBT’s precisam resgatar os métodos e os debates de estratégia das organizações LGBT’s dos fins da década de 60 e 70, a partir da batalha de StoneWall para planificar as relações de produção social e, assim, soltar as amarras das relações de reprodução impostas nessa sociedade.