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Pandemia | Morte, fome e ataques à saúde indígena enquanto Dória faz demagogia com vacinação infantil

Uma criança Xavante foi escolhida para ser a primeira a receber a dose pediátrica em São Paulo. Mas a demagogia de Dória é cínica: por conta da ganância dele e dos monopólios imperialistas, assim como o negacionismo de Bolsonaro, mais de 700 indígenas morreram de COVID, enquanto enfrentam ainda mais ataques a suas terras e à saúde.

sábado 15 de janeiro de 2022 | Edição do dia

As primeiras doses da vacina da Pfizer destinada a crianças de 5 a 11 anos chegaram a todos os estados brasileiros e no Distrito Federal. A aplicação da primeira dose pediátrica contra COVID-19 em São Paulo foi em uma criança do povo Xavante, em uma cerimônia com participação do cínico e demagogo governador de São Paulo, João Dória (PSDB).

Apesar da importância da vacinação nas crianças indígenas, a atitude não passou de um show demagógico e midiático, voltado a embelezar a imagem de Dória como suposto “combatente da pandemia”, enquanto a realidade dos povos indígenas em meio à pandemia tem sido bem diferente. O próprio povo Xavante, na realidade, tem enfrentado enormes dificuldades ao longo da pandemia, com populações caindo em situações de miséria e fome nos últimos anos por culpa da política criminosa dos governos. De acordo com denúncias relatadas à Amazônia Real, os Xavante têm contado apenas com doações de alimentos, que em muitos casos não chega a ser o suficiente para alimentar todas as famílias das aldeias, chegando a casos da fome ser tanta que as doações não duram nem uma semana. A falta de alimentos tem aumentado ainda mais durante a pandemia, com o fato da Funai não disponibilizar transporte e motoristas para levar alimentos nas aldeias mais distantes. Fazendo assim com que indígenas tenham que fazer grandes deslocamentos a pé ou pagando por caronas para irem às cidades receber doações de ONGs e turistas - com isso expondo a si e a suas aldeias ao vírus. Para além do apoio pontual da disponibilidade de cestas básicas, tal situação de insegurança alimentar é causada pela desestruturação da soberania alimentar dos povos em aldeias, tornado-os dependentes de governos que se recusam a viabilizar seu autossustento.

Falando ao Instituto Humanitas Unisinos, o professor Bonifácio Ubnatsewawe Tsirobowe, também de etnia Xavante apontou a importância de que fosse viabilizada uma estrutura básica para plantio e capacitação, para que assim os indígenas possam se alimentar com o que plantam. Ele ressalta como os indígenas da aldeia Paranoá querem “oportunidade, insumos agrícolas, estrutura para fazer o roçado, sementes para o plantio e curso de capacitação para fazer o manejo da terra”. “Queremos comer o que a gente planta”. Trata-se de uma situação que se repete com vários povos, que mesmo que consigam viver em suas terras, sofrem com a inação criminosa dos governos, bem como ataques externos.

No próprio estado de SP, governado por Dória, lideranças do povo guarani, da região do Jaraguá, na capital paulista, denunciam como, em 2020, em plena pandemia, seu território foi colocado em disputa pela empreiteira Tenda Construtora, que pretende erguer 11 torres residenciais na terra indígena.

Casos como esse são reflexo de uma situação crítica vivida historicamente pelos povos indígenas país afora, que se agravou fortemente nos últimos anos, e ainda mais com a pandemia. Os governos federal e estaduais sustentam completa leniência com a invasão e exploração de terras protegidas, dando espaço para cada vez mais para a especulação imobiliárias, grileiros, madeireiros, mineração, narcotráfico, e tantos outros mais que exploram as terras indígenas em nome do lucro dos capitalistas. De acordo com o Instituto Socioambiental o desmatamento das terras indígenas cresceu 138% nos últimos três anos, de governo Bolsonaro.

Leia mais: Lideranças indígenas denunciam avanço do narcotráfico, grileiros e madeireiros na Amazônia

Essa onda de invasões, junto a brutais e covardes ataques e assassinatos a populações indígenas ocorrem ao mesmo tempo que o agronegócio e seus capangas, junto ao congresso nacional e o STF buscam avançar absurdos projetos como a PL 490 ou o genocida Marco Temporal, com a intensão de ratificar e oficializar séculos de invasões e expulsões de povos indígenas de suas terras, para avançar ainda mais com a “boiada” da devastação ambiental e da superexploração predatória para a exportação. Ataques esse que só foram barrados, pelo menos por agora, graças à grande e heroica luta dos povos indígenas, com o massivo acampamento de milhares em Brasília no ano passado como grande marco.

Vimos os nefastos efeitos dessa política genocida, por exemplo, com o criminoso congelamento das demarcações de terras por parte do governo, enquanto tentava aprovar o Marco Temporal, além da notória dificuldade de qualquer povo originário conseguir o mínimo que seria o reconhecimento formal de seu direito a suas terras. O próprio povo Xavante, novamente, somente em 2020 conseguiu demarcação de terras de sua etnia no MS, após mais de 30 anos.

É nessa atmosfera de ataques constantes a suas terras e suas vidas que a demagogia de Dória aparece com contraste marcante. A pandemia teve grande impacto nos povos originários Brasil afora, em grande medida por ataques diretos do governo federal e estaduais, além de uma grave falta de estrutura para levar tratamento a povos aldeados. Isso tudo resultou em uma verdadeira catástrofe, como ressaltou a antropóloga do Instituto Socioambiental (ISA), Carla Dias, que em matéria da Oxfam sobre a situação dos povos indígenas na pandemia ressaltou que:

Essa é uma doença que infelizmente levou parte da biblioteca dos povos indígenas. Algumas pessoas que se foram são os anciões e as anciãs e que estavam fortes e transmitindo as suas práticas na região. Isso é bastante triste, é um pesar

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Veja mais: Em 2020, letalidade da Covid-19 entre indígenas Xavante esteve 160% acima da média nacional]

Trata-se de um cenário preocupante, quando se leva em conta que o percentual de indígenas vacinados segue agudamente abaixo da média nacional, enquanto sobram mostras do descaso do governo federal com a saúde dessa população, como o recente avanço contra a saúde indígena, denunciada por organizações como uma “aprofundamento da privatização da saúde indígena” que colocará aspectos importantes da saúde nos chamados Distritos Sanitários Especiais Indígenas a cargo de entidades que, como apontam lideranças, “não possuem assento nas instâncias intergestoras do SUS e não terão respaldo para negociar a integralidade da atenção”, ao repassar postos importantes de gestão sanitária para ONGs e outras organizações filantrópicas privadas.

As situações de opressão estrutural às quais estão submetidos os povos originários, aprofundadas desde o golpe, e em especial com o governo racista de Bolsonaro, junto ao reacionário congresso, o STF e a grande mídia, a serviço do agronegócio, pintam um cenário que vai muito além do show midiático que Dória - igualmente inimigo dos povos indígenas e aliado aos grandes empresários invasores de terras. São denuncias das condições que opõe diretamente, por um lado, os direitos básicos dessas populações, e por outro a sanha de lucro assassina de madeireiros, garimpeiros, mineradoras, agronegócio, construtoras e capitalistas em geral.

Nos últimos anos, frente a essa escalada nos ataques, povos originários por todo o país deram grandes mostras de heroica luta e aguerrimento. É preciso nos inspirar nesses exemplos e nos somarmos a essa luta, não se contentando com as migalhas que direitistas como Dória tentam oferecer para ocultar a catastrófica situação que ajudam a construir e manter, mas avançando para se enfrentar com as causas profundas da opressão e genocídio dos povos indígenas. Para avançar nessa luta, mostra-se igualmente importante superar as esperanças na política de conciliação hoje encabeçada pelo PT, que tenta convencer os oprimidos e explorados a confiarem em alianças com setores do agronegócio (não nos esqueçamos do que era o Ministério da Agricultura nos governos petistas) e com a direita “opositora de Bolsonaro” (mas que segue votando junto com o governo todos os ataques a nossa classe) para voltar ao poder, nunca ousando se enfrentar pela raiz com os problemas, e, pelo contrário, fortalecendo nossos inimigos. É preciso apostar em nossas próprias forças e nossa organização independente, para uma luta que arranque o direito a vacina para todos, saúde indígena de qualidade, controlada pelas populações, demarcação já de todas as terras, e avance para questionar o conjunto dos interesses capitalistas que pressionam indígenas e o conjunto dos explorados e oprimidos para a miséria!




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