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SEMANÁRIO

O racismo e a violência policial são ferramentas de controle social para a manutenção do capitalismo

Mathias Nery

O racismo e a violência policial são ferramentas de controle social para a manutenção do capitalismo

Mathias Nery

O início de 2024 tem proporcionado escandalosas imagens de violência policial contra a população negra, vemos desde Operação Verão no Rio de Janeiro, Operação Escudo na Baixada Santista, o aumento de 15% na letalidade policial na Bahia, e as imagens repugnantes da brigada militar do Rio Grande do Sul que leva preso motoboy negro vítima de facada enquanto estava trabalhando. Estes e outros casos, obviamente, não são isolados e muito menos fruto de uma infeliz coincidência. Neste texto analisaremos desde uma ótica marxista a opressão racista imbricadamente ligada à exploração capitalista, que são as causas destes dados, a polícia por sua vez, como ferramenta de controle e manutenção deste sistema, mostra a face assassina do capitalismo brasileiro. Também buscamos debater com a visão de combate ao racismo por via institucional e determinar o porquê somado a frente ampla colaboram e são responsáveis pelo estado de não revolta da população negra e da classe trabalhadora.

1º. A cara do enquadro: a desumanização e a violência contra o negro

No início de fevereiro ocorreu a odiosa cena de um entregador que sofreu uma facada sendo levado para delegacia no camburão, enquanto o agressor ficou livre para ir em casa e recebeu toda compreensão da brigada militar de Porto Alegre. Esta cena que viralizou na internet chocando a população reafirma as premissas do racismo, dado o tom da melanina, a pessoa é condenada culpada de modo a priori, e essa sentença os destacamentos armados do estado burguês não pensam duas vezes para cumprir.

O que permite essa tipificação para todos os negros é a situação que se encontra a massa da população negra, que formalmente entrou no status social de cidadão pós abolição, porém nas camadas econômicas mais baixas, seja em relação ao trabalho ou a moradia, a falta de saneamento básico, por exemplo, se encontra na miséria. Neste ponto vemos a relação combinada entre a ideologia e materialidade do racismo. É na herança colonial que encontramos o surgimento deste problema e sua continuidade. Se no início do comércio marítimo e nas “descobertas” de novas terras os comerciantes europeus fizeram dos corpos negros dupla mercadoria para extração de lucro, por outro lado o comércio dos negros como objeto e chegando no destino do outro lado do atlântico foram as ferramentas de exploração dos recursos nas plantations. Para justificar esta situação criaram ideologias raciais para normalizar a exploração e comércio de africanos, agora fruto deste processo histórico de acumulação de capital, o racismo se materializa dentro da sociedade pós-escravidão.

Clóvis Moura [1] demonstra esse processo :

…é visto ainda como mau cidadão negro aquele que vive nas favelas, nos cortiços, nos mocambos nordestinos e se situa nas mais baixas camadas sociais, como operario não qualificado, domestica, mendigo, biscateiro, criminoso ou alcoolatra. É exatamente aquele segmento descendente do escravo, hoje apenas negro livre, porém que não foi, ainda, incorporado na sua grande maioria, a não ser formalmente, a sociedade civil atual, como cidadão. ( MOURA. 1977, p.19.)

Nesse sentido, o capitalismo brasileiro surgiu superexplorando a população negra, destinando a esse setor da classe trabalhadora não apenas os piores postos de trabalho e o desemprego, mas também péssimas condições de vida ancoradas na falta de direitos sociais. Essa condição socioeconômica do negro no pós abolição era fundamental para extração de mais-valia, pois permitia a burguesia herdeira da escravidão pagar baixíssimo salários, não à toa a começo do século XX foi palco de inúmera revoltas e greves.

Mas Clóvis Moura não dá destaque apenas a esse processo, ele também chama a atenção dos instrumentos ideológicos que dispõe a burguesia para aprofundar o racismo. Por isso, ele critica a relação reificada que a burguesia cria entre a identidade étnico racial e a pobreza.

Fazem uma ligação reificada, para usarmos a terminologia lukacsiana, entre a etnia negra e a situação de pobreza, exploração e delinquência a que os seus elementos marginalizados pela sociedade capitalista chegaram, especialmente nas grandes cidades. (Ibid.)

A burguesia utiliza as condições que ela própria criou para o negro, a condição de escravo imposta violentamente pelo processo colonial e a destinação dos ex-escravos para as piores condições de vida, para formular ideologias racistas, em cada conjuntura política a seu modo, como algo intrínseco à população negra. No sistema capitalista, no qual um pequeno grupo seleto enriquece a custo da exploração da força de trabalho de todo o resto, o Estado, suas instituições e produções ideológicas devem voltar-se em manter essa dominação, em outros termos, são ferramentas burocráticas e violentas para manter a hegemonia política de uma classe sobre a outra. Assim sendo, em países como o Brasil, em que o Estado é fruto da escravização direta e que a população que fora cativa permaneceu dentro do país, o Estado e seus órgãos são incompatíveis com os desejos e aspirações da classe trabalhadora e da população negra.

Não poderia ser diferente, a brutalidade da escravidão não era aceita pela massa negra, como mostra Clóvis Moura, o “bom escravo”, que aceitava o regime colonial, é fruto de um discurso historiográfico da classe dominante, o que predominou no período de escravidão foi a tensão entre os “maus escravos”, todos aqueles rebeldes que se organizavam em revoltas e quilombos como Zumbi e Thereza de Benguela, e a coroa portuguesa. A repressão a estes “maus escravos” se dava pela grande repressão da guarda real, bandeirantes, e seus capachos que invadiam quilombos e nas cidades invadiram espaços de religião de matriz africana, os encontros de capoeira que era criminalizada e desarticulando revoltas, como tentaram com a famosa Revolta dos Malês. É a necessidade de manter sua estabilidade pela força, que a burguesia vai estabelecendo seu aparato repressivo, os destacamentos policiais brasileiro nascem deste aprendizado, para manter-se no poder do Estado e garantir seus interesses, a população negra não pode ser e nem se perceber como livre.

2º. Institucional ou estrutural: um debate sobre como funciona o racismo

Situado que a racionalização do racismo, como ideologia fruto necessidade justificar a exploração escravocrata, faz parte da dominação hegemônica burguesa na busca de garantir seus interesses, por que setores insistem em circunscrever o problema do negro em termos institucinais? Como se o racismo fosse um poder de “perversão” das instituições, como se algum dia estas instituições tivessem, ou possam vir a ter, uma atuação não racista? Fica ainda mais esquisito quando a instituição a ser tratada como “pervertida” é a instituição policial, que secularmente mata a juventude negra “do Oiapoque ao Chuí".
Esta elaboração de “perversão a instituição” foi feita pelo ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, autor do livro “Racismo Estrutural” (2020):

O caso do trabalhador negro, no Rio Grande do Sul, que tendo sido vítima de agressão acabou sendo tratado como criminoso pelos policiais que atenderam a ocorrência, demostra, mais uma vez, a forma como o racismo perverte as instituições e, por consequência, seus agentes.

É preciso que as instituições passem a analisar de forma crítica o seu modo de funcionamento e aceitar que em uma sociedade em que o racismo é estrutural, medidas consistentes e constantes no campo da formação e das práticas de governança antirracista devem ser adotadas. Em outras palavras, é preciso aceitar críticas e passar a adotar medidas sérias de combate ao racismo em nível institucional. Conversei com a Ministra @aniellefranco e entraremos em contato com as autoridades gaúchas para acompanhar o caso e ajudar na construção de políticas de maior alcance.(Silvo Almeida, na plataforma X, 18/02/2024)

Ele utiliza os conceitos de racismo institucional e estrutural para propor uma solução ao caso do entregador em particular e uma solução ao problema do racismo em geral. Em sua obra ele busca fazer uma diferenciação entre racismo institucional e estrutural ao mesmo tempo que determina que o primeiro é consequência do segundo. O que o permite utilizar os dois conceitos em harmonia é a desvalorização do caráter de classe para pensar o Estado na sua conceitualização.

Sua elaboração mostra um avanço para debater que o racismo não é um problema individual, de uma pessoa ou um grupo racista, mas da sociedade brasileira como um todo por ser herdeira do passado colonial, no entanto, por localizar apenas na estrutura sem nomear o que ou quem a mantém, sua estratégia para combater o racismo se mostra contraditória e dócil.

Contraditória por dois motivos, o primeiro porque ao admitir a possibilidade de lutar contra o racismo dentro da institucionalidade burguesa, basta criar “práticas de governanças antirracistas”, parece ser apenas vontade dos governantes e líderes de instituições não serem racistas no atual estado das coisas. Segundo, ao afirmar que o racismo cumpre o papel de perverter as instituições, faz concluir que estas possuíam uma origem não racista, ou seja, suas finalidades não seriam manter a hegemonia burguesa, que como apontado na parte anterior, o racismo é indissociável.

A relação econômica fundamental do capitalismo não é colocada em xeque. O campo jurídico, político e a violência policial, por exemplo, são ferramentas da hegemonia burguesa que mantém a opressão racial como potencializador da exploração da força de trabalho da classe trabalhadora. Empurrados em postos de trabalhos mais precários, em favelas sem saneamento básico, é normalizada toda uma condição de vida degradada para população negro, consequentemente, generaliza-se para os trabalhadores. Desta forma, entoar práticas governamentais e mudanças paulatinas nas instituições que não se enfrenta com os interesses burgueses o autor perde de vista a própria estrutura que denunciava.

Por estas conclusões e contradições que sua estratégia é dócil ao racismo, por não levantar a necessidade de fim do Estado burguês e as instituições policiais, cria uma esperança vazia. É impossível pensar que instituições policiais não sejam racistas por apenas “analisar de forma crítica o seu modo de funcionamento”, usando a formulação fanoniana, “em nome da inteligência e da filosofia se proclama igualdade entre os homens, é também em nome delas que se decide pelo extermínio desse mesmos homens” (Fanon,2008,p.43) [2]. Se os pensadores burgueses do Iluminismo, como Kant, teorizaram a inferioridade do negro para sustentar no campo teórico a exploração escravocrata, a polícia sustenta a exploração do trabalho assalariado e a vida precária pela força usando bala e o caveirão. É fato que a violência das instituições policiais contra a população negra vai ser mantida enquanto a burguesia se mantém como único setor que impõe seus interesses. A classe trabalhadora e a população negra, que sofre com a barbárie produzida pela ganância dos lucros e são controladas socialmente por estas instituições, devem buscar uma estratégia para impor seus interesses, o fim da violência policial e da polícia, salários iguais entre negros e brancos, para assim questionar o podre Estado burguês e suas mazelas.

Por fim, a compreensão do estado burguês como um instrumento de dominação de uma classe sobre a outra e, nesse sentido, a polícia como seu braço armado, são provas vivas da incapacidade de se pensar o fim do racismo sem a derrubada do estado capitalista. Ou seja, não se trata da ocupação ou conciliação de classes por meio do aparato estatal responsável e beneficiado pela manutenção do racismo, mas pela substituição por outro, o qual tenha as condições do exercício do poder pela amplíssima maioria da classe trabalhadora e setores oprimidos. Como na Comuna, em que o exército permanente e a polícia foram substituídos pelo povo armado, extraímos a lição de como tais instrumentos só são funcionais aos interesses da classe burguesa em seu estado e, portanto, devem sucumbir diante dos interesses dos explorados e oprimidos.

3º. A política de frente ampla busca apaziguar a revolta

Os dados de brutalidade policial comprovam um verdadeiro derramamento de sangue a céu aberto, devemos indagar em como quebrar essa passividade que está colocada e dar uma respostas contra esta situação? Antes, por que a hegemonia burguesa se mantém conjunturalmente estável? A estratégia de lutar contra o racismo por via institucional é um dos fatores que joga contra a revolta da população negra, pois a desvia para saídas paliativas. Esta estratégia é um dos pilares de sustentação da política de frente ampla que busca gerir a crise capitalista, pois desviando a revolta dos negros e da classe trabalhadora faz com que essa sensação de estabilidade se mantenha, assim os partidos fazem acordões, blocos parlamentares, deixam os sindicatos paralisados, e vão negociando nossas vidas cedendo espaço para direita e extrema direita nas suas conciliações, ao mesmo tempo, que corpos negros são acumulados pela sanguinária polícia.

No estado de São Paulo as mortes pelas mãos da polícia aumentaram em 94% neste primeiro bimestre em relação ao do ano passado, sem contar que a polícia de Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi protagonista do terror assassino da Operação Escudo na baixada santista no final do ano passado. No Rio de Janeiro no dia 27 mais de 20 mil alunos ficaram sem aulas, pois as operações policiais nas favelas fecharam escolas, unidades de saúde e interromperam linhas de ônibus, assim deixaram os moradores com medo de sair das suas casas. Estas operações foram realizadas pela polícia de Cláudio Castro (PL) que comemora os massacres na busca clara de coagir a juventude negra, seja nas operações sangrentas nas favelas seja na “apreensão preventiva” de menores de idade nas praias do Rio com a Operação Verão.

Poderíamos pensar que estes dados e operações, como as imagens repugnantes do Rio grande do Sul, são casos só de estados governados por políticos de partidos de direita. Porém o caso da Bahia, governado pelo PT desde 2006, mostra que a brutalidade policial contra a população negra, ano passado na atual gestão de Jerônimo Rodrigues (PT) a letalidade policial aumentou 15%, batendo recorde no estado desde 2008, quando começou a ser divulgado os dados. Em casos absolutos o estado lidera o país com mais de 1689 mortes em 2023, seguido do Rio de Janeiro (869 casos), Pará (529), Goiás (516) e São Paulo (504).

Mesmo com estes dados a manutenção da passividade é fruto também da sustentação da frente ampla a custo da vida e dos interesses da população negra e da classe trabalhadora. O professor e filósofo Vladimir Safatle afirmou em entrevista à folha que a “esquerda brasileira morreu como esquerda” e que a ambição de transformar estruturalmente a sociedade foi perdida. A questão que o partido que aparece como esquerda nacionalmente, muito pela vociferação bolsonarista dos últimos anos contra um partido origem operária, é o Partido dos Trabalhadores (PT), que no entanto, apesar da sua origem, a muito tempo é um partido da ordem. O PT governa com Geraldo Alckmin(PSB) como vice, Lula não poupar elogios a Tarcísio, Jerônimo com sua polícia além de reprimir, sai em defesa da imagem da PM. Não bastasse esta atuação nas instituições e cargos políticos, o partido que dirige a 5º maior central sindical do mundo, a CUT, não move suas forças para contestar.

Esta paralisia pela burocracia da CUT reforça a separação entre as pautas do movimento negro e das demandas operária, assim diminui a força de transformação da classe trabalhadora, pois faz um falsa cisão entre as mazelas vivenciadas pela população negra e as demandas econômicas-sindicais. Frente a esta paralisia e nível conciliação contrária aos interesses da população negra e a classe trabalhadora, é necessário criar uma alternativa desde o locais de trabalho e estudo contra a violência policial e a precarização da vida. A esquerda não pode se adaptar à lógica institucional do PT que convive e gere a crise capitalista, como vem fazendo o PSOL, que firma chapa de Boulos com Marta Suplicy, apoiadora da reforma trabalhista, e formando bloco parlamentar com PSB e Republicanos em Recife, partidos do Alckmin e Tarcísio de Freitas.

4º. “O mau escravo”: exemplo de luta contra a burguesia e o racismo

Se saídas institucionais e a política de frente ampla não apontam para uma verdadeira solução para o problema da população negra, pois optam por soluções internas ao sistema capitalista e fazem acordos com nossos inimigos diretamente, em que podemos nos apoiar para traçar alternativas de fato compatíveis com nossos interesses e necessidades? Exemplos na historia de luta do povo negro e da classe trabalhadora não faltam, podíamos citar revoluções do séc. XX, as revoltas escravas do período da escravidão, e ate as revoltas recentes, como o Black Lives Matter ou EndSARS.

Aqui partiremos do caso mais famoso no Brasil, o quilombo de Palmares. Um grande exemplo de maus escravos, aqueles que se levantaram contra a exploração e opressão colonial, podemos encontrar neste exemplo a combinação de luta contra a hegemonia dos senhores escravocratas e a coroa, o que poderíamos definir como disputa política, e também como consequência de levar luta implacável, o requisito de auto-organização, pois para se manter de pé era necessário conseguir sua própria produção e a organização das suas defesas militares. Palmares se colocava como alternativa para os escravizados fugitivos e questionavam o poder da coroa, esta sábia os malefícios da organização palmarina para seus interesses, mostra Carlos Zeron:

Tal pressuposto – histórico – manifesta-se com força e evidência numa carta escrita no ano 1691, sobre o quilombo de Palmares. Aqui já não há qualquer elaboração teológica, mas apenas a análise realista das circunstâncias: após ponderar se os negros aquilombados poderiam viver livres como os tapuias da região, afasta tal alternativa com base em uma ponderação estritamente política:

Só um meio havia eficaz e efetivo para verdadeiramente se reduzirem, que era concedendo-lhe S.M. e todos seus senhores espontânea, liberal e segura liberdade, vivendo naqueles sítios como os outros índios e gentios livres, e que então os padres fossem seus párocos e os doutrinassem como aos demais. Porém, esta mesma liberdade assim considerada seria a total destruição do Brasil, porque conhecendo os demais negros que por este meio tinham conseguido o ficar livres, cada cidade, cada vila, cada lugar, cada engenho, seriam logo outros tantos Palmares, fugindo e passando-se aos matos com todo o seu cabedal, que não é outro mais que o próprio corpo. (Vieira, 1928, v.III, p.620-1) [3].

Não atoa o quilombo durou mais de 100 anos, ali se concentrou uma resistência contra a escravidão que dava suporte aos negros fugitivos, invadiam fazendas para libertar escravos e desapropriavam o que fosse possível. Palmares conseguia aglutinar uma referência de luta entre os escravos, e colocar terror a coroa portuguesa e seus mais célebres representantes, estes sabiam quão pernicioso era para seus interesses não aniquilar o quilombo, por isso as várias invasões na tentativa de aniquilar o quilombo [4].

Ter um ponto de referência que se colocava contra a dominação colonial e conseguia sobreviver fora da condição de escravo, era algo que encorajava mais africanos escravizados a se rebelarem. Para manter-se vivo, Palmares teve que ter articular-se entre mocambos, alguns mais dentro da mata que dificultava as expedições das coroas, neste mocambos também encontravam-se suas plantações e casas. Ciente que derrotar os negros palmarinos era necessario tambem atacar seus pontos de sustento, as expedições seja holandesas ou portuguesas, buscavam queimar as rosas e as plantação, quando não se alimentavam destas, pois “os palmarinos plantavam feijão, batata-doce, mandioca, milho, cana-de-açúcar, pacovais” (Carneiro, 1958, 21) [5]. Ainda a organização contava com divisão do trabalho:

Os trabalhadores, aparentemente, dividiam-se por duas categorias principais - lavradores e artesãos. Os escravos procedentes das fazendas certamente se enquadravam no primeiro grupo e terão sido os responsáveis diretos pela policultura. As tropas holandesas que atacaram os Palmares notaram que as roças que encontravam a todo momento estavam sob a responsabilidade de dois ou três negros cada. Os artesãos, notáveis principalmente nos Palmares, eram sobretudo ferreiros, embora houvesse "tôda sorte de artífices" nos mocambos (Carneiro, 1958. 21)

Palmares, como parte de uma luta irreconciliável contra o sistema colonial, possui ensinamentos para pensar a política atual. Frente a barbárie de assassinatos à luz do dia e a precarização do trabalho e da vida, a população negra e a classe trabalhadora devem erguer dentro dos seus locais de trabalho alternativas próprias. Para isso é necessário combater a burguesia e os capitalistas, superar as burocracias encasteladas e buscar um programa que busque o fim das policias; contra a justiça burguesa e pelo fim dos tribunais militares que deixam os assassinos da juventude negra impunes; pela refogação de todas as reformas que atacam os direitos da classe trabalhadora; pela a igualdade salarial entre negros e brancos, entre homens e mulheres; contra a violência de gênero e lgbtfobia; e contra todo o Estado burgues, usas instituições e ideologias que nos oprime. Assim, confiando nas nossas forças, lutar por uma vida sem a exploração capitalista e qualquer tipo de opressão, uma sociedade comunista.


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FOOTNOTES

[1Moura, Clovis. O negro: do bom escravo ao mau cidadão?.

[2Frantz Fanon, Pele negra, máscaras brancas; Tradução de Renato da Silveira. Salvador, BA: EDUFBA, 2008.

[3Carlos Zeron, Vieira em movimento: subjacências da distinção entre tapuias, tupis e negros. Revista: Estudos avançados(33) 97. 2019

[4Alencastro, Luiz Felipe de. Palmares: batalhas da guerra seiscentista sul-atlântica. in Reis, J. J. e Gomes, F. (orgs.)- Revoltas escravas no Brasil. 1ºed. São Paulo: Companhia das Letras, 2021.

[5Carneiro, Edison. O quilombo dos Palmares, 2ª ed. São Paulo: Companhia editora nacional, 1958.
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Mathias Nery

Estudante de Filosofia - USP
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