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CONUNE 2023 | "Vamos debater com os estudantes por que construir chapas comunistas para o CONUNE"

Em julho acontecerá o Congresso da União Nacional dos Estudantes (CONUNE), a principal entidade estudantil do país, que vai pautar importantes discussões sobre os rumos da entidade diante do governo de frente ampla de Lula-Alckmin. O Esquerda Diário conversou com Giovana Pozzi, Pedro Pequini, Juliana Begiato, Ana Carolina, Pedro Viana, Luiza Eineck, Érika Thuanny, Miguel Gryner e Virgínia Guitzel, militantes da juventude Faísca Revolucionária em diversas universidades do país para saber como eles pretendem organizar a juventude que se interessa pelo comunismo em meio aos debates abertos nas eleições dos delegados para esse congresso.

sexta-feira 5 de maio de 2023 | Edição do dia

Esquerda Diário: Vocês vieram construindo diversas iniciativas como os Tours e grupos de estudos comunistas nas universidades, como veem a relação entre o interesse ideológico da juventude pelo comunismo e a organização no movimento estudantil?

Ana Carolina, estudante da UERJ: Diante da crise, os capitalistas querem nos fazer acreditar que somos uma geração sem futuro, querem que a gente pense que a revolução é um sonho distante, que no máximo podemos sonhar em avançar gradualmente com pequenas conquistas, mas nunca em acabar com essa sociedade de exploração e opressão. E para isso contam com os auxílios de seus governos, sejam aqueles reacionários de extrema direita, como foi com Bolsonaro, mas também os de frente ampla e conciliação, como vemos agora com o governo Lula buscando aprovar um “Arcabouço Fiscal” bastante ao gosto dos neoliberais, para seguir pagando o roubo da dívida pública, enquanto não reverteu os cortes na saúde e educação, e já declarou que não vai revogar as reformas como a trabalhista, a da previdência e a do Ensino Médio. Medidas que atendem os interesses dos empresários e dos patrões e buscam reservar um futuro de miséria para a juventude. Mas nossa inspiração vem da juventude francesa que luta lado a lado com os trabalhadores, questionando esse sistema de miséria.

Pedro Pequini, estudante da USP: Aqui no Brasil, temos um cenário diferente da luta de classes na França, ainda sim toda experiência de aprofundamento da crise capitalista, com governos de extrema direita e avanços bonapartistas no regime desde o golpe de 2016, fez surgir jovens que se interessem cada dia mais pelas ideias comunistas. Jovens que entram nas universidades vendo criticamente esse sistema capitalista e estão buscando respostas, dispostos a estudar o marxismo que tanto coloca medo nos bolsonaristas, para pensar os desafios do nosso tempo. Nossas iniciativas nos permitiu conectar com amplos setores desses jovens, apresentando um pouco do nosso comunismo, que se baseia na tradição trotskista como forma de resgatar os fios de continuidade com o marxismo revolucionário. Com os Tours e os grupos de estudos pudemos aprofundar um pouco sobre a história de luta das nossas universidades e do movimento estudantil, estudando o marxismo como uma teoria viva para pensar a prática dos revolucionários do nosso tempo, desde o debate de ideias contra a ideologia dominante, até os debates sobre a própria organização da nossa classe, contra as visões reformistas e de conciliação. Agora queremos conectar esses debates com nossa atuação e batalha prática no movimento estudantil, também como forma de combater a lógica burocrática com que o Conune sempre é construído, como uma disputa por cargos entre os movimentos, na qual a organização des estudantes sempre fica de lado.

ED: Qual o balanço que vocês fazem da atuação da UNE no último período?

Virgínia Guitzel, estudante da UFABC: A pandemia impactou muito na organização do movimento estudantil, como es estudantes estão sempre se renovando, manter presente a tradição de lutas e organização é sempre um desafio. Ainda mais diante de um avanço da burocratização das nossas entidades e de uma profunda institucionalização do papel que elas podem cumprir, vimos que se aprofundou uma concepção das entidades como meras gestoras dos problemas acadêmicos dos estudantes, inclusive aprofundando a relação entre essas entidades e os órgãos burocráticos das universidades. Acreditamos que esse é um dos grandes debates a serem feitos, pois em nossa visão as entidades estudantis precisam ser ferramentas democráticas, que impulsionem a autoorganização des estudantes ao lado des trabalhadores de dentro e fora das universidades, com independência política e organizativa das reitorias e dos governos. Nós estudantes, fomos os primeiros a sair às ruas contra os ataques do governo Bolsonaro, protagonizamos o Tsunami da Educação, mas naquele momento a direção majoritária da UNE, composta pela UJS/PCdoB, pelas correntes do PT e pelo Levante Popular da Juventude, aceitou a chantagem do Rodrigo Maia e entregou toda disposição de mobilização da juventude, separando conscientemente nossa luta da luta contra a reforma da previdência. O último Congresso presencial da UNE aconteceu no mesmo momento em que esse grande ataque foi aprovado em 2019, de lá para cá a entidade só aprofundou a separação das nossas lutas, como vimos nos atos chamados pela revogação do novo ensino médio esse ano.

Giovana Pozzi, estudante da UFRGS: Ao longo do governo Bolsonaro a política da entidade foi atuar nas frentes, como a pelo Fora Bolsonaro, defendendo que a luta dos estudantes deveria ter como horizonte máximo aceitar a conciliação com os empresários e a direita, como se esse fosse o caminho para se enfrentar com Bolsonaro e a extrema direita. Enquanto não fazia as assembleias e espaços de auto-organização do movimento estudantil nos cursos, a majoritária da UNE do PT e PCdoB defendeu que a juventude aceitasse a conciliação de Lula não só com Alckmin, mas com todos aqueles que aprovaram as reformas e votaram quase 80% dos projetos de Bolsonaro, como Simone Tebet, e promoveu a confiança nas instituições como no Judiciário, que esteve junto a todos os ataques. A UJS chegou a defender que a UNE deveria convocar o fracassado ato do MBL contra Bolsonaro, mostrando que não tem limites na sua política de conciliação com a direita. Infelizmente ao longo de todo esse momento vimos muitas correntes de oposição, não só se adaptarem à essa política, mas ser parte de apoiar acriticamente a frente ampla, enquanto reproduziam em algumas universidades a mesma lógica da majoritária de construir fóruns burocratizados e afastados da base estudantil, deixando que as lutas fossem decididas por calendários tirados nas reuniões de cúpula das organizações. Isso aconteceu mesmo nas entidades dirigidas pelos movimentos que se colocam no campo da oposição dentro da UNE, como as juventudes do PSOL, o MUP/PCB e a Correnteza/UP. Inclusive rechaçamos fortemente que agora a UJS esteja criando DCEs e entidades estudantis de forma burocrática só para eleger seus delegados para o Congresso, esse elemento só reforça como precisamos construir uma oposição antiburocrática de fato. Essa reflexão é fundamental, porque queremos que Bolsonaro pague por todos os seus crimes, inclusas as mais de 700 mil mortes pela COVID, mas precisamos arrancar isso em luta junto à classe trabalhadora, sem nenhuma confiança nas instituições que implementaram os ataques.

ED: Mas diante desse balanço, porque uma juventude comunista deve atuar nesse Congresso?

Érika Thuanny, estudante da UFRN: Apesar da direção majoritária da UNE que defende uma política de conciliação de classes e há anos dirige burocraticamente a entidade, nós sempre batalhamos para que elas sejam ferramentas de luta e de auto-organização des estudantes. Acreditamos ser importante participar desse processo construindo chapas comunistas nas universidades como uma forma de seguir debatendo qual é o programa e a estratégia que pode de fato apontar um caminho para a juventude, que não seja simplesmente se resignar a sempre aceitar o menos pior, diante de uma extrema direita que segue como força social e política. Por exemplo, rechaçamos veementemente toda perseguição contra o MST, e sempre debatemos com todes como é a política de conciliação com o agronegócio o que abre caminho para que o bolsonarismo tente criminalizar os movimentos sociais. Nossa tarefa como juventude é construir um outro caminho que não seja eternamente apostar na conciliação com os nossos inimigos, mas sim defender uma reforma agrária radical que se enfrente com os lucros do agronegócio. E para isso é necessário defender que a UNE e as entidades estudantis sejam independentes dos governos e das reitorias, essa é uma grande discussão a ser feita rumo ao congresso, já que vários partidos são parte desse governo de frente ampla, como o próprio PSOL ou como a UP faz aqui no Rio Grande do Norte sendo parte do governo estadual de Fátima Bezerra, que deixa trabalhadoras terceirizadas da saúde passando fome com sistemáticos atrasos de salários.

Juliana Begiato, estudante da Unicamp: Sim, nós também viemos intervindo ativamente em diversas lutas de trabalhadores terceirizados nas universidades, aqui na Unicamp construímos junto com outros estudantes um Comitê em defesa dos trabalhadores terceirizados, e somos parte daqueles setores que constroem nacionalmente um manifesto contra a terceirização e a precarização do trabalho, impulsionado por professores como Ricardo Antunes, Jorge Souto Maior e mais de mil intelectuais, referências sindicais e dos movimentos sociais e parlamentares. Como colocou nossa companheira Diana Assunção, fundadora do Pão e Rosas, a precarização do trabalho tem rosto de mulher, e no Brasil é de mulher negra. Como uma juventude comunista não aceitamos que o conhecimento que produzimos dentro das universidades conviva com tamanha exploração e opressão que é parte de sustentar esse sistema capitalista, por isso, defendemos que todos os trabalhadores terceirizados sejam efetivados com todos os direitos. Construiremos chapas que também irão impulsionar essa campanha nacional contra a terceirização e a precarização do trabalho, e queremos propor que todos os outros movimentos se somem a essa iniciativa, porque essa é uma demanda que deve ser levantada em unidade por todo movimento estudantil, não podemos aceitar que em nossas universidades famílias fiquem na rua porque para a reitoria e os governos esses trabalhadores são considerados apenas “postos de trabalho”.

ED: Para concluir, como vocês veem a relação da UNE com o novo governo da frente ampla e qual a perspectiva que vocês defendem?

Luiza Eineck, estudante da UnB: Como meus camaradas já colocaram, a independência política das nossas entidades é um elemento muito importante e sempre vem acompanhada de um debate sobre qual é o programa que vamos defender. Sabemos que os estudantes não são uma classe, somos um grupo policlassista, mas como comunistas atuamos nas universidades disputando cada estudante para uma perspectiva que seja se aliar a classe trabalhadora. E isso passa por defender um programa que busque atender esses interesses, como a luta em defesa das cotas etnico-raciais, pela aprovação das cotas trans, rumo ao fim do vestibular e a estatização das universidades privadas. Outra discussão importante é que muitos setores defendem que agora o papel das universidades é trabalhar para ajudar Lula a reconstruir o país com os empresários, em nossa visão nosso papel é disputar es estudantes para questionar que a universidade esteja a serviço dos capitalistas, defendendo que o conhecimento que produzimos esteja a serviço da classe trabalhadora e de toda população. Queremos colocar em debate se o papel da juventude é formar quadros que vão auxiliar os governos e as empresas a administrar esse sistema que produz crises e guerras, ou se vamos disputar o conhecimento para que ele possa estar a serviço de questionar a ordem capitalista e de apontar uma saída para a resolução dos problemas da população pobre e oprimida. E para defender essa perspectiva, nossos aliados não estão na frente ampla do governo, mas sim na classe trabalhadora e nos movimentos sociais. Queremos debater com todas as organizações que também compartilham a defesa de que a UNE seja independente do governo e das reitorias, como as juventudes do PSTU e da CST com quem construímos o Polo Socialista e Revolucionário ano passado. como podemos levar adiante essa batalha rumo ao Congresso da UNE, combatendo a política burocrática da direção majoritária que pretende subordinar o papel da nossa entidade as articulações com as reitorias e ao projeto do governo de frente ampla.

Miguel Gryner, estudante da UFF: Como a Lu colocou, os tubarões da educação como Lehman, que participou do governo de transição, vem tendo seus interesses atendidos. O Ministro Camilo Santana e Lula já garantiram que não vão revogar a reforma do ensino médio, que vem precarizando a vida dos professores e exclui ainda mais quem estuda nas escolas públicas. Além disso, também querem passar no Congresso o Novo Arcabouço Fiscal, uma política que substitui o teto de gastos e ameaça a médio prazo a garantia de investimento constitucional da educação em nome de pagar a fraudulenta dívida pública. Essas políticas, o loteamento da FNDE para o Centrão e a não recomposição de mais de 10 anos de cortes demonstram que a educação seguirá sendo um problema estrutural no Governo Lula-Alckmin. O aumento parcial das bolsas em um valor de 2,5 Bi se dá por um valor menor do que o novo Orçamento Secreto de Arthur Lira dá o tom dos limites de um projeto para a educação pautado na conciliação com os capitalistas. Para uma universidade à serviço dos trabalhadores a educação e todo conhecimento não pode ser fonte de lucro, mas um direito de todos. Isso só pode ser conquistado pela nossa mobilização ao lado dos trabalhadores de forma independente desse governo que vem dando todas essas sinalizações aos empresários.

Pedro Viana, estudante da UFMG: Acreditamos muito no potencial da juventude aliada a classe trabalhadora, como vem sendo a intervenção dos nossos camaradas do Le Poing Levé na luta contra a reforma da previdência na França, do Left Voice nos EUA, que esteve nas ruas com o Black Lives Matter e com a Geração U fundando sindicatos contra bilionários capitalistas. Como fazem nossos companheiros que foram parte da rebelião no Chile e agora se enfrentam com os ataques do governo Boric, e os que estão lutando contra a golpista Dina Boluarte no Peru, que vergonhosamente contou com o apoio de Lula para se manter no poder, também nossos camaradas do PTS, que na Argentina vem se enfrentando com o ajuste do governo de Alberto Fernandez e com a extrema direita liberal de Javier Milei, construindo a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores Unidade, que foi a terceira força política do país nas últimas eleições e está presente em todas as lutas para defender que es trabalhadores assumam o controle. Somos parte dessa juventude internacionalista que no Brasil quer se apropriar dessas experiências, resgatando também as lições de luta do movimento estudantil para poder despertar nessa nova geração, que de tanto os bolsonaristas falarem mal do comunismo quer conhecer essas ideias, a vontade serem sujeitos para atuar na luta por transformar essa sociedade pela raiz. Uma luta que vai muito além daquele pensamento gradualista que os reformistas tentam fazer parecer como a única alternativa possível, como se nosso destino fosse ir aos poucos conquistando terreno por dentro desse sistema e das suas instituições para avançar com as ideias socialistas e a revolução fosse um futuro distante. Quando na verdade essa é uma forma de canalizar a disposição que existe em nossa juventude para questionar esse sistema, vendendo a ideia de que podemos ter mais representatividade e uma sociedade mais “inclusiva e popular” sem acabar com os pilares que sustentam o capitalismo, o que só serve para impedir que possamos construir desde agora uma força revolucionária e comunista que tanto faz tremer os bolsonaristas e os capitalistas. Nossas chapas e intervenção rumo ao Conune estão a serviço de aprofundar esses debates e essas perspectivas.




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