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Editorial MRT | É urgente uma luta nacional para derrubar o arcabouço fiscal do governo Lula-Alckmin

Os primeiros meses do ano de 2024 indicam que estamos diante de uma mudança na conjuntura política do país. O segundo ano do governo Lula-Alckmin apresenta mais instabilidade, diminuição da popularidade e percepção em uma parcela ampla da população de que a economia está piorando. Não se trata de uma inflexão abrupta, nem de uma correlação de forças mais à esquerda na situação política, mas de um cenário de maior questionamento, com expressões políticas contraditórias à direita e à esquerda, incluindo ameaças reacionárias de um lado, e movimentos e greves de trabalhadores de outro.

Diana AssunçãoSão Paulo | @dianaassuncaoED

quarta-feira 17 de abril | Edição do dia

Os primeiros meses do ano de 2024 indicam que estamos diante de uma mudança na conjuntura política do país. O segundo ano do governo Lula-Alckmin apresenta mais instabilidade, diminuição da popularidade e percepção em uma parcela ampla da população de que a economia está piorando. Não se trata de uma inflexão abrupta, nem de uma correlação de forças mais à esquerda na situação política, mas de um cenário de maior questionamento, com expressões políticas contraditórias à direita e à esquerda, incluindo ameaças reacionárias de um lado, e movimentos e greves de trabalhadores de outro. Conforme elaborou Danilo Paris em texto recente, poderíamos definir como o “fim da lua de mel” com o governo.

A base desse processo está na própria economia. O primeiro ano do governo foi marcado pelo 8J, a fracassada ação bolsonarista que permitiu Lula integrar e estabilizar a frente ampla e, portanto, parte considerável do regime político, contra o golpismo da extrema-direita. Nesse contexto, foi votada a PEC de transição, que permitiu ao governo gastos maiores que a tônica neoliberal vigente nos últimos anos e assentou bases materiais para uma precária estabilidade. No entanto, 2024 está marcado pela implementação do arcabouço fiscal, reafirmando o compromisso de Lula e Haddad com a velha cartilha neoliberal, aplicando um duro ajuste fiscal que começa a ser sentido por parcelas importantes da população.

Nesse sentido, temos de um lado o peso do ajuste contra os trabalhadores, e, por outro lado, a resposta do governo de conciliação e inclusive de pactos com a extrema-direita, que se expressam nas sistemáticas concessões econômicas para os militares, com aumentos de salários e benefícios. Ou o caso ilustrativo de São Paulo, em que Lula pactua e oferece verbas para os planos de Tarcísio, um governo de extrema-direita que vem tentando implementar privatizações de serviços estratégicos, introduzindo a plataformização nas escolas, perseguindo professores, e sendo responsável pela maior chacina do Estado desde o massacre do Carandiru em Santos, com uma polícia cada vez mais truculenta com o conjunto da população. Não por um acaso greves têm explodido nacionalmente entre servidores de universidades, professores e outros setores da educação, uma vez que enquanto pactua com militares e forças policiais, o governo oferece zero de reajuste para a educação, num duro ataque aos trabalhadores. O movimento estudantil das universidades e institutos federais começa a dar demonstrações de uma retomada com a aprovação de greves estudantis, além do apoio às greves dos trabalhadores.

Mais do que isso, esse começo de ano também foi marcado pelo aprofundamento das reformas dos governos anteriores. Até então, denunciamos como o governo tem mantido intactas reformas como a trabalhista, previdenciária e o novo ensino médio. A tragédia atual é que em muitos âmbitos o governo não só não as revogou, como vem aprofundando. Um exemplo forte e que está dando a tônica é o arcabouço fiscal, uma espécie de teto de gastos 2.0 e que vai mostrar, ao longo desse ano, sua potencialidade danosa contra direitos dos trabalhadores e verbas para os serviços públicos. O mesmo poderíamos dizer sobre o chamado PL da uberização, criando a categoria de “trabalhador autônomo com direitos”, uma aberração jurídica que visa “legalizar” a exploração via aplicativos, a chamada uberização, que termina de ser um complemento reacionário à reforma trabalhista de Temer, como denunciou importante ato realizado em São Paulo, impulsionado pela articulação que leva adiante o trabalho com o Manifesto contra a terceirização e a precarização. Além disso, no caso da reforma do ensino médio, o governo manteve seus pilares fundamentais, e tem aberto espaço para voltar o discurso de “escola sem partido” e formas de perseguição e controle dos professores, que em alguns estados devem seguir a cartilha do governo estadual, controlados pelas plataformas, cuja ênfase é ensinar tecnologias e empreendedorismo. Em suma, preparar a juventude para ser força de trabalho de aplicativos sem direitos.

É evidente que com uma política nesses marcos, a extrema-direita se fortalece, ao mesmo tempo que parte dos trabalhadores que têm ilusões na frente ampla vão percebendo seus limites. Do ponto de vista da direita, é fundamental percebermos que os efeitos de um cenário internacional instável com os conflitos militares e, em particular, o contexto de eleição norte-americana em alguns meses, vão se expressar no país nos próximos meses. Demonstração disso é a ultra reacionária aparição de Elon Musk buscando incidir na política brasileira e moralizar a base bolsonarista, uma ação abertamente imperialista de intervenção na política brasileira – ainda que a disputa se dê com o STF, que tem resguardado todos os planos de ataques do governo e, não nos esqueçamos, foi um pilar central do golpe institucional que abriu caminho para todos os ataques e para a própria extrema-direita, como aliado da ala Democrata do imperialismo.

Nesse sentido, embora já tenha revelado seu insistente fracasso estratégico na história recente do país, a esquerda institucional, particularmente o PSOL assumindo esse papel centralmente, vem tendo como norte político e de suas figuras, diante das instabilidades, apontar como estratégia a defesa do governo. E o que é cada vez mais trágico no caso do PSOL são posições como a de dizer que o PL da uberização "são pequenos avanços, para quem não tem nada" relativizando o nível de destruição de direitos que este PL significa. Sua defesa do governo Lula-Alckmin coloca este partido na posição de, na prática, defender medidas como estas do governo e relativizar os ataques, como o arcabouço fiscal, quando não são eles próprios a implementar os ataques e a repressão, como é o caso da prefeitura de Edmilson em Belém, que nega até mesmo um salário mínimo aos servidores municipais. Vale ressaltar também que depois da rebelião da base contra a direção da Apeoc no Ceará, o PSOL segue nesta mesma direção junto com PT que soltou nota chamando os trabalhadores de “fascistas”.

Nós, do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT) acreditamos que, ao contrário disso, a única maneira de enfrentarmos as ameaças da direita reacionária e os interesses do capital estrangeiro é nos contrapormos a essa cartilha neoliberal que vem sendo implementada pelo ministro da economia Haddad, começando pela luta incondicional por derrubar o arcabouço fiscal, o PL da uberização, a reforma do ensino médio e o conjunto dos ataques que vieram sendo feitos, incluindo aos crimes ambientais e contra os povos indígenas (que continuam a ser perseguidos pelo garimpo ilegal mesmo após um ano e alguns meses de governo). É necessário apontar para um programa anticapitalista, que questione inclusive os mecanismos do capital estrangeiro de espoliação de nosso país, levantando a bandeira do não pagamento da dívida pública - e unificar essa luta internacional, uma vez que o mesmo FMI tem sido um pilar de destruir a economia argentina com sua pressão imperialista por reformas e retirada de direitos.

Nesse sentido, é fundamental que os comunistas e a vanguarda trabalhadora potencializem cada uma dessas greves, enfrentando os ataques do governo federal com uma saída pela esquerda, de independência de classe, moldando uma vanguarda no país inteiro que diga não ao arrocho levantando a bandeira da revogação do arcabouço fiscal. Quanto mais forte for essa vanguarda, mais consciente estiver e organizada para a luta, melhores estarão nossas condições para enfrentar qualquer ameaça pela direita e as tentativas imperialistas de fortalecer o bolsonarismo no país. Contrapor-se a organização e luta independentes com o argumento de defesa do governo diante da direita, como as organizações do PSOL vem fazendo, é o caminho seguro para o abismo político e a incorporação das direções dessas organizações em novas burocracias políticas em defesa do status quo, pois abandonam a perspectiva de impulsionar a classe trabalhadora como sujeito político independente diante de ataques do governo e ameaças da extrema-direita. E nesse sentido abandonam a luta por buscar impor às direções das grandes centrais que de fato organizem a frente única operária.

De nossa parte buscamos batalhar em cada local de trabalho e estudo e em cada luta em curso para levantar essas bandeiras e um programa anticapitalista. No Congresso do Sindicato dos Metroviários fomos a corrente que batalhou pela unificação da nossa classe, em defesa dos trabalhadores terceirizados (lutando pela sua efetivação) e enfrentando os setores que não queriam se posicionar contra o PL da uberização (o rechaço a essa legalização da exploração das plataformas foi aprovado pelos metroviários). Buscamos também na Subsede da APEOESP de Santo André impulsionar a organização unitária dos professores efetivos e Categoria O contra a precarização e plataformização docente. Na campanha eleitoral para o Sindicato dos petroleiros do Rio de Janeiro estamos dando a batalha contra a burocracia sindical da FUP que com ajuda da Resistência-PSOL quer retomar o sindicato para ser um braço do governo. E no próximo Congresso dos Trabalhadores da USP batalharemos em defesa da tradição classista deste sindicato. Intervenções que apontam no sentido de construir uma corrente de independência de classe com um programa para enfrentar os ataques em cada estado e nacionalmente. E nas universidades federais em vários estados do país, com a juventude Faísca na linha de frente da solidariedade à greve dos TAEs e agora dos professores, mas também na linha de frente das greves estudantis na UFF e UnB, e debatendo em diversas federais sobre a necessidade de uma greve nacional unificada. Tudo isso vem combinado a uma forte defesa das ideias marxistas, com ferramentas como a nova revista Ideias de Esquerda - Especial Feminismo e Marxismo, que pretende ser uma arma contra a opressão e a exploração.

As turbulências no Oriente Médio diante do massacre na Palestina perpetrado por Israel, a continuidade da guerra na Ucrânia e as crescentes tendências militaristas nas potências, ao mesmo tempo que vemos uma articulação internacional da extrema-direita (com possibilidades de ganhar novos governos, como nos EUA), colocam a necessidade de uma resposta internacionalista dos trabalhadores, como expressamos na declaração internacional da Fração Trotskista com 3 propostas urgentes de campanhas internacionalistas. No Brasil, temos como organização participado das ações em defesa do povo palestino e comitês por todo o país, exigindo a ruptura das relações diplomáticas e comerciais com Israel. Como parte dessa batalha, no Rio de Janeiro, a Faísca Revolucionária e o Pão e Rosas reuniram cerca de 500 pessoas no Festival Palestina Livre do Rio ao mar, com diversos artistas e saudações das Mães que lutam por justiça para as vítimas da violência do Estado.

As batalhas que têm sido feitas na Argentina contra o ultraliberal Milei mostram o caminho, que deve ser de luta e não de conciliação. Nos inspiremos nesse exemplo, do qual nos orgulhamos de estar na linha de frente com o PTS na FIT-Unidade impulsionando a organização e luta a partir de muitos locais de trabalho e de uma atuação revolucionária no parlamento, para nos preparar para os próximos eventos da situação política nacional batalhando por uma saída de independência de classe.




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