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Campanha salarial
Lições da campanha salarial dos servidores municipais de Campinas
Guilherme Zanni
Professor da rede municipal de Campinas.
Nossa Classe - Educação
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A campanha salarial dos servidores municipais de Campinas terminou com uma escandalosa traição da direção do STMC (Sindicato dos trabalhadores do serviço municipal de Campinas).

Contrariando as expectativas de Dário e do STMC, os trabalhadores encheram o paço municipal em assembleia para ouvir que a prefeitura mantinha a mesma proposta da assembleia anterior mais 2,87% de reajuste em janeiro de 2023, além de uma promessa de bonificação diferente para cada categoria. Em uma votação repetida três vezes, os trabalhadores rechaçaram a proposta da prefeitura e massivamente gritaram por greve. Mesmo assim, a diretoria do STMC disse que aceitaria a proposta, encerrou a assembleia e tiveram que sair escoltados pela GCM de Dário que ainda reprimiu os servidores.

A resposta da assembleia foi admirável. Demonstrou uma enorme vontade de luta e um sentimento de ódio contra a burocracia sindical. Além de colocar os burocratas para correr, se organizou em ato até a reacionária câmara de vereadores.

Não foi a primeira vez que a direção do sindicato, ligada ao PSB (partido de Jonas Donizette e Alckmin) e filiada à CTB, ficou do lado da prefeitura e utilizou de manobras e métodos burocráticos contra os trabalhadores. Contudo, o contexto político atual é fundamental para compreender o empenho por parte da direção do STMC para impedir qualquer desenvolvimento da luta.

Nesse texto, buscamos relembrar alguns antecedentes da nossa campanha salarial, mostrar o sentido político da traição da direção do STMC e refletir sobre quais lições podemos tirar para que nossas lutas não estejam nas mãos de aliados do governo.

Os trabalhadores municipais mostraram força para lutar e enfrentar a burocracia do STMC

O primeiro semestre deste ano teve importantes batalhas e mobilizações dos servidores municipais. Em janeiro, monitoras e agentes de educação infantil se mobilizaram exigindo reconhecimento enquanto carreira do magistério. Logo em seguida, as trabalhadoras terceirizadas da limpeza das escolas começaram a se mobilizar e fizeram uma fortíssima greve exigindo o pagamento dos salários e benefícios por parte da empresa Especialy. O apoio dos trabalhadores efetivos foi muito importante, buscando romper a divisão que os patrões buscam impor entre terceirizados e efetivos.

Ainda em fevereiro, ocorreram assembleias autônomas, organizadas por setores da oposição, contra o sindicato que dizia que só discutiria campanha salarial em maio, mês de nossa data-base. Essas assembleias foram organizadas em resposta a negociação a portas fechadas do sindicato com a prefeitura que definiu um bônus de R$ 800 e 20% de reajuste no vale alimentação como reposição dos dois anos de salários congelados durante a pandemia e de enormes aumentos da inflação e da carestia de vida.

Somente em meados de maio, o STMC falou sobre campanha salarial, definindo as pautas e formando uma comissão de negociação com a prefeitura sem discussão alguma com os trabalhadores e trabalhadoras. Entre as pautas definidas pelo sindicato, estava o reajuste salarial de 25,68%, entre outros pontos. Sendo que, em meio à crise econômica, com inflação alta e sem reajuste salarial a três anos, os trabalhadores já acumulam perdas salariais que chegam a 40,2%.

Na primeira assembleia, após a mesa de negociação em que a prefeitura não apresentou índice algum, nada foi encaminhado, embora boa parte dos trabalhadores presentes na assembleia já expressavam a necessidade de organizar uma greve. Na segunda mesa de negociação, Dário Saadi propôs 12,13% de reajuste, referente à inflação oficial dos últimos doze meses, e aumento de R$100 no vale alimentação. Em uma manobra extremamente burocrática, quando a esmagadora maioria da assembléia gritava a necessidade de iniciar uma greve, a diretoria do sindicato colocou para votação somente “estado de greve”, mantendo os trabalhadores paralisados até a próxima mesa de negociação e assembleia que viria a acontecer somente duas semanas depois, em véspera de feriado.

Nessa altura, era possível que uma greve forte dos servidores municipais de Campinas se somasse a outras lutas em curso no país naquele momento. Professores da educação básica e superior em Minas Gerais pouco tempo antes realizaram uma importante greve contra Kalil e Zema; os metroviários da CBTU lutaram contra as privatizações incentivadas por Bolsonaro e Mourão; em Volta Redonda, trabalhadores entraram em greve contra a privatização da CSN. Professores da rede municipal de Salvador pararam, e, aqui na região, tivemos uma semana de greve de trabalhadores terceirizados da Replan. Greves como essas tinham o potencial de se unificar e apresentar um caminho pela luta de classes na conjuntura reacionária do Brasil de Bolsonaro, Mourão e Guedes, onde os salários são corroídos pela inflação, os direitos são arrancados, impondo precariedade da vida à população e beneficiando empresários e acionistas.

Nós do Movimento Nossa Classe temos clareza que regionalmente era estratégico para a burocracia do STMC impedir uma greve dos servidores contra Dário Saadi. Uma luta decisiva poderia ser mais um fator de instabilidade na conjuntura, poderia gerar solidariedade e influenciar outras categorias.

Através do Esquerda Diário e de nossos militantes divulgamos as ações dos servidores contra Saadi e burocracia do STMC. Construímos a solidariedade a essa batalha com apoio dos estudantes da Unicamp que constroem a Faísca Anticapitalista e Revolucionária, e com professores de diversas escolas da rede estadual.

Exigimos a destituição da comissão de negociação e a votação em assembleia de uma nova, assim como, de uma nova pauta que atendesse as necessidades das categorias da educação, saúde e assistência social, e fosse definida democraticamente. Buscamos colocar nossas forças à disposição para fortalecer o espírito combativo e raivoso contra a campanha do STMC compromissada com a prefeitura.

O sentido político da traição em meio a longa trégua das Centrais Sindicais

Os servidores municipais acumulam experiências inúmeras de que não podem confiar nessa burocracia encastelada no nosso sindicato. É prática frequente a perseguição de ativistas da oposição, como o processo contra ativistas da chapa 2 das últimas eleições sindicais e militantes do MST, assim como os golpes em assembleias e eleições.

Não suficiente, a atual direção do STMC antes ligada à prefeitura de Jonas Donizette (do mesmo PSB de Alckmin e um dos cotados para ser vice-governador de Haddad), manteve a boa relação com a prefeitura na atual gestão de Dário Saadi, do reacionário e pró-Bolsonaro Republicanos.

O histórico de traições do PSB não é novidade. No entanto, ela ocorre em um momento onde as burocracias sindicais conjuntamente estabeleceram uma verdadeira trégua com os governos, em nome de preservar a ordem social até as eleições. Não devemos esquecer, que a chapa Lula-Alckmim tem como protagonista o próprio PSB que dirige sindicatos pelo país, mas defende posições diretamente burguesas, anti operárias. O pacto eleitoral construído por Lula e o PT é um aceno para a burguesia de que suas administração não atingirá os interesses dos empresário e grandes capitalistas. Uma proposta assim necessita que as burocracias sindicais sinalizem para a burguesia que são eficientes em impedir a luta de classes.

Todo empenho em travar a luta dos servidores municipais por parte do STMC não está desligado da política municipal, estadual e nacional. E é por isso que defendemos que a independência de classe, a mobilização, organização e ação direta dos trabalhadores é a única saída que podemos ter, tanto para arrancar conquistas, como para, nos unir às outras lutas contra o reacionário governo Bolsonaro. Isso, sem seguir a política de conciliação de classes do PT que é incapaz de enfrentar o bolsonarismo com suas alianças com a direita, incluindo com nosso inimigo Alckmin.

Por um sindicato independente do Estado, com democracia operária e contra o corporativismo!

Para avançar na luta por melhores salários, condições de trabalho, mais contratações, o que afetaria diretamente a qualidade dos serviços prestados à população, é necessário se enfrentar com a prefeitura de Dário Saadi, mas também com a atual direção do STMC. Os métodos que favorecem a luta dos trabalhadores são os que colocam nossa classe na linha de frente das ações e decisões, defendendo a mais ampla democracia operária. Começando por construir nas bases as nossas assembleias e respeitar a soberania desse espaço, construindo também comitês com representantes revogáveis de cada local de trabalho (escolas, postos de saúde, hospitais, etc).

Defendemos, a rotatividade dos diretores sindicais liberados, e o fim dos privilégios que garantem aos diretores sindicais que deixem de ser trabalhadores se afastando da realidade da nossa classe, e se dediquem a carreiras políticas burguesas, como é o caso de Marionaldo, antigo diretor do STMC, que chegou ser secretário dos Recursos Humanos de Jonas Donizette, hoje é presidente do Camprev e ajudou a aplicar duas reformas da previdência contra os servidores.

Tal perspectiva se liga à batalha pela unidade das fileiras operárias, contra a divisão entre efetivos e terceirizados, em defesa da efetivação de todos os terceirizados sem necessidade de prestar concurso público. Também pela aliança com a população, ou seja, não como sindicalistas defensores somente dos interesses de uma categoria, mas defendendo respostas às necessidades do conjunto dos setores explorados e oprimidos. Uma perspectiva independente, democrática e anti burocrática como essa nos permitiria poder atuar como uma alavanca para potencializar a força de toda a classe e sua capacidade de conduzir a luta de todos os oprimidos.

Na nossa opinião essa perspectiva deve ser de toda a oposição. Um dos perigos que a rotina sindical impõem à luta dos trabalhadores é de restringir nossas demandas unicamente as pautas da categoria, e somente, aquelas que são pragmaticamente negociáveis. Nossa oposição à burocracia, vai além de exigirmos mais direitos ou um maior índice, temos concepções do que devem ser os serviços públicos radicalmente opostas e isso deve estar explícito em nossa luta. No contexto atual, em que políticos de direita e a mídia tentam difamar a imagem dos servidores como priveligiados, nossa batalha deve ser para que os serviços como saúde, educação e assistência social estejam a serviço e sejam controlados pelo conjunto da população. Um sindicato corporativista e compromissado com as administrações é o oposto dessa perspectiva.

Nós do Movimentos Nossa Classe lutamos para forjar esta tradição, baseada na auto-organização e na independência de classe, para arrancar os sindicatos das mãos da burocracia e colocá-los a serviço da luta de classes. Consideramos que o enfrentamento da categoria contra a direção pelega do STMC, que vimos nessa campanha salarial, é um grande exemplo de luta que precisa ser incentivada através da construção de organismos de base em nosso local de trabalho.

As assembleias autônomas seriam ainda mais fortes e com mais potencial para superar os pelegos com uma forte organização democrática e pela base, a partir de cada local de trabalho. Assim intervimos nas assembleias e em nossas escolas.

Consideramos que após a traição do STMC, poderia ter sido articulado um forte movimento pela continuidade da construção de uma greve, que exigisse assembleia e espaços de organização e pela destituição da comissão pelega de negociação. Nossa luta contra a burocracia sindical, além dos períodos eleitorais, deve implicar em impor a força dos trabalhadores nos momentos decisivos de luta contra a vontade das próprias direções sindicais quando elas estão aliadas aos governos ou aos patrões.

Consideramos fundamental que a oposição à atual diretoria do sindicato crie espaços de auto organização democráticos que imponham a vontade dos trabalhadores, sem capitular a conciliação de classe imposta pela burocracia sindical e pelo projeto eleitoral de Lula-Alckmin. A oposição em Campinas, possui uma contradição, PT e PCdoB se colocam como oposição ao STMC, mas em outros lugares, como Metrô de São Paulo formam uma mesma chapa que, como aqui, aceitam ataques e submetem burocraticamente os trabalhadores aos acordos com a empresa. Agora que a campanha salarial chegou a um fim, essas forças políticas que se colocam na categoria estão voltadas para as eleições e, tragicamente, estarão unidas com o mesmo partido, PSB, anti trabalhador que dirige o STMC. O PT e o PCdoB que dirigem as centrais sindicais CUT e CTB (mesma central que se encontra o STMC) deveriam romper a trégua que se encontram esperando as eleições e colocar toda sua estrutura para lutar na rua contra as ameaças golpistas do bolsonarismo, a fome, inflação, assassinatos de Dom e Bruno… Motivos para se parar o país não faltam.

Infelizmente, a maioria das correntes do PSOL, também embarcaram a seu modo na chapa Lula-Alckmin e estão fortalecendo a ilusão de que a extrema direita vai ser derrotada fundamentalmente pelas eleições e não pela luta de classes. Por isso, achamos que é fundamental, que as correntes que atuam na categoria e também são críticos a conciliação de classes, escancarada na chapa Lula-Alckmin, como as que estão no Coletivo Trabalhadores em Luta, se utilizem da experiência da campanha salarial para debater com a categoria que a traição que vivenciamos na campanha salarial é fruto de uma política que rifa a luta dos trabalhadores para administrar o Estado capitalista. Nesse sentido, não podemos separar a luta sindical para retomar o STMC da política nacional, da batalha para construir uma força operária independente que possa derrotar Bolsonaro e as reformas, como a trabalhista e da previdência, que geram fome e tanto desespero da população. E isso só pode se dar pela luta de classes, pela força independente dos trabalhadores. Não serão atos eleitorais com empresários, banqueiros e a FIESP que vão derrotar as ameaças de Bolsonaro e seu projeto econômico, já que esses atores o fortaleceram e querem garantir que esse legado de reformas do golpe seja preservado. Somente com um plano de lutas, com paralisações e greves, para que a classe trabalhadora entre em cena como sujeito independente, poderemos enfrentar Bolsonaro e a extrema direita, com representantes como Dário, e todos os ataques contra os trabalhadores.

Nós nos orgulhamos de participar dessa batalha dos servidores municipais de Campinas. Aqui, debatemos ideias que consideramos importantes para avançar em futuras lutas, e nos preparar para batalhas decisivas que exijam retomar os sindicatos para as mãos dos trabalhadores, lutando por nossas demandas e construindo um movimento para derrotar as reformas, a extrema direita e o bolsonarismo na luta de classes. É urgente uma saída operária para essa crise, que se aprofundou ainda mais desde a pandemia, com centenas de milhares de mortes. Precisamos enfrentar os capitalistas no nosso terreno, na luta de classes, para que eles paguem pela crise.

 
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