As condições básicas para garantir o direito à maternidade passa pelo acesso à educação de qualidade, creches nos locais de trabalho e estudo, saúde, pleno emprego, moradia etc. Estes são direitos negados à população pobre de conjunto, a qual é em sua maioria negra e que impacta diretamente no direito da mulher negra que decide ser mãe.
Durante a pandemia, no dia 02 de junho de 2020, a morte do menino Miguel em decorrência do descaso da que era patroa de sua mãe, que o abandonou sozinho no elevador que o levou ao nono andar de onde caiu, lançou luz sobre essa questão. Mirtes Renata, mãe de Miguel, era trabalhadora doméstica da família de Sarí Corte Real e Sérgio Hacker, que neste momento era prefeito de Tamandaré pelo PSB. Mirtes teve que sair para levar o cachorro da família para passear e deixou seu filho aos cuidados de Sarí, que preferiu fazer as unhas à cuidar da criança por alguns minutos.
Mirtes, uma mulher trabalhadora e negra, não pôde decidir não levar seu filho ao trabalho - sem escola e tendo o governo decretado o trabalho doméstico como “essencial”, ela teve que ir trabalhar - mesmo sob o risco de se contaminar de covid. Naquele 02 de junho, o racismo e o capitalismo tiraram o direito de Mirtes de estar com seu filho em segurança.
E quantas outras mães negras têm esse direito roubado todos os dias nas vilas, favelas e palafitas deste país, que possui a polícia mais assassina do mundo, que vê na pele negra seu alvo padrão?
Essa realidade responde a uma lógica perversa do sistema capitalista: a de manter negras e negros em condições de grande precariedade, com o fim de justificar salários miséria, com poucos ou nenhum direitos e repressão cotidiana, de forma de maximizar os lucros dos patrões, expressão de como se alia a exploração e a opressão neste sistema.
Neste mesmo sentido, o outro lado da moeda, quando a mulher não deseja uma gestação, ela muitas vezes é obrigada a tê-la, o que por si só já é uma violência, ou a se submeter a métodos inseguros ou clínicas ilegais que são verdadeiros açougues, sob o risco de perderem suas vidas ou ficarem com sequelas irreparáveis.
O caso de Elizângela Barbosa, mulher negra vítima da ilegalidade do aborto, é um exemplo do tipo de violência à qual as mulheres são expostas: teve seus órgãos perfurados e faleceu durante o procedimento e seu corpo foi abandonado em uma mata na região de Araçariguama, estado do Rio de Janeiro. Assim também como Jandyra, também do Rio de Janeiro, que teve o corpo carbonizado após falecer durante um aborto ilegal.
O aborto, quando realizado de maneira asséptica, por profissionais capacitados, em local seguro e abordagem humanizada, é um procedimento simples. Manter negado este direito elementar é um forte desagravo aos direitos das pessoas com útero de decidirem sobre seus próprios corpos e no caso das mulheres pobres e negras, uma sentença de risco de morte.
No ano passado, no dia 28 de setembro, o então ministro da saúde de Bolsonaro, Pazuello, apresentou no congresso um projeto de lei que visava restringir ainda mais o precário acesso ao aborto no nosso país. Bolsonaro e sua ministra Damares Alves, não se cansam de falar contra o direito ao aborto, mostrando sua total ignorância quanto aos problemas de saúde pública. Por essa razão, a luta pelo nosso direito a decidir, vem de mãos dadas com nossa luta contra este governo reacionário, que vê as mulheres como um dos seus alvos hierárquicos para atacar.
A partir da agrupação de mulheres Pão e Rosas lutamos pelo nosso direito a decidir quando quisermos ser mães, assim como pelo direito de decidir não o ser; e entendemos que esta luta precisa estar aliada a uma batalha consequente por acabar com o sistema capitalista, que necessita da opressão sobre nossos corpos para aumentar os níveis de exploração sobre a classe trabalhadora de conjunto.
Neste 28 de setembro, dia Latino-americano e Caribenho de Luta pela Legalização do Aborto, é necessário nos apoiarmos na força que demonstraram nossas irmãs argentinas com sua forte mobilização que conseguiu arrancar na luta este direito fundamental; luta à qual estivemos presentes com nossa organização irmã, o Partido dos Trabalhadores Socialistas na Frente de Esquerda Unidade.
Aqui no Brasil, esta luta é inseparável da luta contra o governo Bolsonaro, por isso é necessário um forte chamado para os organismos da classe trabalhadora, das mulheres, negros e negras, indígenas e da juventude para unificar esta demanda às mobilizações contra o governo que estão ocorrendo, colocando a necessidade de defendermos o direito ao aborto legal, seguro e gratuito, junto à contraceptivos gratuitos e de qualidade e educação sexual livre nas escolas e contra todos os ataques de Bolsonaro e Damares Alves.
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