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CRISE E MUNDO DA ARTE
Crise, corte de verbas e vendas de obras de arte em alta?!
Jonas Pimentel

Apesar da crise econômica que vivemos, galerias de arte aumentam 97,4% suas exportações e leilões batem recorde.

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No dia 18 de janeiro de 2016 a Folha de SP publicou matéria apresentando dados coletados pelo governo federal referentes a venda de obras de arte brasileiras à colecionadores no exterior durante o período de 2015.

Foram US$ 66,9 milhões em obras de arte, ou seja, R$271 milhões de reais. O que significou para o setor um crescimento de 97,4% em relação à 2014. Porém esses dados ainda são parciais e não se tem uma visão mais abrangente das transações do país. Das galerias envolvidas 59% são de são Paulo e 29% do Rio de Janeiro.

Esses números assustam um pouco dada a situação de crise econômica, retirada de direitos da classe trabalhadora, recordes de demissões no setor industrial, demissões também no setor cultural, redução nos incentivos à arte e cultura, corte de gastos públicos que afetam diretamente artistas independentes, arte-educadores e outros profissionais da da arte e cultura.

Os dados foram coletados da Apex Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) do governo federal que envolve os ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Ministério das Relações Exteriores (MRE), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), BNDES e outros.

A Apex promove a ABACT (Associação Brasileira de Arte Contemporânea) que reúne 50 galerias de arte localizadas em 8 estados brasileiros.
Essa parceria ganhou o nome de Latitude - Platform for Brazilian Art Galleries Abroad, fundada em 2007 quando movimentou cerca US$6 milhões e agora se encontra em plena expansão com crescimentos exponenciais.

O que temos aqui é a tradicional relação entre público-privado que aparece em forma de entidade sem fins lucrativos mas que movimenta um dos principais mercados de arte no Brasil.

Para se ter uma ideia mais ampla do mercado de arte, cito um outro dado importante que é organizado anualmente pela Feira Europeia de Arte (Tefaf) em Maastricht – Holanda. Segundo relatório de 2014, as transações no mercado internacional da arte chegaram a pelo menos U$54,9 bilhões, ou seja, cerca de 171 bilhões de reais, sendo que as feiras de arte representam 40% das vendas totais.

Segundo site do grupo Latitude (Apex Brasil + ABACT) uma de suas principais ações é a promoção de artistas em eventos e feiras internacionais como SP-Arte (Brasil), Art Basel Miami Beach (EUA), Arco, (Madri, Espanha), só para citar algumas.

A 14° edição da Art Basel Miami Beach, por exemplo, que aconteceu entre os dias 03 e 06 de dezembro de 2015 disponibilizou ao mercado cerca de US$3 bilhões em obras de arte.

A SP-Artes, maior feira de arte do Brasil, em sua edição de 2014 movimentou cerca de R$250 milhões nos 5 dias de duração e a edição de 2015 superou as expectativas de negociações de algumas galerias (porém não foi encontrados dados exatos). Cabe ressaltar que para esses 5 dias de feira das edições de 2014 e 2015 o governador Geraldo Alckmin (PSDB) concedeu isenção de imposto (ICMS) para obras de arte comercializadas com valor unitário de até R$3 milhões por meio do decreto nº 60.065, publicado no Diário Oficial do Estado em 15/1 de 2014.

Outro dado importante sobre o mercado da arte tem sido sobre os valores de obras de arte vendidas em leilões. Em 2013, um tríptico de Francis Bacon intitulado “Três estudos de Lucian Freud” foi comprado por US$142 milhões. Em 2015 “As Mulheres da Argel” de Picasso foi vendida por US$ 179,3 milhões, cerca de R$ 537 milhões em reais, se tornando o quadro mais caro dos leilões de arte do mundo.

Como é possível existir alguém na sociedade que vivemos que disponha desse valor para comprar uma pintura?

Essa lógica representa de forma nefasta todo o sistema de desigualdades promovido pelo capitalismo, como já denunciamos aqui e que pode ser resumido na constatação de que: “62 bilionários no mundo possuem uma riqueza equivalente a tudo o que metade das pessoas do mundo somadas tem” ou que “1% dos mais ricos do mundo tem o equivalente em riqueza dos 99% restantes da população”.

É bem possível que o comprador de “As mulheres da Argel” de Picasso possa estar entre esses 62 bilionários que juntamente com o conjunto de banqueiros e empresários expropriam tudo o que a classe trabalhadora produz.

Enquanto o dinheiro corre solto nas negociações dos patrões do mundo da arte as políticas públicas de arte e cultura são inviabilizadas pelos governos.

Como todos devem imaginar, a verba para arte e cultura é das menores em nosso país. Se a educação e saúde públicas se encontram em péssimo estado, imagine a cultura! Em março de 2015, durante sua fala no Salão do Livro em Paris, o próprio ministro de Cultura da presidente Dilma (PT), Juca Ferreira, havia anunciado que o governo federal inviabilizaria a pasta da cultura com os cortes pretendidos para o ano que ficou em torno dos 30%, rebaixando o orçamento estatal de R$ 3,3 bilhões para R$ 2,6 bilhões.

No estado de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) também promoveu cortes absurdos na pasta de cultura chegando a pelo menos 10% dos R$946 milhões previstos para 2015. Demissões em massa também foi a marca de 2015 para o setor da cultura em SP, afetando museus como Pinacoteca, Museu da Imagem e do Som, Museu AfroBrasil, Paço das Artes e a Escola de Música do Estado de São Paulo (EMESP).

O incentivo estatal à arte e à cultura não é objetivo dos governantes, como podemos ver por meio dos dados citados, mas sim o incentivo privado. Essa regra não é nova e faz parte da própria lógica capitalista de concentrar capital nas mãos de pequenos grupos que se autofinanciam gerando uma rede de privilégios.

Essa barreira é muito conhecida para artistas independentes que procuram formas de sobreviver com seu trabalho. Os editais existentes não atendem a demanda da produção artística e a lógica de isenção fiscal desses financiamentos também está muito longe de ser uma política pública de fato. É só analisarmos os projetos patrocinados pela Lei Rouanet, por exemplo, que financia mega eventos como Cirque du Soleil (que em 2013 captou cerca de R$11 milhões), SP-Artes (que captou pelo menos R$1,5 milhão dos quase R$6 milhões pretendidos para 2015), Bienal de Arte de São Paulo, entre outros. Sem contar os patrocínios de turnês de Luan Santana, Cláudia Leite, Gospel Music Festival, MC Guimê e por aí vai.

É necessário refletirmos sobre o financiamento da arte, barrar o que está sendo imposto pelos governos e empresários e lutar por uma produção verdadeiramente livre e independente.

A burguesia vende e impõe sua ideologia diariamente tentando fazer com que os trabalhadores e a população pobre acredite que é livre no capitalismo. Porém, a realidade de exploração do trabalho, a precariedade de serviços elementares como saúde e educação, a desigualdade absurda, o controle da produção artística e cultural sempre nas mãos de banqueiros e empresários, faz cair por terra a ilusão de qualquer tipo de liberdade.

A libertação do ser humano só será possível com a derrubada desse sistema que gera tantas misérias, opressões e exploração. E arte e a cultura tem papel fundamental na luta contra o capitalismo pois as experiências estéticas e a produção cultural tem potência para exacerbar as contradições e apontar vislumbres e caminhos que superem as relações capitalistas.

 
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