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52 ANOS DE STONEWALL
Myanmar, Colômbia e BLM: LGBT+, luta de classes e estratégia revolucionária
Rosa Linh
Estudante de Ciências Sociais na UnB

Para o terror dos reacionários em todo o mundo, onde há luta de classes houve LGBT+ na linha de frente - seja contra o golpe militar em Myanmar, na rebelião colombiana ou no Black Lives Matter. A luta pela plena liberdade de auto-identificação, pela emancipação sexual e de gênero só pode vencer com o fim do capitalismo, a partir de uma aliança das LGBT+ com os trabalhadores, e pela construção de um mundo novo sem opressão e exploração.

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Se existe uma mentira absurda propagada pela burguesia é de que as LGBT+ não tem nada a ver com a luta de classes. O capitalismo com seu pink money tenta dizer para milhões que é possível emancipar a sexualidade para meia-dúzia de pessoas, com elas ascendendo em altos cargos de empresas, com pessoas trans em capas de revistas e em propagandas na TV. Isso enquanto centenas de milhares de pessoas trans não conseguem empregos e acabam na prostituição, as famílias despejam a juventude que já não vê sentido nas barreiras de gênero, milhares se suicidam por não aguentar ter de fingir ser outra pessoa.

Mas a luta de classes dos últimos anos prova o contrário - as LGBT+ não se contentam com as migalhas do “capitalismo representativo" e já estão se rebelando contra o pior da extrema-direita. São milhares e milhares de LGBT+ na linha de frente contra esse sistema, enfrentando a polícia e muitas vezes se colocando lado a lado dos trabalhadores - dispostas a lutar até às últimas consequências contra o velho e podre desse sistema capitalista, racista e patriarcal.

Foram milhares de LGBT+ que foram às ruas contra o golpe militar reacionário em Myanmar, junto de outras centenas de milhares de jovens estudantes e trabalhadores. Com as mulheres à frente, em especial as operárias têxteis, a classe operária e os oprimidos do país resistiram por meses com barricadas, greves e milícias populares.

“Todos nós viemos aos protestos para apoiar uma causa maior” foram as palavras de Maung Soe, ativista LGBT+ e fundador da organização CAN Myanmar. Min Khant, uma drag queen de 21 anos, da cidade de Yangon, afirma: “as pessoas nas passeatas nos dizem que deveríamos ter nossos direitos.”

“Dado que nós, LGBT+, temos um histórico de participação ativa no ativismo político do passado, queremos anunciar que neste golpe militar, apoiaremos o povo e os funcionários do governo que estão iniciando as campanhas de desobediência civil” - disse o ativista.

Leia mais: O ativismo LGBT contra o golpe em Mianmar: “Nas passeatas nos dizem que deveríamos ter nossos direitos”

O Black Lives Matter sacudiu o mundo desde o coração do imperialismo estadunidense sob os gritos de “sem justiça, sem paz” e “vidas negras importam”. Da mesma forma, as LGBT+ se somaram à revolta e estiveram na linha de frente. O grito de “Vidas trans negras importam” ecoou depois do brutal assassinato de Tony McDade, um homem trans baleado pela polícia racista na Florida, dois dias depois do assassinato de George Floyd.

Em um país no qual apenas uma minoria se declara como trans, ela se torna ainda menor quando se trata de pessoas trans e negras (16% da população autodeclarada trans, se comparado a 55% das brancas). Mas no quesito violência e brutalidade, as trans negras são as que mais sofrem (das 26 vítimas até agora neste ano e das 27 vítimas no ano passado, a maioria são mulheres negras trans com menos de 30 anos). Fora as taxas absurdas de desabrigadas, fome e desemprego - isso porque estamos falando do país mais rico do mundo. Fica escancarado que as opressões servem para massacrar e violentar ainda mais as negras e negros.

A Revolta de Stonewall, com mulheres trans negras como Marsha P. Johnson à frente, foi a expressão máxima de como as LGBTQ+ não só lutam por seus direitos, mas como se rebelam contra a polícia racista e machista. A polícia, como expressou o BLM, não está do lado das LGBTQ+, nem da classe operária - são inimigos, são cães armados da burguesia. A luta contra a brutalidade policial é a mesma das LGBTQ+, das negras e negros, mas também dos trabalhadores, que lutaram em diversos sindicatos para que os policias fossem expulsos das centrais sindicais. O racismo, assim como a transfobia e a homofobia, são faces de uma mesma moeda da ideologia burguesa.

Veja também: Stonewall: Marsha P. Johnson e o Black Trans Lives Matter

Foto: Hollie Adams

As mulheres trans também tomaram a frente nos protestos na Colômbia contra a reforma tributária, a precarização da vida e a repressão do governo de Duque. O vogue dessas mulheres na frente da polícia é exemplo radical de irreverência e fúria por lutar por uma vida que valha a pena ser vivida.

Como diria Trotski, são os mais oprimidos (e as mais oprimidas) que lutam com mais força e vontade pelo novo. A esmagadora maioria das LGBT+ não tem nada a perder diante desse sistema de miséria.

Diante de tantos exemplos, precisamos de uma estratégia para acabar com as opressões e lutar pela mais ampla e total liberdade sexual, de gênero e auto-identificação - e isso só pode ser realizado pondo fim ao capitalismo. A burguesia está desesperada com a radicalidade que pode tomar as LGBT+ - e pior seria para eles se nos juntássemos com os trabalhadores. Por isso criam o pink money, a pura e simples representatividade dentro do capitalismo, tentam separar a luta por liberdade de gênero como mera "política de identidade”, totalmente desligada a um combate anticapitalista. É o que tenta fazer Biden e os Democratas, Macron e Merkel, em níveis diferentes.

Mas isso também mostra um claro limite do reformismo e do neorreformismo - como o PT de Lula que pavimenta um governo com golpistas para administrar o capitalismo em 2022. Ou mesmo o PSOL, que cada vez mais segue os caminhos de conciliação de classe do PT, como fez em Belém, ao querer passar uma reforma da previdência com Edmilson. Correntes como a Resistência e o MES tomam bandeira da luta LGBT+, mas quando o assunto é estratégia, tudo se reduz a impeachment - que colocaria o racista e homofóbico Mourão na presidência -; o teatro de perdão dos golpistas com a CPI da COVID; ou mesmo uma negação sistemática no movimento estudantil em exigir das centrais sindicais e da UNE, dirigidas pelo PT e PCdoB, unidade entre estudantes e trabalhadores, bem como assembleias de base com voz e voto para construir uma greve geral nacional. As LGBT+ não têm absolutamente nada a ganhar ao lado de quem ataca os trabalhadores, pois eles são os mesmos que nos atacam! Por isso a política reformista com a qual o PSOL se adapta não é uma resposta. Os rumos da luta de classes, da luta contra Bolsonaro, Mourão e os militares não pode estar separada da luta contra a LGBTfobia e a liberdade de gênero.

Leia mais: A força nas ruas não pode ser combustível para campanha eleitoral! Paralisação nacional já

O neoliberalismo, por outro lado, tenta nos convencer que a revolução é impossível - e o responsável por tantos anos de hegemonia neoliberal é o stalinismo, a traição à revolução de outubro que deu passagem para a restauração capitalista na URSS, China e tantos outros Estados operários. Foi sob essas bases que o neoliberalismo estabeleceu um dogma de que o socialismo é autoritário e contra as liberdades de gênero e sexualidade, igualando marxismo revolucionário e sua degeneração burocrática, o stalinismo. No entanto, foi a URSS dos sovietes, de Lênin e Trótski, que legalizou pela primeira vez na história da humanidade o aborto de forma livre, segura e gratuita, num sistema de saúde 100% estatal - muito a frente de muitos países capitalistas ainda hoje. Além disso, foi o primeiro país no mundo a descriminalizar a homossexualidade - muito antes da OMS que a tratava como doença até os anos 80. Justamente por isso é deplorável que organizações como a UP e o PCB reivindiquem esse "legado" (mais ou menos descaradamente, a depender do oportunismo) - pois foi Stálin e sua camarilha burocrata quem recriminalizou tanto o aborto, como a homossexualidade, além de inúmeros retrocessos aos direitos das mulheres.

Apenas destruindo as bases materiais da exploração é que podemos acabar com a opressão. A LGBTfobia, a transfobia e tantas outras não vão desaparecer imediatamente após a revolução. Pelo contrário, será necessário uma “revolução cultural permanente”, com as LGBT+ à frente, para libertar a humanidade de todo entulho machista, racista e homofóbico. A exploração se dá na economia, na apropriação do trabalho humano; a opressão decorre e se sustenta na ideologia desse sistema de exploração - e serve justamente para explorar ainda mais o conjunto da classe trabalhadora, marginalizar pessoas trans etc.

As LGBT+ são parte integrante também da classe operária. A luta por liberdade sexual e de gênero, na verdade, diz respeito também as héteros e cisgêneros - afinal, todas as divisões de gênero surgiram do capitalismo e sua relação promíscua com o patriarcado. Isso significa que, além de explorar ainda mais as negras, LGBT+ e mulheres, abaixando os salários do conjunto da classe - a ideologia burguesa ainda cria barreiras para toda a humanidade desfrutar plenamente de sua sexualidade.

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Por isso, é preciso acabar com a exploração capitalista. Para chegar até lá, é preciso defender a aliança entre as LGBT+ e os trabalhadores, pois nossos inimigos são os mesmos. Nos inspiremos nos ares da luta de classes internacional para que, no Brasil, defendamos assembleias de base com voz e voto em cada local de trabalho e estudo para que possamos defender um comando nacional de delegados de base, exigindo a unidade entre estudantes e trabalhadores à CUT, CTB e UNE, rumo à uma greve geral nacional.

Só a luta contra Bolsonaro, Mourão e os militares, sem nenhuma confiança no STF e no Congresso pode avançar para garantir os direitos das LGBT+, por isso defendemos uma Assembleia Constituinte livre e soberana. Nela, as LGBT+ em luta poderiam defender o direito ao aborto legal, seguro e gratuito; o fim da "cura gay", completa separação da Igreja e do Estado; pleno direito ao casamento civil e adoção de crianças; livre educação sexual nas escolas, etc. A partir dela, seria possível discutir e mostrar para o conjunto dos trabalhadores e oprimidos que o capitalismo não pode garantir esses direitos, com o qual responderemos com a necessidade de batalhar pelo fim da polícia racista e homofóbica, rumo a um governo de trabalhadores em ruptura com o capitalismo, com a planificação da economia. Assim, poderíamos conquistar, assim como na Rússia soviética, hotéis públicos para a juventude viver sem as restrições sexuais e emocionais da família; lavanderias públicas e estatização do trabalho doméstico etc. Essas são algumas das pautas fundamentais para construir o caminho para a total liberdade sexual, de gênero e de identidade.

Apenas com o fim desse sistema de miséria é que poderemos todes desfrutar de uma vida de abundância material com o avanço das forças produtivas - o que significa não só desenvolvimento técnico, mas cultural, artístico, humano - e porque não de camaradagem, amor livre e mais ampla emancipação sexual e de gênero?

Como já diria Trótski:

“A vida é bela. Que as futuras gerações a livrem de todo mal e opressão, e possam desfrutá-la em toda sua plenitude.”
 
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