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OPINIÃO
Com a privatização da Eletrobras, a crise do Amapá sem luz pode se generalizar
Vanessa Dias
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A principal empresa de energia elétrica da América da Latina caminha para ser privatizada pelos planos de Bolsonaro e Guedes. Amapá, que foi jogado ao desespero com a crise da falta de energia, é um exemplo do que pode vir a ser a realidade de outros estados do país.

Seu projeto de privatização, ensaiado por Michel Temer, ganha mais corpo e força agora como parte do plano de privatizações levado adiante por Paulo Guedes, e já teve sua primeira aprovação pela Câmara dos Deputados e agora segue para o Senado, o que diminuirá a participação da União e abrirá mais espaço ao capital privado da energia elétrica, deixando-a à mercê da bolsa de valores.

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A crise pela qual passa o sistema de energia elétrica é uma crise de proporções históricas, cuja situação é a pior dos últimos 91 anos, onde os principais reservatórios das usinas brasileiras, que são os da região Sudeste e Centro-Oeste, estão operando com 35% de sua capacidade, chegando aos níveis de comparação de 2001, quando houve apagões e as políticas de racionamentos.

Essa crise se arrasta desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, cujos motivos vão muito além das esporádicas faltas de chuvas, mas sim é resultado de políticas conscientes de sucateamento, desinvestimento e precarização ao longo de anos, tornando estruturais os problemas que foram se agravando ao longo dos anos, adiando quaisquer tipos de reparos e reestruturações que evitariam desperdícios e onde a escassez é tida como mais rentável.

O que impuseram à gigante estatal é o que se faz com toda estatal cobiçada pelos investidores famintos pelas riquezas nacionais: sucateamento, precarização, funcionamento no limite de suas capacidades até que se apresente como inviável para atender às necessidades mínimas, e então buscam convencer a opinião pública sobre sua incapacidade de produção, e aí buscam entregá-la de bandeja ao capital privado.

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O que o governo Bolsonaro faz é tomar a dianteira de um mega plano de entrega das estatais, e já anunciou a contratação de energia de termelétricas que estão fora de produção atualmente para “suprir a demanda”, atendendo ao lobby das oligarquias ligadas ao centrão, entregando um valor 4 vezes mais alto do que o valor da energia produzida pela Eletrobras. Para o plano de entregas, conta com o apoio ativo dos golpistas Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, além de todo o espectro golpista do regime do golpe - o que já era evidente -, mas conta também com o escandaloso apoio de deputados do PDT e PSB, que votaram a favor da MP que entrega a estatal.

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Enquanto isso, o Ministério de Minas e Energia do governo Bolsonaro prepara um aparato cínico de comunicação para justificar essa enorme crise como resultado da falta de chuvas, levantando uma campanha para que o consumidor passe menos tempo no chuveiro, escovando os dentes etc, como se esse problema da energia fosse provocado pela ação individual de cada um de nós.

E qual o primeiro impacto de toda essa política? Evidentemente, o primeiro impacto é no bolso dos trabalhadores e da população mais pobre, que já sofre com o coronavírus, o desemprego e a fome: neste começo do mês, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já enviou a todos os consumidores a notificação sobre a nova determinação, e a conta de energia será mais alta, com aplicação do segundo patamar da bandeira vermelha. Será cobrado nas contas de luz de todos os consumidores um valor adicional de 6,24 para cada 100 kwh de energia consumidos.

Além deste primeiro impacto, há uma série de outros que também serão sentidos pelo conjunto de toda atividade produtiva que demanda energia elétrica, tendo o encarecimento do conjunto de diversos outros serviços e produtos. Para citar o principal, afeta a atividade industrial, e se chegar ao ponto de ameaçar a estabilidade do fornecimento de energia elétrica, passa a ser considerado um país desvantajoso para manutenção e desenvolvimento destas.

Os resultados dessa política possivelmente poderão ser vistos de forma mais generalizada tal como aconteceu no Amapá, cuja crise da energia foi causada pela empresa privada Gemini Energy, em que foi preciso convocar a Eletrobras para socorrer o caos energético que causou total desespero, falta de energia, água potável, comida, enquanto bairros ricos, como o da família de Davi Alcolumbre, eram alimentados por energia.

Essa crise, ainda que tenha pleno protagonismo do governo Bolsonaro, do centrão e do grosso da podridão do regime político brasileiro que atua para a sua entrega, se trata de um produto que é continue do projeto golpista de sucateamento das estatais e entrega ao mercado, tendo em vista que criar uma crise dessa magnitude seria cavar a sua própria cova. Não é necessário esse nível de autossabotagem, afetando inclusive o próprio agronegócio e demais atividades que também dependem dessa energia, para que haja aberturas para o capital privado e o favorecimento de empresários de olho na energia brasileira. Essa crise expressa, para além do ímpeto privatista do regime atual, uma característica histórica do capitalismo débil brasileiro, que inclui a debilidade na formação de seus próprios pilares, como é o caso da própria matriz energética brasileira.

E Bolsonaro e centrão sabem bem disso. Ainda deixarão a estatal sangrar e sangrar, aumentando o discurso de que a culpa da crise é da falta de chuva e da dona de casa que toma banho demorado, aumentando a imagem de que o Brasil e a Eletrobras não têm capacidade energética suficiente e, dessa forma, entregando mais e mais aos capitalistas que priorizarão o lucro e abrirão ainda mais a possibilidade de apagões e outras novas tragédias como Amapá, que serão sentidas pela população mais pobre.

Mais do que uma esquerda que veja alternativas para a possibilidade de redução das tarifas de energia, é preciso de uma forte luta em defesa das estatais, que tenha como objetivo reestruturar as usinas e todo o sistema de energia elétrica do país.
Lula, que em palavras se diz contrário à privatização da Eletrobras, também dizia o mesmo em relação à Petrobras, enquanto os governos do PT abriam a empresa cada vez mais ao capital privado, e hoje abertamente coloca em seus discursos a possibilidade de entrega de estatais como a Caixa Econômica Federal, para se mostrar uma alternativa ainda mais confiável à Faria Lima e ao conjunto do regime golpista para as eleições de 2022.

É nessa mesma lógica que as centrais sindicais, dirigidas pela CUT e pela CTB, atuaram em todas as mobilizações e greves das estatais: enquanto faziam discursos contrários, na prática atuavam para abafar, isolar e boicotar as mobilizações, isolando-as em suas próprias demandas corporativistas e assim atuando para enterrar qualquer capacidade efetivamente séria de resistência aos planos de privatizações.

O verdadeiro interesse em impedir mais barbáries, apagões e tragédias deve ter corpo na luta por uma Eletrobras 100% estatal, gerida e administrada pelos trabalhadores, que deixaria de colocar os interesses com o lucro em primeiro lugar, priorizando a capacidade de produtiva que jamais deixaria correr o risco de deixar uma população desabastecida, ainda mais em meio a uma pandemia onde a vida de milhões de pessoas estão em jogo nos hospitais e redes de saúde.

Mais do que fazer cair o valor da energia elétrica no bolso de todos os trabalhadores, teria como objetivo a resolução de todos os problemas estruturais que jamais permitiriam acontecer barbáries como as do Amapá, além da diversificação da matriz energética e aumento da capacidade de geração energética nacional, investindo em outras fontes, como a eólica e solar. É nessa perspectiva que a esquerda deveria estar imediatamente se colocando.

 
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