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OPINIÃO
A importância de assimilar as lições internacionais para o marxismo revolucionário
Gabriel Girão

Proletário de todos os países: uni-vos! Muito mais do que uma mera frase de efeito, essa colocação do manifesto comunista mostra a essência internacionalista do marxismo revolucionário.

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Desde os primórdios, o internacionalismo foi um pilar fundamental da tradição marxista, já bem marcado no manifesto comunista. Isso não se dava por um capricho de seus fundadores que gostavam discutir tudo que é assunto do mundo, ou porque como revolucionários foram forçados a correr o mundo no exílio. Longe disso, o internacionalismo no marxismo tem suas origens no fato que a própria burguesia conseguiu fazer de seu sistema econômico um sistema mundial, muito mais que qualquer outro anterior. Como diz Marx no [Manifesto Comunista]:

“Através do rápido aperfeiçoamento de todos os instrumentos de produção, através das comunicações infinitamente facilitadas, a burguesia arrasta todas as nações, mesmo as mais bárbaras, para dentro da civilização. Os módicos preços de suas mercadorias são a artilharia pesada com que ela põe abaixo todas as muralhas da China, com que ela constrange à capitulação mesmo a mais obstinada xenofobia dos bárbaros. Ela obriga todas as nações que não queiram desmoronar a apropriar-se do modo de produção da burguesia; ela as obriga a introduzir em seu próprio meio a assim chamada civilização, isto é, a tornarem-se burguesas. Em uma palavra, ela cria para si um mundo à sua própria imagem.”

Se isso já era verdade na época de Marx, na época imperialista isso dá outro salto. A imensa acumulação de capitais nas potências imperialista e a necessidade exportação dos mesmos e da repartição do mundo em áreas de influências dessas potências fazem com que a economia mundial deixe de ser uma mera soma de economias nacionais interligadas para se tornar um todo que subordina cada realidade nacional. Nos tempos atuais isso é totalmente evidente. As cadeias de produção são cada vez mais dispersas assim como também é a interdependência entre os países. Vimos como as paralisações econômicas na pandemia tiveram efeito global, assim como também como a Guerra Comercial entre EUA e China arrasta o mundo todo atrás. Emblemático foi o navio encalhado em Suez e seus efeitos no comércio mundial.

Ver também: Um barco encalhado, capitalismo e globalização

No entanto, ao mesmo tempo a burguesia também criou a escala internacional o seu coveiro: o proletariado. Essa classe, desprovida de tudo com exceção de sua força de trabalho para vender, que não tem a nada a perder exceto suas correntes, também não tem pátria. Mostra disso que a luta da classe trabalhadora sempre teve um caráter internacional. As mobilizações dos trabalhadores em um país impulsionavam os trabalhadores de outros. Além disso, nos exílios e migrações de proletários, estes também levavam consigo suas experiências de lutas e organização assim como suas ideologias. Por exemplo, a presença forte do anarquismo no Brasil no início do século passado está fortemente ligada à imigração italiana. Como exemplo máximo disso, a Comuna de Paris, primeiro governo operário da história, concedeu aos estrangeiros iguais direitos, até mesmo de votar e ser eleito.

Baseado no fato que tanto o capitalismo como a luta da classe trabalhadora é internacional é que o internacionalismo se constitui com pilar indissociável do marxismo revolucionário. No entanto, o internacionalismo marxista não é algo meramente passivo, que se limita a discutir a política internacional e a geopolítica. Pelo contrário, é um internacionalismo de combate, que busca se apropriar das lições mais avançadas da experiência da luta da classes a nível mundial, além de buscar intervir ativamente nesses processos. Como diz Lenin, no “Que Fazer”:

Segundo, o movimento social-democrata é, pela sua própria essência, internacional. Isso não significa somente que devemos combater o chauvinismo-nacional. Significa, também que um movimento iniciado em um país jovem só pode ter êxito se assimilar a experiência dos outros países. Ora, para tanto não é suficiente apenas conhecer essa experiência, ou limitar-se a copiar as últimas resoluções. É preciso saber proceder à análise crítica dessa experiência e controlá-la por si próprio.

Baseado nessa lógica é que Marx fundou a primeira internacional, assim como Engels fundou a segunda. Marx seguiu de perto processos como a Guerra Civil americana, assim como a Comuna de Paris, buscando extrair suas lições mais profundas. No caso da última, ficou expresso no livro “Guerra Civil na França”, onde Marx coloca que a Comuna mostrou a todos a essência da ditadura do proletariado.

Lenin, Rosa e Trotsky dão continuidade a essa tradição, sendo ainda na Segunda Internacional importantes dirigentes de sua ala esquerda. Rosa, por exemplo, em base a Revolução Russa de 1905, escreveu seu livro “Greve de Massas, Partido e Sindicato”. Essa obra tem como objetivo tentar sintetizar algumas lições do processo, principalmente no que concerne à questão da greve de massas e também suas implicações na luta de classes na Alemanha e no mundo. Independente das diferenças que possamos ter, tal obra marcava a coerência revolucionária de Rosa frente a ala oportunista que começava a se consolidar no SPD alemão. Lenin dá um passo a mais com a Internacional Comunista (IC), conhecida como a terceira internacional. Além de generalizar a experiência e as lições da Revolução Russa e dos Bolcheviques (e também de outros processos, vide as discussões sobre frente única, governo operário, as discussões sobre a questão negra etc), a Internacional Comunista buscava ser o Partido Mundial da Revolução. Nesse sentido, a luta de cada partido nacional estava orientada por uma organização internacional. Com a degeneração burocrática da IC nas mãos do stalinismo, Trotsky e os partidários da Oposição da Esquerda fundam a IV Internacional, que se baseava nos mesmos princípios e na mesma lógica da IC sob a direção de Lenin, agora também em base ao balanço de novos fenômenos, como a ascensão do fascismo e as burocratizações nos Estados Operários.

Quando o internacionalismo foi rompido pelas organizações políticas que se diziam marxista, isso não constituiu um desvio “pontual”. Pelo contrário, significou o total rompimento com o marxismo e muitas vezes fez com que essas organizações passassem diretamente à traição de classe aberta. No caso da ala direita da II Internacional, significou apoiarem suas próprias burguesias na Primeira Guerra Mundial. No caso do Stalinismo, que adotou o “socialismo em um só país” e depois de burocratizar ao extremo chegou a dissolver a IC, foi responsável pela traição direta de inúmeros processos, como a Revolução Chinesa de 1925-1927 e a Guerra Civil Espanhola.

Infelizmente, também vimos esse rompimento em correntes que se reivindicam trotskistas. Muitas delas degeneraram em nacionais-trotskismos, com internacionais se baseando em acordos programáticos frouxos ou até mesmo em alguns casos, como no Secretariado Unificado, sendo praticamente uma “federação” de partidos ao estilo da Segunda Internacional, tendo no Brasil 4 grupos por exemplo. Em muitos casos, essas junções internacionais oportunistas acabaram rachando ou explodindo frente aos grandes processos políticos ou da luta de classes internacional, o que nós chamamos “testes ácidos”.

Ao contrário disso, a Fração Trotskista-Quarta Internacional (FT-QI) tenta resgatar o internacionalismo de combate. Nesse sentido, busca analisar os principais processos internacionais de luta de classes, assim como a intervenção de seus grupos onde isso é possível. Dessa forma, cada sessão nacional da FT-QI busca se desenvolver e se forjar não apenas nos combates de seu país, mas no mais profundo internacionalismo, buscando assimilar as lições e as experiencias dos processos internacionais mais avançados. Assim como a economia mundial é um todo complexo que subordina as realidades nacionais, o desenvolvimento de nossa organização também não é uma mera soma do desenvolvimento individual de cada grupo nacional, e sim um desenvolvimento internacional de conjunto.

No entanto não acreditamos que um partido revolucionário vai se dar apenas do nosso desenvolvimento evolutivo. Acreditamos que os processos de luta de classes internacionais vão gerar giros à esquerda, rupturas e fusões de grandes setores de vanguarda e também de setores de massas que permitirão, a partir das lições dos principais processos de luta de classes, formar verdadeiros partidos revolucionários.

No entanto, longe de uma espera passiva por esse momento, buscamos desde já dialogar e tentar discutir as principais lições dos últimos processos de lutas com setores de vanguarda, sejam os companheiros que vem de outras tradições, trotskistas ou não, assim como os setores que estão despertando nos processos recentes. Frente ao primeiro ciclo da luta de classes pós crise de 2008, lançamos em 2013 o Movimento por uma Internacional da Revolução Socialista -Quarta Internacional, que foi atualizado em 2017. Agora, depois do segundo ciclo da luta de classes, iniciado com os Coletes Amarelos no final de 2018, sendo brevemente interrompido pela pandemia mas já voltando a se manifestar em alguns países, tendo como ponto alto nesse período pandêmico a luta negra nos EUA, lançamos um novo manifesto, que busca atualizar o anterior e sintetizar as principais lições dos últimos processos da luta de classes. Uma parte desse debate também foi feito no IV Congresso do MRT, ocorrido no último final de semana;

Ver também: 1º dia do IV Congresso do MRT: a crise mundial e as lições da luta de classes na França e na Argentina

Mesmo depois da elaboração desse manifesto, alguns dos processos que chegaram a ser discutidos continuaram, como por exemplo a luta da saúde em Neuquén, que acabam de conseguir uma importante vitória. No Chile também houve uma importante greve de portuários que obrigou Piñera a liberar o terceiro saque do fundo previdenciário, assim como também uma paralisação nacional na Colômbia contra a Reforma Tributária de Duque. Além disso, vale colocar que há vários focos de lutas na Argentina para além da saúde de Neuquén, onde o PTS, grupo irmão do MRT na Argentina, está atuando ativamente para coordenar cada uma dessas lutas e batalhar pela unidade da classe trabalhadora, como a unidade entre empegados e desempregados. Unidade que faz a burguesia tremer, como mostra todo o ódio despejada pelo jornal argentino reacionário Clarin, dizendo que a Cidade de Buenos Aires amanheceu sitiadas por quem levantava a consigna de unidade entre empregados e desempregados e culpando os manifestantes por se manifestarem durante a pandemia.

Leia o Manifesto aqui: O desastre capitalista e a luta por uma Internacional da Revolução Socialista

Nesse sentido, convocamos todos os jovens e trabalhadores que estão presentes nas lutas, os intelectuais marxistas que acreditam que o capitalismo precisa ser superado por uma via revolucionária, assim como a organizações e indivíduos do movimento trotskista e organizações que se dizem internacionalistas a lerem e debaterem o manifesto e avançar no debate da proposta de um movimento para uma Internacional da Revolução Socialista, baseado nas lições da luta de classes. Faremos também amanhã, no dia 1º de Maio, às 18h30, Dia Internacional dos Trabalhadores, um ato virtual de lançamento do manifesto, que convidamos todos a assistirem.

 
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