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PROFESSORES NA PANDEMIA
Precarização, descaso e morte: sobre o trabalho dos professores na pandemia no Brasil
Comitê Esquerda Diário DF/GO
Cris Libertad
Professora da rede estadual em Anápolis - GO.

É de ferver o sangue de qualquer mortal o que vêm acontecendo com os trabalhadores. De categoria em categoria, os ataques vêm sendo ininterruptos e, como se tudo isso não bastasse, o risco de vida é latente. Este breve texto vêm de encontro à angústia que os professores passam no atual contexto. A sala de aula é um ambiente naturalmente aglomerador de alunos e professores, mas que seja também de sonhos, oportunidades e conhecimento, não de vírus e descaso.

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É de ferver o sangue de qualquer mortal o que vêm acontecendo com os trabalhadores. De categoria em categoria, os ataques vêm sendo ininterruptos e, como se tudo isso não bastasse, o risco de vida é latente. Embora infelizmente não possamos aqui ir pormenorizando o que todas as distintas categorias de trabalhadores vêm passando - o que denota a necessidade de uma frente única operária para combater as investidas dos capitalistas e do regime de golpe que o sustenta, para que estes paguem pela crise se desenrola -, este breve texto vêm de encontro à angústia que os professores passam no atual contexto.

De Norte a Sul, os governadores, que são tidos como os “queridinhos” e fontes de racionalidade ante aos destemperos e negacionismo de Jair Bolsonaro, estão impondo o retorno às aulas presenciais. A pressão sob os trabalhadores da Educação não se dá em razão do desenvolvimento dos estudantes - embora os prejuízos sejam evidentes para educandos que estão fora da sala de aula há mais de um ano -, mas sim em razão dos lucros dos donos das instituições particulares e da crença geral de que os professores são cuidadores e que, portanto, devem estar nas escolas para tutelar as crianças e os adolescentes, demonstrando também como o capitalismo nos priva de tempo de qualidade com a família pois o trabalhador precisa colocar comida na mesa. São essas as ambições que movem os governadores e os empresários dos grandes conglomerados da educação privada no país.

Na visão destes senhores, os professores nada fazem em casa. Após o ensino remoto ter sido imposto em todo o país, aqueles professores que não foram empurrados para o trabalho de casa (chamado de home office), foram deixados com a "alternativa" de serem dispensados no início da pandemia, no já distante março de 2020. Outros, como o caso dos professores da categoria O em São Paulo, sintetizam o retrato do projeto de precariedade desenhado por governadores como João Dória e o prefeito Bruno Covas para o professorado no país. Impedidos de trabalharem em razão da crise sanitária, esses profissionais ficaram sem receber o já insuficiente auxílio emergencial em 2020 e também sem salário. Dória inclusive está em conflito aberto contra todos os trabalhadores da Educação, terceirizando o máximo que consegue e retirando as conquistas alcançadas às duras penas como o adicional de insalubridade dos Agentes de Serviços Escolares (ASE). Os demais que ainda não foram forçados a retornar - e aqui a ênfase recai, sobretudo, sobre os professores das redes privadas, que discutiremos adiante neste texto - foram obrigados a se reinventarem em um arremedo de EaD excludente que praticamente anulou as vidas desses profissionais, que já eram habituados a levar serviço para casa e que passaram a trabalhar todos os dias, sem finais de semana, em um malabarismo constante entre seus próprios afazeres domésticos, cuidados com os filhos e atendimentos da forma que podem, e nos mais variados horários, aos pais e estudantes. Sem contar a ampliação do serviço ao se depararem com centenas de relatórios e planilhas de uma burocracia desorganizada - afinal, professores não fazem nada (sic!). Certamente não é preciso dizer que esta insana jornada tripla ou quádrupla recai, majoritariamente, sobre as professoras, em sua maioria negras.

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No segundo semestre de 2020, vimos pelo país o retorno presencial de vários profissionais em razão da reabertura insegura principalmente das instituições privadas mas também de muitas escolas públicas. Além disso, veio a determinação do ensino híbrido, que nada mais é do que outra aberração que veio para precarizar ainda mais os professores, fazendo-os trabalhar duas vezes mais - simultaneamente presencial e virtualmente - sem receber por isso. Sem testes em massa para identificar os doentes, os trabalhadores, estudantes e toda a comunidade escolar foram deixados suscetíveis à contaminação, sem direito sequer ao fornecimento adequado de EPI’s (só álcool 70% em gel nas portas das salas não conta, meus caros!).

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Já no princípio de 2021, esses setores que nutrem ódio aos trabalhadores da Educação já não mais se aguentavam e o ensino presencial foi empurrado goela abaixo em vários estados do país. A chamada segunda onda de contaminação da COVID-19 já castigava Manaus quando escolas foram consideradas serviços essenciais e passaram a ser abertas por todo o país. Os surtos de contaminação foram generalizados e os casos de professores, estudantes e demais trabalhadores da Educação morrendo em decorrência da COVID-19 durante o mês de março foram catastróficos. O país atingiu a marca de 3 mil mortes diárias, obrigando novamente o fechamento das escolas, mas a pressão para o retorno às aulas presenciais apenas se espalhou pelo país, onde SP, RJe RSsão alguns dos estados que exigem essa retomada forçada do ensino presencial inseguro. Governadores e prefeitos admitem que as escolas são focos de contaminação de SARS-CoV-2, mas utilizam o pretexto de que são serviços essenciais para jogar a responsabilidade do retorno para a comunidade escolar. Mais um golpe na categoria que junto aos trabalhadores da área da saúde podem ter seus salários congelados até 2036 com a PEC emergencial 186, que pretende fazer com que a conta dessa crise recaia sobre os trabalhadores do funcionalismo público.

Nesse imbróglio, ainda temos a situação precarizada dos trabalhadores da rede privada de ensino. Muitos professores e trabalhadores da Educação estão em sala de aula no país em razão dessa imposição das escolas como serviços essenciais - que não se restringe à SP, pois outros estados da federação, como GO e DF, também permitiram o retorno das instituições privadas de ensino. Governadores e prefeitos, que não investem na testagem em massa, EPI’s ou mesmo em um transporte seguro para todos os trabalhadores, permitem através de decretos arbitrários a abertura dessas instituições. Parecem considerar que trabalhadores e estudantes se dirigem às escolas por meio de teletransporte. Declaram as escolas como locais seguros e chegam a afirmar que os doentes não se contaminaram no ambiente escolar - já acreditam que podem fazer o mapeamento do vírus que há mais um ano está em transmissão comunitária no país. Assim, vários professores, estudantes e demais membros da comunidade escolar estão sendo contaminados. O afastamento para os trabalhadores que a priori apresentem sintomas de Covid é uma medida ainda essencial, embora os casos que andam sendo ignorados aos milhares no país não sejam novidade.

Quando todas essas condições desfavoráveis levam a um adoecimento, o que causa ainda mais revolta é ouvir que, em um período de alta transmissão em massa como estamos vivendo, os trabalhadores possam ter sido os responsáveis pela própria contaminação. A ineficiência de um transporte público de qualidade é notória no país, onde motoristas e demais trabalhadores da área sempre estiveram na linha de frente e não vêm sendo considerados como grupos prioritários de vacinação, mesmo sendo incontestável como esse é um meio de transmissão e contaminação do novo coronavírus. Não obstante, até mesmo o próprio local de trabalho pode ser o foco de contaminação, como já listamos neste texto. Quando até mesmo prefeitos e governadores admitem que as escolas são locais suscetíveis para que as pessoas adoeçam, é inadmissível que ainda tenhamos casos de profissionais que estão perdendo seus empregos sob a vaga justificativa de que adoeceram por sua própria conta e culpa. Essa é a realidade para professores da rede privada de ensino neste país: desemprego ou doença - possivelmente, também morte.

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Diante de tais justificativas absurdas, vemos que a realidade concreta demonstra o quanto é urgente empoderar os trabalhadores de que eles são a chave para derrotar essa crise. Os professores historicamente constituem uma categoria com tradição de luta e podem ser o modelo para tal e precisamos batalhar por uma unificação de todas as categorias da Educação em defesa de um retorno seguro. Algo que passa pela demanda de vacina para todos, testagem em massa de toda a comunidade escolar, liberação de recursos para todos os protocolos sanitários e EPI’s, contratação de professores e assistentes para garantir baixa lotação das salas, efetivação de todos os terceirizados a fim de fortalecer a classe. Precisamos impor a contratação e efetivação de funcionários de limpeza e cozinha para garantir as medidas sanitárias na escola e a alimentação adequada de todo o corpo de alunos. E mais importante, situar que os lucros não devem ser os marcos orientadores da Educação. Vidas valem mais que o lucro de poucos. A categoria da Educação conta com um enorme contingente de trabalhadores e deve se unir em prol de toda a estatização do ensino, pois Educação jamais deveria ser considerada mercadoria.

A sala de aula é um ambiente naturalmente aglomerador de alunos e professores, mas que seja também de sonhos, oportunidades e conhecimento, não de vírus e descaso.

 
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