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GÊNERO
Lorenna Muniz Presente! Nossas vidas precisam valer mais que o lucro deles!
Virgínia Guitzel
Travesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC
Cristina Santos
Recife | @crisantosss

Na madrugada deste domingo, 21 de fevereiro, faleceu a recifense Lorenna Muniz, por morte cerebral, após ficar 7 minutos sem oxigênio por ter sido abandonada sedada em uma maca cirúrgica durante um incêndio na clínica onde realizaria a cirurgia de próteses de seios. Exigimos justiça por Lorena e todas as vítimas da ganância capitalista. Lorenna Presente!

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Foto: Rede Social de Lorena Muniz

Começamos a escrever esse texto com um nó na garganta. Um ódio nas entranhas de quem recebe uma notícia que corta na minha própria carne.

Na madrugada deste domingo, 21 de fevereiro, faleceu a recifense Lorenna Muniz, mulher trans que trabalhava como maquiadora e viajou para São Paulo para realizar o sonho de colocar silicone, em uma clínica bastante conhecida entre mulheres trans e travestis por realizar o procedimento com um valor bem abaixo do que é praticado.

Na quarta-feira, 17 de fevereiro, aquilo que era para ser a realização de um sonho se converteu num pesadelo. Após Lorenna já estar sedada e conforme seu marido, Washington Barbosa, relatou em sua rede social, houve um curto-circuito na clínica onde um equipamento pegou fogo e nessa situação Lorena foi abandonada enquanto se encontrava sedada e sem nenhuma possibilidade de reagir. Ficou sem oxigênio por sete minutos e foi levada em estado grave ao hospital das clínicas de São Paulo, onde faleceu por morte cerebral na madrugada deste domingo. Washington Barbosa que estava em Recife ficou sem receber informações, separado por quilômetros de distância de Lorenna e a clínica tentou de todas as formas esconder este crime bárbaro – mais uma expressão da violência da situação –.

Este caso é um retrato da crueldade a que estão submetidas as mulheres trans e travestis em um sistema que utiliza das opressões para determinar que uma vida vale menos que outras. O sonho de construir e mandarmos no nosso próprio corpo é inegociável e o capitalismo nos rouba ele todos os dias. Como Washington Barbosa colocou na sua rede social “Não é só o absurdo de uma travesti abandonada numa mesa de cirurgia sedada, é um processo de exclusão que leva as pessoas trans e travestis a se arriscarem em muitos níveis”, ou seja, chegamos a pontos horripilantes como esse no marco de existir uma longa cadeia de violências, legitimadas por várias “instituições democráticas”, que vai desde as dificuldades que temos para conseguir algo básico como ter nosso nome social em nossos documentos, a discriminação quanto acesso ao trabalho, à educação.

Há 5 anos, eu mesma, Virginia Guitzel, teria me colocado sob este mesmo risco. Também em busca do sonho de construir meu corpo de acordo com a minha identidade, pisei nesta mesma clínica que tinha uma aparência quase de clandestina por atender mulheres trans e travestis que chegavam de várias partes do país. O valor da cirurgia naquele momento era de 4 mil reais, que sabemos que é bem abaixo do valor que se cobra por uma cirurgia desse tipo e que por isso a qualidade do material era extremamente duvidosa. Viramos um nicho de mercado para açougueiros como o Paulino de Souza, que se aproveitam de vivermos em um estado que só enxerga nossos corpos na hora de nos reprimir ou de submeter-nos a prostituição e tráfico de pessoas para lucrar.

Os recorrentes casos de transfeminicídio sem respostas e sem investigação, os obstáculos para o trabalho formal e para o acesso ao ensino tanto fundamental e médio e quem dirá universitário, a impossibilidade de realização do tratamento hormonal com acompanhamento médico e de procedimentos cirúrgicos para lidar com as disforias são parte de uma longa cadeia de violências ao qual esse sistema nos submete.

A morte de Lorenna é uma expressão gritante de como o capitalismo mata nossas identidades, nos empurram para a marginalidade, aos salários-miséria, trabalhos precários com poucos ou nenhuns direitos, à prostituição compulsória.

É esse o futuro que o capitalismo reserva para as identidades trans. Enquanto algumas travestis e mulheres trans rompem a invisibilidade como expressão de nossa luta de décadas, a ampla maioria de nós seguimos massacradas, sem direito ao nosso corpo.

Somos o país onde um presidente misógino profere discursos machistas que dão suporte à violência contra nossos corpos. O Brasil leva o macabro título de ser o que mais mata mulheres trans e travestis. Bolsonaro junto com esse congresso e STF golpistas passaram todo tipo de ataque a classe trabalhadora, que sabemos que recai sobre nossas costas, os setores mais oprimidos. A pec do teto de gastos corta da saúde, corta da educação. Não podemos esquecer da responsabilidade do PT, que durante seus anos de governo se aliou com figuras reacionárias como Marcos Feliciano e Eduardo Cunha, fieis agitadores do golpe institucional que abriu caminho para a eleição de Bolsonaro.

Nossa luta por um SUS 100% estatal e gerido pelas trabalhadoras e trabalhadores da saúde precisa estar a serviço também de um SUS de acolhimento para a construção de nossos corpos de acordo com nossa identidade, de forma gratuita e com segurança sanitária. Estamos a poucas semanas do 8 de março, e esse ano precisamos fazer ecoar nossa voz nesse dia de luta, com a força das mulheres trabalhadoras que estiveram na linha de frente durante todo esse ano pandêmico, e vamos gritar mais forte por justiça por Lorenna e todas as vítimas de transfeminicídio e do descaso capitalista.

 
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