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COLUNA
1984 de George Orwell, o criador do Big Brother, a metáfora do stalinismo reapropriada pelo capitalismo
Gonzalo Adrian Rojas
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A origem do que hoje conhecemos como Big Brother está no último romance do libertário inglês e internacionalista George Orwell, intitulado “1984”, publicado em 1949, poucos meses antes de sua morte. Uma distopia do que poderia acontecer no mundo se não mudássemos as sociedades, como afirmaria ErichFromm.

Em 1984, depois de uma guerra mundial nuclear na década de 60, sobrevivem três Estados que lutam entre sim, sem armas nucleares, mas que realizam um controle total da população através do Big Brother, o grande irmão, esse olho que a todos alcança e controla de forma permanente. Também é muito conhecida a versão livre em filme baseado no romance do diretor inglês Michael Anderson, que data de 1956.

Da leitura do livro se desprendem diferentes interpretações, em geral como uma crítica a todos os totalitarismos de forma genérica. Em termos genéricos, a crítica é válida, mas parcial, já que na minha interpretação, mesmo nos advertindo contra todas as sociedades de controle, é possível ser tomada em termos foulcautianos, a partir do disciplinamento dos corpos e da biopolítica. Do ponto de vista marxista revolucionário, de quem escreve, é preciso aprofundar as relações que existem entre economia e política, classes sociais e Estado, para poder construir uma luta política que gere uma ruptura e permita a superação destas sociedades de classes em termos concretos.

Minha hipótese, talvez não tão original, mas que pretendo destacar, é que 1984 expressa uma crítica específica ao stalinismo, aparece com clareza um regime político de partido único stalinizado, o partido interno, difamações e mentiras próprias dos processos de Moscou e as purgas stalinistas, que obriga inocentes a se autoincriminar, como aconteceu, por exemplo, com os últimos membros da velha guarda bolchevique, os quais haviam realizado a Revolução de Outubro, e que conseguiram sobreviver a guerra interimperialista e a guerra civil interna em defesa do primeiro Estado Operário, sendo assassinados pelo estalinismo e o culto à personalidade do líder impossível para a burocracia de se questionar, Stalin, no caso do Estado Operário Degenerado, como afirmaria León Trotsky.

George Orwell, desde a Inglaterra, participou das Brigadas Internacionais que combateram na guerra civil espanhola do lado dos republicanos, onde é ferido e se descobre anti-estalinista, mesmo sendo membro do Partido Comunista Britânico, mas combatendo na guerra civil nas milícias do Partido Operário de Unificação Marxista (POUM), uma organização política centrista, mas anti-stalinista, dirigida por Andres Nin, o qual foi sequestrado e assassinado pelo próprio stalinismo. O inimigo era Franco, mas o próprio stalinismo estava disposto a desarmar o proletariado e o campesinato espanhol para afogar em sangue a revolução em função dos interesses geopolíticos da URSS stalinizada, a teoria do socialismo em um só país.

O livro Homenagem a Catalunya de próprio Owen, escrito no final da guerra civil e o filme de Ken Loach, Terra e Liberdade de 1995, uma adaptação do diretor trotskista inglês desse livro nos conta experiencia. Também se expressa seu anti-estalinismo em outro romance Rebelião na Granja escrito em 1945.

Neste sentido, para os marxistas revolucionários, é central o conceito formação econômico social, já que nos permite entender de forma concreta em cada país, o conjunto de relações sociais que existem, a hegemonia de uma delas e partir disso o mais importante: como a partir desta análise realizamos uma melhor intervenção na luta de classes para superar essa sociedade. George Orwell, desta perspectiva e a partir de sua experiência, sem realizar uma análise na relação classes e Estado na URSS, começa acreditar em um stalinismo como fenômeno político totalitário, mas que acaba quase sendo impossível de combater de forma interna, pelo qual, paradoxalmente, realiza no final de sua vida uma colaboração com o serviço secreto britânico de delação de comunistas “encriptados”.

Podemos acrescentar que o sujeito da mudança é uma resistência quase individual, mesmo que o protagonista Wiston Smith faz parte do Partido Externo, seu trabalho no Departamento de Registros do Ministério da Verdade, consiste em reescrever documentos históricos para que correspondam à linha partidária em constante mudança. No lançamento do livro de Trotsky , Stálin: O grande organizador de derrotas, das Edições Iskra, aparece essa característica como própria do stalinismo.
Wiston Smith, por sua vez, tenta se vincular à resistência, uma resistência que não sabemos se é real ou um invento do poder para legitimar a repressão, neste contexto, o amor com Julia é proibido e perseguido, a qual aparece com iniciativa própria, mas sempre subordinada, e além disso, o uso dos medos individuais para garantir que as pessoas confessem o inconfessável, uma verdadeira economia política do terror.

Em relação ao conteúdo do livro, o que particularmente resulta assombroso, mesmo que não seja nenhuma novidade, é a capacidade que tem o capitalismo de se reapropriar da obra e das características do stalinismo para ressignificar, para fazer funcional ao sistema, mercantilizar, gerar lucro a partir disto, e apresentar como algo positivo com consenso de massas.

Minha leitura é conceitual, mas é inegável que o programa de TV, o qual não assisto, como toda ideologia dominante expressa alienação de massas, mexe com o senso comum, e pela minha visão empírica nas redes sociais tem uma audiência de massas. O fetichismo aparece de muitas formas, como uma submissão voluntária ao grande líder, abstratamente uma escolha livre, e quem sobrevive leva o prêmio, isso sim uma chance inexistente no regime stalinista e da Oceania onde acontece o romance.

Conseguiram fazer de um livro, que mesmo sem estratégia e sem saída possível, é um tributo à liberdade, um cárcere “voluntário”. Frente a isto, recomendo a leitura do livro 1984 de George Orwell, São Paulo, Companhia das Letras, 2009, e a assistir o mencionado filme e que seja um convite a uma luta estratégica por uma sociedade sem exploradores nem explorados, sem opressores nem oprimidos.

 
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