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RACISMO
Lider comunitário de favela em BH tem candidatura cassada ilegalmente pela Justiça
Aren Kwame

Júlio Fessô recebeu 3.037 votos, que, se contabilizados, são suficientes para que tenha direito a uma cadeira no Legislativo de Belo Horizonte. Mas teve sua candidatura indeferida por ter sido preso há mais de oito anos pela política racista de guerra às drogas.

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Eleito a vereador em Belo Horizonte, o líder comunitário do Morro do Papagaio, Júlio Fessô, recorre ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que possa ter o registro de candidatura deferido e conseguir tomar posse na Câmara Municipal. Ele recebeu 3.037 votos, que, se contabilizados, são suficientes para que seu partido, o Rede Sustentabilidade, tenha direito a uma segunda cadeira no Legislativo municipal de Belo Horizonte. Mas uma condenação em 2006 por tráfico de drogas foi uma brecha para o judiciário racista indeferir sua candidatura no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG).

O TRE-MG indeferiu a candidatura de Júlio Fessô em base à lei da Ficha Limpa, que considera inelegível por 8 anos, a partir do fim da pena, quem é condenado em segunda instância. Desta maneira, os votos que Júlio recebeu, são considerados anulados e não entram nos cálculos do resultado oficial das eleições, segundo o TRE-MG. No entanto, ele cumpriu pena de 2006 a 2011.

Se o prazo de oito anos da Lei da Ficha Limpa for contado partindo de 2011, como é defendido por advogados de Fessô, o mesmo poderia ter o registro de candidatura deferido e tomar posse, no entanto, além da prisão, Júlio Fessô foi condenado a pagar uma multa de R$ 800.

Segundo o processo, Fessô não quitou débito, mesmo o TRE considerando prescrito em 2013. “Deste modo, subsiste a restrição à candidatura do recorrente, visto que inelegibilidade ainda perdurará até 06/05/2021, data final do transcurso do prazo de 8 anos”, escreve o Juiz Rezende e Santos, ao negar um dos recursos apresentados ao TRE-MG pela defesa de Júlio.

O advogado Gustavo Martins, que atua na defesa do candidato, argumenta que o Estado teria cinco anos para executar a multa: "O TRE entende que tem uma multa em aberto. Só que se o processo transitou em 2006, o Estado teria até 2011 para executar essa multa. Tanto é que o Júlio tem a Certidão Negativa de Débito e todas outras certidões negativas de que ele não responde a nenhum processo na área cível e criminal. É um absurdo, uma arbitrariedade isso. O nome dele sequer foi protestado".

Fessô argumenta que a multa não foi cobrada, já que, diante do valor, foi considerado à época que era mais vantajoso ao estado não gastar dinheiro em medidas para cobrar a dívida dele. "Se essa multa chegasse para mim, como eu não tinha condições de pagar porque tinha acabado de sair da prisão, teria ido ao fórum pedir atestado de pobreza. Para você ter ideia, essa multa não consta na Receita Federal", diz ele.

A multa em questão é a pena pecuniária, que atrasa todo e qualquer recomeço de vida das pessoas que saem da prisão, que além de terem que encarar o ostracismo e o desemprego, são cobradas pelo Estado mesmo após pagarem pelo resto da vida por essa passagem na prisão. Quando foi absolvido, Júlio passou a atuar como instrutor no Programa de Prevenção à Criminalidade, ministrando oficinas de hip hop, serigrafia, fotografia e poesia para adolescentes, oficinas que fez surgir o apelido de “Fessô”.

Em sua defesa, Fessô menciona às situações atuais do Rio de Janeiro, citando Marcelo Crivella (Republicanos) e o prefeito eleito, Eduardo Paes (DEM), que disputaram às eleições com base em liminares concedidas pelo TSE que suspenderam condenações do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TER-RJ) que os tornavam inelegíveis.

Não apoiamos o Rede Sustentabilidade nem a candidatura de Júlio Fessô, mas seu caso é mais uma demonstração do nível de arbitrariedade à qual o judiciário recorre para perseguir e punir o povo negro e os trabalhadores, em detrimento dos grandes empresários e políticos de carteirinha, envolvidos em mil esquemas de corrupção e crimes de responsabilidade com a população. O Estado insiste em colocar como prioridade a "guerra à drogras" para colocar em cárcere a população pobre e de preferência negra, uma juventude sem acesso à educação, saúde, lazer e vivendo inclusive em situações miseráveis.

É um absurdo que Júlio ainda esteja marcado por um crime do qual ele cumpriu a pena e seja privado de seus direitos democráticos, de assumir o cargo para o qual foi eleito, e da população, de ter como vereador alguém que elegeu. O judiciário foi um responsável fundamental para Bolsonaro ter chegado à presidência em eleições manipuladas, com fakenews, sequestro de títulos de eleitor, prisão arbitrária de Lula e pós impeachment de Dilma (que sempre lutamos contra, sem prestar apoio político ao PT). Sempre dissemos que o avanço arbitrário do judiciário seria ainda pior com os trabalhadores e o povo pobre, e se mostra agora com um homem comum como Fessô, no qual miram e atacam sem piedade.

O sistema capitalista toma como base o racismo para se manter. O Brasil possui mais de 800 mil presos, tendo como maioria os negros que somam 65% da população carcerária. 65% que não têm direito a viver livremente mesmo quando cumprem sua pena, sabendo que 40% dos presidiários sequer foram julgados. A política de encarceramento e privações pós prisão se mostra abertamente racista, revelando o quanto o estado brasileiro reproduz suas práticas como um verdadeiro mecanismo de tortura àqueles que cumprem pena. Bolsonaro, Mourão e os militares reforçam a política com o discurso de que “bandido bom é bandido morto”, enquanto aos criminosos de terno e gravata é reservado delação premiada, prisão domiciliar e acesso a todo e qualquer tipo de privilégio.

Repudiamos o veto de posse de Júlio Fessô, defendemos a libertação dos milhares de presos sem julgamento e o fim da guerra ao povo negro e favelado sob o nome de "guerra às drogas". É preciso defender cada mínimo direito democrático ainda existente como parte da luta por derrotar todo o regime político do golpe, no qual vivemos hoje.

 
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