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O Congresso argentino votou o orçamento do FMI em uma sessão cheia de manobras
Redação

Na madrugada desta quarta-feira se votou o imposto às grandes fortunas no Congresso argentino. Este foi um dos projetos com os quais o oficialismo buscou esconder a política de ajuste que o Orçamento 2021 significa, ratificado durante a terça-feira.

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Novamente o FMI. O organismo internacional, com o qual a Argentina tem uma longa e trágica história, que inclui “marcos” como as privatizações do ex-presidente Carlos Menem nos anos 1990, a dramática crise econômica, social e política de 2001 ou o desastre do Governo de Macri, está novamente percorrendo pelas terras argentinas.

Na verdade nunca deixou de percorrer essas terras. Entretanto, nas últimas semanas, a coalizão governante do Frente de Todos confirmou algo lamentavelmente esperado: a dívida contraída pelo ex-presidente Macri, e denunciada como ilegal pelo próprio Governo e seus parlamentares, será reconhecida e paga com fome, suor e lágrimas do povo argentino.

Não são palavras ao vento. Desde a última carta da vice presidente Cristina Kirchner que chamou a um acordo nacional com os grandes empresários, os burocratas sindicais e os meios de comunicação, um rumo bastante claro se colocou em caminho: repressão na ocupação de terras Guernica, emissão de dívida para os especuladores, encontros com Héctor Magnetto da mídia Clarín, Paolo Rocca de Tenchint e outros empresários donos do país argentino. O anúncio de uma nova fórmula de mobilidade que ajusta outra vez os aposentados e, finalmente, a comunicação de que será pedido ao FMI um acordo de facilidades estendidas, que posterga pagamentos de dívida em troca de condições de submissão e ajuste para o país.

Nesse marco se inscreve a sanção do Orçamento 2021 que terminou de ser aprovado nesta terça-feira, 17, na Câmara de Deputados: a pedido do FMI, durante os próximos anos o país, novamente, irá subordinar toda sua economia ao pagamento da dívida ilegal aos especuladores. Irá ser eliminada a compensação salarial chamada Ingresso Familiar Emergencial (IFE) em um momento que a pobreza cresce, irá ajustar os aposentados, irão ser reduzidas áreas como as da saúde e educação, irão ser habilitados novos “tarifaços”, fim dos preços máximos em alguns produtos e irão ser postergados os salários dos trabalhadores estatais. Tudo isso, em benefício do capital financeiro internacional.

Veja mais: Festa no FMI: Congresso argentino aprova orçamento de ajuste

Afinal, entre os aposentados e os bancos, ganharam os bancos. É mais uma das promessas de campanha que foram só mentiras.

Repassando alguns números, o Orçamento 2021 estabelece entre outras coisas um reajuste de 9,5% em termos reais do gasto primário respeito a 2020, incluindo uma redução do gasto em saúde de 9,4%; as áreas para prestações sociais irão cair 16,5%, o IFE será eliminado, o que é destinado às universidades cai 9%, entre outros dados.

Por outro lado, seguem garantindo os pagamentos de lucros e parcelas da dívida aos credores privados, o qual representa 1,5% do PIB. É um montante equivalente a garantir 6 meses de IFE de cerca de R$670,00 para 9 milhões de pessoas. Mas as prioridades que o Congresso votou são outras.

Também se beneficiam setores ligados às exportações a partir de reduções fiscais, e empresas energéticas como Tecpetrol de Paolo Rocca que será premiada com subsídios de mais de R$4,5 bilhões. As empresas de gás (principalmente YPF) também vão receber fundos calculados em mais de R$5 bilhões provenientes da aplicação do “aporte extraordinário” que vai financiar práticas contaminantes como o fracking.

Por todos esses motivos é que nas redes sociais, durante a tarde desta terça-feira, foi tendência #NoAlPresupuestoDelFMI (“Não ao orçamento do FMI” traduzido do espanhol) com dezenas de milhares de tweets e em outras redes sociais como Facebook e Instagram.

Manobras para esconder o ajuste

Para ocultar esse enorme ajuste é que nesta terça-feira, 17, houve uma sessão maratona na Câmara dos Deputados do Congresso argentino. No fechamento desta edição já estavam a mais de 13 horas em discussão. Foi no transcurso desse lapso de tempo que se terminou de aprovar o Orçamento 2021.

Já na madrugada, depois das 3 horas da manhã para quarta-feira, 18, se deu meia sanção ao imposto às grandes fortunas que tocaria uma pequena fração dos lucros dos empresários mais poderosos. A iniciativa, anunciada quase 8 meses pelo oficialismo, recém foi discutida nesta terça-feira. A coincidência com a aprovação do Orçamento não é casualidade. Pelo contrário, demonstra que se tratou de uma manobra destinada a esconder o ajuste definido em função de acordar com o FMI.
Ao longo da extensíssima sessão no Congresso Nacional, houve muita hipocrisia. Por exemplo, Fernando Vallejos, da Frente de Todos do governo argentino, disse que o projeto de imposto às grandes fortunas representava “um ato de reparação e um pontapé inicial para tantos outros debates a partir dos quais possamos parir uma Argentina com maior igualdade”. Justo um momento depois de ratificar o Orçamento de acordo com os moldes do FMI.

Os representantes da coalizão opositora Juntos por el Cambio (Juntos pela Mudança, traduzido do espanhol), para confirmar mais uma vez que são representantes diretos da imensa minoria milionária do país, passaram toda a sessão chorando contra o projeto como se tratasse de uma expropriação dos grandes proprietários e banqueiros. Javier Campos, da Coalizão Cívica que integra o Juntos por el Cambio, disse que se tratava de uma “selvageria tributária”. Luciano Laspina, disse que o imposto “não tem uma intenção de cobrança, mas é na verdade ideológico”. E para completar o quadro, Jorge Enriquez, do PRO, outro partido da oposição, disse: “Assim começou o êxodo das ‘classes produtivas’ da Venezuela”.

Também houve vozes claras para declarar as coisas como realmente são: as de Nicolás del Caño e Romina del Plá, da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT, sigla em espanhol), oposição de esquerda ao governo de Alberto Fernández da Frente de Todos.

O deputado e ex candidato a presidente da esquerda, Nicolás del Caño, disse sem rodeios, entre outras coisas que “esta lei é para camuflar um ajuste contra o povo”. Del Caño se referia ao chamado imposto às grandes fortunas que não só apareceu 8 meses atrasado, depois de uma pandemia que deixou estragos no país, mas também que é insuficiente e está muito longe de compensar o grande ajuste que significa o orçamento votado a pedido do FMI, além de que em parte se usará para financiar o fracking contaminante.
Ou seja, foi utilizado como uma manobra para dizer que afetam os interesses dos poderosos quando o que sucede na verdade, de mãos dadas com o FMI, é exatamente o contrário.

Confira a fala de Nicolás del Caño, em espanhol:

Como dito por Del Caño no Congresso, “hoje estamos diante de uma manobra, diante de uma enganação, porque tentam esconder um novo ajuste contra o povo trabalhador, mas sabemos que não se pode tampar o sol com uma peneira. Guzmán anunciou que o orçamento de ajuste que foi votado agora a pouco nesta Câmara, vai ser ainda pior. Ele disse a Magnetto e a outros grandes empresários da Argentina, que o déficit fiscal vai passar dos 4,5% que diz o orçamento para inferior a 4%. E quem que vai pagar por isso? Os banqueiros, os grandes empresários, os milionários? Não, quem vai pagar por isso são os aposentados, os trabalhadores, os setores populares.

Desde a Frente de Esquerda não só apoiamos verdadeiros impostos progressivos às grandes fortunas, como também nosso programa integral aponta para a expropriação dos expropriadores do povo, a esse núcleo de banqueiros, de grandes proprietários e grandes empresários que se valeram do genocídio para multiplicar seus lucros a sangue e fogo e geraram este espiral permanente de atraso e decadência do país”.

O deputado da esquerda não se esqueceu de apontar quem são os outros responsáveis principais pela situação: “quero dizer a todas as pessoas que verdadeiramente querem terminar com esse ajuste contra o povo trabalhador, que lutam para impor às centrais sindicais que estão paralisadas, que estão ‘lutando’ pelo Twitter… que é preciso impor um verdadeiro plano de luta para unificar todas as batalhas que estão acontecendo hoje. Há muitas lutas dos trabalhadores acontecendo hoje, mesmo que os meios de comunicação ocultem todas elas, e essas lutas têm que ser unificadas para que esta crise seja paga pelos que a provocaram e não pelas maiorias populares”.

Aborto, nada é por casualidade

Uma leitura similar corresponde ser feita a respeito do envio do projeto de interrupção voluntária da gravidez. Longe de ser uma casualidade que se anuncie no mesmo dia que se vota o orçamento do FMI: é parte das manobras do oficialismo para tentar mudar uma agenda, ainda que, de todas as formas, o sol não pode ser tampado com uma peneira.

Ao mesmo tempo, é preciso dizer que se depois de tanto tempo de atrasos o projeto foi enviado ao Congresso, é mérito indiscutido da força do movimento de mulheres e sua luta histórica para impor este direito democrático.
Agora está declarado sair às ruas para que se aprove não este projeto do oficialismo, com muitas limitações, mas o projeto da Campanha Nacional pelo Direito ao Aborto Legal.

Nosso futuro por nossos direitos, contra o ajuste e por uma saída de fundo contra a exploração e a opressão, está nas ruas.

 
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