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EXTREMA DIREITA NOS EUA
Polícia e milícias de direita: uma longa história de conluio nos EUA
Scott Cooper

Não é por acaso que policiais e milícias de direita parecem trabalhar em estreita cooperação. Eles têm uma história de conluio que auxilia a polícia a desempenhar seu papel, como articulado por Lenin: de “corporações especiais de homens armados” para proteger a propriedade privada e a ordem capitalista.

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Dia 29 de maio, num prédio federal em Oakland, Califórnia, um policial federal foi baleado e morto por tiros disparados a partir de carro em movimento. O mesmo homem acusado deste assassinato também é acusado pelo homicídio de deputados de Santa Cruz, Califórnia, mortos em uma emboscada e de atirar bombas caseiras contra a polícia local, matando um e ferindo outras quatro pessoas. Ele é membro do Boogaloo Bois, que faz parte de um movimento de extrema direita vagamente organizado com fortes laços com várias milícias de direita.

As milícias de direita de hoje são grupos paramilitares que existem há décadas para contestar o que vêem como um governo norte-americano "tirânico" que impõe regras e leis das quais discordam. Este estado de coisas, esta situação que eles combatem, frequentemente está associada à influência ou controle sobre os governos por grupos raciais, étnicos e religiosos odiados por eles - razão pela qual eles estão tão intimamente associados à supremacia branca e ao neonazismo. O número de membros das milícias cresceu consideravelmente em alguns surtos, mais recentemente no período imediatamente após a eleição de Barack Obama como presidente - um sinal de seu racismo subjacente - e em outras vezes quando a direita raivosa e violenta é instigada por Donald Trump.

Os Boogaloos querem ver a ruína do sistema político vigente através de tumultos na sociedade, e o movimento existe para ajudá-lo. Nesse caso supracitado, o FBI diz que o atirador e seu cúmplice “vieram a Oakland para matar policiais”, usando como disfarce os protestos contra a morte de George Floyd pela polícia. Talvez eles tivessem sorte e os assassinatos fossem atribuídos a grupos Antifa. Opa, espere um pouco, foi exatamente isso o que foi relatado inicialmente.

Mas milícias atacando policiais são a exceção, e não a regra. A “regra” é milícias e polícias coniventes, trabalhando juntos - ou, no mínimo - policiais fazendo vista grossa para a ameaça. Isso remonta ao século 19 e provavelmente antes nos Estados Unidos: agências policiais oficiais recebendo a ajuda de vigilantes enquanto trabalham para fazer cumprir a ordem capitalista. Mais recentemente, tem sido assim desde que o assassinato de George Floyd desencadeou manifestações por todo o país. Enquanto o governo Trump acusava apressadamente os “anarquistas” e os “extremistas de esquerda” nas ruas, ameaçando “a lei e a ordem”, os próprios documentos internos do governo deixavam bem claro que a maior parte da violência vem de terrorismo de direita nacional, na maioria das vezes de milícias. Mas essa ameaça é amplamente ignorada, por razões políticas. Além disso, há evidências crescentes não apenas de que muitos policiais também são membros de milícias, mas de que alguns departamentos de polícia organizaram grupos ligados diretamente às milícias entre seus policiais. Em 2019, o RevealNews publicou uma incrível série de três partes sobre policiais e sua participação em grupos intolerantes (grupos de ódio).

O que nos leva a Kenosha, Wisconsin, na noite de 25 de agosto. Após alguns dias de protestos, membros da milícia foram a Kenosha para apoiar os policiais locais, que estavam batendo nos manifestantes. Eles foram mais do que bem-vindos pelos “agentes da lei”, que os agradeceram por estarem ali, ofereceram-lhes água e, no geral, sinalizaram que eram “aliados”.

“Eu literalmente testemunhei em primeira mão uma enorme quantidade de supremacistas brancos organizados dirigindo caminhonetes, intimidando os manifestantes”, disse o representante do estado de Wisconsin David Bowen ao Democracy Now! “E eles estavam lá não para tentar defender os comércios, como dizem. Eles estavam lá para dar um recado. Eles estavam lá para machucar as pessoas. Eles estavam armados e usavam substâncias químicas irritantes. Eles estavam assediando os manifestantes. E mesmo pelo vídeo, parece que eles estão alinhados com as autoridades policiais de Kenosha que estavam lá, literalmente”.

Bowen descreve como Kyle Rittenhouse, que assassinou dois manifestantes na rua de Kenosha, foi tratado pela polícia local. Ele está “usando [suas visões da supremacia branca] de forma letal. Ele está usando para machucar outras pessoas. E ele nem mesmo está sendo responsabilizado por isso. Eles lhe dão água." Ele passou direto pelos policiais enquanto os manifestantes gritavam que ele tinha acabado de atirar nas pessoas e, mais tarde, quando foi preso, recebeu o mesmo tratamento dado a Dylann Roof - você sabe, você é bem tratado, você se ambienta, depois de tirar a vida das pessoas, literalmente”.

Em outras palavras, preso “sem incidentes”. Não há sete balas nas costas para o garoto branco.

Existem muitos outros exemplos recentes, numerosos demais para este artigo. Quem pode esquecer os membros da milícia armada que tiveram permissão para entrar no parlamento de Michigan com suas armas de fogo semiautomáticas enquanto os policiais aguardavam - servindo aos interesses do capital? Alguns exemplos mais recentes bastam.

Dia 15 de junho, em Albuquerque, Novo México, os manifestantes se reuniram em frente a um museu para derrubar uma estátua de Juan de Oñate, um assassino explorador espanhol. Membros da Guarda Civil do Novo México - uma milícia local de direita - apareceram para “proteger” a estátua, fortemente armados com armas semiautomáticas. Enquanto uma corrente passava pelo pescoço da estátua, um ex-candidato à Câmara Municipal de Albuquerque, que estava entre os milicianos, jogou uma mulher no chão e se afastou. Os manifestantes o perseguiram e o homem - Steven Ray Baca - abriu fogo, atingindo um deles, Scott Williams, no torso.

Williams estava caído na rua, sangrando. Os milicianos “formaram um círculo protetor ao redor de Baca, com as armas prontas. Quando a polícia chegou, os policiais criaram um segundo círculo ao redor da milícia ...” Eles então “dispararam gás lacrimogêneo e granadas explosivas contra a multidão perturbada”.

Se pra você isto parece um conluio devidamente orquestrado, você não está só.

Os policiais detiveram o atirador. Como uma testemunha descreveu, “A polícia lidou com a Guarda Civil do Novo México e os “cavalheiros” com desvelo, com muito cuidado, para garantir que eles não se ferissem, enquanto eles estavam do lado oposto tentando atingir os negros e indígenas”.

Em Snohomish, Washington, em 31 de maio, com rumores de que ônibus lotados de membros da Antifa estavam supostamente a caminho da cidade, cem vigilantes armados se reuniram no centro da pequena cidade como "guardas" - fato este que o prefeito aplaudiu. O chefe da polícia local foi criticado e acabou sendo rebaixado por caracterizar o evento como uma noite festiva de brincadeiras não convencionais e comemorativas: "um homem agitando uma bandeira da Confederação e pessoas vestindo adesivos da insígnia de um grupo intolerante sobre roupas militares. Eles haviam chegado com o suposto propósito de proteger as butiques locais da pequena cidade de supostas ameaças de saque esquerdistas que nunca se materializaram”.

Há muitas histórias semelhantes ao que foi filmado em Salem, Oregon, em 1 de junho. Um policial se aproxima de um grupo de vigilantes brancos armados pouco antes do toque de recolher, após Salem ter sido palco de manifestações anti-racistas. “Meu comando queria que eu viesse falar com vocês”, diz o policial, “e pedisse para que vocês permanecessem discretamente em suas casas ou veículos, ou em algum lugar onde não seja uma violação, para que não pareça que estamos favorecendo vocês.” Os homens em questão faziam parte do Proud Boys ou do Patriot Prayer, de acordo com a maioria dos relatos das redes sociais. Este último tinha aparecido anteriormente para “defender” um salão de beleza local que tinha sido reaberto quando o proprietário se recusou a seguir a ordem de permanência em casa por causa do vírus dada pelo governador.

Aqui estão alguns trechos de outros exemplos:

∙ Em Chicago, um policial foi filmado usando a logo do Three Percenters, um grupo de milícia de direita, na sua máscara facial. Este grupo acredita que apenas 3% dos colonos lutaram contra os britânicos durante a Revolução Americana e, portanto, eles só precisam de um pequeno grupo para lutar. Os homens que explodiram bombas em uma mesquita em Minnesota em 2018 estavam ligados a este grupo.

∙ Em Oakdale, Califórnia, no início de junho, membros da Milícia do Estado da Califórnia apareceram para proteger uma empresa fechada com tábuas. Eles também se posicionaram em um telhado local enquanto os manifestantes anti-racistas protestavam. Embora os policiais oficialmente alegassem "nenhuma afiliação", o "comandante da companhia" da milícia disse a um repórter que "seus homens têm monitorado a atividade de manifestação ... por cerca de cinco dias" e que "ele informou aos chefes de polícia, xerifes e prefeitos da região que podem chamar a milícia onde problemas surgiram e seus recursos estiverem esgotados”. Dado o que sabemos, é difícil imaginar que os policiais não tenham gostado dessa oferta de apoio.

∙ Em Provo, Utah, uma milícia recém-organizada teve um conflito com os manifestantes do Black Lives Matter. Eles estavam armados até os dentes. Um policial disse a um repórter que "ele confiava em 99,9% dos homens e mulheres com as armas e disse: ’Esses homens e mulheres seriam os primeiros a levar uma bala por qualquer um dos manifestantes lá’”.

∙ Em Georgetown, Texas, em 6 de junho, a Texas Freedom Militia apareceu em frente ao tribunal do condado de Williamson para enfrentar um protesto Black Lives Matter. O porta-voz do departamento de polícia local “pediu aos membros da milícia ... que relatassem quaisquer sinais de violência à polícia de Georgetown para que a polícia pudesse lidar com isso”. Como um representante da milícia twittou mais tarde, "Somos todos texanos aqui, então esta não é uma competição, mas uma operação de força conjunta para preservar e proteger vidas no Texas, bem como manter a linha com o Departamento de Polícia de Georgetown”.

“Operação de força conjunta”. Essa é a linguagem dos exércitos lutando do mesmo lado em uma guerra. E, neste caso, é uma guerra - travada em conluio entre a polícia e milícias de direita, em todo o país. Quando os policiais em Kenosha e outros lugares são pegos dando as boas-vindas aos terroristas de direita – “estamos felizes por você estar aqui" - não é um acidente. As agências policiais, repetidamente, revelam que vêem essas milícias como reforços com a oportunidade de desempenhar um papel mais livre do que a polícia. As milícias não têm corregedoria para investigar tiroteios policiais, por exemplo. Em um impasse, pode ser muito útil para os policiais usarem membros da milícia sem rosto e sem emblema com armas semiautomáticas para aterrorizar os manifestantes. Isso é o que eles tentaram replicar em Portland, Oregon, com policiais federais agindo como milícias anônimas. E as crescentes evidências do envolvimento direto de policiais como membros dessas forças terroristas desmentem qualquer alegação de que as agências policiais não sabem o que as milícias estão fazendo. Mais provavelmente, eles são apenas a diferença entre a repressão organizada “oficial” e a “não oficial”.

David Bowen, representante do estado de Wisconsin, pode estar certo sobre o que aconteceu em Kenosha com Kyle Rittenhouse, mas ele está errado sobre o que precisa acontecer a seguir. “Esta é a Prova A e Prova B do motivo pelo qual precisamos transformar a aplicação da lei e a segurança pública em Wisconsin e neste país, com certeza”. Não, esta é a Prova A e a Prova B de porque precisamos abolir a polícia e colocar a segurança pública nas mãos dos trabalhadores, porque precisamos desmantelar completamente as corporações armadas que existem para proteger o sistema capitalista racista e opressor.

Ataques brutais e assassinatos como os de Kenosha - sejam por policiais oficiais ou seus parceiros não oficiais nas milícias de direita - não vão acabar sem desmantelar o sistema que eles protegem, só vão aumentar.

Tradução de https://www.leftvoice.org/cops-and-militias-a-long-history-of-collusion

 
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