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EDITORIAL MRT
O momento reafirma: Fora Bolsonaro e Mourão e a necessidade de lutar por uma Assembleia Constituinte
Leandro Lanfredi
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi
Mateus Torres
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Todo dia centenas de milhares em suas bikes e motos sob sol, sob chuva, batalhando por um sustento, diário e sofrido. 12 milhões de trabalhadores registrados, praticamente um terço do total, sofreram redução de salários, há milhões no desemprego. Sem proteção, outros milhões vão às ruas sem direito à quarentena já que o auxílio emergencial de R$600, que para muitos nunca nem caiu, não sustenta uma pessoa, o que dizer uma família. Milhões vão sendo expostos a maior exploração e maiores riscos na pandemia. Todos os dias 1 mil mortos por Covid, há quase 60 dias seguidos. Os ritmos de mortes podem variar conforme as regiões, mas a raça e a classe de sua maioria não. Deste lado da crise, os trabalhadores, e sua maioria negra e feminina.

Do outro lado da crise, governantes de norte a sul do país que, na segurança dos palácios falam em gripezinha como Bolsonaro falou meses atrás, ou Mourão e militares que supervisionam o ministério da saúde enquanto vidas que poderiam ser salvas vão sendo ceifadas ou governadores que, meses atrás, faziam campanha contra Bolsonaro, inclusive governadores de PT e PCdoB e hoje assinam os mesmissimos protocolos a serviço da FIESP, da Bovespa, etc. Do mesmo lado, a mídia burguesa comemora o retorno de jogging em pleno horário comercial em algum parque florido. Bolsonaro edita uma MP para facilitar que patrões imponham ainda maiores cortes salariais, e os militares e o STF na figura de Gilmar Mendes se dão o luxo de trocar acusações na mídia buscando disputar os rumos do Ministério da Saúde e de fundo quem que tem mais poder de arbítrio no país.

A luta antirracista nos EUA enfraqueceu Trump e impactou o mundo todo. No Brasil, o STF impôs derrotas táticas contra o bolsonarismo em meio a protestos antifascistas e antirracistas. A vantagem eleitoral dos democratas americanos sobre Trump pesa também em seu capacho brasileiro, e Mourão é quem responde a temas importantes durante a quarentena de Bolsonaro, após anúncio de seu teste positivo para o coronavírus. Em compasso de espera para ver como se define o cenário eleitoral nos EUA (que por enquanto aponta sustentada vantagem dos Democratas), emergem no Brasil objetivos em comum entre os distintos setores, antes em disputa aberta.

Há uma trégua entre os burgueses do país. Se antes havia muitos debates, até na grande mídia, sobre se as ações de Bolsonaro justificavam impeachment ou se o melhor caminho seria a renúncia, agora parece que tudo praticamente sumiu. Podem estar afiando suas facas uns contra os outros esperando outros momentos, pode essa dinâmica conflitiva se reabrir amanhã, mas por enquanto há uma agenda comum. A agenda comum de Bolsonaro, Mourão, Maia, Gilmar Mendes, generais, Toffoli consiste em continuar as aberturas sem nenhum tipo de política de testes massivos, sem nenhuma garantia de contratação de equipes médicas e sanitárias (da limpeza a alimentação e enfermagem),e querem passar a boiada, não somente contra qualquer tipo de proteção ambiental, mas também votar novas leis trabalhistas que legalizem trabalho por demanda, estendendo a exploração dos aplicativos, diante da qual os entregadores protestam pelo país, com nova data de paralisação sendo convocada para o dia 25. Querem impor a privatização de empresas estatais para aumentar o lucro dos verdadeiros donos do país, um punhado de bilionários brasileiros e estrangeiros.

Essa situação não caiu do céu e nem é imutável.

Há todo um sistema político que garante isso. Foi construído pelo golpismo, primeiro com a mão do poder judiciário aristocrático e racista, manipulado pelo imperialismo norte-americano, que organizou operações para derrubar o governo Dilma e impedir que quem quisesse pudesse votar em Lula, pavimentando o caminho para Bolsonaro governar. O reacionário Bolsonaro nunca se cansa de discursos racistas, nunca se furta em elogiar a ditadura, em incentivar milícias e outros elementos fascistas nas polícias. Mas seu vice, Mourão, um general de 4 estrelas faz exatamente o mesmo discurso racista e de apologia à ditadura. Exatamente o mesmo, fez, não só em discurso, mas na prática, cada general de destaque no governo em seu estágio de racismo e repressão na ocupação do Haiti, iniciada lá nos idos do primeiro governo Lula.

Não podemos confiar no STF golpista em sua farsa de “combate à extrema direita” como alternativa a esse descalabro. O STF usa contra a extrema direita os métodos que usaram contra o PT, e a qualquer momento se voltarão contra a esquerda e os movimentos sociais, como querem fazer com o controle das redes sociais por trás do discurso contra fake news.

Por trás das disputas no sistema, entre extrema direita e direita, que por vezes parecem “polarizadas”, o interesse é quem se localiza melhor na eleição, quem tem o controle político e militar das tropas policiais, da justiça, do parlamento, mas estão todos juntos descarregando, mais uma vez, a crise nas nossas costas e tentando preservar esse sistema. São todos igualmente agentes dos grandes empresários, nacionais e estrangeiros.

Não é das mãos dos jogadores deste jogo que podemos esperar algo que seja a favor dos trabalhadores e da maioria da população.

Mas é justamente dar as mãos a estes políticos e juízes, que foram cruciais para atacar nosso direito à aposentadoria, por exemplo, o que fazem os partidos e a ampla maioria dos sindicatos opositores. Juntam-se a Luciano Huck, a ex-ministros de Temer e até mesmo de Bolsonaro, em uma série de iniciativas conhecidas como “Frente Ampla”. As iniciativas do "Estamos Juntos", “Somos 70%” e “Direitos Já”, têm todas o mesmo caráter e contam com protagonismo de bilionários, reacionários e golpistas. São tentativas de subordinar os trabalhadores ao programa da classe dominante, evitar uma revolta social que derrube Bolsonaro, revigorar a direita tradicional nas eleições e estabilizar o sistema golpista com suas reformas econômicas ultraliberais. Evitar a queda de Bolsonaro, evitar que a revolta ganhe as ruas é o objetivo último dessas iniciativas.

É natural que o PSDB e a Globo apostem nessa perspectiva frente ao desespero de querer reconstruir uma centro-direita, assim como Ciro Gomes e seu bloco com PDT, PSB, Rede e PV, de caráter burguês e anti-esquerda, para o qual crescentemente entra o PCdoB. Também é natural que o PT aposte nessa perspectiva. Governa junto de reacionários nos estados do nordeste, fortalece as tropas policiais, ajuda com bilhões o agronegócio, concede direitos das mulheres e populações LGBT para bancadas religiosas dominadas por cúpulas milionárias de igrejas. Continuam no nordeste a mesma política que tocaram no governo federal e que ajudou a fortalecer justamente os líderes do golpe institucional e tantos membros do governo Bolsonaro. É por essa prática concreta – e não qualquer discurso em alguma live de Lula - que os governadores do PT vão em cada iniciativa dessas frentes, e o mesmo faz Haddad. Enquanto toda a política concreta do PT vai por esse lado, Lula faz discurso crítico à “frente ampla”, tentando oferecer sua figura com outro discurso. Um jogo duplo que busca evitar que surja algo pela esquerda do PT.

Infelizmente, o PSOL se localiza parecido com o PT em relação a essas Frentes. Um setor liderado por Guilherme Boulos, Marcelo Freixo e Áurea Carolina aderiu a todas, sendo que parte dessa ala adota uma linha mais parecida com o PCdoB de Flávio Dino, dar peso para aliança com burgueses “democratas”, inclusive nas eleições. Lamentavelmente, no caso da “Somos 70%” e “Direitos Já”, contou até com a adesão de setores que se reivindicam trotskistas como o MES, através de Fernanda Melchionna.

Nada faz o PT mudar sua estratégia de alimentar a ilusão de mudanças graduais e pacíficas pelas vias institucionais e eleitorais. Mesmo quando a burguesia pisoteia leis para garantir vitórias judiciais e eleitorais que lhe interesse, o PT atua sistematicamente para enjaular os trabalhadores nesse caminho que só nos leva a derrotas. Deste modo são parte constitutiva de construir a situação atual, de construir a atual correlação de forças.

O reformismo sempre aposta nas saídas institucionais e negociações com alas cada vez mais degeneradas do regime, dando passos de “mal menor” em “mal menor”, e construindo com isso um mal cada vez maior. Os argumentos sobre a “correlação de forças desfavorável”, que impediria saídas pela esquerda, encobrem o fato de que justamente não atuam para construir outra correlação de forças mais favorável.

O único caminho para se enfrentar com o governo reacionário de Bolsonaro e Mourão é o da luta de classes. Não se arrancará nenhum teste de COVID a mais, nenhum mês a mais de auxílio emergencial, nenhum aumento de seu insuficiente valor para no mínimo R$2mil, que era a média salarial antes da pandemia, nenhuma proibição de demissões, absolutamente nada se arrancará esperando o STF, Maia, a Globo, Doria, Witzel.

O impeachment está cada vez menos na ordem do dia quanto mais o PT, PCdoB se aliam a burgueses golpistas e só poderia ser assim. E mesmo se estivesse na ordem do dia, serviria para colocar Mourão em seu lugar. É preciso reafirmar a necessidade de trazer abaixo não somente Bolsonaro mas Mourão, os generais e todo esse regime político degradado.

Quanto mais apostam em Maia e no STF mais acordos os togados votados por ninguém fazem com o governo e bloqueiam caminhos como a da “cassação da chapa”. Qualquer eventualidade destas alas burguesas mudarem de linha só pode significar trocar então, hipoteticamente, esses 2 jogadores em prol de manter o sistema, as regras do jogo do golpismo e seus fins: o controle do STF sobre quem se candidata ou não, para garantir que exista continuidade da agenda do golpismo. Sem se enfrentar com todo esse sistema político e mudar as regras do jogo não há saída realista. É por isso que nós do MRT e do Esquerda Diário reafirmamos o chamado a unir a esquerda socialista, batalhando para romper a passividade que prima no país e preparar uma grande mobilização de massas, que seja capaz de enfrentar todo o sistema político e fazer com que os capitalistas paguem pela crise. Uma grande mobilização para que seja o povo que decida os rumos do país e não o STF ou Rodrigo Maia. Frente a este sistema político a serviço dos capitalistas, a única saída realista possível é lutar para mudar tudo. Não basta trocar os jogadores com novas eleições e, menos ainda, com um impeachment ou renúncia que dê lugar a Mourão.

Precisamos mudar as regras do jogo com um movimento de massas que barre os ataques através de medidas que ataquem, em primeiro lugar, os grandes empresários e instituições nacionais e estrangeiras que roubam as riquezas do nosso país. Nesse sentido, nosso chamado segue sendo para que a esquerda socialista se unifique na luta por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, abrindo caminho para uma verdadeira soberania popular que possa debater os grandes problemas das massas trabalhadoras, em uma perspectiva de acelerar a experiência dos trabalhadores com essa democracia degradada, apontando a necessidade da luta por um governo de trabalhadores de ruptura com o capitalismo.

Esta posição do MRT é diferente das propostas pelos partidos legalizados que se apresentam como alternativa à esquerda do PT: PSOL, PSTU, PCO, UP e PCB. São organizações com distintas tradições e políticas. Algumas delas inclusive dialogamos como MRT, e consideramos interlocutores dos chamados que fazemos acima para construirmos uma unidade. Viemos inclusive propondo uma coordenação pelo Fora Bolsonaro e Mourão e buscando acordos práticos na luta de classes, mas não avançamos em acordos sobre a necessidade de superar políticas que levam a um governo Mourão ou ao fortalecimento do STF.

Esse programa não se trata de sonho sem base na realidade. Confiamos na força do movimento de massas e da classe trabalhadora, do povo negro e das mulheres. É isso que está em cena fortemente com o levante do povo negro nos EUA que teve enorme impacto no Brasil e em todo o mundo. Aqui isso foi parte do que deu lugar às manifestações antifascistas e antirracistas e parte do que impactou para uma paralisação histórica de entregadores. A aposta da esquerda socialista deve estar em desenvolver, unir e coordenar, com um amplo trabalho em comum na base, essas mobilizações.

Nossa energia vem do ódio frente a cada negro assassinado pela polícia no Brasil, a cada Amarildo, João Pedro e tantos outros. Vem da vontade de não deixar o assassinato da Marielle passar impune. Se unirmos forças da esquerda socialista nessa perspectiva podemos pressionar inclusive as direções burocráticas do movimento de massas a se mover. Confiando na burguesia, seus políticos, seus juízes não conquistaremos nada. O único caminho possível é o da luta de classes e da independência política da classe trabalhadora e ele passa por reafirmar Fora Bolsonaro e Mourão e a luta por Assembleia Constituinte Livre e Soberana.

 
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