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OPINIÃO
Quem foi e quem é Paulo Freire?
André Galindo da Costa
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Durante as manifestações de 15 de março de 2015 causou muito espanto uma faixa na qual estava escrito: “Basta de Paulo Freire”. Esse caso isolado poderia facilmente ser esquecido como quase tudo que gera comoção e polêmica via redes sociais, se não fosse a capacidade infinita de imaginação da mente humana e um fato que ocorreu uma semana antes dessas manifestações. No dia 06 de março de 2015 fomos desagraciados no site da Revista Veja, o Veja.com, com uma das maiores pérolas dos últimos tempos. Trata-se de um artigo do colunista Rodrigo Constantino intitulado como “Escola sem partido já!”.

Entre várias acusações infundadas sobre Paulo Freire e seu pensamento chama a atenção a descrição de uma fotografia do educador no artigo a qual diz que “Paulo Freire: o “patrono” da educação brasileira deve ser colocado em seu devido lugar, que é o lixo da história.”.

Sempre tive comigo que determinadas opiniões não merecem se quer ser motivo de preocupação dada sua superficialidade e portanto não devem ter resposta. Mas apesar do artigo citado compor esse grupo de pronunciamentos os quais não valem a mínima atenção penso que esse em particular requer um posicionamento dado o alcance da revista e do colunista em questão. Farei tal coisa primeiro mostrando quem foi Paulo Freire com destaque para sua pessoa e alguns de seus feitos e depois mostrando quem é Paulo Freire tratando da importância e atualidade do seu pensamento.

Paulo Freire nasceu em Recife em 19 de setembro de 1921. Cursou direito na Universidade do Recife e fez doutorado em filosofia da educação pela mesma universidade, mas sempre teve um interesse muito grande por temas relacionados a língua. Suas primeiras atividades profissionais deram-se no ensino da língua portuguesa e na alfabetização de pessoas pobres. Nos anos 1960 destacou-se por refletir os processos de alfabetização, quando em 45 dias conseguiu alfabetizar 300 trabalhadores rurais no Rio Grande do Norte. Os excelentes resultados alcançados por Paulo Freire na alfabetização de adultos faria suas ideias cairem nas graças do então presidente progressista João Goulart e ser incluso no Plano Nacional de Alfabetização. As reformas de base que incluiam a educação e o Método Paulo Freire enquanto política de governo cessariam alguns meses após serem iniciados, com o golpe militar de 1964.

Após o golpe militar Paulo Freire foi preso por 70 dias e depois exilado primeiro na Bolívia e depois no Chile, onde desenvolveu diversas práticas de natureza educativa e humanitária e escreveu algumas obras. Em 1968 terminou de escrever sua obra mais célebre, que por questões de censura só viria a ser publicada no Brasil em 1974: Pedagogia do Oprimido. Em 1969 é convidado como professor visitante da Universidade de Harvard. Antes de retornar ao Brasil em 1980, após a Lei de Anistia, desenvolveu diversas atividades relacionadas à alfabetização em Genebra na Suíça e em países da África onde se falavam língua portuguesa.

No Brasil se filia ao Partido dos Trabalhadores sempre atuando com atividades relacionadas à alfabetização de adultos. Em 1986 recebeu o prêmio da UNESCO da Educação para a Paz. Entre os anos de 1989 e 1991 foi secretario da educação da cidade de São Paulo, no governo da então petista Luiza Erundina. Foi indicado para o prêmio Nobel da Paz em 1993.

Paulo Freire publicou 30 livros que foram traduzidos em 35 países. Somente Pedagogia do Oprimido foi traduzido para 17 idiomas diferentes. Foi professor em 8 universidades dentre elas: Universidade de São Paulo, Universidade Católica de Santiago do Chile, Universidade de Genebra e Universidade de Harvard. Possui 36 doutoramentos honoris causas por diversas universidade do mundo, como a Universidade de Estocolmo na Suécia e a Universidade de Massachusetts nos Estados Unidos. Colecionou diversos prêmios, homenagens e doutoramentos in memoriam. Paulo Freire faleceu em maio de 1997.

Agora um pouco de quem é Paulo Freire, tratando-se do seu pensamento. Paulo Freire desenvolveu um modelo de pedagogia crítica e assumidamente política. Com as ideias do que chama de Pedagogia da Libertação temos a partir de uma teoria com fortes influencias marxianas e aplicada à realidade do terceiro mundo uma proposta de conscientização das pessoas pertencentes a classes menos favorecidas de modo que possam conquistar sua própria liberdade das amarras históricas. Nessa perspectiva é considerada como educação bancária o modelo tradicional onde o professor é um mero depositante e o aluno um mero receptor de informações. O modelo bancário se mostra alienante e prejudicial para o desenvolvimento da curiosidade e da criatividade do estudante.

Relações democráticas entre professor e aluno em sala de aula seriam capazes de colocar o conhecimento prévio de ambos em situação de igualdade o que possibilitaria uma construção conjunta do aprendizado. Nesses termos as experiências até então vivenciadas pelo aluno não deveriam ser substituídas e sim usadas como referências durante o processo educativo. O método freiriano não se ocupa apenas de ensinar a ler palavras, mas sim, como afirma o próprio autor, capacitar as pessoas a lerem o mundo e a realidade que os circundam. O pensamento de Paulo Freire não se limita apenas a um método pedagógico, mas a toda uma construção teórica e filosófica com importantes reflexos sobre a teoria da educação e em outras áreas do conhecimento.

Entre as diversas homenagens que recebeu hoje destaca-se a escultura do sofá de Pye Engstron. A mesma encontra-se em Estocolmo na Suécia e tem Paulo Freire representado ao lado de outras importantes figuras como Pablo Neruda (poeta chileno vencedor do prêmio nobel de literatura), Georg Borgstrom (ambientalista) e Elise Ottesen-Jesen (militante feminista). Hoje Paulo Freire é o patrono da educação brasileira. Para aqueles que querem conhecer um pouco mais sobre a obra e a pessoa de Paulo Freire considero altamente recomendável o filme Paulo Freire Contemporâneo do cineasta Toni Venturi e o livro Convite à leitura de Paulo Freire de Moacir Gadotti.

Se é essa figura que a revista Veja e o colunista Rodrigo Constantino propõem que coloquemos no lixo da história há ao menos duas possibilidades: ou desconhecem Paulo Freire ou conhecem e o negligenciam. Lembremos que quando tratamos de Paulo Freire não nos referimos apenas a um dos brasileiros mais célebres da história, mas também a um dos seres humanos e humanistas mais importantes de todos os tempos. Raramente a humanidade é agraciada com o nascimento de um gênio, e foi assim com o nascimento de Paulo Freire. Para fechar uma de suas reflexões:
Não basta saber ler que Eva viu a uva. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho.” – Paulo Freire

 
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