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DIA DAS MÃES
Mães da linha de frente: “Quero estar viva para vê-los crescer e para transformar essa realidade, mudar tudo desde a raiz”
Marília Lacerda
Diretora de Base do Sindicato dos Trabalhadores da USP-HU

Neste dia das mães em meio a pandemia do novo coronavírus e o isolamento social, reproduzimos o relato de algumas mães trabalhadoras da linha de frente do combate ao coronavírus. Com a palavra Marília Lacerda, trabalhadora do Hospital Universitário e mãe de dois.

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Meu nome é Marília Lacerda, trabalho no Hospital Universitário da USP e sou mãe de uma menina de 10 anos e de um adolescente de 18 anos.

Todos os dias vejo chegar notícias de pessoas contaminadas e mortas por causa do coronavírus. No hospital onde eu trabalho, passamos por falta de EPIs básicos como máscaras, algo tão fundamental para garantir a nossa segurança, que é ultrajante que nos neguem isso. Pensar que como eu tem centenas de trabalhadoras no hospital que tem filhos e que se desesperam com a ideia de que podem levar o vírus para suas casas e contaminar seus entes queridos.

As trabalhadoras da higienização do hospital, que são terceirizadas e ganham um salário de fome, mal foram orientadas sobre as máscaras. Elas que são invisíveis aos olhos do reitor, do superintendente, mas que são essenciais para que o hospital seja um ambiente mais seguro, são tratadas como se valessem menos. Ao longo dos anos vi muitas delas que engravidavam e eram demitidas, ficavam doentes e eram punidas. Imagina agora nessa pandemia se elas adoecem? A empresa terceirizada, que já atrasa os salários e os benefícios, vai tratá-las como se fossem descartáveis, caso elas contraiam o vírus.

Eu fico imaginando que como eu, várias mães que estão na linha de frente, as atendentes e caixas de supermercado que são maioria mulheres, as operadoras de telemarketing, as trabalhadoras da limpeza e higiene, as metroviárias, as operárias nas fábricas, todas elas vivem o dilema de ter que escolher entre a saúde ou a fome. Se elas não trabalham, não tem salário para alimentar seus filhos. Se saem para trabalhar arriscam as suas vidas e também a dos seus filhos. Porque a maioria dos patrões não se importa com a segurança delas. Não fornecem EPIs necessários. O governo dá as costas para nós mães. Bolsonaro já tinha dito que as mulheres tinham que ganhar menos porque engravidam. Agora marca um churrasco “fake” no dia das mães para tirar sarro das mais de 10 mil mortes só pela covid-19. “E daí?” ele diz.

E daí que, além de passar por todo o medo constante de ser contaminada, ainda chego em casa preciso limpar, cozinhar, ajudar minha filha a estudar. E agora ainda preciso limpar a casa mais vezes, lavar a roupa mais vezes, porque não posso arriscar contaminar meus filhos. É muito cansativo.

Não bastasse tudo isso, as mortes de homens e mulheres que são filhos de alguém, a morte de mulheres que eram mães de alguém, vemos os nossos filhos perdendo emprego ou perdendo a juventude pedalando para os aplicativos de entrega. Meu filho foi demitido nessa crise e não sabemos se ele vai conseguir outro tão logo. Isso porque quando tem uma crise dessas, são os mais vulneráveis os primeiros a pagar por ela.

Quero que essa pandemia passe logo. Mas quero que o mundo após ela não seja um de mais miséria e exploração. Não quero isso para os meus filhos. Quero estar viva para vê-los crescer, mas quero estar viva para transformar essa realidade, mudar tudo desde a raiz para que meus filhos possam viver uma vida que valha a pena ser vivida.

Neste dia das mães, a todas as mães trabalhadoras, em especial as da linha de frente, muitas que sequer vão poder estar com os seus filhos hoje, deixo o meu grito de revolta contra esse sistema que transforma a maternidade em algo tão doloroso. Que todas essas mães possam ver seus filhos crescerem e que junto à nossa classe possamos lutar por um mundo sem exploração e opressão.

 
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