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ESPECIAL BRUMADINHO
Antecedentes: como o lucro assassino da Vale foi incentivado pelos governos e pela justiça
Francisco Marques
Professor da rede estadual de Minas Gerais

Um ano após o crime da Vale em Brumadinho, relembramos como as mineradoras foram incentivadas por diferentes governos e pela justiça em sua busca desenfreada por lucro, os antecedentes dos crimes de Mariana e Brumadinho, que marcaram a história de Minas Gerais com um rastro de destruição e morte.

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Foto: Cristina Boeckel/G1.

Ao contrário de Zema, Bolsonaro e os partidários da extrema direita, que querem apagar a história de destruição causada pela mineração para aprofundar a exploração mineral, precisamos retomar a história para fundamentar a luta por outra forma de mineração. A isso se pretende esse artigo.

Quando o crime de Mariana ocorreu não faltou quem cinicamente defendesse a Samarco (propriedade da Vale e da anglo-australiana BHP Billiton) e sua responsabilidade com o meio ambiente. Desde a Globo e a grande imprensa, os velhos políticos de direita até o governador Fernando Pimentel (PT), que deu entrevista coletiva dentro da sede da empresa (!!!) três dias depois do rompimento da barragem, e fez de tudo para isentá-la de responsabilidade criminosa, afirmando que “não podemos apontar culpados sem uma perícia técnica mais apurada”.

Mas Brumadinho confirmou de maneira trágica que a conduta da Vale sempre foi criminosa. Mesmo depois de Mariana, a empresa trabalhava calculando riscos e sabendo quantos seriam mortos e quanto gastaria com indenizações.

A mesma empresa foi capaz de, em menos de 4 anos, e no mesmo estado, no primeiro crime destruir uma bacia hidrográfica, do Rio Doce, no maior desastre ambiental da história do país, que levou poluição até o oceano e matou 19 pessoas, e, no segundo crime, matar 259 pessoas (além de 11 que seguem desaparecidas) e poluir um dos principais rios que abastecem a região metropolitana da capital mineira.

Além do impacto imediato, foram dezenas de consequências nefastas para a população, como a destruição da cultura e do meio de vida de ribeirinhos e comunidades indígenas e o adoecimento psicológico dos sobreviventes.

Foto: Agência Brasil. Mariana, 2015.

Os antecedentes

A Vale já nasceu de acordos de submissão do país, alinhada à nossa história de ex-colônia de Portugal. A Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) foi criada na década de 1940 por meio dos Acordos de Washington, programa de cooperação militar e econômica entre Brasil, Estados Unidos e Inglaterra, no qual o Brasil deveria fornecer minério para os interesses bélicos da potências imperialistas.

A partir da privatização em 1997 por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em meio ao avanço neoliberal, ocorreu um salto na pilhagem de recursos e na superexploração dos trabalhadores e do meio ambiente, com grandes grupos estrangeiros e nacionais ganhando cada vez mais espaço dentro da empresa, ainda que o Estado brasileiro mantivesse um peso importante.

Durante a década petista, apesar da demagogia de “defesa da soberania”, o projeto de país como fazenda e mina do mundo fez com que se aprofundasse a dependência do país das commodities, como o minério de ferro. Ao contrário de reverter a privatização tucana que havia tanto criticado, o PT impulsionou o crescimento do império da Vale. Durante os 21 anos como empresa privada, a Vale gerou 320 bilhões de reais de lucro aos seus acionistas, a maior parte desse valor durante os governos petistas, quando as commodities se valorizaram no mercado internacional.

Com o golpe institucional capitaneado por Temer (MDB) em 2016, já em meio à forte crise econômica, acelerou-se a desregulação ambiental e aprofundou-se a gestão privada da Vale, por meio do sistema “true corporation”.

Bolsonaro e Zema (Novo), ambos filhos do golpe institucional, amantes do autoritarismo e amigos desavergonhados dos grandes empresários, sempre defenderam a facilitação da exploração mineral, com aceleração de licenças ambientais, afrouxamento da fiscalização e aceleração das privatizações. Uma receita perfeita para novos crimes impunes como os de Mariana e Brumadinho.

Ambos (extremos) direitistas colecionam declarações em favor das grandes mineradoras e contra os trabalhadores e o meio ambiente, como Bolsonaro que fala de uma suposta “indústria das multas” ambientais e que o “capricho” dos fiscais atrapalha obras. Zema, que poucos dias antes da tragédia de Brumadinho comemorou a ampliação da exploração da mineração no estado, algumas semanas depois chegou a chamar o crime de “incidente”.

Foto: Cadu Rolim/Fotoarena. Brumadinho, 2019.

Horizontes da mineração

Nem o crime de Brumadinho – anunciado – nem o crime de Mariana foram acidentes. Foram a consequência de uma política de inserção submissa do país no mercado internacional, respeitada e aprofundada por cada um dos sucessivos governos. Ao Brasil cabe fornecer commodities, vitimando os trabalhadores com acidentes de trabalho e superexploração, arrasando povoados tradicionais e destruindo os recursos naturais do país. Ao mesmo tempo, os produtos manufaturados e tecnologias devem ser comprados de outros países imperialistas e de capitalismo mais desenvolvido.

Uma tônica que não só acompanha a república desde sempre, mas remonta ao Brasil Colônia e à escravidão, que já vitimava negros e negras mais de 300 anos atrás nestas mesmas terras, não à toa chamadas Minas Gerais. Se na escravidão a mineração era considerada o trabalho mais pesado, a maior parte dos operários mortos na mina de Brumadinho eram terceirizados, contingente precário formado no Brasil invariavelmente por uma maioria de negros.

Dentro desse ciclo vicioso, o “menos ruim” alardeado pelo PT em referência ao próprio governo, justificado pela sagrada “governabilidade” e pela intangível “correlação de forças”, foi responsável pelo maior acidente ambiental da história do país em Mariana, enquanto governava o país com Dilma e o estado com Pimentel. E esse menos ruim também pavimentou novas tragédias, tendo Brumadinho acontecido somente 25 dias após Pimentel entregar o governo ao seu sucessor.

A direita e a extrema direita souberam fazer uso do Estado capitalista para sangrar a terra e roubar os trabalhadores e o povo com a mineração, contando sempre com a impunidade escandalosamente garantida pelo judiciário.

A única maneira de romper esse ciclo é acabando com a mercantilização desse recurso estratégico que é o minério. É preciso estatizar a Vale sob gestão dos trabalhadores e controle popular, a única maneira de arrancar a mineradora das mãos dos acionistas privados e impedir uma gestão de mercado por parte do Estado, que também é destrutiva e fonte de corrupção e disputas políticas.

Esse programa é parte de uma luta anticapitalista para reorganizar e diversificar a economia do estado e do país, acabando com a dependência do minério e das commodities, tarefa histórica incumprida pelas elites do país e que somente um governo de trabalhadores em ruptura com o capitalismo pode levar à frente.

Fontes:

1. Lívia Tonelli, “Vale S/A: a serviço de que(m)? A fome capitalista de ferro que mata”. Ideias de Esquerda, 10 de fevereiro de 2019.

2. Movimento Revolucionário de Trabalhadores, “Pela re-estatização da Vale sob gestão dos trabalhadores e controle popular, para enfrentar a mineração predatória”. Esquerda Diário, 31 de janeiro de 2019.

 
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