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ANÁLISE
O casamento de conveniência entre Bolsonaro e a Lava Jato acabou?
Thiago Flamé
São Paulo

As medidas de Bolsonaro que romperam acordos com Moro e minaram a aliança do bolsonarismo com Sergio Moro, se multiplicaram nas últimas semanas.

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Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Como sabemos, Bolsonaro nunca foi o candidato preferido da Lava Jato. Lembremos do famoso episódio em que Moro deixou Bolsonaro no vácuo, quando este lhe estendeu a mão cordialmente num encontro fortuito no aeroporto de Brasília em 2017. Depois os ventos mudaram, e Moro ainda colaborou para a eleição de Bolsonaro e aceitou ser um dos seus ministros mais importantes, o que “empresta legitimidade ao governo”, como já disse o vice Mourão. Depois do enfraquecimento da Lava Jato, Bolsonaro colaborou para minar ainda mais o poder de Moro. Agora o contra ataque do antigo superministro golpeia o centro da articulação política do governo do Senado. Até onde vai essa briga, que pode ter consequências sérias para o governo?

O governo Bolsonaro vai lenta e paulatinamente perdendo base social em setores que foram fundamentais para a sua vitória, o que tem se expressado nas pesquisas de opinião, na queda de popularidade com epicentro no Sudeste (também no Nordeste, mas ali nunca chegou a emplacar de fato). Ao mesmo tempo, o porrete da Lava Jato não se mostrou uma arma eficaz para subordinar o Congresso, o que teria sido o cenário dos sonhos para Bolsonaro. Vendo sua base popular diminuir e a tentativa do “presidencialismo de coerção” fracassar, pragmaticamente – sim, Bolsonaro é capaz de agir pragmaticamente – vai dando uma nova orientação ao seu governo, se aproximando cada vez mais do centrão, do STF e da política de negociatas que ele chamava de “velha política” e se afastando do porrete da Lava Jato com que pretendia acuar o Congresso.

As denúncias do jornalista Glenn Greenwald e do site The Intercept que enfraqueceram muito a posição institucional da Lava Jato foram um detonador para a mudança de curso de Bolsonaro, mas essa já estava inscrita como possibilidade pelo próprio histórico das relações entre bolsonarismo e a operação. Não é segredo para ninguém as ambições presidenciais do ministro e chefe da Lava Jato. Um ministro que até hoje, depois de todas as denúncias da Vaza Jato e com todo o enfraquecimento institucional, continua ostentado índices de popularidade maiores que o do presidente, que está em queda. E Moro tem controle sobre investigações que poderiam ferir de morte o clã Bolsonaro. Ou seja, um aliado instável e provisório.

As medidas de Bolsonaro que romperam acordos com Moro e minaram a aliança do bolsonarismo com Sergio Moro, se multiplicaram nas últimas semanas. Destacamos duas fundamentais: a indicação de um Procurador Geral da República adversário interno da Lava Jato dentro da procuradoria; a tentativa de troca de comando na Polícia Federal à revelia de Sérgio Moro e da cúpula da instituição que é majoritariamente pró Lava Jato, que terminou com um triunfo importante de Moro que conseguiu manter Maurício Valeixo no comando da PF. Porém a Lava Jato não se contentou com a concessão de Bolsonaro e mostrou que é capaz de reação. O mandado de busca e apreensão de documentos no gabinete e na casa do senador e líder do governo, Fernando Bezerra Coelho foi um sinal claro da cúpula da PF, e de Sergio Moro, que não pretende cair sem esboçar reação.

A ação contra o líder do governo do Senado só saiu por que contou também com o apoio do ministro do STF, Barroso, um dos cruzados da Lava Jato dentro do sistema judicial. Seu caráter político e de retaliação salta aos olhos, inclusive o processo está sendo executado de forma a gerar problemas políticos adicionais ao governo Bolsonaro. Ao mesmo tempo em que debilita a articulação política do governo num momento crucial que é a votação da reforma da previdência no Senado, expõe o bolsonarismo perante a sua base, já que os noticiários foram obrigados a estampar que o hoje amigo de Bolsonaro foi no passado ministro de Dilma.

Aliás, essa disputa pela base social que votou Bolsonaro e vai lentamente rompendo com o ex-mito especialmente sob o impacto da situação econômica que não melhora vai ser um dos elementos mais dinâmicos das disputas políticas no governo no próximo período. Em lugares em que o bolsonarismo e o clã familiar tem uma base própria muito forte, como no Rio de Janeiro, a disputa tende a ser mais dura e estridente. Em São Paulo, ou Paraná, onde a base "lava-jatista" é mais determinante e o bolsonarismo duro é mais fraco, podemos ver um realinhamento de forças (como já estamos vendo em SP, com o governador do “Bolsodoria” se afastando do presidente) mais paulatino e gradual. Até mesmo os setores mais tradicionais de sua base, como os praças do exército, mostram sinais de insatisfação (sobretudo em função da reforma da previdência dos militares que favorece obscenamente os generais e coronéis) e são um dos objetos de disputa de base social entre bolsonarismo e Lava Jato e as diferentes variantes de direita e de extrema direita. É preciso pensar também a dinâmica que pode haver na base evangélica, um setor conservador mas que é sensível as dificuldades econômicas e como pode entrar como parte dessa disputa de bases sociais (em recente reunião de Moro com a bancada evangélica, estes deram sinais contra a maioria do STF, estendendo uma ponte de diálogo com Moro no momento em que Bolsonaro busca se aproximar do STF). Ainda que, os militares e os evangélicos continuam sendo, junto com o Sul do país, os redutos de elevada popularidade bolsonarista .

Esses cenários de disputa que já colocam no marco das eleições municipais, são ainda mais instáveis se acrescentarmos as consequências que outra eleição já está tendo, e terá muito mais nos próximos meses, que é a eleição norte-americana. A disputa nos EUA entre Trump e o partido Democrata tende a ter impactos internacionais e o Brasil é um dos focos dessa disputa. Com o enfraquecimento relativo dos governo populistas de direita na Europa, Bolsonaro se destaca como um dos principais aliados internacionais do trumpismo e os democratas que tem mil e uma relações e forte influência sobre os agentes do Estado brasileiro também estão jogando suas cartas para enfraquecer um aliado fundamental dos seus adversários.

Dentro de todas essas tendências ao enfraquecimento do governo Bolsonaro, a ruptura cada vez mais patente deste com a Lava Jato pode ter consequências enormes para o futuro do governo e do regime político. Inclusive parte dos quadros mais importantes do governo, como uma Joice Hasselmann ameaçam romper. A Lava Jato e Sergio Moro podem estar querendo mostrar ao Bolsonaro que ele não pode simplesmente se desfazer dela sem pagar um alto custo. Mas se Moro realmente está pedindo divórcio do bolsonarismo, ou seja, se o casamento de fato estiver se rompendo, as consequências negativas dessa separação serão enormes para o governo Bolsonaro.

 
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