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ANÁLISE
Bolsonaro tenta avançar no autoritarismo em conjuntura marcada pelo silêncio sindical
Ricardo Sanchez

Cada nova declaração de Bolsonaro tem sido mais pestilenta que a anterior. Insulto à memória dos mortos na ditadura, defesa de execuções e da prisão perpétua. Sua escalada ainda é retórica, mas acompanha medidas autoritárias de Moro. Esse conjunto é inseparável de uma conjuntura de maximização de ganhos autoritários depois do primeiro turno da reforma da previdência e, do silêncio sindical e da oposição petista.

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Uma sucessão de declarações presidenciais estridentemente reacionárias impregnam o ar do país. Elas aconteceram alguns dias depois de Sérgio Moro publicar uma portaria autorizando a expulsão de estrangeiros sem sequer direito a defesa formal em tribunal. Essa medida de Moro foi tomada no ensejo da operação “Spoofing” e a prisão dos supostos hackers, e como mínimo, o recoloca no tabuleiro depois de enfraquecimento que vinha experimentado. A Vaza Jato comprovou o que muitos afirmavam sobre o comportamento autoritário, golpista e politicamente interessado do juiz.

Frente ao massacre de presos no Pará, em sua maioria pobres e negros – como sempre o Estado brasileiro assegura – a dupla autoritária fez novas defesas das execuções ou de prisões perpétuas. Bolsonaro defendeu a perpétua de Adélio Bispo, Moro a prisão perpétua em presídios federais dos detentos supostamente ligados a facções do tráfico . Bolsonaro, seguiu a escalada retórica e declarou que um crime perpetrado por um morador de rua no Rio de Janeiro deveria ter sido acompanhado de um tiro de alguém para matá-lo. O governador Witzel, aproveitando-se da onda decretou que sua ofensiva contra os pobres e negros que até então envolvia “snipers” agora envolve também a internação compulsória daqueles que o estado acusar de usuários de drogas.

Tudo isso ocorre em meio a uma sulfurosa escalada discursiva de Bolsonaro sobre a ditadura, de pedidos de prisão do jornalista Glenn Greenwald por parte partido presidencial, o PSL,da negação por Bolsonaro dos assassinatos da ditadura, e tudo isso a tão somente 15 dias da aprovação da reforma da previdência em primeiro turno na Câmara de Deputados. Na Câmara e no Senado tramitam com urgência medidas para autorizar demissão de servidores concursados, e uma nova reforma trabalhista. A segunda maior empresa brasileira, a BR Distribuidora, foi privatizada na calada da noite. E diante de sepulcral silêncio petista cada uma dessas medidas encontra céu de brigadeiro para tramitar.

O aproveitamento tático das vitórias

O pensamento militar deve ter inculcado em Bolsonaro uma máxima do estrategista prussiano Carl von Clausewitz: tirar o máximo proveito tático das vitórias.

Trata-se portanto de tentar dar passos para consolidar uma correlação de forças não assentada, desferindo novos golpes, manter o inimigo em fricção para que não possa se reorientar, reagrupar. Trata-se de garantir mais autoritarismo como instrumento de disciplinamento que torne mais fácil aprovar mais ataques aos direitos trabalhistas e sociais, promover maior subordinação ao imperialismo. Em suma, vislumbra-se passos mais firmes na agenda de todo golpe institucional, motivo último pelo qual o “mercado” bandeou-se de Alckmin ao filho indesejado Bolsonaro, motivo por qual a Lava Jato e os militares perderam seu sono em busca de proibir entrevistas, retirar títulos de eleitor de nordestinos, vazar delações que questionavam, e sobretudo retirar o direito da população votar em quem ela quisesse para assim garantir a vitória.

Trata-se de uma conjuntura especial para Bolsonaro, Maia, e para o STF – que mesmo cindindo em alas – deu em uníssono seu aval à reforma da Previdência. Uma conjuntura de aproveitar a expressiva votação em primeiro turno da reforma da previdência, tirando o máximo que for possível da classe trabalhadora em meio a alguns sinais de desorganização e desmoralização induzida pela explicita aceitação da reforma por algumas centrais (UGT, Força), e o nem tão disfarçado aplauso de parte do petismo (como seus governadores que pediram a extensão do ataque ao funcionalismo estadual).

O desafio estratégico desses atores é tirar o máximo possível de cada vitória tática e assim tentar consolidar uma correlação de forças mais longeva, de situação, etapa, que dê a cada um deles maiores bases para enfrentar novas contradições que vem do plano internacional na economia e na geopolítica, do plano nacional na economia sem perspectiva de ciclo sólido de crescimento, e dos sempre presentes atritos e conflitos entre os variados fatores de poder no condomínio golpista que é o governo Bolsonaro.

Em seu conjunto, as recentes medidas autoritárias de Moro com a portaria 666, todas ilegalidades na operação “spoofing”, suas declarações e de Bolsonaro são um claro teste de aceitação e resistência para tentar avançar o máximo possível na consolidação de uma correlação de forças. Por outro lado trata-se também de uma enunciação de potenciais intenções de até onde o governo iria em nome dos lucros capitalistas se os vaticínios econômicos de não recuperação do emprego, não recuperação do crescimento da economia se concretizarem e trouxerem maior descontentamento, maior luta de classes.

O avanço autoritário de hoje, mesmo que sobretudo retórico, é preparatório para esse futuro que se alumbra não somente em textos de “esquerdistas”, mas em análises no Estadão, no Valor Econômico e até mesmo no boletim Focus do Banco Central.

Para se aprofundar na análise econômica leia: “Manchete vs letras miúdas: a mentira do renascimento econômico com a Reforma da Previdência”

Maia, o Senado e o STF voltam agora do recesso, e cada um deles também não perderá terreno em assentar derrotas a adversários (bolsonarismo) e sobretudo a inimigos (classe trabalhadora). Batalhas avizinham-se sobre a crise fiscal nos estados se estes não forem inclusos na Reforma da Previdência, na eleição para PGR, em diversos julgamentos no STF, em diversas fontes de suspeição da Lava Jato. E todos atores preparam-se para uma batalha muito importante, as eleições de 2020. Não causa estranhamento quão contundentes foram as críticas as declarações de Bolsonaro sobre a ditadura por parte de parceiros de golpismo, de neoliberalismo senil, mas que militam na direita e não na extrema-direita. Fizeram gala do repúdio Bruno Covas, Doria, Eduardo Paes e até mesmo Janaína Paschoal.

As vitórias em retirada de direitos, sem perspectiva de melhora na economia não acalmam as disputas entre direita e extrema direita. Uma disputa que fraciona o regime e cada instituição e partido político, até mesmo o PSL.

Uma batalha assimétrica, graças às direções sindicais e políticas

Essa semana foi a semana onde Bolsonaro abriu sua infindável cloaca. Para pensar a relação das declarações de Bolsonaro com a conjuntura é importante toma-las nem ao pé da letra como um programa de ação imediato, nem como um mero tweet forçadamente exagerado para negociar como faz Donald Trump. Diferente de Trump com a China, não há um chamado à negociação e um acordo provisório a firmar. Os “chineses” de Bolsonaro são os opositores em geral e em especial aqueles que são portadores de direitos, entendidos como potenciais ameaças.

Em primeiro lugar os inimigos são os portadores de direitos trabalhistas e previdenciários. Em segundo lugar os portadores de direitos sociais, tais como o da educação gratuita e pública. Os direitos, diz Bolsonaro, são empecilhos ao emprego e ao desenvolvimento. Uma balela que visa multiplicar os lucros, em detrimento da miséria, da fome, da exploração, da miséria intelectual.

O verdadeiro pavor de Bolsonaro, no entanto, reside em afugentar o espectro de outro direito. Aquele que é hoje o mais renegado direito, oriundo das declarações do século XVIII de quando a burguesia era revolucionária: o inalienável direito à sublevação, à insurreição.

Não à toa os alvos preferenciais são aqueles que se levantaram no passado. Mesmo tombados auguram o potencial da ressureição dos vencidos. Não à toa os alvos são também aqueles portadores da “balbúrdia” de hoje. Que se levantam ou tem mais claro e imediato potencial de se levantar. São eles os jovens, os professores, as mulheres, os LGBTs e a memória dos militantes nos anos 70.

O PT insiste em separar a crítica à política econômica à crítica aos direitos democráticos, como se a segunda fosse uma cortina de fumaça em relação à primeira. Fazendo isso não combatem nem a primeira nem a segunda. Travam as forças de vanguarda em professores, na juventude, das mulheres, em despertar a confiança na luta de classes do conjunto da classe trabalhadora e das massas. Aí, depois de garantir o esvaziamento operário das manifestações estudantis de 15 e 30 de maio, e garantida à ausência estudantil da paralisação nacional de 14/06, quando tanto a luta democrática como a econômica falham, como só poderia ser, renomadas direções petistas fazem como seu ex-presidente nacional Rui Falcão: eximem-se de culpa no clima do país e culpam os trabalhadores pela situação.

Saiba mais lendo o editorial do MRT: “A cínica entrevista do ex-presidente do PT e a necessidade de uma estratégia baseada na luta de classes

O PT, a maior central sindical do país, a CUT, dirigida por esse partido, a UNE dirigida pelo PCdoB podem desviar, fragmentar a resistência, e não oferecer batalha. Mas a batalha ocorre, e de forma assimétrica na contundência entre os que se atacam e os que se defendem.

Para Bolsonaro, para Maia, para a Bovespa a batalha é de consolidação de seus ganhos. Para a juventude, para as mulheres, para o conjunto da classe trabalhadora é de tirar lições de como chegamos até aqui, para com essas lições agir para frear esses ataques e preparar a contra-ofensiva.

Enfrentar-se com a reforma da previdência ainda não plenamente aprovada, com a privatização das universidades com o Future-se, com a impunidades do militares assassinos da ditadura e de hoje, que tiveram sua impunidade intocada em 13 anos de governo petista, exige da classe trabalhadora e da juventude tomar em suas mãos a mobilização. Exige superar direções sindicais que aceitam os ataques em silêncio porque negociam verbas com Maia, com a MP873 que caducou, que aceitam que a reforma seja aprovada porque seus governadores querem, que deixam que cada morto na ditadura seja esculpido em praça pública para sorriso de seus assassinos de ontem, e para os assassinos impunes de hoje, como aqueles que fuzilaram o músico Evaldo poucos meses atrás. Sorriem impunes os mandantes do assassinato político de Marielle.

Querem nos amedrontar. Querem esconjurar o fantasma da sublevação. Pois que façamos eles temerem esse espectro. Nesse país 47% dos assalariados do país são mulheres e 45,2% de toda população do país tem menos de 30 anos de idade. Dessa força objetiva, potencialmente imparável é preciso formar força subjetiva. Para isso é preciso superar os entraves colocados por uma direção e sua estratégia meramente parlamentar, de confiança no STF e que só tem nos levado de derrota em derrota quando a divisão dos de cima e persistente quadro negativo na economia poderiam ser pontos de apoio para tornar a batalha simétrica e preparar-se a vencer.

 
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