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FRANÇA
Estudantes franceses ocupam faculdade em que Macron se formou
Facundo Rocca

A assembleia de estudantes do Instituto de Estudos Políticos, mais conhecido como Sciences Po, decidiu ocupar o edifício central dessa prestigiada faculdade de Paris. "Macron, sua faculdade está ocupada".

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Os estudantes ocupam o Sciences Po contra as políticas de Macron

No marco de um crescente movimento social contra as políticas do governo de Emmanuel Macron – cujo os epicentros são as mobilizações estudantis e uma importante luta ferroviária, entre outros setores em luta – a Assembleia de estudantes do Instituto de Estudos Políticos, mais conhecido como Sciences Po, decidiu ocupar o edifício central dessa prestigiada faculdade de Paris.

A ocupação então se soma à lista de universidades ocupadas na França, entre as quais se destacam a sede de Tolbiac da Universidade Paris 1 Pantheon-Sorbonne, ocupada há mais de 3 semanas e rebatizada como Comuna Livre, a Universidade Paul-Valéry em Montpellier, a Universidade Jean Jaurès em Toulouse, assim como a Universidade Paris 8 Saint-Denis, nos arredores de Paris.

Os estudantes universitários protestam principalmente contra a Lei O.R.E. (sigla em francês para "Orientation et réussite des étudiants", em português "Orientação e Êxito dos Estudantes") que se propõe a modificar o ingresso ao ensino superior pondo em funcionamento um sistema de seleção excludente; mas também têm cumprido um papel ativo de apoio e solidariedade com as lutas operárias em curso.

Macron tentou deslegitimar o movimento acusando os ocupantes de serem uma minoria de "agitadores profissionais" antes de estudantes, porém a massividade das assembleias, que chegam ao nível de milhares de pessoas em muitas universidades, e a quantidade de ocupações e mobilizações cresce dia a dia. Isto ainda contra a violência policial e para-policial que se toma contra os estudantes. Grupos de extrema direita atacaram e desalojaram algumas ocupações, contando inclusive com a ajuda das autoridades. O edifício histórico da Sorbona foi ocupado por algumas horas até ser desocupado pelas forças anti-motins nacionais, a CRS.

As mesmas forças agrediram e detiveram estudantes que tentavam realizar uma reunião de coordenação interuniversitária em Nanterre, universidade ponta-de-lança do Movimento 22 de Março na origem do Maio Francês (de 1968), e ameaças de intervenção policial foram feitas em muitos outros locais de estudo. Ao mesmo tempo que se desalojava à força a Paris Sorbonne, a CRS cercou a universidade de Tolbiac ameaçando com a mesma medida, porém centenas de estudantes, trabalhadores e habitantes do bairro se reuniram imediatamente em frente a suas portas pretendendo evitar.

Sciences Po não só representa uma das grandes escolas mais elitistas da França, onde a seleção excludente já é uma realidade, como conta entre seus graduados ao próprio Macron e boa parte da casta política francesa. Daí as consignas declaradas pelos ocupantes: "Macron, tua faculdade está ocupada" e "Aqui se formam os que selecionam. Bloqueamos a fábrica das elites".

Enquanto a própria universidade comemorava, nas redes sociais, a participação, há 50 anos, dos estudantes da Sciences Po no Maio de 68, seus estudantes atuais decidiram a voltar a empreender a luta antes só de recordar: em honra à bandeira que se havia levantado "Sciences Po diz NÃO à ditadura gaullista" em 1968, os estudantes fazem ouvir hoje outra que diz "Estudantes da Sciences Po contra a ditadura macroniana".

Reproduzimos, traduzido, o comunicado emitido pelos e pelas estudantes:

SCIENCES PO SE SOMA À LUTA

Os Estudantes de Ciências Políticas reunidos em assembleia geral em 17 de abril decidiram coletivamente a ocupação pacífica do edifício principal da universidade por tempo indeterminado: decisão válida até que seja retirada a lei ORE e todas as demais leis anti-sociais e racistas apresentadas por este governo (lei de asilo, lei de imigração e medidas contra a função pública), cujo terreno foi preparado por várias legislações previas. Frente a essa iniciativa neoliberal e racista levada a cabo em todas as frente por Macron, consideramos que é essencial nos mobilizarmos de maneira concreta parando os centros de produção de riquezas e de conhecimento.

Alguns nos dirão que não temos nada para dizer no movimento estudantil atual contra a seleção no ensino superior, por que como estudantes da Sciences Po, pertencemos a uma universidade por natureza seletiva: cremos que nossa universidade serve de laboratório para as políticas educacionais neoliberais e racistas tais como as orquestradas hoje pelo governo.

Apesar das medidas implementadas para alentar a diversidade, Sciences Po nos da uma ideia de como será a educação superior se deixamos que Macron ir adiante. O acesso a esta universidade segue sendo incrivelmente desigual, resultado de uma seleção social que se vê reforçada pelas pressões acadêmicas e psicológicas sofridas durante nossa educação aqui. A isto se somam as consideráveis violências sexistas, racistas e sociais reproduzidas pela instituição e pelo corpo de estudantes e professores contra as quais não se toma medida alguma.

Ademais, a ocupação de Sciences Po resulta fortemente simbólica: em tanto, é essa a universidade onde estudou Emmanuel Macron e numerosos membros de sua maioria parlamentar, o que põe em evidência as raízes acadêmicas e simbolicas da ideologia liberal racista dominante, que surge tanto na gestão da universidade como no conteúdo do ensino. Numerosas empresas multinacionais intervêm em nossa universidade para que suas práticas de exploração, incluindo a exploração dos trabalhadores, a apropriação dos recursos naturais do hemisfério sul, as violações dos direitos humanos e a destruição do planeta, sejam elogiadas em nossas aulas. Com aulas obrigatórias de economia neoliberal no primeiro ano, aulas neocoloniais sobre "empreendedorismo na África", sobre a lei do petróleo no Mestrado em Energia, sobre a melhor maneira de castigar os trabalhadores no Mestrado de Recursos Humanos... Nossa universidade está cheia destes módulos que pretendem formar ladrões de colarinho branco e entusiastas funcionários de alto nível para um regime autoritário liberal, que não fazem nada além de garantir continuamente suas próprias posições.

Por estas razões, chamamos a todos e todas estudantes indignadxs pela política de Macron, Mion [Frédéric Mion, diretor da Sciences Po] e seus aliados, a somarmo-nos a fazer da Sciences Po um lugar aberto a todxs – estudantes, desempregadxs, precarizadxs, assalariadxs, imigrantes com ou sem vistos - com o objetivo de derrubar este templo da educação injusta, desigual e elitista que querem nos impor.

Nós, os e as estudantes da Sciences Po em assembleia:

· Queremos salientar que o pessoal de segurança não estava de forma alguma envolvido em nossa mobilização e que nenhuma sanção contra eles será tolerada por nós.

· Demandamos que não se compute as faltas em dias de manifestação a fim de permitir que todxs possam participar e se mobilizar por seus direitos.

· Já que o poder está nas mãos de uma elite, e que, infelizmente, os acordos de corredor são muito eficazes para produzir mudanças, exigimos que Frédéric Mion, diretor do IEP [Instituto de Estudos Políticos, conhecido como Sciences Po], utilize todas as redes a sua disposição para garantir a retirada das leis propostas que condenamos. Se seus decretos são suficientes para pô-las em prática, duas ou três chamadas telefônicas deveriam ser suficientes para freia-las.

· Convidamos os e as professoras a refletir e discutir conosco a fim de construir uma nova pedagogia e descompartimentalizar nossos saberes. Os e as professorxs precarizaxs, pelas mesmas lógicas que levam hoje a exclusão, demandam que suas aulas sejam pagas mesmo que não sejam dadas pela ocupação.

Hoje ocupamos Sciences Po para bloquear a produção deste saber dominante em que assenta as bases racistas, elitistas e sexistas do mundo atual.

Ocupamos Sciences Po para bloquear a reprodução das elites liberais, aquelas que excluem nas fronteiras e nas universidades, privatizam o país e precarizam os mais vulneráveis.

Ocupamos Sciences Po porque já não escutaremos mais a ladainha de suas teorias dominantes que não deixa nenhum espaço para os saberes críticos e enterra toda a possibilidade de inventar outro saber para outro mundo.

Ocupamos Sciences Po contra seus controles e suas câmeras, e com o desejo de fazer nossa universidade um lugar de encontro e emancipação: contra seu "neo-management" afirmamos a ajuda mútua, a solidariedade, a auto-gestão e a luta concreta e eficaz contra todas as formas de opressão.

Ocupamos Sciences Po em apoio de todos os exiladxs, e em especial aqueles que ocupam o edificio A de Paris 8 e sua demanda de regularização coletiva.

Ocupamos Sciences Po porque Macron saiu daqui e nós não queremos terminar como ele.

 
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