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MARXISMO E NOSSA ÉPOCA
Kautsky e Delbrück: apontamentos teóricos entre as estratégias de desgaste e aniquilamento
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy

O debate das "duas estratégias" entre Kautsky e Rosa Luxemburgo em 1910 marcou um momento importante no marxismo do século XX: a capacidade de utilizar todas as armas na luta de classes e a construção de partido revolucionário é uma tarefa do nosso século. Que podemos extrair desse debate? Voltamos à obra do historiador militar Hans Delbrück para revisitar o tema.

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Para os trabalhos da estratégia, é possível extrair importantes conclusões teóricas dos debates do passado para pensar a atividade militante no século XXI. Revisitar a história, para o marxismo, nunca se assemelha a viagens a antiquários. Encarar os desafios presentes exige extrair o máximo das grandes experiências do passado.

Com esse intuito, queremos fazer uma nova incursão sobre um debate que marcou o início do debate de estratégia na socialdemocracia internacional: o debate das duas estratégias, de 1910, entre Karl Kautsky e Rosa Luxemburgo. Este debate – que buscava fundamentar a orientação partidária da socialdemocracia alemã diante da crise política e econômica do império naquele então – se fundava em dois conceitos elaborados pelo historiador militar Hans Delbrück (1): a estratégia de desgaste e a estratégia de aniquilamento (2).

Este debate chamou a atenção de importante autores e historiadores, dentre os quais podemos mencionar Perry Anderson em seu conhecido trabalho “As antinomias de Antonio Gramsci”, ou mais recentemente o marxista estadunidense Lars T. Lih, em seu trabalho “The New Era of War and Revolution: Lenin, Kautsky, Hegel and the Outbreak of World War I” (3). A verdadeira inspiração para essa reflexão, entretanto, vem do livro recentemente publicado “Estrategia socialista y arte militar” de Emilio Albamonte e Matias Maiello, dirigentes do Partido dos Trabalhadores Socialistas (PTS) na Argentina, organização irmã do MRT brasileiro, obra que será publicada proximamente no Brasil.

Vamos abordar o debate das duas estratégias desde uma ótica distinta – ainda que conectada – à que comumente foi realizada, ou seja, as discussões propriamente ditas entre os expoentes da socialdemocracia alemã, a partir da experiência das Guerras Púnicas entre Roma e Cartago (4), tais como a refletiu Delbrück. Ou seja, demonstrar o equívoco de interpretação dos conceitos militares por parte de Kautsky.

O debate das “duas estratégias” de 1910

Para isso, começamos indicando a forma como Kautsky colocava a questão.
A moderna ciência da guerra diferencia dois tipos de estratégia: a estratégia de aniquilamento e a estratégia de desgaste. A primeira reúne suas forças de combate rapidamente para ir ao encontro do inimigo e direcionar-lhe golpes decisivos [...] Na estratégia de desgaste, pelo contrário, seu chefe evita todo combate decisivo: busca manter o exército inimigo em constante alerta por meio de manobras de todo tipo, sem dar oportunidade de estimular suas tropas através de triunfos; tende a desgastá-las progressivamente, diminuindo sua capacidade de resistência cada vez mais até chegar a paralisá-las” (KAUTSKY, Debate sobre a greve de massas. Buenos Aires: Pasado y Presente, 1975, pp. 133-34)

Essa diferenciação foi tomada por Kautsky a partir de Hans Delbrück, historiador militar alemão que redigiu a obra Geschichte der Kriegskunst (5) (História da Arte da Guerra). Trata de utilizá-la em sua polêmica de 1910 com Rosa Luxemburgo sobre como proceder na luta pela reforma do sistema eleitoral prussiano, que se dava em meio à maior onda de greves na Alemanha desde 1905. Kautsky recomenda aqui a estratégia de desgaste, que em sua “tradução política” significa acautelar o Partido socialdemocrata alemão contra a intenção de impulsionar o movimento de massas ativo naquele então, e apostar tudo na evolução das possibilidades eleitorais do partido. Essa opinião contrastava cabalmente à de Rosa, que negava taxativamente a contraposição entre as possibilidades eleitorais do Partido socialdemocrata e a necessidade de impulsionar o desenvolvimento da luta de classes (6).

Como exemplo do “bom caminho” que representava a estratégia de desgaste para a classe operária alemã, Kautsky retoma o exemplo do ditador romano Quintus Fabius Maximus, que segundo sua interpretação das Guerras Púnicas – tomada de Delbrück – foi capaz de vencer o poderoso exército cartaginês de Aníbal apoiado na estratégia de desgaste, cujas manobras prepararam o caminho para o confronto que pôs fim às Guerras entre Roma e Cartago.

Hans Delbrück

A despeito da distância histórica entre nós e o momento desta polêmica, há mais de 100 anos, nos parece útil para a reflexão estratégica do marxismo mostrar que essa interpretação de Kautsky acerca dos conceitos militares expostos por Delbrück – apesar da erudição demonstrada – se opõe quase que diametralmente à intenção original do historiador alemão ao concebê-las. Isso afetou, como não poderia deixar de ser, o debate sobre as “duas estratégias” naquele então, traduzidos ao terreno político.

Uma interpretação curiosa: o desgaste para Kautsky, e para Delbrück

Ao contrário do que dá a entender Kautsky, ao recorrer à opinião de Delbrück acerca da Segunda Guerra Púnica, o historiador militar alemão nunca considerou que a eventual vitória do exército romano comandado por Quintus Fabius Maximus (o “Cunctator”, ou “demorador” em latim) contra Aníbal se deveu à “estratégia de desgaste” implementada por aquele. De fato, Delbrück, ao tratar do problema estratégico da Segunda Guerra Púnica, assinala a crescente debilidade das legiões romanas em opor um objetivo positivo contra o exército cartaginês, especialmente depois das derrotas no rio Trébia (218 a.C., em que o general Tibério Semprônio caiu diante dos cartagineses) e no Lago Trasímeno (em que Aníbal destruiu o exército de Caio Flamínio, 217 a.C.), que antecederam o quase aniquilamento das legiões na Batalha de Canas (216 a.C.). Assim, longe de ser uma escolha estratégica, a conduta romana de evitar batalhas decisivas foi fruto do seu progressivo debilitamento diante de Aníbal.

Mesmo antes da batalha de Canas, depois das derrotas romanas, o ditador Quintus Fabius Maximus preferiu conduzir a guerra evitando uma decisão tática [...] Agora, a derrota em Canas não apenas conduziu Roma de volta à estratégia do Cunctator, mas também deu a ela o que faltava antes de Canas: um objetivo positivo. É da natureza da guerra que todo triunfo, se não conduz ao total aniquilamento do inimigo e à restauração da paz, forma a base para o contra-ataque e para a retribuição do golpe. Aníbal havia chegado, de acordo com a expressão de Clausewitz, ao ponto culminante da vitória. Os romanos não mais aceitaram batalhas em campo aberto; Aníbal não tinha força suficiente para operações de sítio em larga escala contra as legiões romanas, e não era capaz de impedir que as legiões romanas fizessem operações de cerco contra as cidades desertoras, as sujeitassem e punissem”. (DELBRÜCK, History of the Art of War, Volume 1, p. 342)

As manobras de Quintus Fabius que evitavam uma decisão tática eram produto da incapacidade de opor resistência em campo aberto aos cartagineses, e não a “via livremente eleita” para melhor derrotar Aníbal. De forma alguma estas manobras dariam ao “Cunctator” a vantagem de “diminuir a capacidade de resistência”, menos ainda “paralisar” Cartago.

Ademais, como a “estratégia de desgaste” teria garantido a vitória apenas a Roma, se para o mesmo Delbrück o comandante cartaginês, Aníbal Barca, era também um estratega do desgaste? Em contraposição a outro historiador militar, Johannes Kromayer, Delbrück afirma que “Kromayer acredita que, até a Batalha de Canas, a estratégia de Aníbal era de aniquilamento, e mudou desde então para a estratégia de desgaste. Aníbal não adotou uma mudança em sua estratégia, mas foi e permaneceu desde o início um estrategista do desgaste. Se ele tivesse adotado uma estratégia de aniquilamento teria de ter tentado, após a derrota dos exércitos romanos, atacar e capturar a própria Roma. Aparentemente ele nunca teve isso em mente e nem poderia ter”. Conclui este raciocínio dizendo que “Se Aníbal tivesse sido capaz de ser um estrategista do aniquilamento, então todas as manobras diversionistas do ‘Cunctator’ teriam sido em vão” (DELBRÜCK, History of the Art of War, Volume 1, p. 362)

Primeiro volume da "História da Arte da Guerra"

Esta opinião de Kromayer, segundo a qual o cartaginês Aníbal e o romano Fabius eram representantes de dois tipos diferentes de estratégia – opinião que adota Kautsky – foi de fato criticada por Delbrück. Se Quintus Fabius era obrigado a afastar-se do campo aberto pela fraqueza de suas forças, Aníbal não era forte o suficiente para se beneficiar estrategicamente de suas conquistas táticas, sitiar Roma e liquidar essa grande potência – segundo Delbrück, havia chegado ao “ponto culminante do ataque” (7) contra Roma (voltaremos a outra conclusão sobre este ponto no próximo item).

Karl Kautsky

Em uma tradução possível ao campo político em que se desenvolvem os debates de estratégia entre Kautsky e Rosa Luxemburgo, nada impunha que a onda grevística do proletariado alemão, que tomava um curso ascendente em meio à crise econômica e política do império, se subordinasse ao “desgaste” parlamentar.

Como conclui Rosa, a oferta de “nada mais que parlamentarismo” estava longe de ceifar a capacidade de resistência – menos ainda de paralisar – do Estado prussiano: era necessário combinar as possibilidades eleitorais da socialdemocracia (utilizadas para preparar o partido para dirigir o ascenso operário) com o impulsionamento do movimento que se desenvolvia na luta de classes. O “mero desgaste” (táticas desvinculadas da estratégia revolucionária) não ofereceria perigo algum.

Isso joga nova luz sobre a interpretação “livre” de Kautsky acerca dos conceitos militares, a história da guerra e sua tradução para a política. Kautsky desconsidera (em benefício de seus fins políticos) os fatores reais que impuseram a eleição da conduta de guerra dos romanos, distorcendo a opinião de Delbrück acerca dos motivos finais que explicam o desenlace das Guerras Púnicas em favor de Roma. Isso possibilitava que o “Papa” da II Internacional, em franco percurso de abandono da estratégia marxista, separasse mecanicamente no tempo as “duas estratégias”, de desgaste e de aniquilamento – num momento em que ainda não havia explicitamente renunciado à necessidade da tomada do poder e do “combate decisivo” (ou seja, em 1910).

Rosa Luxemburgo

A estratégia do desgaste não se divorcia da estratégia do abatimento

Não menos importante é esclarecer que a concepção de Kautsky diante da “estratégia de desgaste” e da “estratégia de aniquilamento” não guarda correspondência com o próprio desenvolvimento das duas estratégias por parte de Delbrück.

Como vimos, Kautsky considera que a estratégia de desgaste seria capaz, na situação de crise da Alemanha, “diminuir a capacidade de resistência e paralisar” o Estado monárquico. É interessante ver que essa ideia abriu as portas para teorizações, inclusive recentes, sobre a possibilidade de “neutralizar” (“paralisar”) o Estado capitalista através da batalha pela “hegemonia cultural”, um conceito de hegemonia que pouco ou nada tem a ver com a capacidade da classe trabalhadora tornar-se sujeito político dirigente das demandas das camadas mais oprimidas. Essa concepção da “neutralização do Estado” tem espaço nas elaborações do intelectual britânico Peter Thomas, que busca se apropriar de Gramsci e com quem debatemos aqui.

Ver aqui: Gramsci, Trotsky e a democracia capitalista

Entretanto, para além da aposta na tática eleitoral em detrimento da articulação de volumes de força na luta de classes, Kautsky distorce mais uma vez a visão de Delbrück, que considerava as estratégias de desgaste e de aniquilamento como dois polos da arte da estratégia, nunca mecanicamente tão diferenciados.

Contra a visão de uma separação estanque entre as duas estratégias, em sua obra História da Arte da Guerra Delbrück estabelece múltiplos exemplos de estratégias “bipolares”, que combinavam aspectos das duas estratégias (tendo dois exemplares importantes na história militar: Aníbal e Frederico o Grande).

A estratégia de Aníbal estava dirigida a forçar Roma, através dos golpes mais duros, da perda de aliados e da destruição do interior da Itália, a fazer certas concessões territoriais a Cartago e limitar seu próprio tamanho. Sua estratégia era, portanto, bipolar, assim como aquela de Frederico o Grande, mas nunca colocou-se como objetivo a completa sujeição militar do inimigo como Alexandre Magno e Napoleão” (DELBRÜCK, History of the Art of War, Volume 1, p. 363)

Como dissemos acima, Delbrück considera Aníbal um representante da “estratégia de desgaste” assim como Quintus Fabius. Isso não privou o cartaginês de sempre buscar batalhas decisivas em campo aberto. “Se o desejo por batalhas decisivas marcasse apenas a estratégia de aniquilamento, então Frederico o Grande também estaria nessa categoria, e Aníbal assim também se enquadraria não apenas até 216 a.C. Mesmo depois de Canas, Aníbal definitivamente não parou de buscar batalha aberta, e o fato de não ter encontrado se deve exclusivamente aos romanos”. (DELBRÜCK, History of the Art of War, Volume 1, p. 350)

Batalha de Canas, 216. a.C.

Isso nos leva a outra conclusão importante dos escritos de Delbrück, absolutamente ignorado por Kautsky: o desejo por batalhas decisivas não é marca exclusiva da estratégia de “aniquilamento”, mas também do “desgaste”. Daí não serem formas estratégicas separadas mecanicamente no tempo (como considera Lars Lih, em sua abordagem do debate), mas articuladas dialeticamente no curso da preparação e do próprio combate.

Para Kautsky, e para o amplo arco de intérpretes atuais da “estratégia de desgaste” reduzida a manobras divorciadas da luta de classes, o desgaste implica a espera passiva de um “acúmulo evolutivo de táticas” parlamentares e sindicais a fim de eventualmente “paralisar” o Estado. Esta ilusão de neutralizar o aparato hegemônico da burguesia foi combatido teórica e praticamente por Trotsky, que ao assimilar a necessidade de batalhar pelas posições conquistadas (ou fortalezas) da classe trabalhadora, estas posições (“primeiros esboços de democracia proletária”, partidos, sindicatos, e inclusive organismos de auto-organização e auto-defesa nos ascensos da luta de classes) deveriam servir como ponto de apoio para quebrar a casca da democracia burguesa, destruir a hegemonia da burguesia em favor da hegemonia proletária.

Contra a espera passiva de Kautsky, subordinando o desenvolvimento da luta de classes à tática eleitoral (e não combinando dialeticamente todas as táticas em função da estratégia revolucionária para vencer), a questão de fundo para Trotsky é que o poder político da classe operária não pode se constituir de outra forma que não seja em luta contra o Estado capitalista e seus diferentes regimes políticos, incluída a democracia burguesa.

Este fator do combate como componente das medidas “desgaste” está mais em sintonia com a reflexão de Delbrück.

A modo de conclusão

Karl Kautsky passivizou, distorceu e "desafinou" importantes conceitos da arte militar ao traduzi-los para a política. Era um sintoma importante de uma deriva estratégica que o levaria, anos depois, a rechaçar plenamente a necessidade da tomada do poder pela classe trabalhadora e combater a primeira revolução operária triunfante no século XX, a Revolução Russa de 1917. Rosa Luxemburgo captou com perspicácia os sintomas dessa deriva e colocou em termos corretos a batalha contra a perda do caráter revolucionário da socialdemocracia alemã.

Mas o tema não se esgota na assimilação acrítica e incorreta dos conceitos militares para o debate político. Depois de três décadas sem revolução, a esquerda deixou intocado o tesouro que representa a apropriação crítica da obra de Clausewitz (também de Delbrück e outros autores) como ferramenta para enriquecer a estratégia revolucionária do marxismo (um de seus principais avanços no século XX). Para Clausewitz a tática é a organização dos combates em cada batalha e a estratégia a utilização de cada uma destas batalhas em função dos propósitos finais da guerra. Lênin e Trotsky traduziram com perfeição estes conceitos para a política entendida como luta de classes: a condução tática das operações isoladas (greves, eleições parlamentares, atuação nos sindicatos, etc.) deve estar à serviço da arte de vencer, de apoderar-se do comando, destruindo o Estado burguês e abrindo caminho através de um Estado de transição à expansão internacional da revolução a fim de conquistar a socialização das forças produtivas dos países mais avançados do mundo, cuja harmonia e colaboração são a base para o desenvolvimento da técnica humana acima de qualquer patamar anterior no capitalismo: em outras palavras, a base do comunismo.

Trotsky escrevia na década de 30 "Imagine o crime que constitui a conduta de um exército que não se dispusesse a conhecer e utilizar todo tipo de armas, todos os meios e processos de luta que o inimigo possui ou possa possuir. Em política, é ainda menos fácil saber de antemão que método de luta será aplicável e vantajoso para nós, nessas ou naquelas circunstâncias. Sem dominar todos os meios de luta sofremos o risco de sofrer derrotas fragorosas - e até decisivas - se modificações independentes de nossa vontade na situação das outras classes puserem na ordem do dia uma forma de ação no qual somos particularmente débeis".

Esse alerta estratégico cai como um luva no século XXI: a classe trabalhadora deve saber utilizar todas as formas e aspectos da atividade social, e deve estar preparada para substituir uma forma de luta por outra do modo mais ágil e organizado quando as circunstâncias o exigirem. Um partido "kautskista" é incapaz de dirigir estas mudanças rápidas na conduta política (e psíquica) da vanguarda operária. Isso só pode ser feito com um forte partido revolucionário dos trabalhadores, leninista.

Esta tarefa histórica está em busca de herdeiros: a construção desse partido operário, revolucionário e internacionalista é nossa tarefa prioritária.

***

Notas de rodapé

(1) Hans Delbrück (1848-1929), historiador militar alemão e editor dos Anais Prussianos de 1883 a 1919. Foi professor de história da Universidade de Berlim de 1896 a 1921. Membro da delegação alemã à Conferência de Paz de Paris, Delbrück serviu como especialista na questão da responsabilidade alemã pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Sua obra magna é a “História da Arte da Guerra”, composta de 4 volumes. Para este artigo, usaremos a edição editada e traduzida por Walter J. Renfroe, publicada pela University of Nebraska Press.

(2) Ermattungsstrategie (estratégia de desgaste) e Niederwerfungsstrategie (estratégia de aniquilamento), segundo o original alemão. A Niederwerfungsstrategie é convencionalmente traduzida como “abatimento”, “derrubada” ou “aniquilamento” (para este artigo, utilizaremos sempre a tradução “aniquilamento”, pelos motivos adiante). Já a Ermattungsstrategie pode ser traduzida como “fatiga”, “esgotamento”, ou “cansaço”, mas usualmente é utilizada como “desgaste”. Para Delbrück, estas duas estratégias não estavam separadas binariamente, mas eram polos de uma mesma arte em constante contato, dependendo da situação de cada um dos exércitos em cada guerra específica. Por “estratégia de desgaste”, o historiador militar alemão concebia um conjunto de manobras que compunham “métodos secundários de condução da guerra” (Delbrück, op. cit., pp.362-63) que não objetivam a sujeição militar do inimigo para destruí-lo. Por “estratégia de aniquilamento”, entendia a condução da guerra rumo a total liquidação militar do inimigo. Veremos que a própria concepção que Kautsky extrai das “duas estratégias” é consideravelmente diferente das de Delbrück.

(3) LIH, Lars T. The New Era of War and Revolution: Lenin, Kautsky, Hegel and the Outbreak of World War I. Leiden: Brill, 2014.

(4) As Guerras Púnicas consistiram numa série de três conflitos que opuseram a República Romana e a República de Cartago, cidade-estado fenícia, no período entre 264 a.C. e 146 a.C.. Depois de quase um século de lutas, ao fim das Guerras Púnicas, Cartago foi totalmente destruída e Roma passou a dominar o mar Mediterrâneo. O adjetivo "púnico" deriva do nome dado aos cartagineses pelos romanos, Punici (de Poenici, ou seja, de ascendência fenícia).

(5) DELBRÜCK, Hans. History of the Art of War. Bison Books, University of Nebraska, Lincoln and London, 1990.

(6) Assim resenha Perry Anderson o debate entre Rosa e Kautsky: “Foi Kautsky quem introduziu os conceitos militares de Delbrück – sem reconhecê-lo – em um debate político sobre as perspectivas estratégicas da luta proletária contra o capitalismo. A ocasião de sua intervenção era transcendental. Porque foi com o fim de rebater a exigência de Luxemburgo de adotar as greves gerais combativas, durante a campanha do Partido Socialdemocrata alemão pela democratização do sistema eleitoral neofeudal prussiano, quando Kautsky opôs a necessidade de uma mais prudente ‘guerra de desgaste’ do proletariado alemão contra sua classe inimiga, sem os riscos que implicavam as greves de massas. A introdução da teoria das duas estratégias – desgaste e aniquilamento – foi pois o verdadeiro disparador da funesta cisão dentro do marxismo ortodoxo alemão antes da Primeira Guerra Mundial” (ANDERSON, Perry. As antinomias de Antonio Gramsci, pp. 101-102)

(7) “A diferença entre Aníbal e Fabius não é, portanto, de princípio, mas puramente prática, ligada à diferença de suas armas. Aníbal baseou sua atividade em derivar as maiores vantagens possíveis de sua maior força, a saber, da cavalaria e da capacidade de movimento, e isso o inclinou à luta aberta. Fabius reconhecia a inferioridade dos romanos nessa área e procurou derrotar o inimigo mediante métodos secundários de condução da guerra. Ambos, entretanto, não procuravam aniquilar o inimigo, mas forçá-lo, através do desgaste, a aceitar acordar a paz ou abandonar o território inimigo” (DELBRÜCK, History of the Art of War, Volume 1, p. 363).

 
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