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EDUCAÇÃO A PESO DE OURO
Nova escola de 8 mil por mês: Educação como bem imaterial e inalienável pra quem ?
Mariana Pereira
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Já se imaginou estudando ou colocando seus filhos para estudarem numa escola cuja anuidade equivale a míseros 102 mil reais (8 mil por mês, mais taxa anual de 6 mil)¿ Para pelo menos 2 mil famílias do Brasil, esse é um valor irrisório a ser pago diante do valor “imaterial” e inestimável da educação. Esta, claramente, não mais entendida como um bem inalienável, ou seja, que nenhum governo, instituição ou autoridade possa negar a qualquer pessoa esse direito tão fundamental.

Esse é o preço a se pagar na instituição educacional que pretende formar os novos “líderes globais”. A escola Avenues The World School , sediada em Nova York, abrirá no segundo semestre de 2018 uma filial na região de Cidade Jardim, em São Paulo.

Fundada em 2012 em Nova York por Benno Schimidt, ex presidente da Universidade Yale, Greenberg, ex publisher da revista “Esquire” e Chris Wittle, também da área de educação, a escola de Suri Cruise, dos filhos de Eduardo Paes e de apresentadores de programa, possui 1500 alunos que pagam US$ 50 mil por ano. A relação candidato-vaga chega a 17.

Os alunos estudam inglês e mandarim, aprendem a mexer em impressoras 3D e no almoço comem lagosta orgânica no refeitório. Aprendem matemática pelo método de Cingapura e, no ensino médio, constroem casas de selva com painéis de energia solar, estudam ética e religiões do mundo, assim como economia dos países emergentes. Enquanto isso, nas escolas da rede pública, as escolas que garantem o direito universal à educação básica, as salas são super lotadas, merendas racionadas, professores não tem material didático e a polícia a qualquer momento interrompe os estudos, como no caso que custou a vida da Maria Eduarda durante sua aula de Educação Física.

Os planos de expansão para regiões como Londres, Miami, Xangai, Vale do Silício e Doha tem relação com a proposta pedagógica de internacionalização, para que os alunos possam circular por seus diferentes campis mundo afora e a escolha por abrir uma unidade em São Paulo antes foi devido ao grande sucesso de faturamento de outras escolas internacionais, como a americana Graded School, que possui uma lista de espera de 500 pessoas e taxa de matrícula de 40 mil reais, mas o objetivo maior inicial é na China e em países de língua espanhola.

Obviamente, o ciclo escolar visa preparar as crianças para aprovações nas melhores universidades do mundo, e para isso também abordagens pedagógicas “não tradicionais”, como a construtivista, fazem parte do projeto pedagógico.
O cofundador, Alan Greenberg, declarou que mesmo um ano antes de abrir as portas, já recebeu cerca de 2 mil famílias interessadas. E além das famílias, a nova escola está movimentando o mercado de contratações de profissionais altamente qualificados oriundos de outras escolas da elite paulistas.

Nesta última terça (15/08), dezenas de famílias participaram do evento que reuniu interessados no projeto da escola Avenues, em Vila Olímpia (zona oeste de São Paulo). Regado à camarão, champagne e vinho caro, nada lembrava crise naquele espaço. E quem não conseguiu vaga neste encontro, terá que tentar nas próximas edições se quiser tentar matricular seu filho na Avenues, já que são uma espécie de “processo seletivo” para uma das 2100 vagas disponíveis.

O que está em jogo quando a educação de qualidade custa 8 mil reais ao mês?

A resposta para essa pergunta é simples e objetiva: a educação como um direito de todos está em jogo.

Enquanto somente com a mensalidade da escola, o topo da pirâmide social brasileira investe 8 mil reais mensais ou mais, dados recentes apontam que o gasto público do Brasil por aluno tem uma média de investimento de R$ 6.745 a cada ano, segundo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Ou seja, 562 reais ao mês para tudo que diz respeito à manutenção do aluno na escola. A disparidade é enorme e tanto os governos federais quanto estaduais e municipais fazem uma escolha política baseada em interesses de classe ao investirem tão pouco na educação pública e investirem tanto na esfera privada (seja através de isenções de impostos, de leis que lhe favorecem ou de dinheiro diretamente repassado).

Somente a escola pública é capaz de assegurar que nenhuma criança ficará sem estudar. Somente a escola pública é capaz de garantir educação laica e de acordo com os interesses da maioria da sociedade que não é Suri Cruise nem filho de Eduardo Paes, mas paga essa conta todos os dias sem que seus filhos tenham um décimo da estrutura e qualidade que escolas como a Avenues possui.

A partir do momento que qualquer valor é cobrado, numa sociedade extremamente desigual, com certeza alguém fica de fora por não poder pagar.

As inúmeras concessões do Estado e seus governos à iniciativa privada, paulatinamente destruindo a educação pública para benefício da primeira que, em suas diferentes versões aparece como uma alternativa à escola pública como a opção de educação de mais qualidade, explica e constrói a riqueza dos chamados “tubarões do ensino”. Estes têm representantes de seus interesses escolhidos a dedo em cada governo, em cada instituição regulamentadora das escolas para “passar” leis e parâmetros que lhes convém.

A aritmética é simples: para os filhos da maioria absoluta dos trabalhadores e toda população pobre minam e retiram cada aspecto do que garante uma educação pública de qualidade, formando pessoas cada vez mais técnicas, acríticas e mão de obra barata, pois assim garantem que, diante da crise, todos os salários sejam rebaixados e não há quem consiga questionar nada. Nos últimos tempos, choveram projetos de leis com este intuito, como a PEC do congelamento de gastos da educação, Projeto de Lei “Escola sem Partido” (ou lei da mordaça) e a recente reforma do ensino médio.

Mesmo no nível superior da educação pública que ainda mantém-se de qualidade resistindo a partir de suas lutas, os ataques dos governos convergem com as reformas mencionadas acima.

Recentemente, o Conselho Estadual de Educação de São Paulo baixou uma declaração exigindo adequação do currículo das três universidades estaduais paulistas, USP, UNESP e UNICAMP. A reforma consiste em colocar obrigatoriamente 600 horas para a Pedagogia e 200 horas para as Licenciaturas de disciplinas do ciclo básico escolar, como matemática, português, etc., logo no ano de ingresso e seguindo a Base Curricular Nacional. Ameaçando de não conceder diploma aos formandos se a declaração não for acatada até o dia 25 de agosto deste ano. Uma reforma curricular que sequer foi discutida entre docentes dessas universidades que, simplesmente foram interpelados do comunicado, quanto menos com o conjunto dos estudantes e funcionários.

Uma reforma que obriga oferecer disciplinas do ensino básico logo no momento de ingresso na universidade, quando em geral as disciplinas oferecidas são de maior abrangência e profundidade de reflexão sobre concepções de processos de educação. Ou seja, instrumentaliza e tecnicisa ainda mais a formação docente. Quase como uma receita exclusiva de como ensinar cada área do conhecimento, cada conteúdo, como se só existisse um ou outro método e determinados conhecimentos conscientemente selecionados e validados “cientificamente”, portanto “legítimos” para a sociedade. A maioria esmagadora das pessoas sabe como a escola tradicionalmente apenas repassa os conhecimentos (na melhor das possibilidades, não se entendendo como espaço de produção do conhecimento também), como se fossem verdades absolutas e inquestionáveis, como se fosse tudo o que a humanidade ao longo da sua história produziu, omitindo ai que existem tantos outros conhecimentos, validando uma concepção de educação, de história dos conhecimentos “dos que venceram”, ou seja, das classes dominantes.

Mais do que ingerência na autonomia universitária, essa reforma coloca claramente uma concepção de ensino-aprendizagem, uma concepção de formação docente. E que caminha no sentido da retirada da formação docente presencial para que esta, que já é metade realizada no ensino à distância, seja totalmente assim. A universidade se torna lugar apenas dos cursos de bacharéis, com toda influência das empresas privadas, do retorno mercadológico aos empresários que estes podem e assim querem que tenham.

O conjunto dos cursos de formação docente nessas universidades e Brasil afora há anos veem sendo sucateados de diferentes formas. A própria implementação dessa reforma acarreta em recursos humanos e materiais que a crise financeira dessas universidades não dá conta de suprir, dado o repasse de verba pública irrisória e instável (cerca de 9,57% do ICMS) diante das necessidades dessas universidades que foram expandidas anos antes.

Abre-se, assim, mais espaço, a ser ocupado pelas instituições de ensino superior privado que já formam a maioria dos profissionais da educação atualmente.
Essa declaração tenta vender a ilusão de que melhorará a educação superior ao atender os alunos em suas deficiências oriundas do ensino básico, mas se assim fosse, o repasse de dinheiro das universidades públicas teria aumentado, as disciplinas seriam optativas e não compulsórias e a educação básica não teria sofrido com leis de congelamento de gasto, reforma do Ensino Médio e PL Escola sem Partido (ou com os partidos dos banqueiros, empresários e patrões?). É só mais uma forma pela qual a educação pública é entregue aos tubarões de ensino e retirada de sua definição constitucional de bem inalienável: daqui pra frente quanto mais pagar, melhor será.

“Ser professor e não lutar é uma contradição pedagógica”

É por entender a gravidade dessa nova ofensiva de ataques contra a educação pública, por saber que ela só existe e resiste através das lutas dos movimentos sociais e de trabalhadores organizados e que precisamos não somente barrar e retroceder as reformas, mas também avançar num plano nacional de educação no sentido das demandas e aspirações dos trabalhadores e povo pobre, que neste próximo sábado, dia 19 de agosto, estudantes e professores de várias regiões de São Paulo realizarão um encontro chamado “Encontro de professores: o papel dos professores para enfrentar a crise”, na Casa Socialista Karl Marx, em frente ao metrô Vila Madalena de São Paulo. Todos e todas que trabalham, estudam ou simplesmente se interessam pela educação pública estão convidados a participarem e trazerem suas contribuições. Nos organizando podemos mostrar que nossas vidas, sonhos, direitos valem mais que o lucro dos empresários, patrões e seus representantes nos governos.

 
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