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MÚSICA
MC XUXU: Funkeira, travesti e feminista!
Willian Garcia
Bruna Lemos

Imagine esta cena: uma travesti vestida de noiva dança funk nas escadarias de uma Igreja católica acompanhada por bailarinas também travestis. A seguir, entra na igreja repleta de estátuas de santos e, abençoada por um padre rapper, se casa com uma mulher.

Não, não é nenhum filme independente ou uma instalação numa mostra de arte, espaços que geralmente ficam restritos aos setores da sociedade com maior poder aquisitivo. Pelo contrário, é o novo clipe “Quero Ficar” da travesti funkeira MC Xuxu.

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Nascida na periferia de Juiz de Fora, Minas Gerais, Xuxu começou como integrante do grupo de Hip-Hop PZP (Posse Zumbi dos Palmares). Quando se mudou para o Rio de Janeiro, depois de ter sido expulsa de casa por ter se declarado homossexual ao padrasto, se apaixonou pelo funk e virou MC Xuxu. Junto com o novo estilo musical, a questão de gênero entrou em sua vida: “Fui pro Rio e quando voltei, já era de fato uma travesti” [1], conta a MC.

Apesar de estar no país onde mais ocorrem assassinatos de travestis e transexuais no mundo, Mc Xuxu usou o bom humor para alcançar seu primeiro hit, “Um beijo”. Com pinta de produção popstar, o clipe conquistou mais de um milhão de visualizações no YouTube. Nele, Xuxu manda um beijo para as travestis. “As pessoas prestam atenção no que é bem humorado (...) A ideia é chamar atenção e dar mais visibilidade. Quanto mais as pessoas dançarem e compartilharem essa música, mais as trans vão ter visibilidade, por exemplo”, declara.

A funkeira não parou em um único hit, e de lá pra cá seu trabalho traz uma proposta cada vez mais politizada, pensando em exaltar a diversidade e a liberdade sexual, usando o funk como poderoso aliado cultural das minorias sociais. No novo clipe "Quero Ficar", como também fizera no clipe "Um beijo", a funkeira dá espaço para que bailarinos e bailarinas que fogem do padrão estético imposto pela sociedade e pela indústria fonográfica, ou seja, o baixo peso e a cintura fina, expressem sua arte e talento (mesmo estando acima do peso considerado ideal). Utilizando-se de um conceito conhecido como representatividade (dar visibilidade a setores da sociedade "esquecidos" pelos meios tradicionais), os videoclipes colaboram com o combate à gordofobia, e também à opressão estética comumente imposta às mulheres, por vezes reproduzida até mesmo por LGBTs.

Não apenas por meio da representatividade, a luta às opressões se dá também no discurso da MC e nas letras de suas músicas. A música “Desabafo”, por exemplo, é uma critica ao Estado e à Igreja que, aliados a setores conservadores da sociedade, promovem a homofobia e a transfobia e se calam sobre a morte de milhares de travestis e transexuais. “Tão me olhando por cima dizendo o que pode ou não pode, mas tem muita igreja fazendo mais barulho que o meu próprio pagode”. Esses são os primeiros versos da música cujo clipe retrata Xuxu sofrendo assédio e apanhando de homens na rua.

Assim como em seus clipes, em suas entrevistas Xuxu toca de maneira simples, porém contundente, em discussões importantes sobre feminismo, visibilidade Trans e movimento LGBT. “Sim, sou feminista e quero representá-las (as feministas) sempre, porque acho que lugar de mulher é onde ela quiser! Direito iguais para todos”. Sobre o movimento LGBT, reconhece nele as divisões que acabam por ofuscar o protagonismo das mulheres trans e travestis em muitas organizações, mas dá a dica para solucionar esse entrave. “A união entre os LGBTs é uma maneira de diminuir a homofobia no mundo”.

A carreira de sucesso de Xuxu, e a oportunidade de colocar discussões sobre o movimento LGBT para as massas que ouvem e gostam de funk, é infelizmente uma exceção entre as travestis e mulheres trans no Brasil. A prostituição ainda é a profissão da maioria das travestis. Não há leis que obriguem empresas a empregar trans e travestis e algumas inclusive nem reconhecem seus nomes sociais, pauta mínima dentro do Movimento Trans. Mesmo quando conseguem um emprego, as trans e travestis geralmente têm postos de trabalho precários e muitas envolvem-se com tráfico de drogas, sendo vítimas de violência da polícia e do crime organizado. Tudo isso sancionado por um Estado, que por um lado mantém alianças com setores conservadores, como a bancada evangélica, e por outro é conivente com os grandes capitalistas que só se interessam nos LGBTs quando podem lucrar com esse setor.

Trans e travestis, entretanto, precisam de mais do que visibilidade na mídia para emanciparem-se. Para começar, criminalizar a LGBTfobia é urgente e pauta de todo o movimento. Entretanto para que cenas como as dramatizadas em “Desabafo”, extremamente rotineiras na vida real, não mais se repitam é necessário mais que a criminalização: Trans e travestis têm de se organizar para barrar a prostituição e a precarização dos postos de trabalho promovida pelos patrões e o governo, e que prejudicam não apenas esses setores, mas todos os trabalhadores. Só pela força do conjunto de toda a classe trabalhadora, trans e travestis podem superar a violência e a insegurança de não conseguirem garantir sua subsistência. Ao mesmo tempo, essa aliança, que inicialmente pode ser difícil ou artificial, pode fazer com que os trabalhadores cisgênero também avancem na concepção do que é Movimento Trans, vençam seus preconceitos e se tornem de fato importantes aliados nessa luta. Nas palavras da própria MC Xuxu “A ideia é misturar tudo, para sermos unidos”.

 
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