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MÚSICA
Satisfaction: 50 anos de um clássico dos Stones
Afonso Machado
Campinas

Há cinco décadas os senhores malucos da banda inglesa Rolling Stones mostraram que o rock é mais do que espinha na cara e venda de discos. A canção (I Can´t Get No) Satisfaction revelou que, mesmo estando afogada em mil e um esquemas comerciais, a cultura juvenil dos anos sessenta possuía consciência crítica e não se satisfazia com a moral burguesa.

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No longínquo ano de 1965, o rock atravessava uma série de mutações estéticas e políticas que o tornariam a expressão mais bem acabada da revolta incubada nas garotas e nos garotos de uma parte considerável do nosso sistema solar.

“Satisfaction“, composta pela dupla Jagger/Richards, trazia, a partir de um riff diabolicamente bem transado, o ataque ao mundo das aparências sedimentado pela cultura de massa. Estar insatisfeito e exteriorizar as frustrações num canto esgoelado e numa batida sexy não era nada seguro para aqueles que defendiam as convenções sociais. Logicamente que inconformismo e descontentamento não garantem de antemão uma posição política revolucionária. Porém, estes são pressupostos que temperaram (ainda mais no contexto cultural dos anos sessenta, marcado pelo choque geracional) uma sensibilidade de tipo rebelde.

A verdade é que o rock tornava-se um canal de expressão para aqueles que não suportavam mais a ideia de nascer, ser reprimido, crescer, ser reprimido, ter um emprego, ser reprimido (e agora explorado), se casar, ser reprimido (explorado e frustrado), se aposentar, ser reprimido (explorado, frustrado e em crise) e... morrer. É claro que, neste triste percurso existencial, morrer inutilmente numa guerra imperialista ou virar mingau através do bombardeio alienante dos meios de comunicação de massa, não estava fora de questão.

Qual jovem relativamente saudável poderia estar satisfeito nos anos sessenta? A pergunta pode ser estendida para os dias atuais: se o instinto de vida, para utilizar um termo psicanalítico, leva a pior numa sociedade que adia os desejos em nome dos imperativos do capital, como não gritar/cantar? Os Stones, que eram novinhos em 1965, sabiam e sentiam que as coisas não iam nada bem na cultura ocidental. A estrutura rítmica do blues, grávida de sensualidade e que desemboca na carga emocional do rock, era o terreno nada adocicado por onde o protesto social poderia nascer. Tratando-se dos Rolling Stones, o blues é a base musical que possibilitou agressividade e sinceridade. Enquanto que os Beatles do início da carreira suavizaram muito o blues para arquitetar canções que eram gracinhas pops e que tinham seu correspondente visual em alegres terninhos, os Stones (mesmo usando ternos) eram estridentes e sombrios (embora a banda também tenha colocado muito algodão doce nos seus primeiros discos). Diante das convulsões sociais que marcariam a segunda metade dos anos sessenta, os Stones certamente já indicavam o que vinha pela frente.

A esta altura da História ninguém é ingênuo de pensar que os Stones eram “os malvados“ enquanto que os Beatles eram “os bons rapazes“. Ninguém em sã consciência poderia afirmar que John Lennon era um sujeito bem comportado. Todo este marketing não engana mais. A própria interpretação crítica da produção musical dos anos sessenta acaba por superar a polaridade Beatles X Stones. O que observa-se de fato é uma geração de músicos que, no centro explosivo da guerra fria, subverteram um maniqueísmo ainda maior: perante os países capitalistas e os Estados operários deformados, a música relevou formas internacionais de contestação social. Portanto, relembrar a importância de “Satisfaction" não é soprar velinhas para mais um produto comercial. O fato é que esta música mostrou ao mundo que o rock não é ”bobagem de adolescente".

Trazer a discussão sobre as qualidades internacionalistas do rock esbarra, como já tive a oportunidade de frisar em outras ocasiões, nos esquemas comerciais da indústria. Se a neutralização política é indiscutivelmente o preço que se paga pela canção estar vinculada aos meios de produção da classe dominante, então o nível de consciência política dos músicos é o problema dos problemas. Ser revolucionário é uma coisa e rockstar outra. Mas o rock pode contribuir com a luta política. Neste sentido a esquerda brasileira demonstrou historicamente má vontade com o rock (refiro-me ao nacionalismo e todo aquele blá blá blá dos stalinistas). Se hoje em dia as necessidades expressivas da juventude de esquerda incluem mas não se limitam ao banquinho e o violão, refletir sobre o legado de bandas como os Stones ajuda a pensar o caráter contestador da música.

A partir de “Satisfaction" Mick Jagger, Keith Richards, Brian Jones, Bill Wyman e Charlie Watts esculpiram, durante os anos sessenta, um explosivo legado musical. Álbuns como “Aftermath“ (1966) e “Beggar´s Banquet“ (1968) seriam exemplos disso. Pensando este legado sob o ponto de vista político, que se diga mais uma vez que o rock bagunçou a organização mental da direita e da esquerda deteriorada. No caso dos Stones, tanto a ditadura militar no Brasil quanto a burocracia na China, impediram que a banda se apresentasse nestes países durante os anos setenta. Quer dizer, a esquerda revolucionária não pode ignorar a História do rock.

 
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