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OPINIÃO
Grafite: política, lazer e arte. Tudo que Dória não quer para a juventude
Bernardo Guayanases
São Paulo

O grafite brasileiro nasceu nos anos 70, nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, acompanhando os primeiros passos do movimento Hip Hop no país. A particularidade do movimento aqui foi que as influências trazidas “de fora”, vindas especialmente de Nova Iorque, nos Estados Unidos, ganharam contornos e conteúdos próprios, em diálogo direto com a situação política e social brasileira. Desde então, os grafites brasileiros, principalmente em São Paulo, adquiriram reconhecimento internacional e alguns dizem que o Brasil é um dos únicos países do mundo a criar um estilo próprio de grafite, a pixação (com “x” mesmo). A cidade de São Paulo é considerada uma das cidades mais importantes na cena de grafite internacional, junto de Nova York e Berlim seus muros contam com os maiores nomes do estilo; até mesmo a Bienal das Artes de São Paulo teve de abrir espaço documental para os pichadores. Por que então Doria destruiu um dos maiores murais de grafite do Brasil e do mundo?

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Imagine uma cidade onde o grafite não fosse ilegal, uma cidade onde todos pintassem o que quisessem. Onde cada rua fosse coberta de um milhão de cores e pequenas frases. Onde esperar em um ponto de ônibus não fosse nunca entediante. Uma cidade que se parecesse a uma festa que todos foram convidados, não somente os agentes do estado e os barões das grandes corporações. Imagine uma cidade como essa e pare de se apoiar na parede - está molhada.

Banksy

Grafite no Brasil, o surgimento e os ideais

Enquanto nos Estados Unidos, em meados dos anos 80, a cena do grafite estava em seu auge criador, retratado no filme “Style Wars” de 1983, no Brasil o cenário era ainda um pouco mais “pitoresco”. Os grafiteiros eram poucos e quase todos se influenciavam unicamente pelo estilo Nova Iorquino, pois eram as únicas influências que se tinha, através de escassos materiais que chegavam a partir de muito esforço dos ativistas do movimento hip hop, e que poderiam ser comprados ou trocados no largo da São Bento, em São Paulo. Esta é a primeira influência do grafite brasileiro - e mundial. A que determina o grafite como um elemento de um movimento, como uma parte de um todo, e não um fim em si mesmo. É também, talvez a mais importante de todas, pois permite que a arte de desenhar ou escrever nas paredes se enriqueça infinitamente, ganhando distintos significados na medida em que é assimilada e assimila uma série de outros elementos, não apenas estéticos, mas dos mais diversificados campos social e políticos. Ou seja, esta é principal característica que manteve viva e crescente a tradição do grafite até hoje.

No entanto, não só em São Paulo, mas também no Rio de Janeiro, se desenvolvia desde alguns anos antes a prática da escrita política e poética nas paredes da cidade, conhecida como pichação. O nome vem do material utilizado para a escrita nos primórdios da prática no Brasil em fins dos anos 60, o piche. E nos primórdios esta prática era exclusivamente guiada por uma pauta política: “Abaixo a ditadura”. Esta é a segunda influência, podemos dizer de força orgânica, do grafite brasileiro atual.

Após sua primeira vertente exclusivamente política e contra a ditadura nos anos 70 a pichação se desenvolveu em uma vertente mais poética, assumindo também o nome de grafite. Um dos expoentes desta vertente é também um dos grandes nomes da poesia brasileira, Paulo Leminski. O poeta chegou a definir que o “grafite está para o texto assim como um grito está para a voz”. Para Leminski a ascensão do grafite foi uma resposta da juventude estrangulada durante os anos da ditadura, que começou a se expressar com grafite, como começou a se expressar com uma arte carregada de um caráter “criminoso” – a partir disso Leminski conclui que o grafite, não apenas um dos cinco elementos do Hip Hop destacamos nós, senão que uma das manifestações genuínas da poesia marginal brasileira dos anos 70. Esta terceira influência adianta parte das questões mais presentes na atualidade quando falamos de grafite e pixação, questões ainda não propriamente estéticas, mas sim que servem como pano de fundo ao estético – expressão e marginalização.

Mas não era o único e talvez nem o mais importante. "Celacanto provoca maremoto" e "Lemarfu" foram algumas das marcas que buscavam subverter o conservadorismo e “sufocamento” da sociedade sob a ditadura militar. Através de um apelo subjetivo misterioso – o caso do Celacanto, um pequeno peixe lendário, que poderia provocar um maremoto. E a cidade via aquilo e esperava, ou temia, ansiosa pelo misterioso maremoto vindo das profundezas da cidade do Rio de Janeiro. Claro que também influenciada pela sensação de familiaridade com a palavra do Celacanto, causada pelo significado subliminar presente na frase, já que havia menção ao peixe e seu poder na popular série de televisão japonesa National Kid. O grafite se mostrou um inovador jogo psicológico que envolvia uma “charada”, o espaço da cidade, as diversas classes sociais e o uso da mídia de massa da TV. Foi uma inovação que até hoje marca influências estéticas decisivas para uma das características mais remarcadas e originais do grafite brasileiro atual, a mistura contraditória entre elementos humanos, fantásticos e animais em um ambiente de certa forma perturbador psicologicamente.

Em São Paulo, a tradição do grafite poético se expressou de forma semelhante com o “Cão Fila km 26”. Porém, não tão significativo quanto o Celacanto, o Cão Fila (que nada mais era do que alguém entediado e criador de cachorros da raça “fila brasileiro” no Km 25 da Estrada do Alvarenga, em Sao Bernardo) sem querer foi parte de um setor do movimento que deu largada para uma nova prática no grafite brasileiro: o “bombardeio”. Juneca e Pessoinha foram outros destes nomes. A questão então começou a ser “aparecer mais”. Bombardear a cidade de marcas para fazer aparecer uma ideia, ou um nome simplesmente.

Percorrendo os anos 80 o grafite brasileiro explora o submundo (underground) oitentista para se fundir com as caligrafias dos nomes das bandas de punk e heavy metal e criar um tipo de comunicação fechada, ou seja, agora a comunicação com a cidade começaria a se dar de forma mais “conceitual”. Que entendessem o que estava escrito não seria mais o “X” da questão. O “X” da questão estava no “pixo”, agora com “X” mesmo. Ou seja, existir e aparecer se tornou a melhor forma de comunicar: “eu estou aqui, eu te assombro com a realidade que a mídia de massas (dominante na comunicação urbana) esconde”.

As influências anteriores se fundiram em um tipo de prática que seria ao mesmo tempo “política”, como a voz aos que não tinham; o centro da cidade se tornou o principal objetivo, pois o mar interminável de arranha-céus simbolizava o poder constituído e justamente aí deveria ser desafiado. “Expressiva” na relação entre os desenhos e as linhas guias da cidade (por isso em São Paulo a caligrafia é chamada de “pixo reto”, representando a silhueta da cidade). “Marginal”, uma vez que tinha o questionamento à proibição justamente como um de seus maiores impulsos criadores. E extremamente “psicológica”, pois o “efeito psicológico” do “bombardeio” é uma das partes mais importantes – ou seja, um ataque ao prédio mais alto, mais vigiado, deveria ser um ataque ao moral do burguês, ao moral dos poderosos que pensavam ser onipotentes, mas agora, mesmo do alto de seus arranha-céus, se sentiriam acuados quando, ao abrir a janela pela manhã, se deparassem com um letreiro incompreensível bem em cima de sua janela. E em todas as janelas ao redor. E quando o mesmo andasse na rua, iria reconhecer naquela marca os sujeitos que desbancariam seu trono de burguês.

Esta luta por aparecer levou o grafite de São Paulo ao seu verdadeiro momento “style wars”. Nos anos 90 a guerra de estilos teve como um dos grandes nomes “Di”, mas a partir de agora deixo de citar nomes, pois neste momento se operou uma mudança fundamental neste movimento. Com o intuito de elevar o número de aparições os grafiteiros começaram a se organizar coletivamente sob um mesmo nome. E assim poderiam multiplicar suas aparições e a influência principalmente do seu tipo de escrita; a caligrafia se tornou o propulsor estético de todo o movimento.

Hoje são incontáveis as organizações de grafiteiros e pixadores no Brasil. Algumas muito bem organizadas, outras duram pouquíssimo tempo. Porém, sem dúvidas foi esse processo todo que deu uma vida, e criou um terreno muito fértil e rico, assim como um conhecimento coletivo que acessou milhares de jovens pelo país, podendo fazer surgir, através da experimentação, da radicalidade e da criatividade conquistadas através do enfrentamento com a ordem vigente, desde grandes “talentos” individuais, grafiteiros para quem o mais importante do trabalho é a técnica da pintura, se aproximando mais do que tradicionalmente se chama de arte e das galerias, até movimentos culturais, cujo foco é performático, de intervenções críticas à arte tradicional, movimentos políticos ou meramente círculos de amizades e lazer para jovens e adultos, na maioria das vezes moradores das periferias e parte da classe trabalhadora.

Um Dória no caminho?

No entanto, se engana quem pensa que até agora essa história evoluiu de forma pacífica. Muito pelo contrário, as pessoas que fazem grafite são parte do grupo de artistas mais perseguidos pelos governos há muito tempo. Contra estas pessoas, a polícia aplica seus métodos de tortura, herdados da ditadura. Contra estas, seguranças armados e bandos da direita utilizam também seus métodos de barbárie, como recentemente aconteceu no Rio de Janeiro (aviso de cenas fortes). E claro, contra estas, a mídia faz campanhas preconceituosas que justificam estes atos de barbárie sistematicamente.

Todos os governos das principais cidades do país perseguem e perseguiram grafiteiros e pixadores nos últimos anos. Belo Horizonte é talvez uma das cidades onde estas perseguições acontecem há mais tempo e com mais veemência. Desde 2011 vários grafiteiros e pixadores foram presos e recentemente essa perseguição se aprofundou. No entanto, em São Paulo, e no Rio de Janeiro, cidades muito reconhecidas pela cena do grafite, a política de perseguição oficial era baseada em uma separação entre o grafite e a pixação; fazendo murais de grafite em cima de “agendas” de pixação para jogar uns contra os outros e coisas do tipo.

Esta estratégia estava calcada na realidade de que, como podemos ver no desenvolvimento do grafite brasileiro, as duas coisas são a mesma; e mesmo os grafiteiros brasileiros com fama mundial por suas apuradas técnicas de pintura e controle das latas (sem entrar no debate do que é contraditório nesta fama), foram, ou são, até hoje pixadores. Por isso, quando dividiam o grafite e a pixação, os governos tentavam “matar o movimento por inanição”, querendo acabar com a “força moral” que atrai milhares de jovens a se expressarem através do grafite e faz com que se acumule um conhecimento coletivo em torno desta prática, cuja base real está localizada nas ruas e “onde os cupins fazem ninho”

No entanto, a ação de apagar enormes murais é um marco de mudança nesta política, pois aponta um combate frontal de “destruição” de arte urbana. Esta ação por parte de Dória não é algo isolado e se enquadra no cenário político do país, no qual, com o golpe institucional do impeachment de Dilma Roussef e a aparição mais incisiva da direita, se elegeram políticos reacionários, como Dória no primeiro turno em São Paulo, ou Crivella no Rio de Janeiro, entre outros. Dória está perseguindo também os artistas de rua, transferirá a Virada Cultural para um local afastado e inacessível e fica claro que o caminho que quer seguir é o de acabar com o direito ao lazer, à cultura e à educação da juventude. Por outro lado, a saída que eles apontam é “colocar ordem no país”, através da construção de mais presídios. Ou seja, este marco no combate ao grafite por parte de Dória é parte do fortalecimento de uma política de repressão à juventude em larga escala, arquitetada pelo governo golpista junto da base social do golpe, os empresários, a direita reacionária e seus representantes políticos como Dória.

Por que o grafite?

Ainda considerando a situação política do país não deixa de ser curioso que uma das primeiras ações repressivas do governo Dória que se tornou um assunto de ampla repercussão, e também um desgaste à desagradável figura do político empresário rico foi justamente um ataque ao grafite. Dória que acusa de degeneração a arte que não convém ao seu governo de direita, não se indigna contra a “arte oficial” do fascismo italiano que “presenteou” São Paulo com um projeto arquitetônico neoclássico italiano para a prefeitura que leva sobre suas janelas os três M’s que devem ser a inspiração da burguesia paulista: Matarazzo (burguês paulista e que dá nome ao edifício); Marcello Piacentini (conhecido como "arquiteto de Mussolini", projetou a prefeitura); e Benito Mussolini (ditador fascista italiano). Isso mesmo, Dória não acha “vandalismo” o M de Mussolini acima da janela de seu gabinete, Dória não acha absurdo que o prédio da prefeitura da maior cidade do país tenha em seu muro a inicial de um ditador fascista italiano em homenagem. Os “rabiscos foscos” com as iniciais de milhares de trabalhadores é que são “o vandalismo” que deve ser varrido de São Paulo. Na verdade, para Dória os trabalhadores e sua história é que devem ser apagados da cidade.

Só que não. O grafite e a pixação são expressões estéticas cuja riqueza está em um lugar distinto da riqueza do que se aceita como arte erudita. Como tentamos mostrar acima, a história dos estilos mostram, primeiro que tudo, um processo social; que envolveu milhares, centenas de milhares ou até mesmo milhões de pessoas, dos primeiros “rabiscos”, passando pelas escaladas e chegando aos grandes murais como os que Dória destruiu. Este processo social não agrupava as pessoas por alguma ideologia em específico, senão que tinham como impulso vários elementos estéticos ou não, que como um todo eram parte de uma consciência social.

Política, expressão, marginalização, psicologia de massas, mídia de massas, caligrafia, arte erudita, legalidade, ilegalidade. Diferente da arte erudita que tentou na maioria das vezes encontrar “o belo”, o grafite desde que surgiu como um dos elementos do Hip Hop tinha uma função prática que visava transformar a vida dos jovens através da arte. Arte que não era o fim, senão que um processo de formação de consciência. O grafiteiro deveria navegar sobre diversas áreas do conhecimento e das artes para fazê-la do seu jeito, encontrando a si mesmo enquanto sujeito inserido em uma classe e em uma cidade capitalista.

Para se ter uma ideia, a diferenciação entre grafite e pixação foi nestes marcos algo muitas vezes proposital. Como eles entendiam que sua arte era proibida, os grafiteiros e pixadores começaram a utilizar como uma espécie de estratégia de atuação em dois marcos: o “legal” e o “ilegal”. O grafite “legal” era feito com mais tranquilidade e tinha a função de também arrecadar rendimentos financeiros. O pixo “ilegal” – ou os “bombs” - feitos para experimentar técnicas e radicalizar a experiência criativa em relação com a cidade e o espaço público. E foram muito bem sucedidos, pois, mesmo com as tentativas dos governos em separar os dois polos da arte do grafite nunca conseguiram; e podemos dizer que sem o cenário borbulhante da pixação, jamais o grafite brasileiro teria adquirido o reconhecimento e conseguido atrair tantos jovens como fez até agora. E quando um grafiteiro tenta um espaço na “arte erudita”, muitas vezes ele estará mais preocupado com este sentido prático do que com as discussões acadêmicas sobre o que é “o belo” e o que é “o grafite”.

Se criaram categorias, como a ocupação em três dimensões do espaço público através da escalada, que é algo único no grafite brasileiro, que por natureza é fruto do trabalho de cooperação e criação coletiva. E a “organização” propiciou aos artistas do grafite horizontes jamais imaginados no grafite de outros países ou na produção do grafite através das oficinas das ong’s. Por outro lado a caligrafia simples e contrastante, em apenas uma cor, tirava o foco da engenhosidade do desenho em si e levava todo o foco a um experimento minimalista onde uma palavra ou frase escrita em um prédio, dependendo de onde feita, seria capaz de revelar a “forma da cidade”. A questão de “onde fazer” se tornou um jogo de “expressão” capaz de mostrar partes da cidade que de tanto que pareciam iguais (mar de prédios), se tornavam algo em si mesmo aos olhares acostumados e apressados, mas que, ao toque do pixador, mostravam “do que são feitos”, “onde estão”, “quais as diferentes proporções” entre si. E mostravam que são feitos por pessoas, que ali dentro habitam pessoas, que fora delas as pessoas não têm onde habitar. Em suma mostrar que o concreto armado poderia estar a serviço da livre criação, e não mais se levantaria por sobre as pessoas como um peso esmagador a serviço da cidade capitalista e dos senhores donos do poder.

Faça um experimento: tente olhar a cidade de São Paulo através das pixações e com certeza terá os melhores ângulos. A cidade é considerada a terceira do mundo em números de arranha-céus, e com certeza, as linhas guias e os ângulos de uma grande porcentagem destes já foi, do térreo até o último andar, meticulosamente estudado por alguma marca de grafiteiros e pixadores que tentava encontrar o lugar ideal para sua obra – assim “como fazer para chegar lá”.

Quando dizemos que a riqueza do grafite está em algo distinto da da arte erudita, queremos dizer que um artista tradicional concentra em si um conhecimento e uma formação extraordinária advindas de uma tradição formal (e de tudo que daí se desdobra). Diferente disso, não queremos dizer que cada grafiteiro e pixador concentra em si o mesmo tipo de conhecimento que um artista tradicional, alguns sim, outros não. Nem queremos dizer que cada pessoa que pinta um muro está sendo impulsionada por todas as ideias aqui expressas. O que dizemos simplesmente é que apesar de não acumular este conhecimento e tradição individualmente, o trabalho coletivo de milhares foi capaz de levar a que o conjunto das intervenções do grafite expressassem uma estética formal (e de tudo que daí se desdobra) que estava acima do interesse individual de cada um que fazia, mas que expressava de alguma forma as contradições sociais e os interesses da classe trabalhadora e do povo oprimidos[1], ainda que maneira distorcida, pois é sobretudo uma construção estética apenas e por isso não teria como responder de forma totalizante às contradições do capitalismo.

Independente do que você estivesse pensando; se estivesse fazendo um grafite, então com certeza seria algo ligado a um questionamento da ordem social imposta. Estaria se contrapondo à mídia de massas, que domina a cidade com sua propaganda. Com certeza a burguesia tremeria a ver os seus “rabiscos”, pois viria naquilo uma marca de que ela pode ser desafiada. E você com certeza teria prazer e estaria neste processo sentimentalmente mudando sua concepção sobre a cidade e suas contradições e estaria no mais das vezes se ligando ao lado que gostaria que a expressão fosse livre para todos.

Alguém disse uma vez, não me lembro em qual ocasião: “aquele prédio gigante ali (centro da cidade)? Foi meu pai que ajudou a construir... nunca entrei lá. Se eu tento entrar lá e eles me veem, sou expulso na porrada. Aí eu fui lá e pixei o beiral, fiz as janelas e também a marquise. Se eles pintarem eu faço de novo, esse eu faço mesmo!”. Esta frase que me marcou expressa a classe a que a maioria dos grafiteiros e pixadores pertencem e ao mesmo tempo a classe para quem a total liberdade artística é a que mais interessa, pois no mundo atual está proibida de se apropriar do fruto até mesmo do seu próprio trabalho (como no exemplo do pai do jovem grafiteiro), a classe trabalhadora e o povo pobre.

Transformar a luta contra Dória em uma luta contra a direita em todo o país

Nos últimos dias, Diana Assunção, trabalhadora da USP, candidata a vereadora do MRT pelo PSOL em 2016 em São Paulo, editora do Esquerda Diário e fundadora do Grupo de Mulheres Pão e Rosas denunciou a destruição que Dória estava promovendo, e após essa denúncia a sua página no Facebook começou a sofrer uma série de ataques de direitistas e seus robôs (programas de computador gerados para atrapalhar uma publicação). Dentre as mais absurdas estavam as absurdas ameaças de violência machista que desconsideravam o feminicidio. Que não são nenhuma novidade pois o machismo é uma das principais armas da direita.

No entanto, as denúncias que Diana fez viralizaram no facebook e o vídeo já consta com mais de 700 mil visualizações. A solidariedade está vindo de toda parte. Além de também me solidarizar neste texto, gostaria de terminar colocando como este exemplo tem de ser espalhado por todo o Brasil.

Por ser uma construção estética e social o destino do grafite está ligado de maneira inevitável ao destino da classe trabalhadora. Como construção estética e social o exemplo da luta contra Dória quando o mesmo ataca o grafite, e especialmente no momento político em que vivemos, assume para nós marxistas significado especial porque, assim como já havia feito antes Leon Trotsky, busca ligar de maneira indissolúvel a possibilidade de lazer, diversão, liberdade de expressão, arte e cultura à destruição do capitalismo e à construção de uma sociedade que não coloque o lucro acima da vida dos jovens, que não destrua os direitos da juventude e a arte para enriquecer empresários.

Este encontro entre grafite e a esquerda - que luta de verdade, e não o PT que fez todo tipo de aliança e segue fazendo sua política de conciliação com a direita - não é fruto de um mero acaso; é na verdade uma amostra de que é necessária uma esquerda revolucionária e anticapitalista, que coloque claramente que não é possível conciliar os interesses dos ricos e empresários donos do poder com os dos trabalhadores e de todo o povo. Se os golpistas e os governos de direita conseguem impor seus ataques à classe trabalhadora e maior controle social e repressão, o grafite vai ser um elemento atacado também, como já mostra a ação destruidora de Dória.

A denúncia por parte de Diana e da esquerda que vem se solidarizando é fundamental para fazer deste um momento para mostrar que é necessário transformar esta luta em uma luta contra a direita reacionária em todo o país. Contra estes seguidores de Dória e Jair Bolsonaro, direitistas dos mais reacionários que destilam seu veneno preconceituoso e seu ódio à liberdade de expressão, ao grafite, às mulheres, aos negros e LGBT’s.

[1] Esta ideia foi influenciada pelo conceito de “construto estético-social” de Rodrigo Duarte. Pode-se ler mais sobre este conceito em http://www.academia.edu/1287543/Sobre_o_construto_est%C3%A9tico-social

 
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