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Marx & Engels | Um livro imprescindível sobre Marx e Engels

Reproduzimos uma versão reduzida do prólogo ao livro "Marx e Engels", de David Riazanov, publicado pelas Edições IPS em 2012, leitura recomendada para quem queira conhecer as ideias daqueles. Este ano, as Edições Iskra lançam a obra ao público brasileiro.

Christian CastilloDirigente do PTS, sociólogo e professor universitário

quarta-feira 15 de junho de 2022 | Edição do dia

Tradução de Seiji Seron

O trabalho de Riazanov é um clássico da literatura de divulgação marxista. E o é por vários motivos. Em primeiro lugar, pela destacada trajetória de seu autor como pesquisador e propagandista. Em segundo lugar, por sua forma de aplicar o método do materialismo histórico à retratação da própria conformação do marxismo como teoria e movimento político e social. Por último, porque permite um conhecimento bastante exaustivo da atividade militante de Marx e Engels desde as origens do marxismo até a dissolução da I Internacional, os últimos anos de Marx e o posterior trabalho de Engels até sua morte.

Este último aspecto merece destaque, dado que, por obra do academicismo, a dimensão militante da atividade de Marx foi secundarizada ou diretamente mantida no esquecimento durante as últimas décadas, de modo que se construiu uma imagem de Marx como um teórico dissociado da organização concreta da classe trabalhadora. Na realidade, o papel militante de Marx não é um aspecto “a mais” dentre muitos outros, e sim um ponto central para a compreensão de sua obra.

Entrelaçando as biografias pessoais com os grandes acontecimentos históricos que marcaram o período, Riazanov percorre desde os processos que influenciaram Marx e Engels até os que estão na base do surgimento da classe operária e do marxismo: a Revolução Industrial inglesa e a Revolução Francesa.

A Revolução de julho de 1930, na França, e a insurreição polonesa de 1931 deram, na Alemanha, um novo impulso aos movimentos revolucionários, compostos principalmente por jovens e estudantes, que sofriam o castigo do regime monárquico após uma insurreição fracassada. A resistência dos intelectuais e o nascente movimento operário estabeleceram as coordenadas a partir das quais Marx e Engels se relacionarão com a “esquerda hegeliana” e começarão a intervir nas questões políticas de seu tempo. Engels, escrevendo por conta própria, e Marx, intervindo na Gazeta Renana, sob a direção de Moses Hess, onde publicou sua conhecida crítica das leis que proibiam a utilização comunal da lenha e o direito de coletá-la nos bosques, um passo que Marx posteriormente consideraria decisivo para a elaboração de sua concepção materialista da história. Esta experiência marcou o desenvolvimento político e intelectual de Marx profundamente.

Da fundação da Liga dos Comunistas até a I Internacional, o enfoque de Riazanov destaca de maneira permanente o caráter de militantes revolucionários de Marx e Engels. Riazanov questiona as posições que apresentam a relação de Marx e Engels com a organização operária de sua época como se tal relação tivesse sido relativamente externa. Assim, desde a vinculação com o movimento cartista, as tentativas de realizar em Bruxelas um congresso geral dos partidários do comunismo, a ruptura com Weitling em 1846, a conformação da Sociedade de Educação Operária de Bruxelas, o trabalho de organização de Marx e Engels foi contínuo. Riazanov destaca especialmente o papel de Marx e exalta um “ofício” pouco popular entre a intelectualidade nos tempos atuais, mas que foi fundamental na história do movimento operário, qual seja, o do organizador revolucionário: “Aos historiadores passou desapercebido este trabalho de organização de Marx, que é apresentado por aqueles como um pensador de escritório, desconhecendo o papel de Marx como organizador, negligenciando um dos aspectos mais interessantes de sua personalidade. Se não se conhece o papel que Marx (e não Engels) teve por volta dos anos 1846-7 como dirigente e inspirador de todo esse trabalho de organização, é impossível compreender a importância que Marx teria como organizador depois, em 1848-9 e na época da I Internacional”.

Marx e Engels participaram da Revolução de 1848 na Alemanha, intervindo como ala esquerda da organização da burguesia democrática. Todavia, o desenvolvimento da Revolução, com o fortalecimento da reação e a capitulação do partido democrático diante desta última, levou-os a modificarem seus pontos de vista e radicalizarem suas posições. O balanço de 1848 é sucedido, em 1850, pela “Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas”, que assevera a delimitação com o partido democrático e a necessidade de que a classe trabalhadora tenha um programa e uma organização independentes de tal partido, impulsionando a revolução além do que quer a direção da burguesia e da pequena burguesia.

Estas conclusões de Marx têm uma importância capital para a reflexão sobre os problemas de tática e estratégia da classe trabalhadora naquela época e na atual. O Manifesto Comunista havia assentado as bases e princípios fundamentais da luta de classes do proletariado e assinalado o objetivo estratégico da ditadura do proletariado como governo de transição ao socialismo e à sociedade comunista. A experiência de 1848 demonstrou que o papel histórico progressista da burguesia ante os resquícios do Ancien Régime havia chegado ao seu fim. No entanto, a classe trabalhadora ainda não tinha força suficiente para tomar o poder. Abriu-se, então, uma etapa de experimentação e acumulação, que Alain Brossat, – em seu livro Nas origens da Revolução Permanente: O pensamento político do jovem Trótski – definiu como o “já não mais da revolução burguesa e o ainda não da revolução proletária”, que daria lugar, após a derrota da Comuna de Paris, em 1871, ao crescimento exponencial da socialdemocracia alemã e à primazia da tática eleitoral e sindical, sendo deixados de lado (parcial ou totalmente, conforme o caso) os problemas da estratégia revolucionária. Todavia, já em um trabalho como Balanços e perspectivas, Trótski, no calor da experiência da Revolução Russa de 1905, reafirma as conclusões a que Marx e Engels chegaram em 1848, traçando uma continuidade entre as elaborações destes e a análise da burguesia russa e de sua debilidade diante das tarefas da revolução, em uma interpretação que superava os pontos de vista predominantes da socialdemocracia deste período, retomando a concepção da “revolução permanente” de uma perspectiva nova e original. A explicitação de uma perspectiva internacionalista é uma das mais importantes contribuições programáticas do marxismo à história do movimento operário.

Como diz Riazanov, Marx aponta para uma “tarefa política extremamente importante. A classe trabalhadora não deve se fechar na esfera estreita da política nacional. Deve acompanhar com atenção todos os problemas da política externa. Se o êxito da obra de libertação da classe trabalhadora depende da solidariedade fraternal dos operários de todos os países, tal classe não pode cumprir sua missão se as classes que dirigem a política exterior puderem aproveitar os preconceitos nacionais para pôr os operários de diferentes países uns contra os outros, derramar o sangue do povo em guerras de rapina e saquear suas riquezas. Portanto, os operários devem dominar todos os segredos da política internacional, devem vigiar a diplomacia de seus respectivos governos, resisti-la, caso seja necessário, por todos os meios, e se unirem em uma revolta unânime contra os manejos criminosos dos Estados”. A I Internacional teve o mérito de trazer esta bandeira para o movimento operário mundial: “Conhecer todos os segredos da política internacional”, unir a classe trabalhadora além das fronteiras nacionais e lutar em todo o mundo contra a dominação capitalista. Estas ideias guiaram também o trabalho de Engels à frente da II Internacional e constituem um acervo estratégico fundamental para a classe trabalhadora mundial.




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