×

Debate | UNE na transição de Alckmin junto ao MDB: por que lutar por entidades independentes de todos os governos?

Após o sentimento de alívio pela derrota eleitoral de Bolsonaro, agora é necessário uma reflexão profunda dos caminhos do futuro do próximo governo Lula e como se derrota de vez o legado bolsonarista na educação. A UNE anunciou que estará no governo de transição chefiado com Alckmin, junto do MDB, da direita e dos capitalistas, esse é o caminho para derrotar as reformas e o projeto da extrema direita para a educação?

segunda-feira 21 de novembro de 2022 | Edição do dia

O governo Bolsonaro deixou um legado de cortes profundos na educação. Entre o primeiro ano do governo e o orçamento previsto para 2023, há um corte de 34%. Já são 8 anos de cortes consecutivos na educação, que se aprofundaram desde o golpe institucional de 2016, mas começaram nos governos petistas. Bolsonaro realizou intervenções nas universidades e em cada oportunidade promoveu ataques ideológicos junto a pastores e militares. Para enfrentar essa extrema direita, que se institucionalizou no regime e se combina a uma força social que pode de tempos em tempos tomar as ruas, somente podemos contar com nossa luta. Por isso, denunciamos a tutela militar nas eleições, avalizada pelo TSE de Alexandre de Moraes. Cada ameaça bolsonarista ao resultado eleitoral precisa ser respondida nas ruas e com nossos métodos de auto-organização ao lado da classe trabalhadora.

No marco desta situação, a UNE, pela via de sua presidente, Bruna Belaz, vai compor a transição do governo Lula no GT de juventude, ao mesmo tempo em que não fez uma única crítica ao GT de educação, composto por um setor empresarial que veio avançando na destruição da educação pública no país ao longo dos últimos anos, conforme debatemos aqui. Alguns setores podem achar que a participação da presidenta da maior entidade estudantil do país numa equipe de juventude para discutir a transição poderia ser um contraponto a enorme presença dos interesses neoliberais na precarização das nossas vidas, mas não é o que vemos na prática. Essa entidade sequer criticou a presença de empresários no GT da educação e muito menos o fato de que vai estar na mesma equipe que um membro do MDB, o partido de Michel Temer que sob as bombas e repressão ao movimento estudantil aprovou o teto de gastos em 2016, além de ter sido um fiel defensor do golpe institucional e das nefastas reformas que atacam nossas vidas.

No marco de anos de sucateamento e absurdos cortes na educação por parte de Bolsonaro é necessário vermos que a participação da UNE ao lado de setores do MDB (!) não irá cumprir o papel de “esquerdizar” a agenda do novo governo, mas, ao contrário, vai subordinar nossa entidade estudantil à política de um governo de transição dirigido por Geraldo Alckmin, o mesmo responsável por anos de uma política de assassinato sistemático de milhares de jovens nas periferias de São Paulo, e pelo fechamento de escolas em 2015, que só foi derrotado pelos secundaristas em luta, os mesmo que tinham, não por acaso, muita desconfiança das direções burocráticas da UNE e da UBES.

As aspirações da juventude não podem ser canalizadas para ilusões de disputar por dentro das regras deste regime e desse sistema como é a política defendida pela UJS/PCdoB . Para além de dar origem a Bolsonaro e à extrema direita, o sistema capitalista também forja uma burguesia sedenta pelo suor e sangue da juventude, uma burguesia que se beneficia da reforma trabalhista, principal responsável pelo trabalho precário sem nenhum direito, que hoje se tornou a norma para a maioria dos jovens. É preciso retomar nossas entidades estudantis para que elas sirvam como ferramenta de luta e organização, e para defender os interesses dos estudantes precisamos nos contrapor ao projeto empresarial contido no governo de transição.

Essa política da UNE é coroação de anos de passivização no movimento estudantil e direcionamento da disposição de luta dos estudantes em direção às instituições durante o governo Bolsonaro. Em 2019, o PCdoB, partido que dirige a majoritária da UNE, apoiou o então presidente da câmara Rodrigo Maia, um dos principais articuladores da reforma da previdência, aceitando este ataque histórico como uma chantagem para reverter cortes na educação que posteriormente se efetivaram. Nos estados onde governam, o PT e o PCdoB não tiveram nenhum pudor em implementar reformas da previdência . Em cada oportunidade ao longo destes anos, o papel da UNE foi de canalizar todas as lutas em direção às alianças com a direita que agora se materializam na equipe de transição que vai manter as reformas. Para defender sua política de conciliação, essa entidade e o PCdoB chegaram a participar até mesmo do falido ato do MBL pelo superimpeachment.

Esse caminho de institucionalização das entidades já se mostrou fracassado antes. Onde estava a UNE quando na época dos governos Lula e Dilma surgiu o maior monopólio de educação do mundo, Kroton-Anhanguera? Só esse conglomerado cresceu seus lucros em mais de 20 mil por cento de 2010 a 2014, saltando de 85.988 alunos matriculados em 2010 e, passados quatro anos, chegando a 1 milhão. Também onde estava quando Dilma levou a frente uma política que de conjunto aumentou vagas no ensino superior à custa de enriquecer empresários, com vagas precárias e cortou 10,5 bilhões da educação, equivalente a 10% do orçamento da pasta? A expansão precária das universidades e institutos federais durante os anos de governo do PT teve esta contracara, combinado a diversas universidades que até hoje sequer possuem restaurantes universitários e residências estudantis, com bolsas que tampouco foram reajustadas durante seus anos de governo, quando em 2012 se iniciou uma greve histórica das universidades federais contra a precarização, a UNE atuou para que permanecessem isoladas, colaborando com o então governo.
A resposta para essas perguntas é: a UNE, pela via das direções majoritárias do PCdoB e do PT estava dentro do governo, defendendo esses programas e se chocando contra as lutas que surgiam para questionar esses projetos que abriam espaço para a precarização do ensino e o avanço dos monopólios privados da educação.

Que a UJS/PCdoB tenha como linha subordinar o papel das entidades estudantis a se calar sobre a política nefasta dos grandes empresários e políticos da direita em busca de cargos no novo governo Lula-Alckmin não é nenhuma novidade, e essa foi a política que conduziu a UNE ao longo de todo governo Bolsonaro, avançando ainda mais na burocratização do movimento estudantil, com a UJS defendendo abertamente contra a necessidade de assembleias e combatendo qualquer política de auto-organização. A pergunta que fica é se as juventudes do PSOL, que como partido tem mais peso ainda na transição de governo, defenderão essa mesma linha no movimento estudantil, abandonando de vez qualquer perspectiva de oposição de esquerda a majoritária da UNE e até mesmo o fraco discurso que algumas de suas juventudes tiveram quando falavam que se manteriam independente do novo governo de conciliação de classes, apesar da sua enorme diluição na campanha da frente ampla de Lula-Alckmin. Além disso, a UP também anunciou que será conselheiro dessa mesma equipe de juventude com seu representante na FENET assumindo um cargo na transição de Alckmin com a direita e os neoliberais. Mostrando como por trás de todo seu discurso "radical" e "combativo", está a velha conciliação de classes stalinista.

Diante da necessidade de combater a extrema direita que já mostrou que não irá abaixar suas bandeiras reacionárias contra a educação e os direitos da juventude e da classe trabalhadora, devemos lutar pela revogação integral das reformas, do teto de gastos e de todos os cortes na educação. É urgente a unidade de todos os setores de se dizem oposição de esquerda à burocracia majoritária da UNE para batalhar que nossa entidade possa de fato defender esse programa, o que passa necessariamente por manter uma política independente dos governos e das reitorias, defendendo a auto-organizaçao dos estudantes para fortalecer as verdadeiras alianças que precisamos, que é a aliança com a classe trabalhadora e os movimentos sociais.

É preciso resgatar e tirar lições do legado da UNE na Ditadura Militar e defender um programa contra os lucros capitalistas para educação que só pode ser arrancado pela luta junto à classe trabalhadora. A UNE precisa colocar seu peso para, em sentido oposto a participar da transição do governo com grupos empresariais, preparar um ano de lutas contra os cortes, as reformas e a extrema direita que aponte no sentido da defesa do ensino público e laico, em defesa das cotas raciais, organizando a luta pela ampliação radical do acesso às universidades, com o fim do vestibular e a estatização das universidades privadas, defendendo o não pagamento da dívida pública e uma universidade a serviço da classe trabalhadora e da juventude.

O movimento estudantil precisa depositar sua confiança na aliança com a classe trabalhadora, contra a precarização docente e junto aos trabalhadores efetivos e terceirizados, que mantém as universidades de pé todos os dias. Precisamos recuperar nossas entidades como ferramentas de luta e de auto organização democrática onde possamos decidir os rumos das mobilizações, com um programa concreto em defesa das universidades à serviço da classe trabalhadora e do povo pobre. É essa batalha que damos como Faísca Revolucionária junto a estudantes independentes em universidades pelo país. E é nesse sentido que nós da Faísca Revolucionária estamos discutindo com cada estudante nas universidades e nas eleições de entidades estudantis que participamos, como nas eleições para o CA de Letras da USP, ou no CACS Marielle Franco da UFRN, assim como em outras universidades, contra o bolsonarismo e os cortes da educação, por entidades subversivas, independentes e aliadas dos trabalhadores.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias