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OPINIÃO | Teori, Temer e Trump: o que é possível prever em tempos de incerteza

Eventos de imensa magnitude se sucedem rapidamente em tempos de crise. A morte, cheia de suspeitas, de Teori Zavascki que tinha denunciado sofrer ameaças é um desses eventos. Ela abre novo capítulo na crise nacional: para onde vai a Lava Jato? Enquanto isso se desenvolve a crise penitenciária que expõe as mazelas mais grotescas do encarceramento em massa de negros e pobres acusados de tráfico de drogas, muitos deles sequer julgados. Daqui a algumas horas Trump assume a presidência dos Estados Unidos e reinam incertezas na economia e na geopolítica mundial.

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

quinta-feira 19 de janeiro de 2017 | Edição do dia

A morte de Teori e a ascensão de Trump marcam novas dúvidas e incertezas em um país com um Temer de presidente. Um recordista de citações na Lava Jato e também recordista de impopularidade, que mesmo assim promove inauditos ataques aos direitos trabalhistas, previdenciários e sociais. Como a morte de Teori, que rapidamente gerou suspeitas em todo país, e a ascensão de Trump podem influenciar os rumos do governo Temer e de nosso país?

Num tempo tão cheio de novidades, incertezas, numerosos jornalistas chamam os tempos de Brexit, Trump, de tempos da “pós-verdade”. Muito mais que o tempo da “pós-verdade”, estamos em minha opinião no tempo da incerteza, de fenômenos passageiros e aberrantes enquanto a velha hegemonia morreu e não surge ainda uma nova, tempos de descontentamento com os regimes políticos e de revolta contra o tradicional, abrindo corações e mentes a novidades à esquerda e à direita.

“Pós-verdade” é um termo que parte de uma ideia elogiosa da grande mídia, portadora supostamente universal de uma verdade atacada pelas redes sociais e novos meios. Bem, basta observar em nosso país para ver que mesmo a grande mídia gosta de suas “barrigas” e uma boa dose de “jornalismo de guerra”. Evidentemente há mentiras, calúnias e outros disparates voando a solta no Facebook.

Voltemos a Teori, sua morte trágica e os rumos da Lava Jato

Pairam como uma nuvem sobre o evento suspeitas de que algo mais que um acidente possa ter ocorrido. Independentemente de uma ação homicida o evento colocou subitamente nas mãos de Temer, super-citado e delatado, os rumos da Lava Jato. De acordo com o artigo 38 do regimento interno do STF cabe ao novo ministro nomeado pelo presidente (citado 43 vezes na operação) assumir a relatoria da operação. De acordo com o artigo 68 do mesmo regimento, em casos excepcionais de vacância o próprio Supremo, dirigido por Carmén Lúcia pode nomear ou sortear um novo relator. O que prevalecerá?

Por trás do debate jurídico em rede nacional desenvolve-se a disputa sobre os rumos da operação. Pode Temer correr e nomear um substituto. Prestaria-se o hipotético substituto a acabar “com a sangria” como disseram em gravações Renan, Jucá e Sarney? Cármen Lúcia atuará em prol da Lava Jato e contra essa ala do regime político? Quando Renan tinha sido excluído da presidência do Senado por decisão monocrática de Marco Aurélio não foi o que ela fez.

Nessa disputa não há caminho que garanta um efetivo combate à corrupção. A Lava Jato e o STF atuam conforme interesses políticos e econômicos. Liberam e encobrem fatos (por exemplo a lista da Odebrecht) conforme seus interesses. Tal como pairam suspeitas sobre a morte de Teori, pairam ainda maiores suspeitas sobre a operação sediada em Curitiba. Procuradores e Sérgio Moro foram treinados nos EUA e mostram impressionante seletividade não só em alvos políticos mas com as empresas internacionais citadas na operação, mas nunca investigadas.

Para além da atuação errática e messiânica de um Dallagnol ou Moro há interesses que os fortalecem ou enfraquecem. Quando se tratava de tirar Dilma para colocar um governo que realizaria maiores ataques aos trabalhadores toda a mídia e todos setores patronais clamavam em uníssono: “todo poder à República de Curitiba”. Quando, em nome da estabilidade política e dos mesmos ataques aos trabalhadores a operação ofereceria complicações a atitude foi outra. Para garantir a presteza em trucidar a saúde e educação pública com a PEC 55 perdoou-se a operação “abafa a Jato” de Renan e o mantiveram no poder.

Estão os empresários e interesses multinacionais satisfeitos com Temer? Essa pergunta ajuda a responder para onde vai a Lava Jato. Em dezembro estavam insatisfeitos. Editoriais da grande mídia exigiam ações rápidas e contundentes ou ameaçavam a destituição do golpista. Temer apressou-se em apresentar uma reforma da previdência que fará cada brasileiro trabalhar ao menos dez anos a mais para ter direito a uma aposentadoria de miséria, e não satisfeito também apresentou uma reforma trabalhista de corar a burocracia chinesa em termos de super-exploração. De pronto os editoriais mudaram de tom e enalteceram Temer.
Se olharmos essa foto poderíamos concluir que trabalham pela estabilidade do presidente. Porém o suficiente em 19 de janeiro, antes de Trump pode ser suficiente também no dia 20 ou 21?

Trump promete uma reviravolta na economia e geopolítica mundial. Quanto a verborragia se encontrará com os fatos? Mesmo se muito pouco, a tendência a aumento da taxa de juros (já iniciada) e algumas medidas protecionistas e mais ainda se investir pesadamente em infra-estrutura como promete, suas decisões produzirão sismos no mundo e em particular naqueles dependentes do fluxo de capitais internacionais e da exportação de commodities. Eis o nosso caso, duplamente.

O aumento dos juros nos EUA leva, normalmente, a uma saída de capitais de países emergentes e da especulação nos valores futuros das commodities (soja, ferro, petróleo) rumo aos títulos da dívida americana. Um cenário “Trump máximo” poderia ter consequências catastróficas na já combalida economia pátria. Um cenário “Trump mínimo” não deixaria de ter impactos nessas mercadorias que são a principal aposta para crescimento da economia brasileira em 2017 e no câmbio, afetando a dívida pública e privada. As agressivas privatizações do programa “Ponte para o Futuro” de Temer poderiam ser uma contra tendência e segurar fluxo de capitais em um cenário “mínimo” ou “médio”, mas o impacto na economia se sentiria, agravando ou no mínimo mantendo a recessão.

Se estas previsões da economia têm alguma ressonância, pode-se esperar que o suficiente para a FIESP e comparsas hoje, não seja suficiente amanhã. Demandando mais e mais ataques de Temer, ou haver-se com a Lava Jato.

Soma-se a todas essas incertezas uma outra fonte de dúvidas. Essa última não tão externa a nossa ação. Quanto de crise econômica, social e política é possível existir sem efetiva resposta dos “de baixo”?

Lula, a cúpula do PT, e por esta via a CUT, UNE, MST atuam na justa medida de se opor aos ataques porém conduzi-los não ao “incêndio”, mas a esperar outubro de 2018. Poderão os trabalhadores superar esses limites colocados por suas principais e tradicionais lideranças? Poderá a juventude oferecer um exemplo que contamine os trabalhadores? Uma juventude, uma geração que já sacudiu o país nos últimos anos, primeiro em junho de 2013, depois com as ocupações de escolas de São Paulo que frearam o fechamento de escolas pelo todo-poderoso Alckmin, e depois no fim do ano passado com uma imensa onda de ocupações de escolas e universidades por todo país. Tudo isso é incerto, mas nossa ação pode influenciar os rumos dessa parte das incertezas que pairam sobre nosso futuro.

Uma frente-única improvisada no calor do momento em defesa da liberdade de Guilherme Boulos, líder do MTST arbitrariamente preso pela PM de Alckmin, e hoje em defesa do direito de organização sindical dos trabalhadores da USP mostra o potencial da união das forças para derrotar os desejos dos governantes e das patronais. A força da ação comum de sindicatos, organizações estudantis, populares, à esquerda ou ao menos críticas ao PT, conseguem atuar e mover parlamentares do próprio PT para a ação. Essa força social poderia exigir que a CUT e poderosos sindicatos rompam sua paralisia em defesa dos direitos dos trabalhadores. Assim teríamos uma “engrenagem” para derrotar Temer e não a espera passiva por 2018 já com ataques consolidados. A partir da força de uma defesa como essa poderíamos começar a avançar em contra-ataques questionando esse podre regime político de corrupção e ataques a nossos direitos.

Para isso é preciso compreender o que está acontecendo na realidade nacional, mas, mais que isso, a partir daí atuar conscientemente pela transformação radical dessa realidade.




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