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Sindicalização de base: lições da vitória dos trabalhadores da Amazon nos EUA

Tatiana Cozzarelli

James Dennis Hoff

Tradução: Laura Scisci

Sindicalização de base: lições da vitória dos trabalhadores da Amazon nos EUA

Tatiana Cozzarelli

James Dennis Hoff

“Queremos agradecer Jeff Bezos por ter ido ao espaço, porque enquanto ele estava lá, nós estávamos organizando um sindicato”. Chris Smalls

Os trabalhadores da Amazon em Staten Island, no distrito de Nova York, derrotaram uma das corporações mais ricas e antissindicais do mundo. Sua vitória é um rechaço à falha estratégia da burocracia sindical e mostra a potência da organização pela base.

[Este artigo foi originalmente publicado na revista Left Voice, em 10 de abril deste ano].

O Amazon Labor Union [Sindicato dos Trabalhadores da Amazon, em tradução livre] em Staten Island, Nova York, é uma verdadeira história à la Davi e Golias: um grupo de trabalhadores subestimados pela patronal e a grande mídia enfrentou a segunda pessoa mais rica do mundo, e venceu.

A Amazon, segunda maior empregadora nos Estados Unidos e a terceira maior corporação do mundo, teve lucros recordes às custas de seu mais de 1,6 milhão de funcionários (entre estes, 1,1 milhão de trabalhadores apenas nos EUA), muitos dos quais trabalham em condições inseguras e exploratórias, em armazéns onde são tratados como máquinas humanas. Em 2021, a Amazon alcançou um lucro exorbitante de 33,6 bilhões de dólares, que financiaram o distópico “passeio” de Jeff Bezos pelo espaço enquanto a população mundial amargava as consequências catastróficas da pandemia; no entanto, a empresa paga aos trabalhadores de seus armazéns um salário que não cobre sequer os custos de vida. Enquanto isso, apenas no ano passado a empresa pagou mais de 4,3 milhões de dólares a advogados dedicados a dificultar ao máximo a sindicalização dos trabalhadores, como parte de sufocar as tentativas de organização em seus armazéns pelo país, como na Amazon de Bessemer, no estado do Alabama, e de Staten Island. Afinal, as reivindicações levadas adiante por um sindicato, como o fim da imposição de horas extras e o aumento salarial, afetariam substancialmente os lucros garantidos por trabalhadores superexplorados.

Apesar destes esforços, o Amazon Labor Union (ALU) persistiu, e com uma campanha de sindicalização pela base, alguns advogados voluntários e um orçamento de pouco mais de 100 mil de dólares arrecadados entre trabalhadores e apoiadores locais, conseguiu estabelecer-se como o primeiro sindicato em um estabelecimento da Amazon nos Estados Unidos. Os organizadores do ALU jogaram fora a cartilha tradicional da organização de sindicatos, imposta de cima para baixo. Sua campanha dirigida aos trabalhadores não apenas derrotou Jeff Bezos, como também deixou um recado às direções sindicais burocráticas, ossificadas e bem financiadas.

Como isso aconteceu?

No fim de março de 2020, em meio à pandemia do coronavírus, Chris Smalls (atual presidente do ALU) e Derrick Palmer ajudaram a organizar uma passeata com mais de 50 trabalhadores do armazém JFK8 da Amazon, em Staten Island, exigindo medidas efetivas de proteção sanitária. A empresa não apenas negou essas demandas mínimas, como também aproveitou a oportunidade para mandar um recado aos seus funcionários, cinicamente demitindo Smalls por “desrespeitar o distanciamento social e as medidas de quarentena”, embora ele nunca tivesse testado positivo para o vírus.

Ao invés de desistir, Smalls, Palmer e outros trabalhadores continuaram sua luta por seus direitos, formando um sindicato.

De acordo com documentos internos vazados em abril de 2020, executivos da empresa, incluindo o CEO Jeff Bezos, começaram a discutir como derrotar as incipientes tentativas de organização e atacar Smalls. Com um discurso em tom claramente racista, o principal advogado da Amazon o descreveu como “não inteligente ou articulado”, e indicou que a empresa poderia facilmente vencer uma batalha na opinião pública se destacasse o papel de liderança de Smalls. Mas eles claramente subestimaram seu adversário e a capacidade de organização de seus trabalhadores.

Smalls e outros funcionários do armazém iniciaram sua campanha de forma semelhante a de tantos outros movimentos operários: montando uma mesa e chamando constantemente seus colegas, de dentro e fora de seu local de trabalho, para conversar. E desde os baixos salários iniciais até as condições intoleráveis de trabalho, havia muitas demandas pelas quais se organizar. Como relatou Brima Sylla, funcionário do armazém JFK8: “Eles só se importam em pensar como usar e controlar o seu tempo enquanto você está naquele prédio. É desumano – para ser sincero, é uma verdadeira plantation”. O portal Motherboard noticiou a rotina de uma trabalhadora do JFK8 que dormia em seu carro e tomava banho em uma academia, porque não tinha dinheiro para pagar aluguel na cidade de Nova York.

O sindicato em formação confluiu com o ódio dos trabalhadores da Amazon, alimentado por estas condições de trabalho, e conforme eles cresceram em número, a mesa virou uma tenda montada com café, bebidas e comidas trazidas pelos organizadores para seus colegas. Os trabalhadores da Amazon têm uma composição diversa: vêm de várias regiões das cidades de Nova York e Nova Jersey, e pertencem a múltiplas gerações. Há muitos imigrantes, alguns dos quais não falam inglês. Portanto, o sindicato da Amazon tinha o desafio de unir essa força de trabalho diversificada em torno de um objetivo comum. Como contou uma das organizadoras, Angelika Maldonado, à revista Jacobin, trazer comida típica de países africanos para a tenda atraía mais trabalhadores africanos. Sylla, que também tem origem liberiana, criou grupos de WhatsApp para os imigrantes africanos, buscando que se envolvessem mais no processo de sindicalização. O número de trabalhadores organizadores aumentou, e estes recrutaram outros organizadores, formaram grupos de estudo, distribuíram camisetas do sindicato para serem usadas no armazém, e começaram a coletar as assinaturas necessárias para que houvesse a votação de formação do sindicato. Vale retomar o caráter profundamente anti operário da legislação dos Estados Unidos: o primeiro obstáculo para que os trabalhadores de um local de trabalho possam se filiar a um sindicato é a coleta de assinaturas que representem no mínimo 30% dos funcionários favoráveis à sindicalização, para que sejam submetidas à análise do Conselho Nacional de Relações do Trabalho [NLRB, na sigla em inglês].

Dispensando a estratégia tradicional dos sindicatos, o ALU estava aberto ao público desde o início; seus organizadores discursavam dentro do armazém e montaram uma tenda do lado de fora. Ao invés de esperar para convencer cada trabalhador antes de enviar as assinaturas coletadas e requerer o processo de votação (um “trabalho de Sísifo” em um local de trabalho com longos turnos e perseguição deliberada das chefias aos organizadores), eles enviaram a petição ao NLRB assim que alcançaram o número mínimo de assinaturas necessárias. Depois de muitas reclamações da Amazon, eles alcançaram o número suficiente de assinaturas válidas e a agência federal não teve nenhuma opção a não ser convocar uma eleição.

Estes esforços foram impedidos pela Amazon em todo o processo. Como fizeram no estabelecimento em Bessemer, bombardearam os trabalhadores com panfletos e mensagens anti-sindicalização, e reuniões obrigatórias para persuadi-los a votar “não” à formação do sindicato. Por todo o país, a Amazon gasta milhões de dólares em atividades anti-sindicalização. A empresa chegou até mesmo a contratar a famosa agência de investigação Pinkerton (a mesma que assassinou e aterrorizou várias gerações de trabalhadores nos Estados Unidos) para espionar as tentativas de organização no armazém.

Mas as reuniões obrigatórias não saíram como se esperava: os trabalhadores passaram a denunciar as mentiras da Amazon, o que lhes permitiu conectar-se com outros trabalhadores e seus relatos das tentativas dos gerentes para dividi-los. Outra estratégia falida da Amazon para minar a sindicalização foi a prisão de Smalls e de dois outros funcionários do armazém que traziam comida para os trabalhadores, em fevereiro. Como efeito imediato, até mesmo os funcionários contrários à sindicalização se revoltaram. Brett Daniels, trabalhador do armazém JFK8, relatou que um gerente antissindical, que tentou impedir funcionários de coletar assinaturas no horário de almoço, terminou se juntando ao movimento de sindicalização depois das prisões. “Nós não vamos deixar isso acontecer”, disse o gerente.

A liderança de Smalls e Palmer claramente teve uma importância fundamental no sucesso do sindicato. No entanto, os mais de 100 trabalhadores-organizadores que arriscaram seus empregos para falar nas reuniões, que se reuniam individualmente com outros trabalhadores, montavam grupos no WhatsApp e traçavam estratégias para atrair mais trabalhadores, também foram cruciais para a vitória.

Um tapa na cara da burocracia sindical

Segundo John Logan, professor e pesquisador das relações de trabalho da Universidade de São Francisco,

A Amazon é a empresa mais importante da economia global, e também a mais temível empresa antissindical em termos de riqueza, sofisticação e de seus esforços para manter os sindicatos de fora. O ALU pareceu virar de cabeça para baixo todo o conhecimento convencional de organização. Eles o fizeram sem um sindicato enorme ou organizadores experientes.

Podemos ir mais além: a vitória do sindicato no JFK8 é, na verdade, um tapa na cara das direções burocráticas dos sindicatos nacionais. Há anos, grandes sindicatos como o Sindicato de varejo, atacado e loja de departamentos e o Sindicato internacional dos trabalhadores de serviços [RWDSU e SEIU, respectivamente, na sigla em inglês], têm repetidamente falhado em organizar novas camadas de trabalhadores precarizados, apesar dos milhões de dólares investidos.

Tomemos como exemplo as tentativas, até agora fracassadas, do RWSDU para organizar os trabalhadores do armazém da Amazon em Bessemer. Ao invés de ajudar a construir uma campanha de sindicalização dirigida aos trabalhadores, o que fizeram foi adotar uma abordagem de cima para baixo, se apoiando substancialmente em patrocínios do Partido Democrata e no uso de funcionários do sindicato como substitutos de trabalhadores-organizadores. Quando a reportagem do Left Voice foi até Bessemer para noticiar o processo de sindicalização, o que havia era um evento com Bernie Sanders e menos de 15 trabalhadores presentes. Do lado de fora do armazém, se via pessoas com cartazes pró-sindicato, mas nenhum trabalhador.

No entanto, este método de organização não é uma coincidência ou um mero erro tático. No decorrer da etapa de crise imperialista, os sindicatos e suas direções se tornaram ferramentas do capitalismo. Líderes sindicais – cujos interesses materiais são fundamentalmente diferentes dos trabalhadores por eles representados – abandonaram, em sua maioria, qualquer militância real. Ao invés disso, atuaram para transformar os sindicatos nos Estados Unidos em um apêndice eleitoral do Partido Democrata, na esperança de conquistar algumas migalhas da mesa do capital. Desta forma, trabalham para manter os trabalhadores na passividade, dizendo-lhes que seu poder reside nas urnas, em votar em seus inimigos de classe, ao invés da luta. Esta submissão ao Partido Democrata é uma das razões pelas quais os sindicatos nos Estados Unidos foram esmagados pela ofensiva do bipartidarismo neoliberal, e as taxas de sindicalização, apesar do crescente apoio popular aos sindicatos, seguem decaindo há décadas.

Isto não significa, porém, que os trabalhadores não necessitam ou devem rejeitar grandes sindicatos como o RWDSU. Nós precisamos de maiores ferramentas de organização dos trabalhadores, incluindo os sindicatos. Mas, para levá-los ao máximo de suas potencialidades, a base dos trabalhadores precisa lutar para arrancar seu controle das mãos dos burocratas. Os trabalhadores devem lutar para superar as atuais direções sindicais e passar a controlar seus sindicatos democraticamente, usando-os como ferramentas para a luta de classes contra os patrões e o Estado.

A encruzilhada do Partido Democrata

Apesar dos democratas tentarem se posicionar como amigos dos trabalhadores, não são. Fazem promessas em atos e discursos eleitorais, mas consistentemente falham em cumprir até mesmo as promessas mais miseráveis. No caso do ALU, a máquina eleitoral dos democratas foi usada contra o sindicato. Como noticiado pela CNBC, a Amazon chegou a contratar uma influente agência de pesquisa de opinião democrata para lutar contra a sindicalização em Staten Island.

Até mesmo sua ala progressista em Nova York, com parlamentares como Alexandria Ocasio-Cortez, eleita por uma nova geração de votantes que são pró-sindicalização e anti-opressão, sequer compareceu em apoio ao ALU. Como declarou Smalls, a parlamentar estava prevista para visitar os funcionários da Amazon em Staten Island em apoio ao seu sindicato, mas acabou cancelando e não houve nenhum esforço para outra visita. Pior ainda, falhou em usar de sua posição como figura pública para angariar o apoio de outros trabalhadores e da população.

Em uma discussão no Twitter, Ocasio-Cortez argumentou ter tido um conflito de compromissos em sua agenda, e que o armazém de Staten Island não ficava em seu distrito eleitoral. Ela então foi marcada em resposta por vários trabalhadores, incluindo Smalls, que relembraram que ela não apenas viajou regularmente para fora de seu distrito em campanhas eleitorais de democratas como Nina Turner, como também que muitos de seus eleitores eram trabalhadores do armazém JFK8. Obviamente, a parlamentar não pode estar em mais de um lugar ao mesmo tempo, mas sua recusa em priorizar o que se tornou um dos maiores feitos do movimento operário dos últimos anos, enquanto garantiu comparecer na cerimônia do Met Gala em um vestido com os dizeres “Taxe os ricos”, estimado em 10 mil dólares, demonstra que ela é apenas mais uma política carreirista.

[No tweet:
@AOC: “O armazém não fica no meu distrito e talvez você deveria olhar no mapa antes de dizer isso. Tirando o conflito de compromissos na agenda, nós fizemos pedidos de supervisão investigativa à Amazon, nos reunimos com funcionários dos armazéns em Woodside, e mais. Espero que você pesquise melhor da próxima vez”.

@Shut_downAmazon: “Não, @AOC, isso é terrível. Trabalhadores do seu distrito definitivamente se deslocam para Staten Island, eu os conheço pessoalmente. Talvez você deveria melhorar sua pesquisa”.]

A verdade é que Ocasio-Cortez e o Partido Democrata não desejavam ser associados com um grupo de trabalhadores radicais. A ausência de apoio ao ALU se choca com todo o apoio do Partido ao movimento de sindicalização em Bessemer, no qual o RWDSU levantava bandeiras pró-sindicato com a foto de Stacey Abrams [democrata e ex-parlamentar na Assembleia Geral do estado de Georgia].

Desde a vitória do ALU, os democratas calculadamente demonstraram efusivo apoio ao sindicato, incluindo de Joe Biden, mas isto é apenas uma cortina de fumaça para ofuscar os ataques do governo aos trabalhadores em todo o país. O novo orçamento estatal, por exemplo, destina mais verbas aos militares, policiais e ao ICE [Serviço de Imigração e Controle das Aduanas], remetendo às míseras promessas sociais na campanha eleitoral de Biden. O apoio dos democratas aos trabalhadores da Amazon deve ser compreendido pelo que realmente significa: uma tentativa de boicotar o poder dos trabalhadores e desviá-lo para a encruzilhada política que enfrenta o partido.

Um novo momento para o movimento operário

O sucesso do ALU não pode ser compreendido em um vácuo histórico. Como qualquer evento na História, trata-se de mais do que alguns indivíduos corajosos com audácia estratégica. O ALU foi formado no despertar de um período de profunda crise e luta de classes, em meio à pandemia e aos levantes de massas contra a violência policial em 2020, eventos que contribuíram para radicalizar toda uma nova geração de trabalhadores. A pandemia e o movimento Black Lives Matter moldaram profundamente toda a classe operária, como foi demonstrado pela onda de greves e mobilizações em outubro do ano passado, que ficou conhecida como Striketober, quando trabalhadores por todo o país se mobilizaram por melhores condições de trabalho. Mineiros, trabalhadores da saúde, da indústria carpinteira e sinfonistas - todos estes entraram em greve. Foi uma rebelião dos trabalhadores “essenciais” que arriscaram suas vidas e mantiveram o funcionamento da economia durante o lockdown da pandemia.

Leia também: Batalha no Alabama: o movimento antirracista e a luta pela organização sindical na Amazon

Os trabalhadores sabem também dos lucros massivos acumulados pelos que se beneficiaram da crise. A riqueza acumulada dos bilionários nos Estados Unidos cresceu 70% durante a pandemia, passando de 3 trilhões de dólares para 5 trilhões. Enquanto isso, o aumento da inflação e as rupturas nas cadeias de produção e distribuição tornaram a classe trabalhadora cada vez mais consciente da desigualdade no coração do sistema capitalista, assim como de seu poder para quebrá-la. No entanto, à medida que a gestão Biden aumenta o financiamento aos militares, à polícia e ao ICE e reduz ainda mais as já parcas promessas às demandas sociais, os trabalhadores enfrentam uma difícil batalha.

E são os jovens trabalhadores a maioria da linha de frente. Como publicado pelo Washington Post: “Muitas lideranças do movimento são jovens de 20 e poucos anos, que fazem parte da chamada ‘Geração-U’, de Union [sindicato, em inglês]. O apoio aos sindicatos é o maior desde 1965, com uma taxa de aprovação de 68% – chegando a 77% entre a população de 18 a 34 anos de idade –, de acordo com uma pesquisa recente promovida pela Gallup”. Estes são os jovens – millenials e zoomers, que estão buscando organizar sindicatos dos trabalhadores das lojas da Starbucks em todo o país, além da Condé Nast, Alphabet, New York Times e outros exemplos nos últimos meses.

Esta geração vivenciou duas recessões econômicas históricas, uma pandemia mundial e um levante de massas em defesa das vidas negras. É também uma geração que defende os direitos LGBTQIA+, da população negra e de outros setores oprimidos – e isto se expressa incipientemente no movimento operário. Trabalhadores da mídia Jezebel entraram em greve pelos direitos trans, os professores de Minneapolis entraram em greve pelo emprego e contratação de profissionais da educação não-brancos [BIPOC, na sigla em inglês: black, indigenous and people of color], e funcionários da Disney marcharam contra a reacionária lei anti-LGBTQIA+ “Don’t Say Gay”.

Enquanto alguns se demitiram de seus empregos na chamada Great Resignation [“Grande Renúncia” em inglês, como ficou conhecida a onda de pedidos de demissão em massa], outros estão se organizando em greves. Estamos diante de um fenômeno insurgente de sindicalização pela base, de trabalhadores como Smalls e os funcionários da Starbucks que se organizam exigindo a formação de sindicatos. Disto, surgirão novas lideranças e novos questionamentos da base dos trabalhadores à sindicalização tradicional imposta de cima para baixo.

Olhando adiante

Uma batalha imediata do ALU será para arrancar um bom primeiro contrato de trabalho da empresa. O sindicato declara que planeja lutar pelo salário mínimo de U$30/hora, com duas pausas de trabalho de 30 minutos ao dia, por mais folgas remuneradas e pelo fim das horas extras obrigatórias. O ALU espera começar a negociação do contrato em maio.

Sem dúvidas, a Amazon tentará punir os trabalhadores pela sindicalização, tentando anular a votação e negociando o pior contrato possível. A saída para o ALU deve ser a mesma estratégia que possibilitou arrancar o direito à formação do sindicato.

Ao contrário da lógica sindical que se submete aos interesses da patronal, pregando a possibilidade de se alcançar bons contratos por meio de advogados e negociações nos bastidores, a vitória do ALU mostra que a organização de base dos trabalhadores é a chave. Um bom primeiro contrato não será conquistado com alguns advogados à mesa, mas com a força de todos os trabalhadores, prontos para entrar em greve se necessário.

Além disso, o expressivo apoio ao sindicato pode ser a base para se conectar com trabalhadores de outros armazéns da empresa e de outras categorias. Os trabalhadores devem se apoiar em solidariedade de classe e na luta coletiva.

A experiência no armazém da Amazon em Staten Island desafiou o clássico modelo sindical, e este é apenas o começo. Agora, à medida que os trabalhadores avançam para sua primeira negociação de contrato de trabalho, é preciso lutar pela abertura das sessões de negociação, das quais todo e qualquer trabalhador possa participar, e organizar assembleias de base para discutir os próximos passos da luta. Sobretudo, é necessário organizar a disposição imediata para a luta e greve.

Um bastião para a classe operária

O ALU já está sendo procurado não só por cerca de cem outros estabelecimentos da Amazon, como também por trabalhadores da Starbucks, Walmart, Teamsters e outras empresas. O sindicato tem o potencial de se configurar como um bastião para a classe operária e cumprir um papel ainda maior no desenvolvimento da onda de sindicalizações. Há também o objetivo de conquistar um contrato coletivo em Staten Island que abranja outros setores de trabalhadores da Amazon, como os motoristas.

Além disso, também há a questão sobre qual tipo de relação o ALU estabelecerá com outros sindicatos. Pode o ALU ser uma ferramenta para quebrar a paralisia e as imposições de cima para baixo dos sindicatos submissos às patronais e exigir a ação na luta de classes? Pode o ALU exigir que todos os outros sindicatos coloquem seus enormes recursos a serviço da mobilização nas ruas para lutar por um bom contrato para os trabalhadores da Amazon e de outras categorias em Nova York?

Mais além, é essencial que o ALU mantenha sua independência política dos partidos capitalistas. Já está claro que os democratas estão do lado da patronal e do uso dos mais diversos e nefastos métodos contra a sindicalização, e não do lado dos sindicatos. No entanto, quase todos os sindicatos destinam verbas e mobilizam seus filiados para propaganda eleitoral do Partido Democrata. A independência política dos partidos capitalistas é uma questão de vida ou morte para este jovem sindicato. A experiência até agora tem mostrado que o poder dos trabalhadores da Amazon reside na organização em seu local de trabalho, impulsionado pelo apoio da “Geração-U”. Enquanto muitos democratas abordaram o novo sindicato e querem cooptá-lo, os trabalhadores devem se lembrar que este partido é um “cemitério de movimentos sociais”.

No entanto, a independência dos democratas não significa se abster da política – ao contrário, significa a organização contra os ataques de ambos os partidos Democrata e Republicano, aos trabalhadores não apenas da Amazon, mas de todo o país, e aos setores oprimidos. Significa utilizar o sindicato como ferramenta construir uma verdadeira luta em defesa dos trabalhadores da Amazon e de suas comunidades, pelos direitos dos trabalhadores imigrantes, negros, LGBTQIA+ e outros.

O potencial do Amazon Labor Union

O ALU é talvez o mais claro exemplo do surgimento da sindicalização de base, com Chris Smalls, Derrick Palmer e outras figuras como lideranças orgânicas desse movimento. E os capitalistas têm motivos de sobra para se preocuparem, uma vez que o ALU já vem sendo buscado por trabalhadores de mais de cem outros estabelecimentos da Amazon, interessados em formar seus próprios sindicatos, e que a experiência em Staten Island e Bessemer extrapolou as fronteiras nacionais para inspirar a organização de trabalhadores da empresa na Alemanha e em outros países.

Mas o futuro do ALU, e deste fenômeno mais profundo, está em aberto. Se múltiplos locais de trabalho da Amazon se sindicalizarem e exigirem maiores salários, isto pressionará pelo aumento do padrão salarial de conjunto para toda classe trabalhadora nos Estados Unidos. Se múltiplos armazéns da Amazon não apenas se sindicalizarem, mas tiverem um papel ativo na luta de classes, se abrirá um enorme potencial. Trabalhadores do setor da indústria logística são centrais na economia e podem causar prejuízos milionários aos capitalistas se paralisam sua produção.

Os organizadores do ALU e os trabalhadores do armazém JFK8 abriram uma brecha na longa e difícil batalha entre a classe trabalhadora nos Estados Unidos e o capital. A tarefa de todos trabalhadores neste momento é de aproveitar esta oportunidade para fortalecer os interesses e a luta dos trabalhadores em todos os lugares.


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