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CAPITALISMO E CORONAVÍRUS | Sem poder se aposentar e sem poder sobreviver ao coronavírus: um retratato da decadência capitalista

Quando se aprovava a Reforma da Previdência no Brasil, uma das coisas mais chocantes era pensar como que toda a tecnologia desenvolvida pela humanidade, na capacidade de nos fazer chegar a altas expectativas de vida como 80, 90 e até mais anos teria se tornado não uma conquista, mas um custo. Ao que parece, o coronavírus recolocou essa questão de maneira ainda mais cruel: o que que tem morrer os que já não trabalham e já não garantem lucros patronais?

Virgínia GuitzelTravesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC

sexta-feira 27 de março de 2020 | Edição do dia

Um vídeo assombra e nos amargura infinitamente, uma senhora espanhola chora e suplica por ajuda internacional porque não há respiradores e nem cuidadores para seu esposo. Na Itália, os número de mortos não para de subir e registra 919 em único dia. Na França, há um morto a cada 4 minutos pelo Covid-19 e as previsões para o Brasil não são nada alegres, segundo pesquisadores de Oxford espera-se 478 mil mortes. Essa situação escancara a incapacidade dos governos e deste modelo econômico de salvar milhões de vidas quando se aparece pandemias como a que vivemos. 

Apesar dos discursos de enfrentar o coronavírus como uma "guerra", o que temos visto é a ausência completa de medidas coerentes com isso, uma vez que não se reorganizou a produção para garantir insumos necessários para combater a crise, seguem salvando bancos e empresas e oferecem condições humilhantes para a grande maioria da população, com demissões, suspensões de contrato e assédios. Além de demagogia, há poucas medidas efetivas de controle da pandemia, pelo contrário, o que vemos é o reforço dos autoritarismos dos Estados como prevenção ou diretamente contenção da indignação que naturalmente surge do descaso com nossas vidas através de quarentenas militarizadas.

Foi noticiado hoje que após 5.402 mortes, prefeito de Milão - Giuseppe Sala - admitiu erro de ter apoiado campanha para cidade não parar. Uma campanha muito parecida como a lançada hoje pelo filho de Bolsonaro nas Redes Sociais intitulada #OBrasilnãopodeparar. Uma resposta as pressões de grandes empresários como o "Véio da Havan", Roberto Justus, entre outros, de que as vidas dos trabalhadores valem menos do que os lucros patronais.

O capitalismo é sempre cruel. Mas em muitos momentos, nos que se pode chamar de "paz", aonde reina a "natural exploração" e os dramas cotidianos ele busca deixar castigos secretos amenizados pela esperança de "todos tem as mesmas oportunidades" e de que se você se esforçar muito, você pode enriquecer também. Já em tempos de crises econômicas, como os que se abriram pós 2008, e ainda mais em meio a pandemias, fica nítido todo o seu conteúdo reacionário, a impossibilidade de confluir este modelo econômico com os interesses da maioria da população, e de que não se trata de disputas técnicas para se encontrar melhores alternativas, os interesses de classe, a predominância das ganâncias e dos lucros se impõem, e junto ao problema de saúde que vivemos de forma sem precedentes, temos que enfrentar politica, econômica e socialmente as mazelas do capitalismo.

Se o avanço da ciência, da nossa capacidade produtiva, da globalização, da tecnologia não está a serviço de impedir uma enorme devastação de vidas humanas, a que serve este sistema? É obvio que o capitalismo já não permitia com que a maioria dos trabalhadores tivessem condições financeiras para uma alimentação altamente qualificada, a garantia de 8 horas de sono diárias, acesso ao lazer e outras tantas condições que hoje são determinantes para se pensar a resistência biológica contra o Covid-19. Mas quando além disso, é possível ver que as possibilidades de intervir verdadeiramente contra o coronavírus são destinadas a intervir contra as pequenas possibilidades de reagir da classe trabalhadora, com o fechamento de fronteiras, quarentenas militarizadas, negação de testes massivos para todos os que tiveram contato com o vírus ou apresentam sintomas leves, a não restruturação da industria e a ameaça de que as pessoas retornem a vida normalmente enquanto sequer existe um remédio para tratar a doença é insuportável.

Não há mais como defender o sistema capitalista, se a cada nova crise por ele gerada, ele se demonstra insuficiente para responder as demandas que ele mesmo engendra. Não há mais como negar a atualidade da luta de classes, quando são as vidas das massas trabalhadoras que estão em risco contra a mesquinhez e ganância dos patrões que dirigem seus carros em "carreatas" para exigir o fim das quarentenas. Senão abrem mão de nenhuma parte dos seus lucros para manter vivos seus próprios funcionários. É então, uma provocação aos trabalhadores que se organizem para que arranquemos os lucros e o futuro da humanidade que os patrões não merecem de forma alguma deter.

No Brasil, estamos frente a frente com uma enorme crise estatal e disputas entre os poderes para lidar com a pandemia, no marco que não há nenhum desacordo com que sejam os trabalhadores a pagarem pela crise econômica e do coronavírus. No dia de ontem (26), Doria conseguiu fazer uma Coletiva de Imprensa sem falar em testes massivos, enquanto o país batia recorde de assassinatos e novas infecções. Esse é o "opositor" de Bolsonaro que pra justificar sua política assassina diz que o vírus não passaria pelos vidros blindados das lotéricas. Não há como confiar em nenhum destes poderes. 

Resta somente a nossa classe a decisão de tomar em nossas mãos o futuro da humanidade, que hoje está ameaçada por esta pandemia. Se decidirmos enfrentar estes parasitas que controlam todos os recursos que geramos com nosso esforço e suor, podemos tomar as fábricas, universidades, escolas e demais ramos produtivos e colocá-los a serviço de produzir todos os materiais necessários para combater a pandemia, combinado medidas de prevenção como a garantia da redução da jornada de trabalho sem redução de salários, a possibilidade de alimentações nutritivas que ajudem em elevar a imunidade e na produção de testes massivos que possam ser utilizados para organizar uma quarentena racional, diferentemente do que fazem os governos. Sabemos que não faltam recursos para realizar estas medidas, mas interesse dos patrões e dos políticos que lhes servem para colocar nossas vidas como prioridade.

A luta contra o capitalismo certamente não garante resolver todos os problemas da humanidade. Não resolve em si mesma todos os males e todas as formas de opressão da qual se estruturou a nossa sociedade. Todavia, sem essa luta verdadeiramente decidida por destruir esta sociedade miserável e construir uma sociedade nova, livre das classes sociais, do Estado capitalista, da polícia assassina e da propriedade privada não há condições para enfrentar a pandemia. Não podemos pagar novamente por mais esta crise, façamos os capitalistas pagar.




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