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MARXISMO E O NEGRO | [VÍDEO] Questão negra e marxismo

Marcello Pablito Trabalhador da USP e membro da Secretaria de Negras, Negros e Combate ao Racismo do Sintusp.

quinta-feira 31 de agosto de 2017 | Edição do dia

Campina Grande (PB), 23 de agosto de 2017

Bom dia a todas e todos, me chamo Marcello Pablito e sou integrante da Secretaria de negras, Negros e combate ao racismo do Sintusp e militante do Movimento Revolucionário de Trabalhadores, uma organização que é parte da Fração Trotskysta Quarta Internacional, que impulsiona a rede de diários internacional Esquerda Diário, do qual sou colaborador nas sessões do Mundo Operário e na Seção de Negras e Negros e que convido todos a conhecer e construir conosco.

Sou também um dos colaboradores do livro Questão negra, marxismo e classe operária no Brasil e organizador juntamente com Daniel Alfonso do livro “A revolução e o negro” que são dois livros resultados de uma pesquisa e de um trabalho coletivo para recuperar o que houve de melhor nas elaborações trotskystas, algo que infelizmente é desconhecido pela própria esquerda. Este livro está disponivel para quem tiver interesse em conhecer e já anuncio que para o ano que vem estamos preparando uma nova edição revisada e ampliada que espero poder apresentar aqui em uma outra oportunidade. Gostaria de agradecer pelo convite e pela oportunid ade de estar nessa mesa de debatendo Marxismo e Questão Negra. Para mim é um orgulho e um prazer poder fazer isso em pleno centenário da maior revolução que a classe operária já realizou e também como forma de mostrar que mesmo depois de 77 anos do assassinato do grande dirigente revolucionário Leon Trotsky a mando do stalinismo, suas ideias estão vivas.

Estamos há quase 10 anos do inicio de uma das mais importantes crises do capitalismo, e isso já faria com que o debate sobre a relação entre a Questão Negra e o marxismo seja uma das tarefas mais necessárias para aqueles que lutam contra as mazelas desse sistema de exploração e opressão. Se no passado o racismo esteve a serviço de justificar o que foi ao mesmo tempo uma das maiores atrocidades vistas na história da humanidade e um dos negócios capitalistas mais lucrativos: o comércio de carne humana (a carne negra), através da escravização de milhões de homens, mulheres e crianças, hoje o racismo se mantém mais vivo do que nunca no coração do principal país capitalista mundial, nos atos de defesa da supremacia branca na Virginia nos Estados Unidos, no discurso xenófobo e racista de Donald Trump, nas barreiras imigratórias perpetuadas pelos governos e pela burguesia europeia que primeiro afogaram o continente africano na mais profunda miséria e agora são os responsáveis pela morte de milhares de nossos irmãos negros na travessia do Mediterrâneo fugindo da fome e das guerras.

O racismo está mais vivo do que nunca no macabro rastro de sangue deixado pela polícia brasileira que assassina, tortura e humilha sistematicamente os negros em nosso país, e em um governo golpista que hoje quer fazer com que nós negros trabalhemos até morrer apertando a cada dia mais as correntes da escravidão assalariada e do trabalho precário.

Vídeo completo da intervenção de Marcello Pablito na Paraíba

Para iniciar gostaria de localizar a partir de onde estou me dirigindo pois durante os anos 90 o marxismo foi muito atacado pelo pensamento dominante como uma teoria ultrapassada para explicar e transformar a realidade. Com a chamada ofensiva neoliberal e a restauração capitalista na URSS e nos estados operários se tentou cristalizar a ideia, sobretudo na academia, de que o marxismo não tem qualquer utilidade para pensar o momento atual.

Em alguns espaços o máximo que se tolerou durante décadas foi um marxismo analítico, onde a luta de classes era uma ausente arrancando assim a alma dessa grande arma do proletariado mundial na luta pela sua libertação e tornando o algo inofensivo para decorar as citações e notas de rodapé. Em relação a questão negra não foram poucas as tentativas de manchar a história do marxismo como algo que não diz respeito a luta do povo negro. Parte desta operação para desqualificar o marxismo, levada a cabo por autores como o cubano Carlos Moore só foi possível recorrendo a grotescas falsificações históricas e tentando confundir o pensamento marxista com o stalinismo, deturpando e corrompendo a força da teoria, da ciência e da estratégia contida no marxismo revolucionário.

Falo portanto reivindicando as elaborações de Marx, Engels, Rosa Luxemburgo, Lenin e Trotsky e a experiência deixada em mais de 170 anos de lutas heroicas do proletariado mundial e do movimento socialista, reunidas no Manifesto Comunista, nas lições da Comuna de Paris, das revoluções de 1905, 1917 e na história da Primeira, Segunda Internacionais e da Internacional Comunista em seus quatro primeiros congressos, nas batalhas da Oposição de Esquerda Internacional e da IV Internacional, para quem a luta dos explorados e dos oprimidos pela destruição desse mundo de miséria sempre pulsou nas veias e foi seu motivo de existência. Parto também das elaborações geniais de dirigentes e revolucionários negros como CLR James, um dirigente trotskista que revelou ao mundo a primeira revolução negra vitoriosa onde os próprios negros puseram fim a dominação colonial da França e também a escravidão conquistando com os métodos revolucionários aquilo que a burguesia mesmo em sua fase revolucionária jamais poderia conceder aos negros. CLR James, militante trotskista e intelectual negro e revolucionário durante boa parte de sua vida, pode fazer isso justamente porque como marxista revolucionário enxergava o mundo com as lentes da luta de classes, lugar onde os negros sempre tiveram lugar na primeira fileira.

Trago essa questão não apenas por um excesso de zelo epistemológico mas porque esta fala é parte de um combate contra aqueles que querem a qualquer custo separar o marxismo, a classe trabalhadora e os negros, deixando assim estes reféns das estratégias de “empoderamento individual” ou no reconhecimento de sua identidade apenas na esfera do consumo, buscando apagar a palavra revolução do imaginário dos negros, transmitindo a ideia de que devem reiniciar sua caminhada sempre do zero, aumentando e, tornando assim ainda mais tortuoso o seu caminho para conquistar a liberdade e o fim da exploração e da opressão.

Racismo, capitalismo e revolução socialista

O racismo surge como o uma ideologia a serviço de justificar a escravização de milhões de negros arrancados a força do continente africano e comercializados através do tráfico que foi um dos pilares da acumulação primitiva de capitais que futuramente serão decisivos para o desenvolvimento da revolução industrial.

Sobre esse processo, Marx afirma:

A descoberta das terras auríferas e argentíferas na América, o extermínio, a escravização e o soterramento da população nativa nas minas, o começo da conquista e o saqueio das Índias Orientais, a transformação da África numa reserva para a caça comercial de peles-negras caracterizam a aurora da era da produção capitalista. Esses processos idílicos constituem momentos fundamentais da acumulação primitiva. (...) Os diferentes momentos da acumulação primitiva repartem-se, agora, numa sequência mais ou menos cronoló- gica, principalmente entre Espanha, Portugal, Holanda e França e Inglaterra. Na Inglaterra, no fim do século XVII, esses momentos foram combinados de modo sistêmico, dando origem ao sistema colonial, ao sistema de dívida pública, ao moderno sistema tributário e ao sistema protecionista. Tais métodos, como, por exemplo, o sistema colonial, baseiam-se, em parte, na violência mais brutal. Todos eles, porém, lançaram mão do poder do Estado, da violência concentrada e organizada da sociedade, para impulsionar artificialmente o processo de transformação do modo de produção feudal em capitalista e abreviar a transição de um para o outro. A violência é a parteira de toda sociedade velha que está prenhe de uma sociedade nova. Ela mesma é uma potência econômica. “

A escravidão existiu antes do intenso tráfico de escravos africanos em lugares como a Grécia e Roma Antiga, porém não se assentava em uma justificativa da inferioridade de um determinado grupo social fundamentada nas características físicas para justificar um negócio altamente lucrativo. No século XIX, na fase imperialista do capitalismo, o racismo cumpriu um papel decisivo para justificar a partilha e espoliação de todas as riquezas do continente africano, servindo assim para construir a riqueza das potências capitalistas como Inglaterra, França, Portugal, Bélgica, Alemanha e Itália.

Em todos esses momentos em que o racismo colocou a nu seu rosto tiveram uma resposta à altura nas rebeliões negras. CLR James aponta alguns desses momentos

O negro dócil é um mito. Escravos em navios escravistas se atiraram ao mar, fizeram longas greves de fome, atacaram as tripulações. Há registros de escravos que subjugaram a tripulação e tomaram o controle do navio levando-o até o cais, um feito de extraordinária audácia revolucionária. (...)

“ Na América, os negros organizaram cerca de 150 revoltas de destaque contra a escravidão. O único lugar onde os negros não se rebelaram é nos livros de historiadores capitalistas. Toda essa história revolucionária pode parecer uma surpresa para aqueles que, independentemente a qual internacional estejam filiados, seja a segunda, Terceira ou IV ainda não se emanciparam das mentiras perniciosas do capitalismo anglo-saxão, não é estranho que os negros tenham se rebelado, teria sido estranho se não o fizessem”

Porque o racismo sobrevive até os dias de hoje?

O capitalismo se apropria e se utiliza do racismo de variadas formas. Se nos séculos anteriores o racismo esteve a serviço de justificar a uma das piores aberrações da história da humanidade com a escravização de milhões de seres humanos, atualmente é uma ideologia que permanece completamente viva em nossa sociedade. Na sociedade capitalista, uma sociedade assentada na propriedade privada dos meios de produção como as terras, as fábricas etc, todas as riquezas acumuladas pela burguesia provém da apropriação privada e criminosa do trabalho produzido pelas mãos do conjunto da classe trabalhadora.

Nesta relação de exploração, de uma classe pela outra, o racismo entra como um fator fundamental da equação, pois permite ao capitalista pagar salários mais baixos, direitos inferiores aos trabalhadores negros, relegando-os aos trabalhos mais precários, ou seja, utilizar o racismo como um instrumento fundamental para ampliar a exploração ao permitir uma maior extração de taxa de mais-valia dos trabalhadores negros. No caso das trabalhadoras negras esta operação é ainda mais terrível, pois à exploração capitalista se soma o peso da opressão machista e racista que no fim lhes relega a pior localização social. Esta enorme extração de lucro, garantida pela combinação entre exploração e racismo é o que permite à burguesia nacional e internacional ampliar seus lucros

Esta história mostra que o racismo não é uma “ideia solta no ar”, uma determinação divina, natural ou uma característica moral com que os seres humanos já nascem e que tampouco pode ser derrotada. É uma ideologia que se associa de diferentes formas, aos interesses econômicos capitalistas, tem uma determinação histórica, e em uma realidade onde primam as relações capitalistas de produção e, consequentemente, a força de trabalho assalariada, o racismo se complexifica e se transforma em uma potente ferramenta de divisão da classe operária a serviço da burguesia, que fará com que negros e brancos explorados se vejam como rivais, brigando pelas migalhas que caem da mesa, enquanto a burguesia lucra cada dia mais sobre essa divisão, que impede que estes se unam contra ela, mas que assim como tudo na história pode nascer e pode também ser superado.

Entender isso nos mostra que não há como levar a cabo um combate consequente contra o racismo sem combater a exploração capitalista em seu conjunto.

Os altos índices de desemprego e o que poderíamos chamar de exercito industrial de reserva, aí também o racismo garante à burguesia um batalhão de homens e mulheres que lhe permite chantagear e reduzir os custos de produção com o conjunto da classe operária. Em todos os aspectos o racismo possibilita à classe dominante beneficiar-se da superexploração do trabalho, que empurra para baixo e força o salário do operário desça do valor dos custos “normais” de reprodução de sua força de trabalho. Assim, o racismo também opera no sentido do rebaixamento geral de todos os salários, pois ao superexplorar os negros a burguesia pode barganhar e rebaixar os salários e direitos do conjunto da classe trabalhadora.

Isso significa que o racismo, usado em primeiro lugar contra os negros, é um instrumento que permite à burguesia dividir os trabalhadores e atacar o conjunto desta classe. Significa também que este combate só poderá ser encarado seriamente se lutarmos de maneira intransigente pela unidade das fileiras operárias, entre brancos e negros para combater com um só punho a exploração capitalista e o racismo. Para isso é necessário uma ação consciente que se materialize em um programa que responda as principais questões que atingem os negros e sua organização politica correspondente, o que para nós é um partido revolucionário. Como revolucionários, valorizamos todos os combates ao racismo impulsionados por um sentimento genuíno de igualdade que se expressaram nas lutas do povo negro durante a história.

Em cada uma destas rebeliões e revoltas se colocava a nu a que ponto odioso e repugnante poderia chegar a humanidade sob um regime social baseado na opressão do homem pelo homem. Todas estas lutas trouxeram em si um enorme e latente potencial de subversão da ordem social e justamente por essa razão foram afogadas em sangue, para que fosse possível a manutenção da classe dominante no poder. Esta indignação e ódio ao racismo são um combustível que deve correr nas veias de todos que almejam um mundo livre das injustiças, da exploração e da opressão. Em um país racista como o Brasil, é extremamente progressivo que os negros afirmem sua identidade negra contra o mito da democracia racial e a hipócrita tese de que a miscigenação teria posto fim ao racismo. Ao mesmo tempo, apontamos que é necessária uma estratégia revolucionária para levar a frente o combate ao racismo, pois a cada passo se mostra que mesmo para alcançar muitas das reivindicações negras é necessário enfrentar-se diretamente com o capitalismo, com as instituições do Estado, suas leis e o aparato repressivo que assassina e aprisiona os negros. Isso é assim pois este sistema social já deu incontáveis mostras no passado e no presente de que não tem nada a oferecer além de opressão, sofrimento e miséria aos negros e ao conjunto da humanidade.

Racismo e luta de classes no Brasil

O Brasil é o maior país negro fora da África. Dos mais de 7 milhões de negros arrancados a força do continente africano, mais da metade foi trazido diretamente para o Brasil, que foi o país em que a experiência da escravidão negra perdurou por mais tempo do que qualquer outro país do mundo. Isso é o que está na origem de um pais em que mais de 53 % da população é negra e sofre na pele o racismo que se revela em todos os poros da sociedade.

A elite colonial brasileira que dará origem à burguesia nacional se forma como uma classe débil, sua base material está em uma economia agrária, que na divisão internacional do trabalho capitalista já surge espremida entre a submissão aos interesses das metropóles europeias, e as incontáveis rebeliões negras e populares que foram encaradas como um risco à constituição do próprio projeto de unidade territorial em que se baseia a ideia de um Estado brasileiro. Esse não é um aspecto menor pois é uma marca constitutiva da formação da burguesia brasileira, que se desenvolve sob a base de uma submissão e covardia que delimitam seu horizonte político, da incapacidade de defesa de seus próprios interesses contra a ingerência metropolitana, na medida em que para defender uma causa nacional e ter um perfil próprio teria que recorrer ao armamento das massas negras. Poderiamos dizer que, apesar de seu discurso critico à metropole a burguesia brasileira nasce e se desenvolve com mais medo da luta de classes e de uma revolução negra do que da submissão e mediocridade politica.

Assim, para sua perpetuação como classe dominante a elite brasileira desenvolve deram a cara das instituições do Estado brasileiro como a “cristalização de uma determinada relação de forças entre as classes sociais em nosso pais, utilizando para isso do grande peso do aparato repressivo um papel destacado para manter a subordinação dos “de baixo” mesmo que a custa de milhares de assassinatos, chacinas, e de escrever as linhas da história do Brasil com o sangue negro e indigena.

Para justificar isso, a burguesia brasileira se utilizou em um primeiro momento de justificativas que tentavam explicar a inferioridade dos negros recorrendo a argumentos biológicos. Ao contrário de imaginar que o racismo, como ideologia se enfraquece com o fim da escravidão, o racismo se aprofunda como uma ideologia a serviço da dominação capitalista, e não é outra base senão o “racismo científico” associada a ideia de civilização dos povos inferiores o que sustentará a dominação imperialista de todo o continente africano.

Com o desenvolvimento capitalista e novas relações de produção em que o trabalho assalariado livre se tornou uma forma mais lucrativa, o enorme peso social dos negros e a ausência de uma aristocracia operária, o racismo no Brasil teve que recorrer ao desenvolvimento de novas ideologias que permitissem à burguesia conseguir manter a sua débil dominação no Brasil como a democracia racial, uma ideologia que tenta sustentar a ideia de que o racismo não existiria mais pois em determinado momento os negros estariam em iguais condições que os brancos.

Diferentemente de outros países, onde a repartição das riquezas se dá de outra maneira, o Brasil é um pais semicolonial (tem sua independência formal do ponto de vista politico mas mantem uma enorme submissão do ponto de vista econômico e social), do ponto de vista politico o regime democrático nasce de forma precária, constituindo uma democracia degradada que volta e meia a relação entre coerção e consenso se coloca a olhos nus, predominando em muitos aspectos a coerção e efetivamente tendo muito pouco a oferecer do ponto de vista de concessões e do ponto de vista social a concentração de renda de um lado e a super-exploração de uma massa de trabalhadores composta por um importante setor de negros. A combinação entre a exploração capitalista e a opressão racista durante décadas pode dar um resultado extremamente explosivo e por isso é tão importante para a burguesia brasileira negar a existência do racismo.

A idéia de que “somos todos iguais” e de que o regime democrático é o representante de todos, pregada como pilares da democracia, e mesmo da igualdade entre negros e brancos no Brasil é corroída a cada passo, sobretudo em um país em que no passado, mesmo com o fim da escravidão a “desigualdade” de uma sociedade assentada na exploração se coloca a cada dia de forma mais escancarada.

Nesse momento a contradição entre “igualdade real” e formal é cada vez mais escancarada em país marcado profundamente pela desigualdade social, com mais de 14 milhões de desempregados, o aumento do custo de vida, os baixos salários e trabalho precários, a falta de transporte, saúde, moradia e educação de qualidade enquanto vêm na politica nacional um golpe institucional ser operado por uma ala da burguesia para aprofundar ainda mais estes ataques e na opressão sofrida pelos negros talvez seja onde é mais evidente esse nível de contradição, pois é uma esfera social onde não há qualquer igualdade e muito menos democracia.

Em todos os critérios que se queira adotar os negros são os que mais sofrem com esse sistema de exploração: são o alvo prioritário das chacinas policiais (de cada 10 mortes pela policia 9 são negros), recebem em média 40% a menos do que os trabalhadores brancos, as mulheres negras compõem a pior média salarial do país, são 64% entre os desempregados, e além de todos os negros econômicos e sociais são submetidos às mais diversas formas de violência social como se conhecem inúmeros casos de crianças que desde pequenas aprendem na escola, na família a andar com a cabeça baixa, se ver como inferiores na sociedade a ponto de serem tão recorrentes casos de crianças que tomam banho da cândida para diminuírem o peso negro que carregam na pele. O Brasil é o 4º pais com a maior população carcerária do mundo. Em 2013 eram 607.731 presos, sendo que destes 60% são negros e do total cerca de 40% estão presos sem qualquer julgamento, é também o pais com o maior exercito de empregadas domésticas do mundo.

Uma nova etapa da luta de classes e o questionamento a democracia branca e dos ricos

As manifestações de junho de 2013 trouxeram a tona o questionamento das instituições do regime podre e carcomido da democracia dos ricos sob a qual a burguesia brasileira mantém o seu domínio. De lá para cá vemos se desenvolver no país uma profunda crise dos mecanismos e engrenagens de dominação da burguesia que tem a legitimidade de suas instituições, partidos, figuras questionadas e desgastadas frente aos olhos dos trabalhadores, da juventude. O golpe institucional aprofundou essa percepção de forma avassaladora, quando a burguesia se utilizando de instituições racistas e reacionárias como o Judiciário, maneja o Estado ao seu bel prazer para atender da melhor forma os seus próprios interesses.
Com o questionamento das instituições que vem ocorrendo desde 2013 se abre um espaço privilegiado para a denúncia e o combate ao racismo.

O desgaste da democracia dos ricos que comentamos acima começam a criar fissuras, rachaduras na velha mascara da democracia por onde se pode enxergar a sua verdadeira essência: uma ditadura do capital sobre os trabalhadores que para se mantém age com mão de ferro, balas, fuzis e coturnos para manter a qualquer custo a dominação de um punhado de parasitas sobre a esmagadora maioria da população. Esse questionamento abre espaços “por baixo” em vários poros da sociedade em que o controle burguês não consegue chegar e corrói a democracia racial como uma das engrenagens de dominação burguesa no Brasil.

Um sintoma de como a própria burguesia vem buscando responder a questão negra no campo cultural, através da combinação entre reconhecimento de críticas ao racismo sem maiores consequências e propagação de ideologia, lidar preventivamente com a questão racial, tratando desse aspecto com uma força muito maior nos últimos tempos. Se internacionalmente talvez uma das maiores expressões disso tenha sido a premiação de Moonlight, mas também na quantidade chamativa de filmes e séries recentes que tratam da temática racial como The Get Down, Cara Gente Branca, 13ª Emenda, Black Panter, no Brasil as emissoras de televisão de massas como Globo vieram tratando sistematicamente a questão racial. Somente nos últimos meses transmitiram teleséries que têm apelo entre os negros como a série Raízes, Cidade dos Homens, Mister Brau. O peso do tema da mulher negra também se expressa tanto ideologicamente com o lançamento de dois importantes livros de Angela Davis no espaço de menos de um ano (Mulher, Raça e Classe e Mulheres, Cultura e Política) como politicamente nas Marchas das Mulheres Negras que reuniram mais de mil mulheres negras esse ano e o dobro disso no ano passado, além de figuras como Djamila Ribeiro que expressam como o reformismo vem buscando forjar novas figuras nesse terreno. Se expressam ainda, em outra medida, em setores de artistas que começam a assumir um perfil ligado à organização e combate ao racismo como Lázaro Ramos que chegou a articular em uma proposta de “partido político negro” chamado Frente Favela Brasil.

É aí onde se assenta a projeção de casos que poderiam ser “apenas mais um” e tenham uma repercussão muito maior como o desaparecimento de Amarildo, as bárbaras mortes de Claudia Ferreira, Luana Barbosa, Maria Eduarda e o encarceramento de Rafael Braga e mesmo a aprovação de cotas raciais em antros do racismo como a USP e a Unicamp.

O fortalecimento dessa identidade negra não impede que esse processo seja canalizado pela burguesia através da “comercialização da identidade negra” o aumento de propaganda como a venda de produtos para beleza, e transformando assim o corpo e a pele negra novamente em uma mercadoria. Esta operação é extremamente perversa pois “assimilando” A identidade negra “por cima” através de seu reconhecimento na esfera do consumo e do “empoderamento”, a burguesia aprofunda “por baixo” o processo de superexploração, opressão e embrutecimento (econômico e social) dos negros que são indiscutivelmente os maiores índices de precarização do trabalho, desemprego, média salarial, analfabetismo, assassinatos policiais e encarceramento.

Na luta pelas ações afirmativas nos Estados Unidos, por exemplo, a burguesia foi obrigada a fazer concessões a uma parcela dos negros, mas conseguiu preservar sua dominação de classe, o que mantém a esmagadora maioria dos negros ainda hoje na miséria. Isso para não mencionar outras saídas que defendem a ascensão dos negros a cargos de poder nas empresas e na politica, nos marcos da atual sociedade capitalista.

Do ponto de vista politico essa crise de representatividade, em que 53% da população é negra e apenas 6% dos políticos são negros, a resposta a esse fortalecimento da identidade negra pode ganhar contornos a esquerda, de fortalecimento de uma posição de questionamento profundo do sistema político, mas também expressões racialistas como o movimento “Reaja ou será morto” que, ao perder o norte estratégico de quais são os verdadeiros inimigos dos negros, como a burguesia e o Estado, orienta o combate dos negros ao ódio individual aos brancos, essa identidade pode levar a novas armadilhas de conciliação de classes como a Frente Favela Brasil no Rio de Janeiro, ou ainda a respostas a direita como a eleição de Fernando Holiday em São Paulo.

Identidade negra e luta de classes

Em outros materiais desenvolvemos a idéia de que a identidade negra se recoloca na situação nacional e internacional de diferentes formas em cada processo da luta de classes. Dizemos isso porque os processos de luta de classes liberam uma energia concentrada, oprimida e silenciada pela opressão racista. Trotsky dizia que aqueles que mais sofreram com o velho lutarão com mais energia pelo novo, no caso dos negros isso significa que nas batalhas da luta de classes isso muda a forma com que eles próprios se enxergam.

Se referindo à revolução haitiana, no texto que dá nome a este livro CLR James diz algo sintomático disso que estamos falando:

Os escravos, porem, recusaram a escutar as ameaças e nenhuma promessa foi feita a eles. Liderados do começo ao fim por homens que tinham sido escravos e não sabiam ler ou escrever, lutaram uma das maiores batalhas revolucionárias da história. Antes da revolução eles haviam parecido subhumanos. Muitos escravos eram chicoteados sob qualquer pretexto, até mesmo para se levantarem e se moverem de um lugar a outro. A revolução os transformou em heróis.

Nos últimos anos vem se desenvolvendo cada vez com mais força um processo tortuoso mas continuo em que a identidade negra vem se reafirmando cada vez mais e de diferentes formas. Quando as instituições do regime vem sofrendo um maior desgaste diante da crise orgânica, dos mecanismos de dominação da burguesia e onde os aspectos da identidade negra vem ganhando mais força uma tarefa para qualquer militante revolucionário deveria ser pensar como acelerar a experiência dos negros com a democracia burguesa e ajudar a fazer uma ponte entre esse questionamento e o nível de ilusões que os próprios negros ainda tem nesse sistema com as tarefas da revolução socialista. Falar da revolução sem pensar medidas concretas que ajudem a questionar a estrutura sobre a qual se assenta o racismo não resolve o problema.

Não podemos esperar que as instituições da própria burguesia ponham fim aos assassinatos, as chacinas e a impunidade e ao próprio racismo pois são coisas inerentes a uma sociedade estruturada sobre a miséria e a exploração. Dito de outra forma o racismo serve ao capitalismo e não vai acabar enquanto este modelo de sociedade não for destruída. Para conquistar esse objetivo é preciso encarar o combate ao racismo como parte de uma perspectiva de destruição do capitalismo. Para isso é necessário entender que a classe trabalhadora é uma classe fundamental tanto para a produção de todas as coisas da sociedade mas também porque detém em suas mão a potencialidade de paralisar a produção e o funcionamento da sociedade atacando a burguesia naquilo que é a essência de sua existência: o lucro.
Em um momento em que a classe trabalhadora entrou em cena como não fazia desde a década de 80, defendemos que não se trata dos trabalhadores lutarem apenas pelo salário e que os negros precisam avançar da luta pela liberdade a Rafael Braga e de cada denuncia correta do racismo cotidiano para se colocar a tarefa de lutar pelo poder, para derrubar a burguesia e assumir para si o rumo da sociedade.

Para isso é necessário superar todas as ilusões na democracia dos ricos e que os negros vejam que com a revolução eles não tem “nada a perder a não ser os seus grilhões”. Partimos do desgaste na democracia dos ricos, mas ainda em uma ilusão enorme nas instituições desse regime que se expressam no fato de muitos negros considerarem que a saída para as suas necessidades se daria através do voto em Lula em 2018, como se este fosse um mal menor, ignorando não apenas que ele foi responsável pelo aumento da terceirização no país (nos anos de lulismo o número de terceirizados passou de 4 para 12 milhões), o numero de jovens negros assassinados aumentou enormemente e também liderou a ocupação militar das tropas brasileiras no Haiti, que estão lá até hoje, o que colaborou para calar as vozes dos negros que tem em sua história a primeira revolução negra da história é o primeiro lugar do mundo a abolir a escravidão. É nesse sentido que propomos medidas que permitam fazer uma ponte entre a atual ilusão na democracia com as tarefas da revolução. Levantamos uma Assembléia Constituinte Livre e soberana imposta pela greve geral que permita aos trabalhadores e aos negros fazer uma experiência que revele a essência barbara e decadente escondida por trás da máscara de democracia dos ricos e da ideologia da democracia racial, que acelere e facilite o caminho a que milhões de negros em nosso país concluam a necessidade de destruir essa sociedade miserável e construir um o governo dos trabalhadores de ruptura com o capitalismo.

Uma Assembléia Constituinte permitiria que fossem os próprios negros se elegerem levando a frente as suas demandas e não este políticos corruptos, que com a reforma politica querem impedir que os próprios negros tenham a mínima voz no parlamento. Estes representantes deveriam receber o mesmo salário que um professor para que a luta não se tornasse um negocio e uma carreira descolada dos interesses daqueles que o elegeram deveriam ser poderiam ser controlados pelos trabalhadores e oprimidos e se não cumprissem com seu mandatos deveriam ser imediatamente destituídos. Se eleitos poderiam levar uma luta em comum com os trabalhadores brancos para que esta Assembleia Constituinte votasse a anulação da reforma trabalhista e a lei de terceirização que permite a burguesia tratar os negros como semi-escravos até os dias de hoje. Poderia aprovar medidas elementares reais de “igualdade” que é O IGUAL SALÁRIO PARA TRABALHADORES NEGROS E BRANCOS, HOMENS E MULHERES, EFETIVOS E TERCEIRIZADOS, a efetivação dos terceirizados sem a necessidade de concurso público. Um plano de obras públicas para que os negros não sejam obrigados a se amontoar nas favelas e morros, saúde de qualidade e educação, mas para isso será necessário acabar com o pagamento da divida pública. Poderíamos colocar como uma demanda dessa ACLS a liberdade imediata a todos os presos sem julgamento e outras demandas como o fim da perseguição as religiões de matrizes africanas.

Marxismo revolucionário e por que os negros devem tomar o poder?

Marxismo revolucionário é uma teoria de explicação cientifica da realidade, uma ideologia e sobretudo uma estratégia para a emancipação do conjunto da humanidade. Como já havia anunciado não estamos tratando aqui do stalinismo que, tanto no terreno da analise, mas principalmente no da política e da estratégia significou a traição da revolução russa, e de processos como a revolução alemã em 1923, a revolução chinesa em 1924, a greve geral na Inglaterra em 1926, e também os enormes anseios revolucionários das massas negras na África e no Brasil, mostrando que aos negros não tem nada a oferecer. Partimos aqui da trajetória do marxismo que tratou da questão negra em vários momentos como o IV Congresso da Internacional Comunista (um momento em que o stalinismo ainda não havia conseguido corromper o seu caráter revolucionário) em que a resolução sobre o combate ao racismo partia da seguinte consideração:

“A história dos negros americanos preparou-os para desempenhar um papel importante na luta de libertação de toda a raça Africana. Há 300 anos, os negros Americanos foram arrancados da sua terra natal Africana, transportados para a América em navios negreiros e, em condições indescritivelmente cruéis, vendidos como escravos. Por 250 anos, eles foram tratados como gado humano, sob o chicote do feitor Americano. O seu trabalho limpou as florestas, construiu as estradas, cultivou o algodão, construiu as ferrovias nas quais repousa a riqueza da aristocracia do sul dos EUA. A recompensa para seu trabalho era o analfabetismo, a pobreza e a degradação. Os negros não eram escravos dóceis; a sua história é cheia de revoltas, rebeliões, e uma luta clandestina pela liberdade, mas todos os seus esforços para se libertarem foram violentamente reprimidos. Eles foram torturados, enquanto a imprensa burguesa justificava a sua escravidão.

Quando a escravidão se tornou num obstáculo que impede o desenvolvimento pleno e irrestrito da América para o capitalismo, quando esta escravidão entrou em conflito com a escravidão do trabalho assalariado, ela teve que ceder. A guerra civil, que não era uma guerra para a emancipação dos negros, mas uma guerra para a preservação da hegemonia industrial do Norte, confrontou os negros com uma escolha entre o trabalho forçado no Sul e a escravidão salarial no Norte. O sangue, suor e lágrimas dos "emancipados" negros ajudaram a construir o capitalismo Americano, e quando o país, que agora se tornou uma potência mundial, foi inevitavelmente puxado para a [primeira] Guerra Mundial, os negros Americanos ganharam igualdade de direitos com os brancos... para matar e para morrer pela "democracia". Quatrocentos mil proletários de cor foram recrutados para o exército Americano e organizados em regimentos especiais. Estes soldados negros mal tinham retornado do banho de sangue da guerra antes de serem confrontados com a perseguição racial, linchamentos, assassinatos, a negação dos direitos, a discriminação e desprezo geral. Eles lutaram, mas pagaram caro pela tentativa de fazer valer os seus direitos humanos. A perseguição de negros tornou-se ainda mais difundida do que antes da guerra, e os negros mais uma vez aprenderam a "conhecer o seu lugar". O espírito de revolta, inflamado pela violência pós-guerra e da perseguição, foi suprimido, mas os casos de crueldade desumana, como os eventos em Tulsa City em Oklahoma (cena de um massacre em 1921) ainda incendeia os ânimos novamente. Isto, somado à industrialização da pós-guerra dos negros no Norte, coloca os negros Americanos, em especial os do Norte, na vanguarda da luta pela libertação dos negros.

A Internacional Comunista está extremamente orgulhosa de ver os trabalhadores explorados negros resistindo aos ataques dos exploradores, uma vez que o inimigo da raça negra e o inimigo dos trabalhadores brancos é o mesmo — o capitalismo e o imperialismo. A luta internacional da raça negra é uma luta contra o inimigo comum.

Para concluir que:
1. O IV Congresso considera essencial apoiar todas as formas do movimento negro que visam minar ou enfraquecer o capitalismo e o imperialismo ou impedir a sua expansão.
2. A Internacional Comunista lutará pela igualdade racial de negros e brancos, por salários iguais e igualdade de direitos sociais e políticos.
3. A Internacional Comunista fará todo o possível para forçar os sindicatos a admitirem trabalhadores negros onde a admissão é legal, e vai insistir numa campanha especial para alcançar este fim. Se esta não tiver êxito, ela irá organizar os negros nos seus próprios sindicatos e então fazer uso especial da táctica da frente única para forçar os sindicatos gerais a admiti-los.
4. A Internacional Comunista vai tomar imediatamente medidas para convocar uma conferência ou congresso internacional negro em Moscovo.

Travar um combate consequente contra o racismo, portanto na tradição do marxismo revolucionário significa batalhar para que as organizações da classe operária e seus sindicatos assumam as demandas dos negros como parte integrante e fundamental de seu programa de reivindicações, superar a separação que ocorreu historicamente entre as demandas econômicas e as demandas politicas e priorizar a defesa dos setores mais oprimidos dentro da própria classe operária.

Parte deste combate passa por ver o papel que os negros tiveram na história da luta de classes, o seu papel no interior da própria classe trabalhadora e superar a divisão no seio da própria classe trabalhadora entre brancos e negros e, para isso, assumir um programa levante a igualdade de direitos e salários entre trabalhadores brancos e negros, a efetivação dos trabalhadores terceirizados sem a necessidade de concurso público, assim como a igualdade de todos os direitos civis, o fim das chacinas policiais, o fim da perseguição religiosa e cultura de matrizes negras.

Este combate é parte de uma estratégia para que os trabalhadores assumam em suas mãos a defesa de todos os setores oprimidos da sociedade, pois são a única classe capaz de usar sua localização estratégica, centros nervosos da produção e circulação de mercadorias, para arrancar das mãos da burguesia o poder.

Significa também entender que estratégicamente os métodos de auto-organização, democráticos da classe trabalhadora, como as assembléias por local de trabalho e como foram os conselhos operários em momentos revolucionários são a melhor forma de que os oprimidos possam tomar em suas próprias mãos o seu futuro e, no caso dos negros possam desenvolver plenamente a sua identidade.

Uma estratégia revolucionária passa por construir um programa de completa independência de classe frente à burguesia nacional e internacional e a todas as suas instituições, que tenha como objetivo a tomada do poder politico, para que seja o proletariado, organizado no poder, o sujeito da organização de uma nova sociedade, livre da exploração sob os escombros da atual. A respeito disso há uma passagem deste livro que gostaria muito de ler aqui brevemente:

Em Flint durante as greves com ocupação de dois anos atras, setecentos brancos do sul, embebidos desde a infância no racismo, se encontraram cercados no prédio da General Motors com um negro entre eles. Quando chegou a hora da primeira refeição, o negro, sabendo quem e o que seus companheiros eram, se postou ao fundo. Imediatamente foi proposto que não deveria haver discriminação racial entre os grevistas. Setecentas mãos se levantaram juntas. Diante de seu inimigo de classe os homens reconheceram que o racismo era algo subordinado e que não se poderia permitir que atrapalhasse sua luta. O negro foi convidado a sentar-se primeiro e depois que a vitória foi alcançada, na triunfante marcha para fora da fábrica, foi concedido a ele lugar de destaque. Esse é o prognostico do futuro. Na África, na América, no Caribe, em uma escala nacional e internacional os milhões de negros erguerão suas cabeças, deixarão de estar ajoelhados, e escreverão alguns dos mais massivos e brilhantes capítulos da história do socialismo revolucionário.”

Tomar o poder para revolucionar o conjunto da sociedade

A revolução socialista acabaria imediatamente com o racismo? Ao contrário de uma visão dogmática que poderia vender a ilusão de que a tomada do poder acabaria imediatamente com o racismo, vemos os processos revolucionários que conduziram a classe operária e os setores oprimidos ao controle do poder politico não acabam com as contradições e a luta de classes automaticamente, mas permitem criar outro patamar sobre o qual poderemos livrar a sociedade da exploração e opressão do homem pelo homem.

O que vale ressaltar aqui são os novos desafios que surgem a partir da existência de um Estado que trate de dirigir os recursos nacionais e sua posição na ordem internacional em defesa dos interesses da classe trabalhadora, das mulheres, da juventude e dos povos oprimidos dentro e fora de suas fronteiras.

A conquista das demandas e dos anseios que foram a motivação da insurreição implica, a transformação das relações de propriedade e do conjunto das relações de produção. Entraria por exemplo, na conquista do acesso à terra, e a destruição do latifúndio, ou para garantir moradia digna a todos arrancar dos capitalistas o controle imobiliário das cidades. Para que as mulheres possam participar plenamente da vida social e política da nova ordem, é necessária a implementação de uma série de medidas como construção de refeitórios, creches de período integral, lavanderias de acesso público, entre muitas outras.

O desmonte das relações de propriedade existentes no capitalismo iniciam uma fase completamente nova da construção de uma nova sociedade. Ao mesmo tempo, a defesa militar e política das fronteiras da revolução é essencial, e é dessa garantia que depende o aprofundamento da revolução.

A vida tal como era antes não pode mais existir. A revolução não subverte somente a ordem econômica e política, mas também a social e moral. Com ela inicia-se um período de profundas transformações sociais e culturais, que, com a do poder pela classe trabalhadora, significaria que a luta contra a opressão racial toma um sentido muito mais concreto, amplo e profundo.

A ditadura do proletariado leva a luta contra a opressão racial a um nível impossível de ser alcançado em uma sociedade dirigida por um Estado a serviço do capitalismo. Ao discutir os desafios da transformação da moral e dos costumes na Rússia socialista, Trotski aponta a relação entre bases econômicas, poder político e costumes. O que ele trata como moral pode ser entendido de uma maneira ampla, na qual esteja incluída a superação do racismo.

Somente a tomada do poder pela classe operária cria as premissas para uma completa transformação da moral. A moral não pode ser racionalizada, não pode existir em harmonia com as exigências da razão, a não ser que a produção seja, ao mesmo tempo, racional, uma vez que as raízes da moral jazem na produção. O socialismo aponta parta subordinar toda a produção à razão humana. Mas inclusive os pensadores mais avançados tem se limitado às ideias da técnica de racionalizar por um lado (através da aplicação da ciência natural, da tecnologia, da química, das invenções e das máquinas) e a política por outro (através do parlamentarismo); mas não tem tratado de racionalizar a economia, que continua sendo presa de uma competição cega. Dessa maneira, a moral da sociedade burguesa continua subordinada a um elemento cego e não racional.” (Trotski, Para la transformación de la moral)

O racismo é parte integrante da sociedade capitalista; sua extinção é impossível sem uma transformação cultural profunda, que afete não somente as relações raciais mas o conjunto da cultura que se produz e reproduz em uma sociedade voltada à realização de mercadorias. E tão mais abrangente e libertadora será esse transformação quanto mais impacto positivo exercer sobre aqueles que hoje mais sentem as cadeias capitalistas: negras, negros, membros de raças oprimidas, mulheres, a comunidade LGBT, crianças e idosos.

Todas essas experiências mostram que a fusão entre o marxismo revolucionário e os processos de luta negra e da classe trabalhadora mundial são elementos decisivos para que possa emergir um partido revolucionário com influencia de massas que aponte um caminho a heróica luta negra no Brasil e internacionalmente. Em nosso pais nós não partimos do zero mas de heróicos processos de luta como já se mostraram em processos como os Quilombos dos quais Palmares é o maior símbolo, mas também na revolta dos malês, na conjuração baiana, na revolta de Canudos, na revolta da vacina, na revolta da chibata nas lutas negras no campo e na cidade durante a ditadura e no papel que os negros tiveram nas greves operarias dos anos 70 e mais recentemente nas greves gerais de 15 de março, 28 de abril e 30 de junho.

Alguém poder concluir corretamente que a tomada do poder em um país de maioria negra, mais de economia atrasada como é o Brasil não solucionaria todos os problemas, pois a burguesia seguiria dominando o restante do mundo e a experiência da revolução russa já mostrou o quanto é utópica a idéia do socialismo em um só pais, por isso vemos a tomada do poder em um pais como uma barricada da revolução internacional e mundial, e seria uma injeção de energia, animo e moral revolucionária para os negros em todo o mundo. Significaria também que ao se colocar a tarefa de destruir o capitalismo os negros poderiam contribuir de forma decisiva para o a emancipação do conjunto da humanidade, é nessa perspectiva que colocamos cada um dos nossos avanços como organização revolucionária no Brasil que chamo todos a que tem acordo com estas idéias nos ajudarem na tarefa apaixonante de construir.

Saudações negras e revolucionárias




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