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MULHERES | Que os capitalistas paguem pela crise

Teses sobre a luta das mulheres e o movimento feminista diante do governo Bolsonaro no Brasil do golpe institucional. É preciso tirar lições para resgatar um feminismo socialista, revolucionário, anti-imperialista, antirracista, da classe trabalhadora e pela diversidade sexual.

quarta-feira 6 de março de 2019 | Edição do dia

2019 marca a entrada de um governo misógino no Brasil: o governo de Jair Bolsonaro, inspirado em Donald Trump, que nos Estados Unidos provocou a ira de milhões e levou às ruas centenas de milhares de mulheres. Este governo consolida o golpe institucional, cujo objetivo é implementar um duro plano de ajustes no qual a reforma da previdência é o principal ponto. Estes são ataques que se combinam às mazelas que o povo pobre e trabalhador já vive no Brasil. Com a polícia mais assassina do mundo, a liberdade para matar negros e negras irá aumentar com o pacote “anticrime” do Ministro Sérgio Moro. Com a ânsia de lucro dos capitalistas, à qual Bolsonaro irá responder com ajustes, os trabalhadores pagam com suas vidas debaixo da lama, como vimos em Brumadinho, Minas Gerais.

Manifesto impresso publicado em 01/03

Bolsonaro, além disso, tem um alvo particular: as mulheres, os negros e as LGBTs. Em seu discurso de posse, Bolsonaro anunciou que irá fazer de tudo para acabar com a chamada “ideologia de gênero” nas escolas, em entrevistas declarou que as mulheres devem ganhar salários menores que os homens, e ficou “famoso” por ter dito a uma deputada federal do PT que não a estuprava porque ela não merecia. Indicou, para o Ministério da Família e dos Direitos Humanos, uma mulher que recorrentemente ataca os direitos das mulheres, Damares Alves, que defende que as mulheres usem cor-de-rosa, e não azul, e que não podem ter o direito sobre seus próprios corpos. Com ela, há várias mulheres reacionárias no poder: Joice Hasselman, Janaína Paschoal e várias outras figuras do golpe institucional. É seu partido, o PSL, que diz que política não é lugar de mulher e desengaveta mais uma PEC “da vida” contra o direito ao aborto.

Contra estes representantes reacionários na política nacional, nos levantamos apoiadas no enorme movimento de mulheres internacional que veio como uma onda imparável em todo o mundo, com as mulheres contra Trump, a maré verde na Argentina, as manifestações multitudinárias e paralisações internacionais no 8 de março, com destaque para a confluência com a luta pela autodeterminação da Catalunha, as manifestações pelo direito ao aborto na Irlanda e em vários outros países. No Brasil, fomos milhares de meninas e mulheres questionando o patriarcado, lutando por justiça à Marielle, rechaçando os políticos que destilavam misoginia e buscando lutar e nos organizar pelos nossos direitos.

Das jornadas de junho de 2013 até a Primavera Feminista e o movimento #EleNão, também vimos paralelamente o fortalecimento do autoritarismo judiciário, o golpe institucional, a prisão arbitrária de Lula e a ascensão da extrema-direita ao governo. Todos esses são acontecimentos que buscam levar a situação política mais à direita, para aumentar a taxa de exploração capitalista através dos ajustes. Essa é a consequência da crise econômica internacional, combinada de maneira cruel com todas as formas de opressão, que atuam como mecanismos para manter a dominação de classe ao dividir a classe trabalhadora. Além disso, essa extrema-direita tem um profundo caráter misógino, racista, e têm ódio da geração de meninas que na adolescência já começam a entender que eles querem nos tirar tudo. Por isso, é preciso tirar lições e debater com qual estratégia vamos enfrentar o patriarcado e o capitalismo com as mulheres à frente.

Crise internacional como ponta de lança para o fenômeno internacional de mulheres

Qual foi a antessala deste fenômeno internacional de mulheres? Podemos dizer que um importante componente foi a abertura, em 2008, de uma crise econômica de proporções históricas. Essa crise se deu em meio à decadência do capitalismo neoliberal, com sua incapacidade para recompor um ciclo global de crescimento econômico. Como em geral acontece, a crise também foi tornando evidente que cada direito conquistado não era eterno, mas estava sujeito a cortes e retrocessos que poderiam ser impostos pelos governos e instituições internacionais. Ao mesmo tempo, as mudanças na correlação de forças nesta disputa, sobre “quem vai pagar a crise”, aumentam a polarização social, o que faz ressurgir com maior força os setores mais reacionários e sua xenofobia, LGBTfobia, racismo e misoginia.

Essa crise veio após muitos anos de neoliberalismo, onde a ideia de que a classe trabalhadora havia chegado a seu fim foi o centro de uma ofensiva para retirar do imaginário das massas a palavra revolução – usando o stalinismo para identificar o comunismo como uma ideia autoritária. Nesse contexto, muita demagogia foi dirigida aos movimentos sociais, buscando fazê-los crer que o capitalismo poderia responder às demandas das mulheres, dos negros e dos LGBTs. Este processo tinha como objetivo, por um lado, esvaziar o conteúdo radical das justas reivindicações dos setores oprimidos, e, por outro, separar estes movimentos da classe trabalhadora. Podemos chamar esse movimento de “disputa por hegemonia”.

Entretanto, a igualdade perante a lei não é a igualdade perante a vida, e o neoliberalismo sequer nos relegou a igualdade perante a lei. Algumas importantes feministas analisaram esse momento. Nancy Fraser, importante intelectual e parte do feminismo dos 99%, veio levantando a tese de que o movimento feminista conseguiu direitos e uma autoconscientização em alguns setores, mas se mostrou incapaz de transformar a sociedade pela raiz. Andrea D’Atri, fundadora do grupo de mulheres Pão e Rosas na Argentina, veio demonstrando a insuficiência da ampliação de direitos, geralmente retirados nos momentos de crise, e apontando a necessidade de as mulheres superarem a luta de resistência “fragmentada”, lutando por uma estratégia para vencer com a classe trabalhadora.

No Brasil, o desdobramento deste processo de crise econômica foi, em primeiro lugar, o desenvolvimento de uma crise orgânica profunda1 que desembocou em um dos maiores movimentos de massas do país desde a redemocratização, as chamadas jornadas de junho. Neste momento, as demandas democráticas começaram a entrar em cena com mais força, em especial num forte grito contra o racismo e a violência policial, que teve como símbolo o pedreiro Amarildo, assassinado pelo estado. No ano seguinte, uma onda de greves operárias tomou a cena. A crise orgânica seguia aberta, dando espaço para um crescente protagonismo do poder judiciário, uma das únicas instituições que ainda mantinha algum tipo de prestígio. O judiciário, então, encabeçou com todos os setores de direita e o apoio dos militares, o golpe institucional. Ainda assim, tiveram que lidar com a maior paralisação nacional das últimas décadas, e lutas de resistência aos ataques, em especial à reforma da previdência. Para entender os paradoxos do movimento feminista no Brasil, façamos uma breve análise do recém empossado governo Bolsonaro.

A “era” Bolsonaro é fruto do golpe institucional, para aplicar ataques econômicos e retirar direitos democráticos

O governo de Bolsonaro é herdeiro do golpismo institucional, que se instalou no país nos últimos anos, para atacar as condições de vida dos trabalhadores e aumentar a espoliação do Brasil pelo capital estrangeiro, cortando direitos sociais e avançando na privatização dos recursos naturais e das empresas públicas, como a Vale e a Petrobrás. Um golpe que deixou como ferida aberta o assassinato de Marielle Franco. A chegada de Trump na Casa Branca, e a ascensão de tendências nacionalistas nos países centrais, colocaram no centro a disputa entre "Estados-nação" em detrimento das "tendências globalizadoras". É nesse cenário mundial que o capital financeiro internacional tenta, a todo custo, impor uma subordinação ainda maior às economias dependentes, como a América Latina, usando sua influência sobre o poder judiciário em vários países para, por trás de um suposto “combate à corrupção”, aumentar a exploração e destruir os direitos dos trabalhadores e do povo pobre, e ganhar com a privatização de estatais e recursos naturais. A ingerência e ofensiva imperialista na Venezuela é o ponto mais alto dessa política, exigindo uma postura claramente anti-imperialista por parte do movimento feminista, com o rechaço aos planos de Trump e Guaidó, sem no entanto dar nenhum apoio político ao governo autoritário de Nicolás Maduro.

No Brasil, essa ofensiva imperialista se materializou principalmente na Operação Lava Jato, conduzida por Sérgio Moro, uma gigantesca manipulação política do poder judiciário. Esse crescente autoritarismo do poder judiciário, em associação com os grandes meios de comunicação de massas para pressionar o parlamento e a opinião pública, passou a contar com o apoio cada vez maior do Alto Comando Militar, também agora no governo Bolsonaro.

Bolsonaro foi se transformando no principal representante político do “antipetismo”, graças à decadência dos principais partidos tradicionais de direita. Além disso, capitalizou o apoio de um amplo espectro da população - em sua grande maioria de cunho religioso, com destaque para as igrejas evangélicas - que rechaça os avanços do movimento feminista internacional no que diz respeito às transformações de valores e da cultura, vendo por exemplo na Rede Globo um símbolo desta verdadeira “destruição da família tradicional brasileira”. Isso, combinado com a demagogia de Bolsonaro contra a corrupção (como se fosse um “outsider” e não parte da política tradicional há décadas) e pela segurança pública (inclusive com a promessa de facilitar o porte de armas), permitiu que ele emergisse dialogando com essas três grandes “feridas sociais”, capitalizando assim o espaço político da direita tradicional.

Ainda assim ele não tem um cheque em branco. Quanto mais rápido for o ritmo das medidas antipopulares de Bolsonaro, mais aceleradamente setores de trabalhadores e pobres que votaram nele, em função de sua demagogia eleitoral, vão se decepcionar. Os que quiseram se enganar consumindo "fake news" verão que Bolsonaro falava sério quando dizia que os trabalhadores terão que escolher entre entregar seus direitos ou ficar sem emprego. É neste Brasil que precisamos pensar a atuação do movimento feminista. Para isso, resgatemos o processo da chamada primavera feminista.

A primavera feminista no Brasil do golpe institucional

A luta pelos direitos dos setores oprimidos passou a ter mais força depois das jornadas de junho de 2013. Ainda assim, já era notável uma mudança nos “valores” e “comportamentos”, que era reflexo justamente da ofensiva neoliberal que, enquanto atacava as massas trabalhadoras, incorporava algumas demandas parciais das mulheres, dos negros e das LGBTs. Isso resultou em mudanças na ação de empresas, e na própria mídia, já que comportamentos abertamente machistas, racistas e LGBTfóbicos passaram a ser condenados por parte da opinião pública, mas também porque os setores oprimidos passaram a ser encarados como uma espécie de “nicho de mercado”.

Para fazer um resgate da primavera feminista no Brasil, podemos dizer que ela combinou vários momentos: repúdio às declarações machistas e homofóbicas de políticos de direita, como Marco Feliciano do projeto da “Cura Gay”, que era base do governo do PT, em 2013; o rechaço ao Congresso mais reacionário do último período, eleito em 2014, com um fortalecimento da bancada da bíblia, da bala e do boi; protagonismo das meninas nas ocupações de escolas em 2015; enorme repúdio aos números alarmantes de assassinatos de mulheres e de violência de gênero, com um grande destaque ao estupro coletivo ocorrido no Rio de Janeiro em 2016; a reação a leis reacionárias impulsionadas em especial por Eduardo Cunha, para restringir ainda mais o direito ao aborto em 2016; a participação nas manifestações da Paralisação Internacional das Mulheres no 8 de março de 2017 e 2018; e o amplo movimento #EleNão contra Bolsonaro.

Com exceção do movimento #EleNão, nenhum deles foi de fato massivo nas ruas, mas a extensão do fenômeno que já existia no Brasil, a busca por parte da mídia e de algumas empresas por cooptar este fenômeno, inclusive como nicho de mercado, e os movimentos mais massivos a nível internacional, abriram espaço para que mesmo ações de vanguarda, com algumas dezenas de milhares, tivessem uma repercussão grande. É fundamental remarcar que, durante todo esse processo, as mulheres jovens cumpriram um papel de enorme destaque, mostrando uma nova geração que assumia a luta feminista contra os velhos preconceitos da sociedade patriarcal.

Nós, do Pão e Rosas, atuamos em cada um destes processos. Participamos do rechaço aos políticos da direita como Marco Feliciano e Eduardo Cunha, mas também denunciando que eram base do governo do PT, e que a busca por uma suposta “governabilidade” abria espaço para a direita. Fomos parte das manifestações contra toda forma de violência no país, da luta secundarista, da Paralisação Internacional de Mulheres e do movimento #EleNão. Encabeçamos com muita força a batalha para trazer a maré verde da Argentina para o Brasil, na luta pelo direito ao aborto legal, seguro e gratuito. Em cada um destes processos, nossa batalha foi a mesma: massificar o movimento de mulheres, e lutar para que as mulheres trabalhadoras estivessem na linha de frente, ao mesmo tempo em que não diluímos nossas bandeiras, e não aceitamos que nossos direitos fossem entregues como moeda de troca.

Por isso, além de levantar cada demanda mais elementar na luta das mulheres, buscamos sempre colocar com força a necessidade do movimento de mulheres se aliar à classe trabalhadora, e se posicionar contra o autoritarismo judiciário e o golpe institucional. Ao mesmo tempo, batalhamos nos sindicatos e locais de trabalho em que estamos, para que os sindicatos levantassem as demandas das mulheres, com um programa que desse uma resposta para a opressão e a exploração que sofrem as mulheres trabalhadoras, como a luta pela efetivação de todas as terceirizadas sem necessidade de concurso público, e pela igualdade salarial entre negras e brancas, entre homens e mulheres. Batalhamos também por respostas mais profundas, como a exigência de creches para toda a demanda, lavanderias e restaurantes em todos os locais de trabalho financiados pelas empresas, e também em locais de estudo e nos bairros oferecidos como serviços públicos, para enfrentar a naturalização de um trabalho doméstico invisível que cai sobre as costas das mulheres. Para nós, essa batalha sempre esteve ligada à luta pela auto-organização dos trabalhadores, com as mulheres à frente, para recuperar as organizações de massas e combinar a luta contra a opressão com a luta contra os ataques dos governos.

Em todos estes momentos, buscamos alertar sobre o perigo de aceitar a separação entre o movimento de mulheres e o movimento operário. Esse perigo vai percorrer todo este processo, pois a separação entre as demandas democráticas das mulheres, dos negros e das LGBTs, e as demandas políticas e econômicas, ou seja, a luta contra os ataques econômicos e contra a retirada de direitos que dizem respeito ao conjunto da população pobre e da classe trabalhadora, só podem enfraquecer a nossa luta. Não era possível enfrentar verdadeiramente Eduardo Cunha sem vincular a luta das mulheres ao enfrentamento ao golpe institucional – mas naquele momento, figuras do próprio movimento feminista levantavam a bandeira “Viva a Lava Jato”, como figuras do MES-PSOL, apoiando desta forma um dos pilares do golpe institucional.

Em alguns momentos, vimos o STF ser considerado (também por parte de um setor do movimento feminista) um aliado das mulheres, por exemplo, quando tomou posições progressistas em relação ao tema do aborto, ao mesmo tempo em que votava pelo corte de salário nas greves do funcionalismo público. O próprio movimento #EleNão, era tão amplo que abarcava mulheres como Kátia Abreu, uma representação das oligarquias latifundiárias no Brasil, a ecocapitalista Marina Silva, patrocinada pelo Banco Itaú, e até mesmo a escravagista Ana Amélia, que de distintas maneiras buscavam se apropriar do impulso de luta das mulheres para seus próprios interesses capitalistas, sendo bem recebidas por setores do movimento, deixando evidente a necessidade imperiosa de se ter uma delimitação de classe em nossa luta.

O impacto do movimento internacional de mulheres no Brasil, e estes processos que compõem a primavera feminista, trouxeram muitas ideologias, várias delas pós-modernas, sobre o direito das mulheres, mas pouco debate de estratégias. Na realidade, se incentivava uma luta pelos direitos das “mulheres em geral”, que aos poucos foi levando a que se priorizasse duas agendas de reivindicações: a luta por mais espaço no parlamento, e a luta por justiça e mais policiamento contra a violência de gênero. O problema é que estas são duas demandas que não somente se restringem aos limites das instituições, como depositam enorme confiança no Estado, que é capitalista – voltaremos a analisar esta questão em seguida. Por isso, devemos analisar que o desenvolvimento da primavera feminista no Brasil veio praticamente paralelo ao desenvolvimento do golpe institucional e do início do bonapartismo judiciário. Lutas que por muitas vezes ficaram separadas, justamente porque não se enxergava como parte de uma só luta, ou, melhor dizendo, porque as direções dos movimentos preferiam que estivessem separadas.

É preciso analisar os avanços que estavam em curso, que, como apontava Nancy Fraser, não são desprezíveis em si mesmos para as mulheres, ao contrário, são parte da nossa luta contra o patriarcado. Entretanto, se colocaram importantes limites: como não haver uma massificação do movimento desde as bases das estruturas produtivas (nas fábricas, escolas, universidades), as mulheres trabalhadoras ainda não serem linha de frente, e a manutenção dessa separação entre a luta pelos direitos das mulheres e a luta contra o golpe institucional e os ataques econômicos. Tudo isso contribuiu para que o movimento ficasse muito mais no âmbito cultural, de valores e comportamento, sem alterar a correlação de forças no país – o que exigiria o necessário caminho da luta de classes.

Diante da ascensão de Bolsonaro, é preciso discutir com qual estratégia vamos lutar pelo direito das mulheres, e enfrentar toda essa nova situação política no país.

O bolsonarismo também foi uma reação à luta das mulheres

O avanço a passos largos do golpe institucional não significou, de imediato, um retrocesso neste amplo processo anterior de conquistas do movimento feminista. Quando dizemos conquistas, não estamos tratando apenas das concessões que o Estado e os governos vez ou outra necessitam dar, mas também dos avanços do ponto de vista da chamada “batalha cultural”, dos valores e costumes, que passaram a ser encarados de outra forma, ainda que o patriarcado siga existindo.

Um paradoxo desta situação é o papel da Rede Globo. Durante os últimos anos a Rede Globo esteve aliada com Sérgio Moro e foi o principal veículo da imprensa que encabeçou o golpe institucional com o impeachment de Dilma. Porém, ao mesmo tempo em que fortalecia as ações autoritárias do judiciário, ações reacionárias como a “Lava-Jato” e políticas de ataques aos trabalhadores, que pesaram duplamente sobre as mulheres, a Globo colocava em suas novelas e programas de TV temas relacionados à realidade dos transgêneros, à violência doméstica, ao racismo, e exibia programas que tratavam de tabus do sexo e com figuras “do movimento”. Seus programas de humor passaram a fazer piadas muito mais engajadas e contra políticos. Foi também a emissora que mais reproduziu propagandas que dialogavam com este fenômeno de mulheres como nicho de mercado. Sem analisar este paralelo entre golpe institucional e movimento feminista, não se entende como pode ser que a Rede Globo tenha sido um dos pilares do golpe institucional e agora virado supostamente “inimiga” do governo Bolsonaro. Mas o fato é que o objetivo da Rede Globo com o golpe institucional sempre foi levar adiante as reformas e ataques que o PT não levou até o final, e que Michel Temer tampouco foi capaz de terminar. Mas querem fazer isso com a cara progressista de quem está conectado com a luta das mulheres, resguardando um dos pontos fundamentais da ofensiva neoliberal, que é vestir uma “máscara democrática” com o intuito único de continuar separando a luta dos movimentos democráticos da luta dos trabalhadores, justamente porque da fusão entre ambas viria a força para barrar todos esses ataques.

Uma das consequências de a Rede Globo ter buscado essa cara mais progressista foi que amplos setores conservadores enxergaram nesta o símbolo do “fim da família tradicional brasileira”, do “fim dos valores morais”, um “canal abortista” que defende a ideologia de gênero e tudo o que atenta contra a moral e os bons costumes. Este amplo espectro da sociedade encontrou em Jair Bolsonaro, às vezes mais “extremista” do que o necessário para esse público, uma voz que aparecia como antissistêmica, porque não era somente contra os “políticos que estão aí”, mas também contra a Rede Globo. Não à toa que é no SBT e Record que Bolsonaro vai se apoiar para tentar, inclusive, alterar o sistema de mídia no país – o que conflui também com sua relação com as grandes igrejas evangélicas.

Tudo isso acontecia em meio ao golpe institucional, em meio ao levantamento de amplos setores de massas que tinham como bandeira a luta contra a corrupção e por mais segurança, bandeiras da direita para conseguir levar adiante este golpe. Mas o bolsonarismo conseguiu agarrar um “sentido comum” maior que era o de identificar também o PT com a política de destruição da família e dos valores. Enquanto amplos setores da direita se mobilizavam pelo golpe institucional, se fortaleciam dentro deste processo setores mais conservadores, que iam contra as ideias “liberais” no âmbito dos costumes e engrossavam a base mais dura do bolsonarismo. É nessa base que o clã Bolsonaro busca se apoiar para manter seu perfil anti-ideologia, anticiência e antimovimento de mulheres.

O bolsonarismo e sua defesa de determinados papéis para as mulheres e homens também pode ser entendido como reação a mudanças no mercado de trabalho, no trabalho doméstico e na estruturação da família. Em poucos anos, de 2012 a 2017, as mulheres passaram de ser 42,26% da população economicamente ativa a 43,35%, e se considerarmos somente aquelas que não são nem “conta própria” nem “empregadoras”, ou seja, as assalariadas, as mulheres passaram de 46,08% a 47,54% do conjunto de assalariados.

Este mesmo processo de aumento da feminização do proletariado gerou uma rápida transformação nos lares, onde há cada vez mais mulheres que vivem com ou sem filhos, e especialmente sem maridos, que levou a que, mesmo quando há homens no lar, elas sejam frequentemente identificadas como “chefes do lar”, um dado que passou de 36,94% a 43,70% dos domicílios no ano de 2012 ao ano de 2017 na pesquisa PNAD Contínua do IBGE. E, enquanto isso, aumentava a parcela de trabalho doméstico dos homens (+21,97%), mesmo que ainda ínfima em comparação a das mulheres (diferença de mais de 6 horas semanais para aqueles e aquelas que trabalham e de 7 horas entre aqueles e aquelas que não trabalham).

Ao mesmo tempo que crescia a feminização do proletariado brasileiro, em vários dos estados onde as mulheres compõem crescentemente a maioria da classe trabalhadora aumentavam os feminicídios. As estatísticas policiais encobrem quanto os homicídios de pessoas de sexo feminino são feminicídios e não meros latrocínios e outros crimes contra a vida, mas nota-se, em particular, especialmente nos locais de mais forte expansão do agronegócio, como os assassinatos de mulheres crescem em ritmo mais rápido do que os assassinatos de homens, e este é o caso dos seguintes estados: Rondônia, Roraima, Amazonas, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraíba.

Esses dados objetivos da realidade brasileira também servem para alimentar o bolsonarismo como reação aos fenômenos subjetivos do movimento de mulheres e às bases materiais do que se transformou objetivamente nas relações de classe e entre os gêneros nos últimos anos.

Paralelamente a este processo de fortalecimento das bases do golpe institucional e do bolsonarismo, havia uma visão de que a luta feminista avançava como nunca – e de fato, avançava, mas não necessariamente pela via da luta de classes. O fato é que muitos setores do feminismo, ou até mesmo amplos setores de mulheres e meninas, considerou que quando os símbolos da dominação de classe no país, como a Rede Globo ou os grandes bancos, começaram a dizer “lute como uma menina” e demitir figuras machistas, isso significaria uma vitória da primavera feminista, “superestimando” a democracia e “subestimando” o golpe institucional que afetaria também a nós mulheres inevitavelmente.

Esta situação deve nos fazer ver os limites de um feminismo que aceita a divisão entre a luta pelos direitos das mulheres e a luta contra os ataques econômicos: um feminismo que não tem uma estratégia para enfrentar os nossos inimigos de classe. Como dizíamos no início, mesmo as conquistas que levamos adiante com a força da nossa luta podem ser retiradas diante das crises capitalistas. Por tudo isso, podemos dizer que o bolsonarismo, para além de todo o significado que apontamos acima como fruto do golpe institucional, também é uma reação a todo este fenômeno internacional de mulheres. Expressa uma resposta reacionária ao avanço do movimento de mulheres, bem como a luta dos negros e dos LGBTs. Por isso, precisamos nos organizar para enfrentar estes ataques como um todo.

O papel do PT e a luta por retomar os sindicatos

A separação entre a luta pelos direitos das mulheres, dos negros e das LGBTs e a luta contra os ataques econômicos foi uma “máxima” que atravessou o movimento feminista no Brasil durante os últimos anos, como começamos a apontar acima. Por isso queremos debater com duas posições simetricamente opostas, porém profundamente complementares: a posição de muitos setores do movimento feminista em ver os avanços das mulheres por fora da luta contra os ataques econômicos e contra o golpe institucional; e a posição do PT, muitas vezes não declarada, de tratar como “cortina de fumaça”, ou diretamente rifar de forma consciente os direitos das mulheres (como fizeram por anos com alianças com setores conservadores) para supostamente avançar em pautas econômicas e políticas, separando, portanto, as demandas das mulheres das demandas econômicas - o que só levou a maiores retrocessos.

Ou seja, queremos dizer que muitos setores do movimento feminista reduzem a luta das mulheres a demandas isoladas umas das outras. Essa é uma posição tão grave quanto a do sindicalismo que separa a luta econômica por salários e direitos da luta política contra o golpe institucional e contra o avanço de valores reacionários na sociedade. Terminam sendo ideologias complementares e funcionais uma à outra e para que a afirmação das mulheres na sociedade não se transforme em um estímulo à luta de massas que unifique estudantes, trabalhadores e o povo pobre, recuperando os sindicatos e entidades estudantis como ferramentas de luta, expulsando as burocracias traidoras e controlando a partir das assembleias de base os rumos da luta. O PT atua nestes dois flancos da separação: dirigindo a maior central sindical do país, a CUT, que serve como freio à luta dos trabalhadores; e tendo peso de direção no movimento de mulheres, através das dirigentes da Marcha Mundial de Mulheres, que durante todos os 13 anos de governo do PT serviram para tentar “justificar” os chamados “recuos táticos” do governo como expressaremos adiante.

Um dos exemplos mais gráficos deste problema foi durante o 8 de março de 2018, com o papel do PT de contenção e separação entre as demandas em São Paulo: seus sindicatos se negaram a ligar o 8 de março e a luta das mulheres com a greve em curso dos professores, uma categoria majoritariamente feminina, um exemplo que poderia ter mostrado na prática o que significa as mulheres à frente na luta de classes. Dirigem o sindicato dos professores com uma mulher como presidente, uma burocrata que atuou para que a luta dos professores não tivesse nenhuma relação com o 8 de março. Nas reuniões do movimento de mulheres para preparar o 8 de março, as dirigentes da Marcha Mundial de Mulheres atuaram ativamente para separar as lutas. Essa mesma atuação tiveram para separar as lutas parciais e sindicais nos locais de trabalho e não ligá-las aos decisivos embates contra o golpe institucional em 2016 e a prisão arbitrária de Lula em 2018. Assim, impediram a unificação das lutas para enfrentar o golpe institucional, lutar pelos direitos das mulheres e pelos direitos dos trabalhadores. Aqui o papel do PT serviu para enfraquecer ambas as lutas e contê-las.

Também podemos apontar um fato bastante gráfico: o PT foi governo durante 13 anos e não legalizou o aborto. Ao contrário, atuaram contra o direito ao aborto muitas vezes. Resgatemos uma linha do tempo: Em 2007, Luiz Bassuma, ex-deputado federal que era do PT, apresentou o projeto de Lei “Estatuto do Nascituro”, que defende a alteração do código penal brasileiro para considerar aborto como crime hediondo em qualquer caso, e além disso buscava defender a proibição de pesquisas com células-tronco embrionárias. Em 2008, o ex-presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), assinou a criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar o aborto clandestino no Brasil. O pedido de abertura da CPI, com 210 assinaturas, foi encabeçado pelos deputados Luiz Bassuma (do PT-BA naquele momento), Miguel Martini (PHS-MG) e Pastor Manoel Ferreira (PTB-RJ). Em 2009, Lula assinou o acordo “Brasil-Vaticano”, em que concedia isenção tributária a instituições católicas e reconhecia a contribuição destas na área de ensino. Em 2010, Dilma escreveu uma “Carta ao povo de Deus”, em que afirmava que garantia que o aborto não seria legalizado. Para além do tema do aborto, vale lembrar também que em 2011 Dilma vetou o kit de material educativo "Escola sem homofobia", que seria distribuído pelo Ministério da Educação. Em 2013, o PT nomeou Marco Feliciano à Comissão de Direitos Humanos da Câmara, em troca de acordos que iam sedimentando cada vez mais um obstáculo para a luta das mulheres. Em 2015, o PT tentou negociar com a bancada evangélica para que Marco Feliciano fosse vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos, tudo isso depois do deputado ter sido presidente da CDH em 2013 e feito uma série de declarações homofóbicas, racistas e machistas.

O argumento frente aos chamados “recuos táticos” sempre foi, sempre é e sempre será o de que é preciso garantir a governabilidade. Mas a realidade é que o PT governou com parte dos setores mais reacionários da política brasileira, não foram “recuos táticos”. Isso foi resultado de uma decisão estratégica de tomar para si um "projeto de país" baseado no agronegócio exportador, no trabalho precário e no clientelismo estatal, mantendo o Brasil como um dos países mais desiguais do mundo, mesmo depois do ciclo de crescimento econômico que favoreceu o segundo governo Lula, projeto esse que não tem "governabilidade" sem o papel de contenção social das igrejas e de repressão policial nas favelas, junto com a prisão em massa de pobres e negros, sem um enorme aumento do poder econômico e político da oligarquia latifundiária e capitalista ligada ao agronegócio, sem uma política externa que envolveu liderar as tropas no Haiti que massacravam negras e negros. Esse projeto de país é que assentou as bases para que, depois do enorme questionamento a todas as representações políticas que explodiu em junho de 2013, ao não ter surgido uma alternativa de massas pela esquerda ao PT, já em 2014 fosse eleito um Congresso muito mais reacionário, onde os que até então eram aliados do PT passassem de malas e bagagens para o lado da Lava Jato e da ofensiva golpista para descarregar a crise econômica sobre as costas dos trabalhadores e entregar o país de bandeja ao imperialismo. Por isso, não se trata somente de que o PT não avançou no direito ao aborto porque abalaria suas alianças reacionárias, das quais esse partido seria uma "pobre vítima" pela pressão da "governabilidade". Trata-se de que o projeto de país escolhido pelo PT no governo fortaleceu os setores reacionários que depois foram protagonistas do golpe e hoje são protagonistas da ofensiva reacionária do bolsonarismo contra as mulheres, os negros, as LGBTs e toda a população trabalhadora mais pobre do país, que está sofrendo com os ajustes e ataques do golpismo, primeiro de Temer e agora de Bolsonaro.

O movimento #EleNão pode ser analisado deste ponto de vista também. Ali a consigna motora, fortemente eleitoral, buscava retomar a força das mulheres para dizer que “ele não”, ou seja, “Bolsonaro não”, já que ele é o que representava de forma mais perversa a misoginia contra as mulheres. Mas o movimento era tão amplo - ou seja, “ele não” mas os outros “podem ser” - que atuou com um arco de participantes na hashtag ou diretamente nos atos que incluíam até mesmo Geraldo Alckmin, do golpista PSDB. Se as centrais sindicais dirigidas pelo PT não fizessem essa separação criminosa, imaginem o impacto de uma manifestação massiva de mulheres nas ruas, com uma paralisação nacional tendo as mulheres trabalhadoras à frente para derrotar Bolsonaro na luta de classes? Em uma manifestação assim não haveria espaço nem para a latifundiária Kátia Abreu, nem para a golpista Marina Silva. E no decorrer da luta, as mulheres iriam perceber, mais cedo ou mais tarde, que o “lute como uma menina” de Manuela D’Ávila é de mãos dadas com Rodrigo Maia, que prepara a reforma da previdência contra nós.

Por isso, ao priorizar a suposta “resistência” parlamentar ao invés de mobilizar dezenas ou centenas de milhares nas ruas, organizados a partir dos locais de trabalho e estudo, o PT deixa claro qual é sua verdadeira política: esperar o desgaste de Bolsonaro e preparar uma ampla aliança que possa substituí-lo nas próximas eleições. Esperar quatro anos para uma nova eleição é a verdadeira “resistência democrática” proposta pelo PT. Se eleitos, poderão usar a necessidade de “governabilidade” para mais uma vez rifar os direitos das mulheres, e novamente poderemos nos perguntar “como chegamos até aqui?”. O PSOL, assumindo a linha de frente desta “oposição parlamentar” e sem nenhuma crítica à atuação dos sindicatos dirigidos pelo PT, termina cobrindo pela esquerda essa estratégia e aceitando essa divisão.

Por tudo isso é fundamental tirar lições: o movimento feminista precisa se colocar na linha de frente da organização das mulheres trabalhadoras, com comissões de mulheres em todos os locais de trabalho, para enfrentar a burocracia sindical e retomar os sindicatos como ferramentas de luta de toda a classe trabalhadora que atuem como verdadeiros “tribunos do povo”, levantando com a máxima força a luta de todos os setores oprimidos e explorados.

Para enfrentar a extrema-direita e combater o patriarcado é preciso construir o caminho da luta de classes contra o capitalismo

A conclusão mais profunda a que devemos chegar é que não é possível mudar a situação da opressão de gênero apenas introduzindo aspectos culturais e de mudanças de valores e comportamentos. Eles não deixam de ser importantes, e é preciso destacar que a necessidade de várias empresas, mídias, e inclusive partidos políticos de centro e de direita buscarem consultoria para dialogar com o público sensível à pauta feminista é expressão distorcida da luta das mulheres. É uma expressão porque a crítica ao papel da mídia na superexploração do corpo feminino, na objetificação e heteronormatividade do sexo, e no incessante bombardeio de ideias por um padrão de beleza inalcançável é parte de um combate decidido a uma sociedade que utiliza seus meios de comunicação como forma de legitimar o patriarcado. Mas também é distorcido porque, longe de concordar com a necessidade de real emancipação das mulheres, a classe dominante, frente aos descontentamentos sociais, não irá concordar com as bandeiras dos oprimidos e explorados, mas irá buscar se apropriar parcialmente delas até esvaziá-las de seu conteúdo subversivo e revolucionário para manter seus lucros e sua dominação de classe.

Entretanto, a combinação entre a) priorizar um programa de representatividade para as mulheres independente do conteúdo político e priorizar a defesa de punição pelo Estado diante da violência de gênero, b) uma política de separação entre as demandas das mulheres e as demandas econômicas (ora vindo do próprio movimento feminista, ora vindo do PT sempre que tinha que entregar algo) e c) a ideia de que a luta das mulheres avançaria em si mesma por fora do combate ao golpe institucional, são três questões que terminam esvaziando de estratégia o movimento feminista e transformando nossa luta em algo inofensivo ao capitalismo, ou seja, abdicando de uma estratégia para transformar a sociedade. A energia de milhares de mulheres e meninas que se levantam como efeito do fenômeno internacional de mulheres terminará canalizada dentro das instituições. E a luta institucional ganha mais fôlego frente a um movimento que não é massivo nas ruas, às centrais sindicais que não organizam a mobilização e não assumem as demandas das mulheres e a um governo de extrema-direita repressivo e que ataca diretamente o avanço desta batalha cultural.

Mas o que é preciso fazer para buscar o caminho da luta de classes? Queremos debater em particular com o PSOL, que é composto por várias correntes feministas de distintas ideologias, sobre essa questão. Para isso, façamos um resgate dos processos de luta. As duas paralisações nacionais que frearam a reforma da previdência do governo Temer foram uma enorme demonstração de que, apesar da política do PT, existem reservas na classe trabalhadora para lutar. As mobilizações da juventude nos últimos anos, o movimento de mulheres, os movimentos de moradia, mostram uma força de vanguarda que, se canalizada com uma política precisa, tem o poder de organizar as mobilizações pela base e revolucionar as entidades sindicais e estudantis, transformando-as de cascas vazias que são hoje em verdadeiras ferramentas de luta. O processo incipiente de mobilização contra Bolsonaro que vimos em várias universidades do país, mostraram uma enorme potencialidade para que a juventude cumpra um papel de vanguarda nas batalhas de resistência que estão por vir, colocando na ordem do dia a possibilidade de emergir um novo movimento estudantil ao lado do movimento de mulheres.

Os dez parlamentares conquistados pelo PSOL nas últimas eleições, uma importante ampliação da sua bancada, assim como a projeção nacional de Boulos como candidato a presidente, e a projeção das jovens parlamentares mulheres que o PSOL elegeu para a bancada nacional e para as bancadas estaduais deveriam estar a serviço de exigir que o PT, a CUT e seus sindicatos impulsionem um plano de luta sério, construído desde as bases para unir os trabalhadores, a juventude e o movimento de mulheres em um grande processo de mobilização de massas capaz de derrotar os ataques de Bolsonaro e do golpismo institucional, unificando a luta contra o plano econômico de reformas e ajustes de Paulo Guedes com a luta contra a escalada contra as mulheres, negros, LGBT e todo o autoritarismo judiciário.

Entretanto, na medida em que a influência das parlamentares do PSOL e de toda sua bancada não estão a serviço de desmascarar o papel da burocracia política e sindical do PT e estimular a fusão entre a luta política e sindical, a auto-organização desde as bases e planos consequentes para que as mobilizações sejam cada vez mais massivas, lamentavelmente o PSOL termina se constituindo como uma cobertura de esquerda para a “resistência democrática” parlamentar-eleitoral do PT. Ao mesmo tempo, também perpetuam a divisão entre os temas políticos e democráticos, já que com o PT abrindo mão da luta das mulheres ao considerar os ataques como “cortina de fumaça”, é o PSOL que, estando à esquerda do PT, mais poderia capitalizar este processo; mas esse não apresenta uma política alternativa. Essa separação se expressa de forma cabal no fato de que a bancada de mulheres do PSOL, que é uma expressão deste movimento de mulheres, não diz absolutamente nada para denunciar a trégua traidora do PT e da CUT.

qual programa alternativo ao do golpe o PSOL defende para o pais? Voltar ao lulismo? Lulismo com mais impostos aos ricos?

Afinal, é preciso debater: qual programa alternativo ao do golpe o PSOL defende para o pais? Voltar ao lulismo? Lulismo com mais impostos aos ricos? Isso é: Friboi + capital imperialista + Assembleias de Deus. Justamente as forças que com a crise econômica e a Lava Jato deram o golpe. Qual alternativa de país defendem? Como é possível enfrentar a reforma da previdência sem lutar pelo não pagamento da dívida pública? Como é possível evitar Brumadinho ou a corrupção petista sem estatizar a Vale e a Petrobrás sob gestão dos trabalhadores e controle popular? Que “resistência parlamentar" é possível junto com partidos que defendem a reforma da previdência, as privatizações e a Lava Jato como PSB e Rede? Não tem alternativa possível que não seja não pagar a dívida pública, expropriar as empresas estratégicas e colocá-las sob administração dos trabalhadores e do povo, eleição direta para todos os juízes e que políticos e juízes ganhem o mesmo que uma professora. Ou seja, não é possível uma alternativa ao golpismo que não seja lutando por um programa anticapitalista, e buscando construir nos locais de trabalho e de estudo uma força política capaz de ser uma alternativa às burocracias sindicais traidoras que não preparam nenhum combate sério desde as bases e negociam ataques mais brutais por ataques um pouco menos brutais, exigindo que rompam com esta política e organizem os grandes batalhões da classe trabalhadora brasileira.

Por outro lado, vários dos debates que colocamos aqui, em especial em relação à redução de nossas demandas ao tema da violência exigindo mais punição do Estado e dos espaços no parlamento, expressam demandas que não respondem ao necessário enfrentamento com a extrema-direita. Não é à toa que vemos cada vez mais o próprio governo Bolsonaro e sua ministra Damares afirmando que o governo será implacável contra a violência às mulheres e que a orientação para todas é ligar 180 – mesmo mote de campanha eleitoral utilizado por candidatas do PSOL. Por mais mulheres no poder, como demanda em si mesma, nos deparamos com as figuras de Joice Halsemann, Janaína Paschoal e a própria Damares, representantes dignas e “empoderadas” de uma extrema-direita reacionária. Por mais “delegacias de mulheres”, terminam fazendo coro com o endurecimento de um Estado policial como o apresentado por Sérgio Moro.

Os ataques pela direita do bolsonarismo ao movimento de mulheres devem mostrar os enormes limites do identitarismo e do punitivismo. A pauta destes movimentos passou a ser muito mais permeada pela necessidade de se ter uma mulher para expressar seu lugar de fala em determinada atividade política do que por qual política se estava defendendo nesta determinada atividade política. Criou-se um “micro-mundo” no qual se batalhava para não existirem opressões, quando é impossível acabar com as opressões por dentro do sistema capitalista. O correto e real combate às expressões de machismo, racismo e LGBTfobia que acontecem mesmo dentro dos movimentos muitas vezes foi transformada em “fim em si mesmo” e uma “estratégia do escracho”, expressando falta de consciência de classe e não se diferenciando muito dos “justiceiros” que contra a violência “agiam com as próprias mãos” – e os homens passavam a ser inimigos. Contra esse “radicalismo” dos movimentos, o bolsonarismo ataca pela direita. Porque não considera que exista a opressão de gênero, raça e orientação sexual.

Para enfrentar a opressão, não é possível se contentar com ideologias que não vão à raiz dos problemas, que é a sociedade de classes na qual vivemos. Somente assim será possível enfrentar a violência brutal contra as mulheres que é sustentada por este Estado capitalista, lutar para que as mulheres estejam na linha de frente da luta contra essa sociedade e enfrentar toda forma de machismo, racismo e LGBTfobia dentro da classe operária e dos movimentos. Participando ativamente de todas as manifestações contra a violência de gênero, colocando de pé comissões de mulheres para enfrentar a violência e o bolsonarismo de conjunto, pois não vamos dar nenhum passo atrás nos mais mínimos dos nossos direitos, mas o faremos com uma perspectiva de enfrentamento a esta sociedade.

Nós, mulheres, o proletariado

E para este necessário debate sobre como colocar de pé uma verdadeira luta contra Bolsonaro - na aposta de que as mulheres possam ser vanguarda dessa luta, e particularmente as mulheres trabalhadoras, ao sacudirem os sindicatos e locais de trabalho com a energia deste movimento internacional -, é preciso resgatar algumas definições sobre o quanto a classe operária no Brasil tem rosto de mulher e, particularmente, de mulher negra. Dos 10 aos 60 anos, as mulheres são mais de 40 milhões do total da população ocupada no Brasil, ou seja, cerca de metade da classe trabalhadora brasileira, e dentre estas, 20 milhões são negras. Dentre os desempregados, até 2015, as mulheres foram mais de 5 milhões, com maioria também de mulheres negras. 10,5% das mulheres brancas ocupadas trabalham sem carteira assinada, 11,8% das negras ocupadas também. 18% das mulheres negras que trabalham são empregadas domésticas. Entre os precários e informais, sem estatísticas claras, as mulheres são a esmagadora maioria. Do ponto de vista das categorias majoritariamente femininas, é fato que aquelas ligadas ao “cuidado natural”, como professoras, enfermeiras, empregadas domésticas e de limpeza, são amplamente femininas, conservando o elemento da opressão de gênero como fundamento principal da exploração capitalista: rebaixa os salários e apresenta estas profissões como uma “extensão do lar”. Ainda assim, cresce a participação feminina no proletariado industrial, da construção civil, entre outros.

Estes números já expressam a vantajosa maneira pela qual o capital se apropria da opressão, que é anterior ao modo de produção capitalista, criando uma poderosa relação entre exploração do trabalho

Estes números já expressam a vantajosa maneira pela qual o capital se apropria da opressão, que é anterior ao modo de produção capitalista, criando uma poderosa relação entre exploração do trabalho (através da mais-valia) e a subordinação de um grupo social para melhor explorar. Esta tese, que em si mesma resguarda um dos grandes e profundos debates entre marxismo e feminismo, apresenta uma visão de mundo na qual a emancipação feminina não será alcançada sem a destruição neste momento das poderosas amarras do sistema capitalista, que transformaram o mundo em uma suja prisão.

Nas moradias das classes média e alta, a realização do trabalho doméstico é quase exclusivamente feminina. Como apontamos acima, essa é a ocupação de 5,9 milhões de brasileiras, o equivalente a 14% do total das ocupadas no Brasil. Destas mulheres, cerca de 65% são negras. 18% das mulheres negras ocupadas no Brasil são empregadas domésticas, com uma renda média quase idêntica ao miserável salário mínimo. No campo, as trabalhadoras pobres sofrem com as condições arrebatadoras de trabalho que destroem seus corpos. Aí, a reforma da previdência terá um impacto devastador. É um retrato do Brasil profundo e da milenar opressão de gênero, que arranca a vida das mulheres.

Essa precarização se expressa de forma grotesca na diferença salarial entre homens e mulheres, entre negros e brancos. Em 2015, as trabalhadoras brasileiras ganhavam 23,6% a menos que os trabalhadores homens, proporção que é ainda mais gritante se compararmos as mulheres negras com os homens brancos: a média salarial de R$ 1283 equivale a somente 42% da média de R$ 3087 dos homens brancos.

Existem muitos estudos sobre o tempo livre e o que fazer com ele. Mas o fato é que as mulheres trabalhadoras, em sua grande maioria, não têm opção. O último estudo de fevereiro deste ano mostrou que a diferença de carga de trabalho total entre homens e mulheres aumentou nos últimos anos devido ao aumento do trabalho remunerado das mulheres, sem que isso signifique queda concomitante no trabalho de reprodução social não remunerado. Enquanto em 2005 as mulheres trabalhavam 6,9 horas a mais por semana do que os homens, somando trabalho doméstico não remunerado e trabalho fora de casa e remunerado, em 2015 a diferença cresceu para 7,5 horas, segundo o IBGE. Ou seja, num período de 10 anos, o tempo gasto por homens com atividades profissionais diminuiu quase 3 horas e continuaram ocupando 10 horas semanais com tarefas domésticas. Somadas todas as atividades, a jornada total dos homens caiu de 48,4 para 46,1 horas, enquanto a das mulheres foi de 55,3 horas para 53,6.

Ao mesmo tempo em que aumenta a feminização do proletariado, também aumenta a sindicalização feminina. Em alguns estados, a taxa de sindicalização feminina já ultrapassou a masculina, e no país como um todo os ritmos desta são muito diferentes da masculina. Subproduto da crise, a sindicalização do país caiu de 22,07% para 20,49% dos assalariados entre 2012 e 2017, uma queda de 1,6%, enquanto a queda das mulheres no mesmo período foi de somente 0,67%. Em praticamente todos estados, os ritmos de diminuição das sindicalizadas foi menor do que o de sindicalizados, e em alguns estados que apresentaram aumento do proletariado e da sindicalização, como Goiás e Mato Grosso, esse crescimento foi maior entre as mulheres (crescimento de 2,96% das mulheres contra 2% de todos gêneros e 2,19% das mulheres contra 0,6% de todos gêneros, para Mato Grosso do Sul e Goiás respectivamente). Esse cenário fez com que a participação das mulheres no total de sindicalizados do país também aumentasse de 39,29% a 41,11% nos mesmos anos.

Este pequeno retrato da situação da classe trabalhadora feminina no Brasil mostra que é preciso enfrentar a sociedade capitalista para conquistar a emancipação das mulheres. E mostram o quão criminosa é a política consciente de separação entre as demandas das mulheres, que são parte fundamental da classe trabalhadora, e a luta contra a exploração capitalista. Um retrato disso são as direções sindicais, ampla maioria composta por homens brancos, que se alçam como burocracias para frear a luta daqueles que mais sofrem com a opressão e a exploração capitalista. É por tudo isso que, para enfrentar esta divisão e para buscar o caminho da luta de classes, é fundamental a batalha por sindicatos que atuem como verdadeiros tribunos do povo, levantando todas as demandas e mazelas do conjunto do povo explorado e oprimido - e não apenas as demandas salariais imediatas de sua própria fábrica ou local de trabalho. Para tanto, é fundamental levantar um programa, e trataremos disso a seguir.

Este pequeno retrato da situação da classe trabalhadora feminina no Brasil mostra que é preciso enfrentar a sociedade capitalista para conquistar a emancipação das mulheres.

A união entre essa classe operária, cada dia mais feminina, com as milhares de jovens meninas que se levantaram na primavera feminista e aprenderam desde cedo a questionar a opressão patriarcal, pode ser um elemento explosivo. Não por acaso, Bolsonaro e seus aliados querem o projeto “Escola sem Partido” para impedir qualquer discussão de gênero e de sexualidade nas escolas. A energia que essas jovens vêm demonstrando na luta contra o machismo pode contagiar profundamente as trabalhadoras, muitas vezes sobrecarregadas com as duplas ou triplas jornadas de trabalho, e ser uma enorme força para colocar as mulheres na linha de frente do questionamento da relação entre opressão e exploração no sistema capitalista.

O caso brasileiro deve ser analisado internacionalmente

Por que o caso brasileiro deve ser analisado internacionalmente? Porque é um exemplo de como os avanços culturais podem acontecer mesmo num momento em que politicamente vai se gestando um golpe institucional no país, que abre espaço para a extrema direita. Ou seja, que essas transformações, que ocorrem por fora de uma estratégia anticapitalista, terminam por ser avanços circunstanciais que um governo reacionário, como de Bolsonaro, pode destruir e fazer retroceder ainda mais. Nós somos parte deste movimento internacional, mas como ala revolucionária, socialista e da classe trabalhadora precisamos fazer um debate de estratégias. E é um debate necessário hoje explicar como avançamos tanto nos valores e nos comportamentos e mesmo assim chegamos a um governo de extrema direita tão misógino em pleno século XXI.

Como parte do fenômeno internacional, também vimos o surgimento do chamado “Feminismo dos 99%”, que se reivindica anticapitalista. Ainda assim, queremos debater com estas companheiras que sem uma estratégia clara para derrubar o capitalismo, sem uma ferramenta concreta (que é um partido revolucionário), sem ter uma visão precisa sobre a classe trabalhadora e sem colocar no centro o enfrentamento às burocracias sindicais não é possível ser anticapitalista de fato. A luta contra o patriarcado somente pode ser efetiva com a estratégia operária e socialista, que significa assumir a luta pelo fim desta sociedade de classes, e se apoiar na única classe que pode levar adiante essa transformação: a classe operária. Apostamos fortemente que sejam as mulheres trabalhadoras que estarão à frente deste processo, não apenas para resistir aos ataques, mas para transformar a sociedade.

Por isso, consideramos que, diante do movimento de mulheres nos Estados Unidos contra Donald Trump e diante do movimento de mulheres na Argentina - que gritou “Ni Una Menos”, colocou de pé a maré verde, sacudindo e enchendo de esperança a luta das mulheres no Brasil - também podemos buscar definições que potencializam o debate diante do caso brasileiro. Nos Estados Unidos, as mulheres se levantaram em marchas históricas contra Donald Trump. Entretanto este processo não teve continuidade nem assumiu os métodos da luta de classes. Na realidade, houve uma forte tentativa de cooptação por parte do Partido Democrata, buscando canalizar, para a luta eleitoral e institucional, a energia de milhões de mulheres. Na Argentina, a luta defensiva contra os feminicídios que depois se transformou na luta pelo aborto legal, seguro e gratuito mostrou os limites da falta de radicalidade, da ilusão nas instituições e da falta de ligação com o movimento operário.

Por isso, no Brasil, a falta de um movimento de massas e a ideia de que o feminismo poderia avançar sem choques de classe, traz lições. Se não batalhamos contra as tentativas de cooptação, se não enfrentamos as ilusões democráticas buscando o caminho da luta de classes e se não buscamos nos ligar à classe trabalhadora para arrancarmos nossos direitos e avançar a partir daí, o movimento feminista tende a conseguir transformar alguns aspectos da cultura, mas não as instituições. O problema é que quando vêm as crises – sejam as econômicas, sejam as “orgânicas” de representatividade – serão os nossos direitos os primeiros a serem retirados; e então nos vemos “de repente” diante de um governo de extrema direita e misógino como Bolsonaro. Este é um debate que fazemos em especial com as companheiras e companheiros que veem no PSOL uma alternativa à esquerda do PT.

É preciso levantar a bandeira do feminismo socialista!

Diante de tudo isso, acreditamos que as mulheres podem ser uma importante frente de resistência ao bolsonarismo. Para enfrentar o governo Bolsonaro e se apoiar em cada um dos avanços que o movimento feminista, negro e LGBT veio conquistando em nosso país e que o governo quer atacar fortemente, é preciso levantar um feminismo socialista, revolucionário, antirracista, anti-imperialista, pela diversidade sexual e da classe trabalhadora, que vincule a luta contra a opressão à luta contra a exploração capitalista, considerando a mesma luta. Isso significa entender que a classe operária no Brasil é cada vez mais feminina e negra e, portanto, é um crime que os sindicatos não levantem tais demandas numa necessidade vital de unificar a classe trabalhadora e seus extratos mais oprimidos e explorados, incluindo toda a camada de precários em nosso país. Significa levantar um feminismo anti-imperialista, que, diante da ofensiva contra a Venezuela, possa levantar, sem nenhum apoio político à Nicolás Maduro, o rechaço primordial a ingerência imperialista de Trump na América Latina.

Não lutamos pela “igualdade” com os exploradores, não lutamos para que existam mais mulheres exploradoras, gerentes e dirigentes dos imperialismos em todo o mundo. Num sistema em que existem apenas 8 homens poderosos que detêm grande parte da riqueza mundial, a nossa luta não é para que sejam, então, 4 mulheres milionárias e poderosas. Nós somos as operárias, as jovens, as mulheres negras, as indígenas, as empregadas domésticas, as professoras, as donas de casa, as mães, as imigrantes, todas as mulheres que sofrem com a opressão e a exploração capitalista em todo o mundo. Não somos uma no poder, queremos ser milhões não somente nas fábricas, escolas, locais de trabalho e nas ruas, mas também na luta de classes, como mostram os coletes amarelos na França.

Unamos a classe trabalhadora, a juventude, o movimento de mulheres e as organizações do movimento negro, LGBT e indígena para revolucionar os sindicatos e entidades estudantis. Os ataques de Bolsonaro às mulheres, aos negros, aos LGBT e à juventude são parte inseparável da crise econômica mundial que arrasta o capitalismo neoliberal a uma decadência histórica. Se em seus momentos ascendentes a democracia neoliberal tolerou a concessão de alguns direitos democráticos às mulheres, aos negros, aos LGBTs e à juventude - como parte de uma política consciente de cooptação estatal e de separação entre as demandas democráticas e os métodos da luta de classes do proletariado - agora, na presente etapa de crise histórica do capitalismo, esse mesmo neoliberalismo ataca os direitos democráticos e civis, através dos representantes que escolhe para administrar sua decadência, como Trump e Bolsonaro. É uma atualização da compreensão histórica de que o capitalismo em decadência é reação em toda linha.

O capitalismo se apoia, com machismo e cooptação, na opressão às mulheres: a exploração capitalista anda de mãos dadas com essa opressão que nos sufoca todos os dias, massacrando as mulheres trabalhadoras, assassinando as mulheres trans, mantendo a precarização do trabalho, mantendo o trabalho doméstico invisível e gratuito. Não há nenhuma outra estratégia para enfrentar essa situação que não seja batalhar pelo fim do capitalismo e pela construção de uma outra sociedade. Aprendemos isso com as experiências mais avançadas da história da classe operária mundial, como a Revolução Russa. Fruto dela, a Teoria da Revolução Permanente busca, como expressamos neste material, demonstrar a engrenagem entre a centralidade da classe operária para encabeçar a luta pela derrubada do capitalismo e a sua relação com todos os setores oprimidos da sociedade, que, diga-se de passagem, cada vez mais são protagonistas dessa classe, uma classe que no Brasil tem rosto de mulheres e negros.

Lutemos para que as mulheres estejam à frente da luta contra Trump e Bolsonaro, por justiça à Marielle, contra a reforma da previdência e as privatizações. Precisamos batalhar pelos nossos direitos mais elementares: efetivação das terceirizadas sem necessidade de concurso, igualdade salarial entre negras e brancas, entre homens e mulheres, direito ao aborto legal, seguro e gratuito e pela separação da Igreja e do Estado. Não podemos aceitar mais ataques aos LGBTs, e lutamos pela livre identidade de gênero, basta de repressão à livre sexualidade! Basta de ataque às professoras: não ao “Escola Sem Partido”. Revogação de todas as reformas do governo Temer e dos governos anteriores. Abaixo o autoritarismo judiciário, liberdade para Lula já. Basta de racismo, nenhum retrocesso na política de cotas, pelo fim do vestibular. Nenhuma a menos!

Lutamos por essas demandas ao mesmo tempo em que consideramos que não existe emancipação das mulheres dentro desta sociedade capitalista. Por isso, para enfrentar a opressão que milhões de mulheres sofrem, lutamos pela socialização do trabalho doméstico. Lutamos pelo fim do pagamento da dívida pública, que é o maior mecanismo de ingerência imperialista na América Latina.

Lutamos por essas demandas ao mesmo tempo em que consideramos que não existe emancipação das mulheres dentro desta sociedade capitalista. Por isso, para enfrentar a opressão que milhões de mulheres sofrem, lutamos pela socialização do trabalho doméstico.

Por tudo isso, é preciso resgatar um feminismo socialista e revolucionário, o feminismo de Rosa Luxemburgo aos 100 anos de seu assassinato, uma mulher que, com apenas 15 anos como estudante secundarista, se juntou ao movimento revolucionário clandestino na Polônia para lutar pelo comunismo; que pode ser inspiração para milhares de meninas que hoje se levantam. Precisamos de um feminismo que defende o marxismo revolucionário para levar adiante a nossa batalha contra o sistema capitalista, com uma revolução operária e socialista por uma sociedade livre de toda exploração e opressão, com produtores livremente associados, uma sociedade comunista. Para isso, é necessário construir um partido enraizado na classe trabalhadora, que resista com os métodos da luta de classes para que a crise seja paga pelos capitalistas. Acreditamos que as mulheres trabalhadoras, em sua maioria negras, serão vanguarda desta batalha porque nós queremos vencer. O Pão e Rosas, uma agrupação internacional de mulheres, junto com o Quilombo Vermelho, agrupação de luta negra anticapitalista, e o MRT acreditamos nesta estratégia.




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