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Para além do centrão | Por que ressurgiu o ministério do Trabalho e da Previdência?

Afinal, porque não aproveitar essas articulações com o centrão para resolver problemas pendentes da burguesia a respeito da exploração da força de trabalho?

Mateus CastorCientista Social (USP), professor e estudante de História

quinta-feira 5 de agosto de 2021 | Edição do dia

A criação do “novo” ministério do Trabalho e Previdência, liderado pelo fiel bolsonarista Onyx Lorenzoni, foi um fato ofuscado e secundarizado diante da nomeação de Ciro Nogueira para a Casa Civil. De fato, a retomada da pasta, fruto da reforma ministerial, é consequência direta da rearticulação da base de sustentação do Governo Bolsonaro, cujo ápice é o papel do milionário senador e suas relações no Congresso. Neste artigo, daremos a proporção necessária a algo tratado como secundário, pois o ressurgimento dessa histórica pasta está longe de ser uma simples consequência para a classe dominante brasileira.

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Afinal, porque não aproveitar essas movimentações para resolver problemas pendentes da burguesia a respeito da exploração da força de trabalho? Regulamentar as novas formas de trabalho precário (uberização), atacar o funcionalismo público e mirar as eleições de 2022, através de um novo ministério com mais de 200 cargos por indicação política, não soa ruim nem para os liberais opositores, que rapidamente esquecem de suas divergências com o centrão e o governo de extrema-direita diante de tantos interesses em comum.

Questões estruturais de um "novo" ministério

Esta nova articulação de forças do governo, com um tipo específico de presidencialismo de coalizão protagonizado pelo centrão, não pode ser vista apenas pela perspectiva política. Há questões econômicas estruturais no ressurgimento deste ministério que se combinam à disputa eleitoral de 2022.

“(...) Dar uma certa descompressão no Paulo Guedes e deixar o Onyx tratar dessa questão importantíssima, pois, precisamos sim, além de recuperar empregos, buscar mais alternativas para atender aos desassistidos. Não é da pasta do Onyx o Bolsa Família, é do João Roma. Mas trabalham perfeitamente afinados", justificou Bolsonaro sobre o novo ministério.

A burocracia estatal do Judiciário, uma elite formada no período varguista especializada na tutela autoritária do Estado sob o movimento operário, conflui com as afirmações do ex-capitão. A Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), crítica a extinção do ministério em 2019, afirmou através de seu presidente Luiz Antonio Colussi: "Temos 14,8 milhões de desempregados, então é necessário ter um ministério para gerir esta questão, ajudar na geração de emprego, na proteção do trabalhador.", afirmou o burocrata do estado.

O presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, por sua vez, reagiu da seguinte maneira: "É somente uma medida com fins eleitorais com a qual Bolsonaro, desesperado ante as pesquisas e a CPI, busca alocar mais apoiadores dentro do governo e garantir, assim, votos e aprovação às suas ações desastrosas", declarou para o Uol.

Ambas as posições, tanto as que defendem como as que criticam, se limitam à conjuntura econômica e eleitoral. Onyx, contudo, têm o objetivo de sacramentar, através do poder da legislação, as novas formas de trabalho precário, “digital” ou qualquer outra definição que invente o liberalismo decadente. Com atraso, e diversas complicações que surgirão, o Estado brasileiro busca regularizar a “modernização econômica” que diminuiu salários, aumentou jornadas, arrancou direitos e protegeu os patrões, para que ela se consolide enquanto a nova correlação de forças entre trabalhadores e capitalistas. Este é o conteúdo histórico e estrutural imperante sobre as ações e medidas específicas do ministério, neste curto espaço de tempo entre hoje até as eleições de 2022.

A expressão de uma nova correlação de forças

Suas consequências, logicamente, vão ter impacto na disputa entre Bolsonaro e Lula. Este é, de fato, o objetivo político que moverá Onyx. O “Posto Ipiranga” continua a comandar várias secretarias com peso ministerial, mas perdeu uma fração considerável de suas verbas, especuladas pelo jornal poder360 em torno de 75% dos R$ 724 bilhões da Economia. Bilhões que serão gerenciados por 202 cargos por indicação política. Não havia como realizar tamanha tarefa política apenas com uma secretaria do ministério da Economia, muito menos regulamentar anos de ataques aos direitos trabalhistas e mudanças na forma de exploração do trabalho.

Há motivo para se repetir: a regulamentação estatal da nova correlação de forças entre capital e trabalho não se contrapõe às intenções eleitoreiras para 2022. Ainda que não possa sair do papel uma parte considerável dos projetos de Bolsonaro e Centrão na nova pasta, o sentido para os próximos governos já fica indicado, mesmo para um governo de Lula.

O Ministério do Trabalho foi criado em 1930 por Getúlio Vargas. Seu papel fundamental era o controle e contenção do movimento operário, o que resultou na estatização dos sindicatos e consolidação de uma burocracia pelega e corporativista. Ao mesmo tempo, regulamentou as relações trabalhistas, adotando medidas como a CLT, que concedia direitos para uma parcela minoritária organizada da classe operária enquanto excluía as camadas urbanas mais precárias e os trabalhadores rurais.

O governo de Bolsonaro e Mourão extinguiu o ministério para não deixar dúvidas em seu objetivo de realizar uma ruptura à direita com a estrutura sindical varguista, numa ofensiva contra a burocracia sindical e contra os direitos trabalhistas e previdenciários; a reforma trabalhista de Temer teve sua continuidade com PEC de Bolsonaro, a reforma da Previdência e outras medidas que atacavam direitos trabalhistas, a consolidação dos “microempreendedores” e a decadência meteórica da CLT.

Veja também: O PT e os sindicatos no regime do golpe

Desde o golpe institucional de 2016, vemos uma ofensiva aberta da burguesia contra os trabalhadores, entre uma série de derrotas - com o papel chave da burocracia sindical - que resultaram numa nova correlação de forças à direita que garantiu aos patrões margens de lucro maiores e um poder de barganha fragilizado do movimento operário. Agora, os espólios estão na mesa, novas relações de trabalho se desenvolveram e graus de exploração da força de trabalho e naturalização da miséria precisam ser contabilizados e normatizados pelo Estado. Eis aqui o objetivo central do novo ministério de Bolsonaro, ressurgido após um período de concentração na ofensiva do capital contra o trabalho.

Uma análise mais detida das medidas e ações do ministério do Trabalho e Previdência, assim como da posição das burocracias sindicais e a disputa de 2022 ficará para a parte 2.




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