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CAMPINAS | Por que a aliança do PSOL com PT em Campinas é incapaz de derrotar o projeto da direita?

Em meio a um cenário degradante de crise sanitária, social e econômica, é fundamental uma voz dos trabalhadores contra a direita e independente do PT nessas eleições.

quinta-feira 30 de julho de 2020 | Edição do dia

Em meio a uma crise histórica, que no Brasil conta também com o negacionismo de Bolsonaro e seu governo repleto de militares, é um fato que a pandemia agravou as condições de vida da classe trabalhadora e do povo pobre, em particular do povo negro. Os trabalhadores estão divididos entre quem pode fazer quarentena e quem não pode, uma maioria expondo-se ao vírus, por estar sofrendo o impacto das demissões, reduções de salário e de um auxílio emergencial abaixo do que o necessário para sobreviver.

Em Campinas, já são mais de 15 mil casos confirmados de Coronavírus na cidade, sendo a 15ª cidade com mais mortes do país, sem contar a subnotificação. Em estudo recente, foi constatado que o número de pessoas em pobreza ou extrema pobreza cresceu 51% na cidade durante a pandemia, chegando a um total de 110 mil pessoas que estão sem fonte de renda na crise. Junto a isso, os dados de desemprego são alarmantes: a Região Metropolitana de Campinas fechou mais de 32 mil postos de trabalho nos primeiros cinco meses de 2020.

Por sua vez, o prefeito Jonas Donizette (PSB), presidente da Frente Nacional de Prefeitos, nem hesitou em aprovar a Reforma da Previdência municipal em meio à pandemia. Desde antes, Jonas esteve à frente de articular as reformas contra os trabalhadores em vários municípios do país, inclusive se reunindo com Paulo Guedes.

Enquanto decidiu cortar salário dos trabalhadores da saúde nesta crise, sendo nossa linha de frente do combate ao vírus, é preciso relembrar que foi na sua gestão que se multiplicaram cargos comissionados. Ou seja, Jonas é a cara de uma casta política que não hesita em atacar os trabalhadores enquanto preserva seus privilégios.

Embora tenha buscado aparecer como uma oposição de centro ao Bolsonaro, não somente veio precarizando a saúde de Campinas ao longo de seus mandatos, como demonstra o caso do Hospital Ouro Verde, que entregou à iniciativa privada das OSs e seus escândalos de corrupção com a Vitale, como também não garantiu testes, EPIs e leitos desde o início. Quando reabriu o comércio, teve que retroceder pouco tempo depois devido aos picos de contágio que a cidade atingiu, recorrendo inclusive a mandar pacientes para a capital diante da lotação de leitos.

Quem serão os inimigos dos trabalhadores de Campinas nessas eleições?

A Câmara de vereadores de Campinas é notável por seu conservadorismo direitista e ajustador. Episódios como a moção contra a menção à Simone de Beauvoir no Enem, aplausos a Trump e tentativa de aprovação do Escola sem Partido são alguns dos seus emblemas. Não é surpresa que dela sairão alguns candidatos da extrema direita bolsonarista, da direita tradicional e representantes ajustadores de Jonas, com grandes aparatos de campanha financiados por empresários que buscarão convencer os trabalhadores e o povo pobre campineiro de que são alternativa nas eleições.

Algumas das figuras mais nefastas são representantes saídos diretamente da polícia, em um momento em que as massas, com protagonismo negro, combatem esse aparato repressivo racista no coração do imperialismo dos Estados Unidos e que no Brasil o massacre da juventude negra se aprofunda. Em Campinas, essa instituição tirou a vida de Jordy, no início deste ano.

Estamos falando, por exemplo, do bolsonarista Tenente Santini, que entrou na política após uma longa carreira na Polícia Militar de São Paulo. Seu lema de campanha faz referência à "rota". Entusiasta das escolas cívico-militares em Campinas, o vereador do PP encabeçou o projeto Escola sem partido, para não “passar uma doutrinação política contra a ditadura” nas escolas. Disse em 2017 que se devia “passar o cerol” em moradores de rua e, na cidade dos feminicídios, é inimigo declarado das mulheres e faz campanha contra o direito ao aborto, enquanto morrem milhares de mulheres, em sua maioria negras, por abortos clandestinos.

Justamente na contramão do que significa a polícia para as mulheres, há também a pré-candidata Delegada Terezinha, do PTB, partido de Roberto Jefferson, pivô do escândalo do mensalão, que convidou o próprio Bolsonaro a ser parte do partido, e que agora abriga o reacionário Douglas Garcia do Direita São Paulo.

Por sua vez, o presidente do PSB e secretário de Relações Institucionais Wanderley Almeida, Wandão, entrou na disputa para ser prefeito de Campinas. Além de ser parte do mesmo partido de Jonas Donizette, foi responsável por encaminhar a reintegração de posse da Ocupação Nelson Mandela, que pretende colocar 600 famílias que residem no assentamento desde 2017 na rua em plena pandemia, depois da reintegração de posse covarde e violenta de Jonas Donizette no Jardim Capivari. Arthur Orsi do PSD foi amigo de campanha de Santini, e é do mesmo partido de Guilherme Campos que foi presidente dos Correios e atacou permanentemente os trabalhadores. Rafa Zimbaldi do PL, votou a favor da reforma da previdência de Doria e foi um dos responsáveis pela implementação das Oss em Campinas. Além disso, um dos articuladores do golpe institucional, Carlos Sampaio do PSDB, também deve se candidatar.

Como enfrentar a direita em Campinas?

Nesse cenário, na semana passada, o PSOL anunciou sua coligação com o PT em Campinas, decidida inclusive sem prévias no partido, o que gerou inúmeros questionamentos da própria militância do PSOL por ser um processo que foi burocratizado. O candidato do PT é o atual vereador Pedro Tourinho. O argumento central, em defesa da coligação, é que seria a melhor maneira de vencer a extrema direita e os ajustes neoliberais, que se fortaleceram no país com o golpe institucional em 2016 e contaram com eleições manipuladas pelo Judiciário, com a prisão arbitrária de Lula, para eleger Bolsonaro.

Entretanto, a conciliação de classes é parte do DNA do PT, que administrou o capitalismo brasileiro por 13 anos, triplicando os postos terceirizados e usando as forças repressivas nas favelas contra o povo negro com as UPPs e as tropas brasileiras contra o povo haitiano. De mal menor a mal menor, fortaleceu um mal cada vez maior, como a bancada da Bíblia e da Bala que conta com seus representantes em Campinas.

Em Campinas a trajetória do PT é particularmente problemática. O partido não só exerceu quatro mandatos de prefeitos na cidade, como contou com secretários e vice prefeitos em boa parte dos governos pós anos 90 na cidade. A atuação do PT na cidade contou não só com a presença sindical construindo a passividade e traindo lutas e greves como foi agente direto contra os trabalhadores. Podemos lembrar da greve dos trabalhadores municipais contra prefeita do PT, Izalene Tiene, que, em 2003, no contexto da reforma da previdência aplicada por Lula, ficou conhecida como “Izalene Zero” por negar qualquer reajuste a categoria. Os atos e piquetes desta mobilização foram fortemente reprimidos com manifestantes e lideranças sindicais presos.

Na primeira vez que Dr. Hélio foi eleito, o PT, apesar de contar com candidatura própria, teve parte de sua militância e de sua estrutura voltada para a do Dr. Hélio e no segundo turno todo o partido dedicou suas forças para eleger o candidato do PDT. No primeiro mandato de Dr. Hélio, Gerson Bittencourt do PT, foi secretário de transporte da cidade e precisou enfrentar as vigorosas manifestações da juventude pelo passe-livre.

A repressão encabeçada pelo governo, que o PT compunha, contra jovens secundaristas foi violentíssima. No segundo mandato de Hélio o PT contou com o vice, Demétrio Vilagra que chegou a governar a cidade depois do impeachment de Hélio. A câmara de Campinas cassou o mandato de Demétrio por duas vezes. A tentação em fazer parte da administração capitalista é forte para o PT. Mesmo depois da derrota do candidato Marcio Pochmann figuras destacadas do PT apoiaram e algumas fizeram parte do primeiro mandato do governo de Jonas Donizzete, como Jairson Canário que foi secretário do trabalho no governo de Jonas Donizzete (PSB) e Pedro Serafim (PDT) e acabou sendo expulso.

A história do PT na cidade evidencia isso. Foi agente no aumento escandaloso da terceirização em Campinas, defendeu grandes empresários de transporte da cidade e, fundamentalmente, esteve no lado oposto de lutas importantes dos trabalhadores e da juventude como greves de trabalhadores municipais e lutas estudantis. Apesar de o partido aparecer como oposição a Jonas em Campinas, nacionalmente vemos uma grande contradição que mostra a verdadeira face do PT: desde o início do ano, a Executiva Nacional da legenda do PT aprovou uma resolução listando diversos partidos como parceiros preferenciais para as eleições, dentre eles o próprio PSB.

Neste momento, embora Lula busque localizar sua figura à esquerda, até mesmo criticando a frente ampla como parte de uma divisão de tarefas, o PT ainda assim encaminha a aprovação da Reforma da Previdência no Rio Grande do Norte com Fátima Bezerra, que recentemente homenageou a Polícia Militar. Nesse sentido, é implementador dos ajustes neoliberais contra os trabalhadores onde governa.

Por sua vez, o PCdoB não somente foi relator da MP que permite corte de salário e suspensão de contratos na pandemia, como agora anuncia a necessidade de conformação de um novo partido, com Dino, Freixo e também o PSB de Jonas Donizette. Sua pré-candidata é Alessandra Ribeiro para a prefeitura da cidade. Em Campinas, o PCdoB também foi parte do governo de Dr Hélio (PDT).

Precisamos superar o projeto petista de conciliação de classes

Desde o golpe institucional, esses partidos, que também estão à frente das principais centrais sindicais do país, vêm apostando em derrotar a direita com eleição. Com isso, demonstram sua impotência estratégica, porque permitem que cada vez mais se avancem os ataques. É urgente unir os trabalhadores, as mulheres, os negros e LGBTs contra Bolsonaro na luta de classes, como não fizeram as centrais sindicais diante da mobilização de entregadores, por exemplo, com a CUT e a CTB, que poderiam ter chamado dezenas de categorias que estão sendo atacadas no país a apoiar ativamente os mais precários que se colocaram em luta.

O PSOL, por sua vez, não somente não é parte de chamar os sindicatos a se mobilizarem para batalhar pela unidade da classe trabalhadora com os mais precários, como neste momento privilegia a aliança com velhas fórmulas que já mostraram o fracasso do seu projeto, como já se mostrou a política de conciliação de classe do PT.

É preciso superar o projeto petista com um programa de independência de classe dos trabalhadores e do povo pobre campineiro, que desmascare a extrema direita e a direita em Campinas e faça com que sejam os capitalistas a pagarem pela crise.

Para isso, precisamos dar voz à necessidade de um SUS 100% estatal, precisamos dizer abertamente que não há como reformar as forças policiais e que os trabalhadores precisam ter a luta negra dos Estados Unidos como inspiração para lutar pelo fim da polícia racista e assassina, precisamos de uma lei que proíba as demissões em Campinas, de um auxílio emergencial de 2 mil reais a todos que precisam nesta crise, do não pagamento da dívida pública e da divisão das horas de trabalho entre empregados e desempregados para combater o desemprego.

Precisamos rever as regras do jogo desse regime político que veio sendo transformado cada vez mais a serviço dos grandes capitalistas. Isso impacta diretamente nos municípios. Por isso, com a força social das mulheres, dos negros, dos LGBTs, articuladas aos trabalhadores, defendemos o fora Bolsonaro, mas também o fora Mourão, porque não podemos entregar o poder aos militares saudosistas da ditadura, como termina fazendo o programa do impeachment popular que defendem o PSOL, o PSTU, o PCB e a UP. Batalhamos por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, que seja imposta pela mobilização dos trabalhadores, em combate contra a extrema-direita e sem ilusão nos conciliadores e reformistas. A constituição de 88 está em frangalhos, e não podemos aceitar viver pacificamente no país onde não há aposentadoria, da uberização do trabalho, das privatizações, do assassinato sistemático do povo negro, da violência contra mulheres e LGBT´s, e da destruição do meio ambiente.

A serviço desse programa, a pré-candidatura de Lívia Tonelli, do MRT, está se colocando frontalmente contra essa decisão e chamamos o conjunto da oposição de Campinas no interior do PSOL, a não aceitar pacificamente essa decisão como vêm ocorrendo. É necessário que façamos grandes debates de projeto e programa, inclusive com participação de outras organizações e candidaturas de esquerda, como Laura Leal do PSTU, para que o velho caminho da conciliação petista, que já se mostrou completamente insuficiente no combate à extrema-direita, não se fortaleça em Campinas.




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