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EDUCAÇÃO NO RIO | Pedro Fernandes ameaça as escolas que tiverem muitas reprovações

Resolução da Secretaria de educação traz uma série de medidas autoritárias para intervir diretamente nas escolas que apresentarem altos índices de reprovação, ameaçando inclusive retirar direções que tenham sido eleitas.

quinta-feira 28 de novembro de 2019 | Edição do dia

Foi decretado na segunda feira, 25, a resolução seeduc nº 5803 que “estabelece procedimentos para acompanhamento e melhoria de resultados da rede estadual de ensino”, que prevê a criação de uma série de procedimentos de emergência, indo desde auditorias até a destituição da equipe diretiva, incluindo a formação complementar compulsória para os professores, para escolas que apresentarem mais da metade dos estudantes reprovados, além de intensificar o assédio por parte da secretária as unidades escolares.

Infelizmente essa cobrança por resultados vinda dos altos escalões da secretaria de educação não é uma novidade. A prática maquiar o sucateamento da rede estadual já é uma tradição dentro do populismo fluminense, que frequentemente influencia de forma artificial os indicadores da educação. Pedro Fernandes está seguindo a receita que aprendeu em família, de olho no ano eleitoral, enquanto tenta capitalizar forças para um projeto de educação que em sua essência é reacionário, autoritário e militarizado. Colocaremos aqui quatro pontos de questionamento aos procedimentos de emergência de Pedro Fernandes.

1- Pressão pela aprovação automática

Para o começo de qualquer conversa, para Pedro Fernandes e Witzel pouco importa as condições de ensino e aprendizagem dos estudantes das escolas estaduais do Rio de Janeiro. Pedro Fernandes está preocupado única e exclusivamente com números, o secretário da Educação quer ter um índice de aprovados para poder falar em suas campanhas eleitorais o que supostamente seria resultado de sua gestão.

Mas a realidade é que a dificuldade no ensino e na aprendizagem tem como agente direto o próprio estado. Toda a vez que uma escola no Estado do Rio de Janeiro deixa de ter aula por causa de uma das operações da polícia assassina de Witzel, a comunidade escolar é afetada, e os alunos tem seu direito à educação negado pelo próprio Estado que invade favelas e bairros periféricos. Isso fica especialmente nítido toda a vez que um estudante, seja do ensino médio ou fundamental, é assassinado pela polícia assassina de Witzel (e já foram 5 crianças só neste ano). É aí que surge o grande problema com que os professores tem que lidar cotidianamente, que escapa completamente das possibilidades de resolução da própria pedagogia. É um problema de estado.

Soma-se à isso o fato de que as escolas do Estado não tem nem mesmo ar-condicionados na maioria das salas e muitas tem condições insalubres, infiltrações e infra-estrutura precária. Faltam materiais, faltam porteiros, falta pessoal de apoio nas escolas, e principalmente, faltam servidores, já que na maioria das vezes em que há estes cargos, eles são exercidos por trabalhadores terceirizados e precarizados. Como, nestas condições, Witzel e Pedro Fernandes esperam que ocorra o ensino e aprendizagem? Aí é que está: eles não esperam que ocorra nada, querem apenas uma miragem para mostrar a aprovação - se deles dependesse, mandavam os estudantes ficar em casa, afinal de contas, Pedro Fernandes é uma continuidade da gestão de Pezão em termos de fechamento de turmas e escolas.

Nós, professores e professoras, já vivenciamos pressões sobre as reprovações de alunos por parte das direções todos os dias. Devemos lembrar que o atual modelo de avaliações da rede estadual hoje conta com um mínimo de três avaliações nas quais cada instrumento deve contar com alguma forma de recuperação de nota para o aluno, por exemplo. Não se trata de um sistema para identificar a real necessidade pedagógica para cada situação, mas sim para simplesmente maximizar o valor numérico das notas.

A educação e a construção de conhecimento é um processo que leva tempo, não podemos nos deixar levar por formas imediatistas e mágicas como resolução dos problemas da educação. É preciso sim ter um horizonte para educação que vá além dos limites estreitos da educação burguesa - que tenta produzir um profissional alienado - para ser capaz de formar construtores ativos da sociedade.

2- Formação complementar

A grande maioria dos trabalhadores da educação estadual passaram por provas de concurso público, ou seja, já são certificados. Sugerir, ou até mesmo impor, que os professores precisam passar por uma nova qualificação para serem capazes de dar aula, além de ser uma contradição, é um reducionismo grosseiro usado para jogar a culpa do fracasso do estado nas costas dos professores.

Contudo, o que a política atual de contratações temporárias que a seeduc tem seguido nos mostra, é que o real interesse não está em ter professores melhores, mas sim professores cada vez mais precarizados e sem direitos, que terão mais dificuldade para resistir aos ataques da educação, cada vez mais sobrecarregados e subvalorizados, o que certamente afetará de forma negativa a qualidade das aulas. Não, o governo não quer melhorar as escolas, quer sim transforma-la em um campo de trabalhos forçados - se possível sob controle de um militar.

E se esta formação complementar acontecer, como será feita? Será democrática e contará com a utilização de nossas universidades públicas do RJ que contam com referências na área da educação em vários níveis? Ou será centralizada pela SEEDUC? Diante dos recentes ataques ao plano de carreira, podemos também nos perguntar: essa formação ou certificação pode abrir caminho para a divisão dos professores, servindo de porta de entrada para a meritocracia?

3- Perda de autonomia e democracia nas escolas

A possível retirada de direções significa uma medida autoritária que ataca a autonomia e a democracia na comunidade escolar. A eleição para diretores, junto com o retorno da carga horária para as disciplinas Filosofia e Sociologia (haviam sido reduzidas para 1 tempo semanal em 2012), é uma conquista de greve de 2016, a maior do estado, com participação muito expressiva do movimento estudantil que ocupou diversas escolas, enfrentando a polícia, a mídia burguesa e até mesmo grupos ultrarreacionários em alguns locais.

Este direito nunca foi plenamente reconhecido pela seeduc, e seus representantes diretos fazem questão de sempre usar o termo “consulta”. Com esta resolução, o índice de reprovação poderá usado para atacar direções eleitas que porventura possam divergir das políticas secretaria, produzindo resistência a partir do fortalecimento da comunidade escolar. Em outras palavras, a postura adotada por Pedro Fernandes pode sim tomar um proporção de perseguição política de direções eleitas nas escolas.

É fundamental sempre pautar as eleições escolares com o caráter mais democrático possível. Não é possível admitir que “não há conversa”. Da união de professores, pessoal de apoio e estudantes é possível enfrentar qualquer um tente atropelar a autonomia da comunidade escolar.

4 - Auditoria nas escolas

Essa auditoria vai avaliar as carências das escolas ou apenas servirá de punição às direções, equipes pedagógicas e professores? Qual o sentido de se anunciar uma auditoria, sem critérios bem definidos, nas escolas onde houver mais reprovações, em pleno período dos exames finais, se não para ameaçar tanto os professores quanto as equipes diretivas a empurrar o maior número possível de alunos níveis acima. Muitas escolas da rede estadual funcionam com carência de professores e funcionários, e com o acúmulo de funções com relação aos funcionários de apoio, sendo inclusive uma prática normalizada o funcionamento das escolas sem a equipe pedagógica completa, o que torna ainda mais covarde esta ameaça do estado.

Também aqui não é possível ter ilusões. Se a burguesia pudesse, todas as escolas já estariam vendidas e transformadas em presídios. Estas auditorias propostas pela secretaria de educação nada mais são do que uma arma apontada para as direções, que em muitos casos irão redirecionar esta pressão para os já muito sobrecarregados professores.

Enquanto o filho de Rosa Fernandes celebra sua própria demagogia em vídeos nas redes sociais, a realidade mostra que na verdade sua gestão defende um dos projetos mais autoritários e reacionários em curso hoje no Brasil. Ex-militares são colocados nas escolas no infame programa “cuidar”, enquanto os terceirizados amargam constantes atrasos nos salários. A sobrecarga dos professores que acabam precisando fazer horas extras (GLPs) para viver é a resposta deste governo para o congelamento salarial que já dura cinco anos. Enquanto ele promove encontro com os grêmios de diversas escolas, polícia assassina segue matando a população jovem e negra nas favelas. E ao invés de eleições democráticas para diretores, são nomeados militares para gerir as escolas que passaram pelo infame processo de militarização.

Não há conciliação possível com proposta para a educação de Wilson Witzel, que está sendo levada a frente por Pedro Fernandes. É preciso que cada escola se organize para resistir aos ataques deste governo, com professores, estudantes, pessoal de apoio e terceirizados, para superar a inércia das direções sindicais, que permanecem em um vergonhoso impasse diante da aproximação do ano eleitoral, na expectativa de soluções parlamentares e judiciais pra todos os ataques.

No Rio Grande do Sul, os professores seguem em uma greve contra os ataques do governo estadual. E em São Paulo, começam as mobilizações contra a reforma da previdência estadual de Dória. No Rio de Janeiro é preciso que a mobilização supere o impasse do SEPE, para que possamos nos apoiar ombro à ombro e lutar tanto contra os ataques de Bolsonaro, quanto os do governo Witzel. Não nos enganemos, somente da nossa organização em cada local de estudo e trabalho é que pode surgir força suficiente para enfrentar este governo sanguinário e autoritário que tenta descarregar a crise nas costas da população.




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