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RELAÇÕES INTERNACIONAIS | Papa Francisco e a nova diplomacia do vaticano

quinta-feira 21 de maio de 2015 | 02:02

Desde que chegou ao papado, Francisco procura restaurar à Igreja a legitimidade da sua autoridade moral perdido após o tsunami de denúncias de abuso sexual amparados por bispos e cardeais, bem como os escândalos de corrupção do IOR, o banco do Vaticano, entre outros. Seus gestos, discursos e chamadas para "os fiéis" buscam recuperar a autoridade do Vaticano e a diplomacia da "Santa Sé".

A intervenção papal em Cuba e a recente reunião com o líder da Autoridade Palestina são o trunfo do Vaticano, muito próximo da política externa da administração Obama.

O “Anjo da Paz” e os direitos palestinos

"Você é um Anjo da Paz", foi a frase que deu Francisco a Mahmud Abbas e a foto do Papa com o líder palestino percorreu o mundo com a notícia do reconhecimento do Vaticano de um Estado palestino.

O comunicado do Vaticano é mais um golpe para o governo de Netanyahu e uma "pequena ajuda" a política de Obama. Assim, ele se juntou a decisão da ONU que já em 2012 havia declarado Palestina, na verdade, os territórios ocupados, como um Estado observador não membro daquele organismo.

O reconhecimento da reivindicação palestina pelo Vaticano provocou convulsões na diplomacia internacional e um novo golpe contra a ala-direita política Netanyahu. Mas Francisco não faz "pontos sem nó". Por um lado adere à pressão na tentativa de avançar na garantia de direitos para a Igreja Católica na Palestina; se alinha com a política de Obama sobre o acordo palestino e mostra que Israel não está disposto a desistir desses direitos no interior do estado sionista.

Ao mesmo tempo, o apoio a Mahmoud Abbas pretende reforçar a autoridade do líder palestino contra a crescente oposição à sua política de colaboração com o Estado de Israel e fortalecer a saída à reivindicação palestina por meio da política de "dois estados".

O impacto do apoio do Papa à reivindicação palestina é apresentado como um reforço da afirmação destes últimos. Mas o fato é que a reivindicação de Francisco por um Estado palestino aprofunda a política de liquidar a luta palestina pela autodeterminação e o direito de recuperar o território ocupado pelo Estado de Israel, bem como é funcional para tentar atrasar Netanyahu.

A diplomacia americana do Papa

"Se o Papa continua assim, vou orar novamente e frequentar a Igreja" disse Raul Castro após o encontro com o Papa. O líder cubano resumiu o encontro no Vaticano e ao mesmo tempo que mais uma vez agradeceu a mediação da Igreja que levou à aproximação histórica entre os EUA e Cuba, a 17 de dezembro de 2014 anunciou a retomada das negociações formais e diretos após 50 anos.

Como discutido em outro artigo em Cuba, a igreja é tida como a principal força de contenção interna para as medidas de restaurar do capitalismo em Cuba.

A política em relação a Cuba por Francisco é também uma grande aposta do Papa, procurando reconstruir a autoridade da Igreja, como mediação na ilha e em todo o continente. O papel desempenhado na recomposição das relações entre Cuba e os Estados Unidos abre a porta para Francisco de ter uma voz em outros conflitos na região, como a crise política na Venezuela ou o diálogo com as FARC na Colômbia. Não é por acaso que a viagem para a ilha depois de chegar em julho, o Papa visitará o Paraguai, a Bolívia e o Equador.

Dentro deste giro a etapa bolivariana é a que gera maior expectativa. Evo Morales revelou que Francisco tinha solicitado informações de primeira mão sobre a reivindicação da Bolívia ao Chile por uma saída ao mar.

Os resultados bem sucedidos de diplomacia do Vaticano para restaurar as relações cubano-americanas parecem incentivar um maior envolvimento da diplomacia papal em assuntos latino-americanos.

A imagem de Francisco com um dos líderes do "progressismo latino-americano" permite-lhe continuar a recomposição da imagem da Igreja em uma região onde a cumplicidade genocida com ditaduras e escândalos de abuso infantil foram minando sua autoridade. Enquanto se garanta a interferência eclesiástica na vida pública como foi demonstrado na Argentina durante o debate do novo Código Civil.

É claro que com a mediação em Cuba, seguindo a política de administração de Obama, os discursos e gestos denunciando a corrupção ou a busca de melhorar as relações com os principais líderes da região, Francisco tenta colocar a Igreja como um fator de ponderação diante das crises futuras na região.

Francisco e o novo discurso papal para manter seu velho papel

Na conta do Twitter do Papa se adverte: "É melhor uma igreja ferida, mas que indique o caminho." A frase parece resumir a política de Francisco que procura recuperar o seu papel de contenção nas crises futuras, algo para o qual a Igreja atualmente, marcada por alegações de abuso de poder, escândalos de corrupção e abusos sexuais seria difícil fazer sem que surgisse "ares de renovação".

Os discursos de Francisco falando sobre uma igreja austera junto a uma política internacional mais ativa assumindo reivindicações populares estão sendo a aposta para restaurar a autoridade da Igreja Católica e voltar a transformar o Vaticano em um fator de peso internacional.

Os discursos austeros e contra a desigualdade e apoiando causas justas tem levado muitos a olhar para a possibilidade de mudanças em uma das instituições mais reacionárias em todo o mundo.

A verdade é que, com os gestos "populistas", Francisco visa restabelecer a autoridade da Igreja para que ele possa desempenhar melhor o seu papel, que cumpriu por milhares de anos: promover os interesses dos poderosos contra os trabalhadores e o povo.




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