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ARTE E REVOLUÇÃO | O papel da arte na Revolução permanente (parte 3): o gatinho da LIBELU

Nos conflitos internos do movimento estudantil durante o final dos anos setenta, a rapaziada da LIBELU (Liberdade e Luta) dava um banho de criatividade em cima dos cuecões stalinistas.

quinta-feira 6 de agosto de 2015 | 00:00

Não raramente ganhando de lavada nas eleições dos centros acadêmicos da época, a LIBELU envolvia não apenas um espaço de atuação política para trotskistas, mas apresentava a criatividade artística e a abertura estética nos seus debates culturais. E o que a atual geração de militantes trotskistas tem com isso? Bem, se desejamos não ser a meia dúzia de “marxistas iluminados", é preciso que estejamos atentos quanto às formas de comunicação que no plano da arte, por exemplo, ampliam numericamente e qualitativamente o movimento político revolucionário.

No plano da arte gráfica é possível aprendermos com a criatividade revolucionária que a LIBELU possuía. Enquanto que os stalinistas confeccionavam cartazes com foices, martelos e figuras cinzas, assexuadas e uniformizadas, a LIBELU desenhava no centro do seu cartaz um gatinho. Abaixo da imagem do pequeno felino surgia a seguinte frase: NEM TODOS OS GATOS SÃO PARDOS. Ou seja, existe diversidade (estética, sexual étnica, filosófica, etc) e o marxismo precisa lidar de modo revolucionário com esta questão. A atitude criativa da LIBELU era o oposto da uniformização expressiva dos stalinistas; e portanto mais atraente. Era o imperativo da liberdade atraindo os mais variados setores que desejavam destruir o regime burguês e ao mesmo tempo superar a esterilidade dos modelos culturais deformados da esquerda majoritária.

O gatinho da LIBELU se comunicava não apenas com o estudante conhecedor do pensamento marxista, mas com toda rapaziada que, mesmo sem conhecer as implicações da luta revolucionária, possuía uma sensibilidade rebelde e contrária aos valores da classe dominante. Se pensarmos no contexto atual, será que do ponto de vista da experiência estética, agimos como marxistas simplesmente pelo fato de criarmos imagens que tem por tema a luta de classes? A militância cultural deve ser capaz de atrair e se comunicar: é puro idealismo achar que a simples retórica marxista num poema irá ganhar o coração (para utilizar uma expressão de Marx) dos trabalhadores. É arrogante chegar para um camarada que curte funk e dizer que somente a música de protesto, aos moldes sessentista, é o que vale.

A militância cultural revolucionária precisa abarcar um conjunto de táticas visuais e sonoras que, longe de cair em mero ecletismo artístico, pode revelar exatamente o contrário: com a falência dos modelos culturais da esquerda nacionalista, é preciso que estudantes e operários compreendam que a criação artística revolucionária depende do material sensível existente. É este material que molda a percepção do proletariado. É claro que não se trata de falar de Marx utilizando uma camiseta do Mickey Mouse. O importante é detectar nas mais variadas expressões artísticas contemporâneas aquilo que produz um efeito inconformista, rebelde, questionador, ainda que nem sempre o artista esteja consciente da sua revolta. Dialogar com as formas artísticas rebeldes do nosso tempo, pressupõe abertura estética, pressupõe criatividade.

Oferecendo um contexto para a criação e o debate cultural, a esquerda revolucionária não diz como deve ser a arte. O que passa a ser diagnosticado para a juventude e a classe trabalhadora, é que fora da revolução socialista a arte não tem saída: a superação da crise das mais variadas formas artísticas de revolta desagua necessariamente na Revolução permanente. Ou seja, a politização é uma decorrência do amplo diálogo cultural e não uma imposição de convicções estéticas que surgem á priori. É sob estas circunstancias que a informação marxista surge e é estimulada. Novas formas artísticas não são fabricadas artificialmente: a partir das experiências históricas a serem assimiladas pela nova geração, é que uma nova arte revolucionária irá surgir. Já existem elementos desta arte: construtivismo russo, surrealismo e arte pop por exemplo, são relidos em novas criações gráficas e em vídeos experimentais.

Se o trotskismo apresenta uma concepção revolucionária que pelo seu rigor marxista não se degenerou, seu proceder cultural não parte de um programa artístico restritivo mas abarca o que já existe: as experiências da arte contemporânea verificadas em instalações, vídeos e grafites; a literatura realista das periferias, o canto do rap, a linguagem punk, etc. Um gatinho pode ser mais subversivo que um punho cerrado.
No próximo artigo veremos mais detalhadamente como as mais variadas referências artísticas dialogam com a Revolução permanente.




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