×

COLUNA | O fim da Lava Jato, e um mês de Junho quase esquecido

Edison UrbanoSão Paulo

sexta-feira 5 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Na véspera desta coluna, decretou-se a dissolução da “força-tarefa” de Curitiba.

O pensamento aqui já estava armado para tratar de outros temas: as perspectivas de Bolsonaro pós-Trump, a nova onda da pandemia no leste asiático e na Europa (e sim, em Manaus e Brasil adentro); o golpe militar em Mianmar, as controvérsias sobre o papel que a China tem e não tem no mundo… E, sempre de volta, a situação das massas brasileiras e da nossa enorme e multifacetada classe operária (da indústria, transportes e grandes serviços como… a saúde), espinha dorsal de qualquer ideia de reconstrução desse país sobre novas bases.

Até uma entrevista recente de Zé Dirceu parecia em seu momento o assunto perfeito para estrear uma coluna de opinião dentro do Esquerda Diário (quem sabe será tema de uma próxima).

Mas calhou que na véspera, bem na véspera, a Lava Jato, justo ela, foi dissolvida.

Não que ela mereça roubar totalmente a cena agora, assim como não merecia antes, nunca mereceu. Mas que a "coincidência” é forte, isso é.

Justo a Lava Jato, que foi um veículo mais ou menos disfarçado para que o imperialismo dos Estados Unidos colocasse o Brasil de novo no seu devido lugar (de eterno subalterno). Justo ela, que serviu de pretexto para que a direita tradicional - e na esteira dela, a extrema direita bolsonarista - usassem o PT de "alvo" para atacar na verdade as grandes massas trabalhadoras e seus parcos direitos sociais conquistados a duras penas em tantas décadas de luta.

Bem a Lava Jato, que foi a cobertura judicial-midiática perfeita para a expropriação política de umas certas Jornadas de Junho (sim, de 2013), que em seu momento reviraram o país de Sul a Norte e deixaram de cabelo em pé tanto os Partidos da Ordem da direita, quanto os Partidos da Ordem de “esquerda" (especialmente PT e PCdoB). E que depois da Lava Jato (a partir de 2014, vejam só), das manifestações reacionárias dos “camisas-amarelas” de 2015, da consumação do golpe institucional em 2016… foram capitalizadas em sentido contrário.

Hoje por hoje, é fato que a burguesia conseguiu impor o seu “relato dos vencedores” (como diria Walter Benjamin) acerca de Junho de 2013, dissolvendo aquelas genuínas manifestações de massas no processo reacionário que acabou se estabelecendo nos anos seguintes. Aliás, melhor seria dizer que a burguesia conseguiu “apagar" Junho em larga medida - as gerações mais jovens já pouco ouvem falar daqueles dias de convulsão social, e as que participaram em grande medida amargaram tantas derrotas depois que parecem ter se convencido de que nada daquilo valeu a pena.

De fato, nisso tudo é a narrativa do PT que se mostra uma vez mais funcional ao regime das classes dominantes. É o PT que tenta se eximir do papel de administrador do Estado repressor capitalista, e lançar às próprias massas a “culpa” por terem se levantado, contra seu suposto benfeitor.

Se essa narrativa em grande medida se impôs, é mostra tanto da confusão inicial do processo, quanto da falta de vozes que apontassem um relato mais coerente com os fatos, e condizente com os interesses populares profundos.

Afinal, para o PT é útil fazer uma mescla sem sentido entre Junho, Lava Jato, golpe, bolsonarismo (e até… fascismo!). Nessa confusão, apostam em que fique apenas uma vaga lembrança de dias melhores, com um governo petista que usou condições econômicas internacionais extraordinariamente favoráveis para… fazer pequenas concessões e não mudar quase nada da estrutura social profunda do país.

Mas não para nós! Longe inclusive estamos de qualquer idealização daquele junho de 2013… Ali o elemento de luta de classes esteve sempre tão difuso, tão confuso, tão desnorteado, que não é à toa que a burguesia brasileira, velha raposa, percebeu que poderia sair do seu primeiro pânico das massas para depois ir buscando canalizar o processo a favor de uma guinada ainda mais conservadora (aproveitando o fato de que o governo do momento era, vejam só, do PT, da “esquerda”).

Confuso, difuso, manipulável… mas era a luta de classes, enfim. Eram as massas saindo à sua maneira depois de anos de letargia, letargia essa provocada e construída minuciosamente pelo PT (e sim, por Lula em primeiro lugar).

Sem idealização alguma, reivindicar a explosão daquele Junho é a primeira questão que separa os que acreditamos no potencial das massas em tomar para si os seus destinos e abrir um novo caminho para o Brasil e para a humanidade… e todos os outros da “esquerda" que prefere as massas caladas e que só querem falar em nomes delas, governar em nome delas, às vezes até enriquecer "em nome delas”.

Ao mesmo tempo, separar Junho de 2013 de tudo o que veio depois, e em primeiro lugar da Lava Jato, é como separar o joio do trigo. As correntes de esquerda que em nome de apoiar junho contra o PT, apoiaram a Lava Jato, ou até pior em alguns casos, apoiaram o golpe institucional de 2016, não podem estar se preparando para atuar de forma revolucionária quando as massas brasileiras voltem a roubar a cena.

Com essa perspectiva, mesmo os dias mais sombrios da pandemia e do bolsonarismo não nos afligem tanto… O sol há de brilhar mais uma vez, a nossa classe trabalhadora abrirá novamente o seu caminho.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias