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Ásia Central | O avanço do Talibã no Afeganistão demonstra a hipocrisia da guerra ao terror dos EUA

O Talibã conquistou em uma semana 10 capitais provinciais do Afeganistão. Cidades estratégicas como Herat e Kandahar foram tomadas pelo grupo nacionalista islâmico, sinal de importante debilitamento do governo afegão em Cabul. Isso tudo ocorre diante da retirada das tropas do imperialismo estadunidense e das disputas com a China, vizinha do Afeganistão.

Rosa Linh Estudante de Relações Internacionais na UnB

sexta-feira 13 de agosto de 2021 | Edição do dia

Nessa semana, o Talibã reivindicou a captura de Kandahar, a segunda maior cidade do Afeganistão e o lugar onde a organização nacionalista islâmica surgiu na década de 1990. Além disso, Herat, no oeste do país, caiu totalmente para o Talibã. A queda dessas cidades, somadas com a conquista de Ghazni e Pul-e-Khumri parece sinalizar a perspectiva de uma derrota nacional para o governo afegão. Os últimos avanços do Talibã deixam a capital Cabul isolada do resto do país, que agora já controla cerca de dois terços do território.

De acordo com a rede Al Jazeera, o governo fez uma proposta ao Talibã para que haja uma divisão de poder, mas que foi negada. Segundo a agência Reuters, há análises de serviços de inteligência dos EUA que estimam que o grupo pode tomar a capital em cerca de 90 dias. Essa “ofensiva relâmpago", como alguns analistas chamaram, é um resultado direto da retirada das tropas estadunidenses do país e também do completo fracasso da “guerra ao terror”.

Em 2001, o presidente George W. Bush lançou uma ofensiva no Afeganistão em resposta aos ataques de 11 de setembro. O pretexto foi que o governo do Talibã deu refúgio aos líderes da Al Qaeda, incluindo Osama Bin Laden. A guerra no Afeganistão é o conflito militar mais longo que os Estados Unidos já enfrentaram. O custo foi de cerca de US$ 2 trilhões (o equivalente ao atual plano de resgate econômico de Biden), 3.500 soldados americanos e dezenas de milhares de afegãos mortos e feridos no país mais pobre da Ásia Central. Essa é apenas uma das catastróficas intervenções imperialistas, mas podemos ver seus resultados também na proliferação de organizações jihadistas como o Estado Islâmico no Iraque, Boko Haram na Nigéria ou Al Shabab na Somália e tantas outras organizações em diferentes países. Longe de “combater o terrorismo”, a intervenção imperialista matou milhares de inocentes e apenas desestabilizou a região. Trata-se de um jogo político que tem as mãos sujas de sangue dos povos oprimidos da região e muita grana para os senhores da guerra locais e estadunidenses.

O governo Biden anunciou meses atrás a retirada completa dos soldados americanos no Afeganistão até 11 de setembro — marco de 20 anos do atentado terrorista que marcou o início do século. Porém, cerca de 650 militares ainda estão no país para dar segurança ao corpo diplomático americano em Cabul. No entanto, os EUA e outros países ocidentais aceleraram o planejamento para a evacuação de suas embaixadas em Cabul e o site da embaixada dos EUA ordenou que seus cidadãos deixassem o Afeganistão imediatamente. Os EUA e o Reino Unido, numa posição defensiva e desesperada, acabaram de anunciar o envio de 3000 soldados para evacuar seus diplomatas e supostamente “proteger” os civis. Trata-se de uma significativa derrota para os EUA na região, relegando a população à pobreza, fome e autoritarismo. Longe de sua pretensa “defesa da liberdade”, os EUA sistematicamente a destrói, dando passagem inclusive para grupos fundamentalistas como o Talibã. Agora, os esforços geopolíticos de Biden se voltam para o sudeste asiático em que pese sua disputa estratégica com a China.

Leia mais: Biden retirará tropas do Afeganistão, marcando curso estratégico dos EUA

E por falar na China, é importante ressaltar que essa ofensiva é relativamente benéfica para os interesses da burocracia reacionária de Xi Jinping na região. Com os EUA retirando suas forças remanescentes, tanto Pequim quanto Moscou tiveram contato com o Talibã, na medida em que realizaram exercícios militares em conjunto recentemente na província ocidental de Ningxia, próxima de Xinjiang e Gansu - regiões desérticas chinesas em que se encontrou recentemente dados que confirmam a presença subterrânea de instalações de armazenamento de armas nucleares. Xinjiang abriga a fronteira da China com os países da Ásia Central, inclusive o Afeganistão, e é a região em que a burocracia do Partido Comunista Chinês mantém encarcerados mais de 1 milhão de muçulmanos Uighures em campos de concentração. Pequim está realizando movimentações que podem indicar interesse de Xi Jinping para travar acordos com os fundamentalistas do Talibã para conter os movimentos separatistas nessas regiões.

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Diante da catastrófica “guerra ao terror” estadunidense e o avanço das tensões militares entre EUA e China, demonstra-se mais e mais a atualidade da premissa leninista de “crises, guerras e revoluções”. Ou seja, em uma época de decadência histórica do capitalismo imperialista, o horizonte da guerra é cada vez mais um dos possíveis - e apenas passível de ser evitado com a intervenção revolucionária do proletariado, de forma independente, em escala internacional.




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