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Por todo o país, o Pão e Rosas tem participado das reuniões de preparação do 8 de Março em defesa das mulheres e contra Bolsonaro e sua escalada autoritária. Além do Brasil, também estamos organizando as manifestações na Argentina, com os panos verdes; no Chile, em meio à instabilidade deixada pelas enormes jornadas revolucionárias; na Bolívia, tendo de enfrentar mulheres golpistas como Jeanine Áñez; na França, junto aos trabalhadores dos transportes que paralisaram Paris por mais de dois meses e demonstraram a poderosa força da classe trabalhadora organizada e em outros vários países, como México e Venezuela. O mundo é um só campo de combate e, para nós feministas socialistas, não há fronteiras capazes de nos impedir de lutarmos juntas contra o patriarcado e o capitalismo.

Virgínia GuitzelTravesti, trabalhadora da educação e estudante da UFABC

Maíra MachadoProfessora da rede estadual em Santo André, diretora da APEOESP pela oposição e militante do MRT

quinta-feira 5 de março de 2020 | Edição do dia

A crise capitalista chega no seu 13º ano e nós mulheres somos quem tem pago pela ganância dos capitalistas com nossas duplas a triplas jornadas, com retirada de direitos com nossas vidas interrompidas pelo feminicídio. Sem solução aparente para os problemas fundamentais da crise atual, como a inexistência de novos espaços de acumulação capitalista, a crise tem levado a enormes crises políticas, polarizações sociais, crises orgânicas e a um forte movimento feminista internacionalmente, com o retorno da luta de classes em nível mundial.

Os levantes de 2019 cruzaram o mundo de Hong Kong ao Sudão, Líbano e Argélia, que deram uma segunda vida à Primavera Árabe, com protestos no Irã, no Iraque, no Haiti, na Colômbia, na Catalunha, que reativou a luta pela sua independência, e jornadas revolucionárias no Equador e no Chile, a referência do modelo neoliberal internacionalmente. E também em um dos corações do imperialismo europeu, a França, com uma greve que sobreviveu ao Natal e o Ano-Novo para enfrentar a Reforma da Previdência de Macron. É sob essa novidade do retorno da luta de classes, que as mulheres se preparam para este 8 de Março.

Nós, do grupo de mulheres Pão e Rosas, estivemos na linha de frente das manifestações chilenas e francesas, nas quais pudemos batalhar pela unidade de homens e mulheres para enfrentar os capitalistas que buscam descarregar a crise sob as nossas costas. Assim como estamos combatendo o golpe na Bolívia e enfrentando o bolsonarismo no Brasil, onde estamos, somos uma única só voz: a luta pelo feminismo socialista para alcançar nossa emancipação.

O Chile começou o mês de Março com fortes mobilizações, mostrando que mesmo com a tentativa de Sebastian Piñera em normalizar o país através de sua antidemocrática Constituinte, não há calmaria. Na França, apesar do desmonte da greve contra a Reforma da Previdência pelas direções sindicais, especialmente a CGT, ainda há um longo caminho até a aprovação desse ataque e, certamente, enfrentará ainda muita resistência. As mulheres, outra vez, estarão na linha de frente desses processos.

No Brasil de Bolsonaro: as mulheres podem ser a faísca para que os trabalhadores combatam a escalada autoritária, como se demonstrou nos últimos dias na batalha de professoras e professores do Estado de São Paulo contra a Reforma da Previdência de Doria. Fortalecidas pelos combates de nossas companheiras internacionalmente, nós do grupo de mulheres Pão e Rosas rechaçamos a escalada autoritária de Bolsonaro, que apoiado pelas Forças Armadas e alentando as milícias e o motim policial visa a atacar o Congressos e as demais instituições na tentativa de impor seu projeto reacionário, de mais ataques às nossas condições de vida. Junto com Damares, buscam retroceder nos poucos direitos que temos, como os mais de 20 projetos de lei que visam a restringir o direito ao aborto nos casos em que ele é legal, nos constantes ataques às pessoas que convivem com HIV e a juventude, em que hipocritamente se defende a abstinência sexual, buscando apagar ainda mais as sexualidades não heterossexuais e manter proibido a educação sexual para que se decida conscientemente sobre os nossos corpos.

Nosso combate contra Bolsonaro não tira o centro de nossa denúncia esse Congresso nacional, presidido por Rodrigo Maia, que é o grande implementador da Reforma da Previdência nacionalmente, composto por uma série de deputados que defenderam o golpe institucional para poder implementar ajustes contra a classe trabalhadora, ainda mais duros do que o PT implementou em seus anos de governo. Nós, do Pão e Rosas, não alimentamos nenhuma ilusão nesse Congresso e nem mesmo no STF, uma instituição que faz demagogia com nossas demandas e sempre se colocou abertamente contra os direitos elementares das mulheres, como o direito ao aborto.

Por isso, neste 8 de Março, queremos construir um grande bloco do feminismo socialista e colocar todas as nossas forças para que tenhamos atos muito fortes em todo o país, que mostrem ao bolsonarismo que ele tem um grande obstáculo para descarregar seus ataques contra o conjunto dos trabalhadores: as mulheres organizadas. Com a enorme moral dos petroleiros e petroleiras que fizeram uma greve histórica e demonstraram que a classe trabalhadora brasileira não está derrotada estrategicamente, marcharemos contra Bolsonaro, as reformas por justiça a Marielle e pela legalização do aborto. Em cada escola, universidade ou local de trabalho, nós, jovens e trabalhadoras do Pão e Rosas, vamos construir essa mobilização, entendendo que estamos juntas com nossas companheiras em distintos países dando o mesmo combate, porque o patriarcado e o capitalismo não vão cair sozinhos. Nós temos que derrubá-los e, para isso, precisamos nos organizar junto com os homens trabalhadores, os negros e os LGBTs para destruir esta sociedade de exploração e opressão e construir uma nova, na qual não haja mais patrões, polícia ou Estado.

O movimento de mulheres internacional, que antecedeu o segundo ciclo da luta de classes internacional, demonstrou que o neoliberalismo, por mais que tenha nos fragmentado e teorizado contra a existência dos trabalhadores e da possibilidade de revolução, não pode retirar as localizações estratégicas dos trabalhadores, que ainda são a enorme força para paralisar a produção, os lucros patronais e para produzir numa escala muito mais racional, que sem as amarras do capitalismo, pode estar a serviço de nossa emancipação e não para enriquecer um punhado de parasitas que vivem do nosso suor.

Quando falamos de feminismo socialista, dizemos que, para nós, a luta das mulheres não está separada da luta de classes e que quando participamos de cada luta parcial contra a violência às mulheres, pedindo justiça contra os feminicídios, por mais creches ou equiparação de salários, quando vamos aos atos do 8 de Março ou no 28 de Setembro pela legalização do aborto, enquanto estamos na linha de frente contra a retirada de cada direito e por alcançar um ou outro a mais, não separamos esses combates da luta por nossa emancipação. Isso tudo sempre pensando como cada luta pode ser um ponto de apoio para uma radical e verdadeira transformação social. Como diria a enorme revolucionária Rosa Luxemburgo, não perdemos o “fim último”, nosso objetivo final, a luta pela verdadeira libertação do patriarcado e do capitalismo, que nos garanta o direito ao pão, mas também às rosas.

Recuperando o legado das centenas de revolucionárias que dedicaram suas vidas às grandes paixões sociais, nos inspiramos nos combates de nossas companheiras no Chile, que construíram Comitê de Emergência e Resguardo em Antofagasta, e o Comitê da estação ferroviária de Saint-Lazare, em Paris, e agora a Coordenação RATP-SNCF, organismos de auto-organização que buscam integrar as posições estratégicas do movimento operário nos territórios e distintos setores das camadas exploradas e oprimidas. Exemplos esses que não se dariam na realidade sem a intervenção decidida de mulheres e homens que seguindo o marxismo revolucionário, confiam que a classe trabalhadora é a única classe revolucionária de nossa época, a única capaz de dirigir nossas reivindicações em choque com esta sociedade de miséria, Uma sociedade que obriga mulheres trans a viverem da prostituição para sobreviver, que aumenta todos os anos o número de meninas que sofrem com o tráfico sexual e mantém milhares de mulheres mortas por abortos clandestinos.

Se o Brasil foi um dos lugares do mundo onde ficou mais explícito que o multiculturalismo produzido pelo neoliberalismo não era oposto à aprovação de enormes ataques ao conjunto da classe trabalhadora e dos pobres, também é onde se mostra a enorme necessidade de se construir um feminismo socialista, onde as mulheres sejam o combustível de energia e coragem para erguer os grandes batalhões de nossa classe para enfrentar o Bolsonarismo, sem repetir os erros do PT, que até hoje aposta no judiciário e com seus governadores no nordeste aprovando a nefasta Reforma da Previdência estadual. Exemplo evidente disso é a oposição aos valores conservadores por parte da Rede Globo enquanto apoiava fielmente o golpe institucional e a aprovação da Reforma Trabalhista e da Previdência. Por isso, não esquecemos que se o gênero nos une, a classe nos divide e não compactuamos com mulheres como Fatima Bezerra, governadora do Rio Grande do Norte que hoje nos ataca. Muito menos com golpistas como Joice Hasselman, Janaína Pascoal, aqui, ou Jeanine Áñez, na Bolivia.

Somos do Pão e Rosas, trabalhadoras, trabalhadores e estudantes, que lutam pela revolução. Vamos ao 8 de Março de maneira independente para enfrentar a extrema-direita, sem rebaixar nossas bandeiras históricas. Somos feministas socialistas, porque temos um compromisso inegociável com as revolucionárias que nos antecederam, lutamos incansavelmente pela libertação das mulheres, batalhamos pelo direito ao Pão e também às Rosas.




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