A capital do Rio Grande do Norte e região metropolitana enfrentam um alto volume de chuvas, estima-se que em 12 horas choveu mais que o previsto para o mês de julho inteiro, resultando em grandes enchentes, alagamentos pela cidade, bairros e municípios vizinhos e abertura de imensas crateras. Foi decretado calamidade pública e mais de 25 casas foram interditadas pela Defesa Civil por risco de desabamento, um homem morreu em São José do Mipibu, na tentativa de desentupir um bueiro. Felipe Camarão, localizado na Zona Oeste de Natal, foi um dos bairros mais afetados, onde uma cratera se abriu em uma das ruas.
quinta-feira 7 de julho de 2022 | Edição do dia
Se solidarizando e colhendo depoimentos de forma anônima, o Esquerda Diário vem denunciando os responsáveis por essa situação. Tendo isso em vista, uma moradora, uma menina de apenas 12 anos, de Felipe Camarão foi entrevistada ontem pela manhã, dizendo que não consegue dormir à noite de medo dos impactos da chuva:
Menina: "Do asfalto a gente ainda consegue ter acesso à casa, mas tá muito precária, não tem como passar ali, de vez em quando eu passo, agora eu tô passando ao redor pra não passar por ali porque é muito perigoso e dá muito medo né de a calçada cair porque o mais preocupante era a calçada cair. O meu pai conseguiu entrar na casa do lado pra tirar algumas coisas que a mulher que morava lá, o filhinho dela ficou doente então ela foi morar em outra casa. E graças a deus ela foi morar em outra casa porque ali já não tinha como… já foi interditado bem antes. E tipo assim, ali é o perigo, onde mora o perigo, porque a calçada tá muito precária. Já entraram, já desceram, subiram várias pessoas dali então ali tá muito precário. É o nosso maior medo que isso aqui vá desabando as casas, porque enquanto tá só a rua, enquanto tá só essa parte do meio, tá tudo bem, eles vão conseguir ajeitar. Agora as casas, vão ter um prejuízo muito maior, porque a gente não vai receber os nossos móveis de volta e quem vai ser indenizado é o dono da casa. A gente vai ficar sem aluguel, a gente mora de aluguel então provavelmente a gente não vai receber os nossos móveis de volta. Então a nossa preocupação é os móveis que tão dentro da casa. O dono da casa ele mora no primeiro andar e ele já saiu daqui, ele tá um pouco doente até por causa dessa situação e ele saiu. Mas o ruim é os nossos móveis que tá lá dentro, se isso desabar a gente não vai receber indenização de ninguém dali dos nossos móveis, porque é uma casa de aluguel. A gente tá conseguindo, ainda bem que a nossa família tá nos apoiando com [casa] e essas coisas assim. Ontem a gente recebeu várias doações, foram várias pessoas lá, deram roupas, comida, comida ainda não, eles deram… Comida foi o CRAS. Eles [as pessoas] deram panelas, várias coisas assim pra que a gente consiga tá se resolvendo lá. Porque isso aqui não vai se resolver em dois dias. Isso aqui vai se resolver em meses e a gente não tem o que fazer, tem que esperar eles ajeitarem. E o ruim é ver que eles saem daqui, hoje não tem um trabalhador aqui trabalhando. Eles tão trabalhando lá num buraco que tá bem pequenininho que eles já deveriam ter terminado e aqui ainda tá numa situação bem precária aqui, não tem o que fazer".
Esquerda Diário (ED): Tá bem feio lá embaixo
Menina: "É, tá muito feio e é muito preocupante né? Muitas pessoas adoecem com depressão, ansiedade por causa disso, por ver seus móveis presos e não conseguir entrar dentro da sua casa porque tem uma cratera na frente dela. É muito difícil, a gente olha assim e fica triste, já várias vezes meu pai e eu a gente chorava porque a gente via essa situação, a gente as pessoas passando por essa situação e a gente não pensava que se um dia isso acontecesse a gente não se colocava no lugar do outro".
ED: Isso já aconteceu aqui no Felipe Camarão em outras ruas
Mãe: "Não, assim não, nunca não. Primeira vez que isso já acontece. Já abriu por aqui uns outros pequenininhos, mas assim não".
Menina: "Até porque quando abriu o buraco pequeno eu olhei e disse “novidade né abrir um buraco desse tamanho, pequeno”, novidade porque sempre acontecia isso, sempre abria buracos e quando ele começou a crescer, a gente olhou direito as tubulações e não estava do jeito direito que devia estar, não tava do jeito que isso deveria tá pra… porque isso só aconteceu por causa das tubulações. As tubulações caíram, depois que a chuva caiu e tirou a areia as tubulações quebraram… não sei o que aconteceu mas quando isso aconteceu a água foi empurrando mais ainda e abriu tudo e tipo assim, é muito triste ver isso tudo que eles não tão fazendo quase nada por isso. Eles tão resolvendo… é claro que tem vários outros buracos, abriram vários outros buracos em vários bairros, mas isso daqui é o maior, eu tenho certeza que é o maior de todos, é uma rua inteira, várias casas foram interditadas, se eu não me engano foram 22 ou 23 casas que foram interditadas e com situações precárias. Tem muita gente… uma mulher saiu, ela tava passando mal, ela saiu, ela acordou e viu que a calçada dela tinha caído. Imagina você acordar e ver que a sua calçada caiu por causa de uma enchente, de uma chuva muito forte".
ED: Quando que eles vieram?
Menina: "Eles vieram muito depois, tipo assim, a defesa civil. Chegou a população, ajudaram, foram colocando sacos de areia, primeira coisa que eles pensaram era em colocar sacos de areia pra tampar a barreira que tava vindo de água e quando eles fizeram isso, que já tava tudo quase terminando e tal a defesa civil chegou. Quando eles chegaram, eles não souberam o que fazer, só terminaram o que a população tinha feito. Eles tavam fazendo isso e o humor deles não parava, a gente ainda continuava brincando, mesmo com a situação muito séria a gente continuava tendo aquele pouco de esperança, né? Enquanto eles faziam isso, tava todo mundo lá ajudando, pegando guarda-chuva, essas coisas assim. Então quem fez a maioria das coisas pra que eles conseguissem tampar aquele buraco e conseguir tirar o carro que tava ali dentro foi a população. Não foi a defesa civil que chegou primeiro, bem antes e começou a ajeitar isso daqui. Não foi a prefeitura que teve a ideia de fazer isso daqui. A população foi que fez. Saíram de casa, tomaram chuva, ficaram doentes, mas eles terminaram isso daqui, eles não queriam ver isso daqui que aconteceu. Mas isso aqui foi até necessário pra fazer: a água tava descendo muito forte, então eles precisavam fazer alguma coisa pra que o caminho da água fosse feito. Eles tiveram que cavar e cavando, cavando, conseguiram deixar com que a água fosse lá pra maré, lá pra baixo. Mas mesmo assim, se a rua, se tivesse ajeitado bem antes, se ela tivesse bem menos precária que ela tava, isso não teria acontecido, ninguém teria que ter ido pra casa dos parentes se abrigar e perder os móveis".
É revoltante e não é natural que famílias estejam perdendo suas casas e bens materiais, bem como em situação de grave risco por conta das chuvas. Isso é fruto da ganância capitalista que prioriza o lucro acima de tudo, inclusive das vidas da população. A responsabilidade dessas tragédias está nas mãos do Prefeito Álvaro Dias (PSDB) e de prefeitos da região metropolitana, do Governo Bolsonaro, que em 2021 cortou 75% das verbas de orçamento de ações destinadas à prevenção de desastres naturais, assim como de Fátima Bezerra e da conciliação petista que governa o Estado hoje, afinal é o governo que dirige a CAERN, sistema de saneamento de água e esgoto, controlando as lagoas de captação que transbordam e inundam as casas, além de se aliar para reeleição com a oligarquia dos Alves, responsável estruturalmente por essa situação.
Hoje, às 15h, ocorrerá uma plenária no Sindsaúde para pautar as enchentes. É urgente um plano de emergência imposto pela mobilização para conter e dar uma resolução dos trabalhadores, unificados com a juventude, os setores oprimidos e o povo pobre, para essa crise.
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Confira o depoimento de outra moradora: "Começou a abrir muito rápido, a gente se assustou", diz vítima sobre cratera em Felipe Camarão
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