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TEORIA | Minicurso: Trotski - Literatura e Revolução organizado pelo Esquerda Diário na UFCG

O Esquerda Diário organizou um minicurso sobre “Trotski- Literatura e Revolução” na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) nos dias 02 e 03 de agosto, pelo professor Romero Venâncio da Universidade Federal do Sergipe (UFS) que contou com umas cinquenta pessoas.

quinta-feira 18 de agosto de 2016 | Edição do dia

O livro Literatura e Revolução de Leon Trostki foi escrito entre 1922 e 1923. A introdução, no entanto, foi escrita em 1924 após morte de Lenin o que é sintomático e dá o tom das preocupações de Trotski sobre o futuro e os riscos da Revolução.

O minicurso é dividido em três partes, uma primeira sobre Trotski na Batalha de Ideias entre a Vanguarda e a Tradição, uma sobre o Futurismo e por fim sobre os Suicídios como o de Maiakoviski e Iessênin.

Trotsky na Batalha de Ideias entre a Vanguarda e a Tradição

Desde o final do século XIX, na Europa Central (França, Alemanha, Itália, e em parte a Inglaterra) passou a se produzir uma crítica a uma certa concepção de arte moderna – as primeiras vanguardas europeias. Elas começavam a mostrar a que viriam, o exemplo mais claro na poesia é As Flores do Mal do francês Charles Baudelaire, fugindo do padrão de versos com lirismo que de maneira geral não se encaixa na realidade, Baudelaire faz o contrário ele trouxe a realidade para a poesia.

Em relação às vanguardas Trotski tem uma posição revolucionária, dialética. De maneira geral havia duas posições, a de entusiasmo como a de Vladimir Maiakovski e a de rejeição como a do Proletkult que foi um movimento literário de valorização da “cultura proletária” criado por Alexander Bogdanov e Mikhail Gerasimov. Trotski desenvolve uma outra posição, a qual Romero Venâncio chama de Concepção Dialética das Artes e da Literatura. Posição essa que György Lukác só vai chegar muito tempo depois.

A dimensão do desenvolvimento desigual e combinado de Trotski se manifesta inclusive em sua análise das artes, ao não rejeitar as vanguardas e ao não apoiar o Proletkult. Ele percebe elementos importantes nas Vanguardas, ao mesmo tempo que percebe seus limites, na medida que visualiza os problemas da “arte proletária”.

Para além de um livro de história da literatura russa, Trotski produz crítica literária, ou seja, formula uma concepção dialética de literatura e crítica literária.

Em relação a “arte proletária” expressa pelo Prolekult estalinista a principal discordância de Trotski é o dogmatismo da concepção de arte, como pode ser visto no ensaio “cultura e arte proletária”. Para ele as artes devem ser julgadas segundo seu próprio critério, ele tinha medo que uma instância que definisse a arte se tornasse uma instância burocrática a servido de uma burocratização da revolução, uma camisa de força nas artes. O que eventualmente veio a acontecer a partir do Congresso de Kharkov, que trouxe o stalinismo para o campo das artes, engessando profundamente todas as formas de expressão artística.

Romero se referia ao Congresso Internacional de Escritores Proletários que aconteceu em 1930 em Kharkov – por isso ficou conhecido como Congresso de Kharkov – propôs que o Partido deveria aderir a um único tipo de literatura, o chamado Realismo Socialista, condenando as modernas técnicas “decadentes” do ocidente. A partir de 1934 essa posição se tornou oficial.

Essa influência se fez sentir nos Partidos Comunistas de todo o mundo. No caso do Brasil é emblemático as divergências entre Jorge Amado e Graciliano Ramos. Com Jorge Amado na posição de grande referência brasileira do realismo socialista, enquanto Graciliano Ramos era profundamente contra a essa forma panfletária de fazer “literatura”.

Romero Venâncio enfatiza que “Vidas Secas” de Graciliano Ramos obedecia perfeitamente aos critérios de arte para Trostki, e que se coloca como oposição ao modo de fazer literatura do Proletkult. Sobre a obra Vidas Secas já foi publicado um artigo meu aqui no Esquerda Diário

Boa parte da obra do peruano José Carlos Mariategui foi de certo modo relegada ao limbo pelos partidos comunistas por não estar em sintonia com o Congresso de Kharkov, por ser consideram muito eclético, por defender os índios, e também por não ser de origem proletária.

Outro exemplo é Sartre, que mesmo que defendesse essa perspectiva do realismo socialista, não a praticava. A literatura dele não caberia numa camisa de força dessa natureza.

O Congresso de Kharkov calou o cinema russo por mais de 20 anos, aquele cinema que produziu “A Greve”, “A Mãe”, “Outubro” foi levado ao ostracismo, ele só voltou a vida no final da década de 1960.

Já na década de 1920 Trotski já havia alertado para os riscos da burocratização em todas as esferas da sociedade, em particular nas artes que veio a ser o trágico “realismo socialista”. Que foi muito danoso para a imaginação, para a criação porque a “arte se passou a criada” em uma instância “superior”.

Um elemento importante em Literatura e Revolução é a unidade que Trotski dá a forma e conteúdo, onde William Keach no prefácio do livro coloca “Trotski diz haver entre “forma” e “conteúdo” uma interação dinâmica e de definição por reciprocidade, e é isso que o leva a retraçar os conceitos segundo suas raízes no “objetivo social” que se transforma com a história”. Partindo dessa perspectiva não se pode pensar em arte revolucionária exclusivamente no que diz respeito ao conteúdo ou a forma, mas sim em uma interação dialética.

Ao falar sobre a relação entre arte e economia Romero enfatiza que não se pode dizer que haja uma relação direta entre economia e arte, a arte é autônoma! Mesmo que de maneira relativa, como tudo no capitalismo. Liberdade absoluta e autonomia absoluta é um mito, no capitalismo nada é autônomo, tudo é relacional. Isso significa que a arte não precisa ser ancorada dogmaticamente na realidade material e econômica, porque a realidade já está presente na obra. A arte é relativa a realidade, ela não é determinada mecanicamente pela realidade, há uma inter-relação dialética.

Em mais de um momento desse minicurso o professor Romero mencionou o critico literário marxista e trostkista Terry Eagleton, sobre ele o Esquerda Diário publicou os textos “Terry Eagleton: a literatura situada na vida” e “O que vem depois do Pós-Modernismo?”.

Futurismo e Carta de Gramsci

As Vanguardas Estéticas foram um fenômeno tipicamente europeu, iniciado no final do século XIX, ao qual se destacam o Impressionismo Frances, Expressionismo Alemão, Surrealismo Frances e o Futurismo Italiano e Russo. Essas vanguardas, todas, rejeitam a tradição e questionam a arte enquanto arte.

No que corresponde ao Futurismo, essa vanguarda vai no sentido da anti-tradição de maneira radical na forma dos versos e produz toda uma poética da tecnologia. Trotski percebe, e está no seu ensaio sobre o futurismo, que isso é uma arte tipica de países atrasados tecnologicamente. Essa apologia da técnica é ambígua, na medida em que não é incompatível o progresso técnico e barbárie política, o que pode ser chamado de modernismo reacionário, ou seja a implementação de mudanças tecnológicas e conservadorismo político.

No que se refere ao Futurismo na Rússia e na Itália, há convergências e divergências. Trotski percebe, e aparece também na carta de Gramsci, que o Futurismo Italiano que nasceu no ceio popular se tornou de extrema direita fascista. Ao contrário do que aconteceu na Rússia, onde os futuristas se aliaram aos revolucionários.

Os Suicídios (Maiakóviski e Sierguei Iessênin)

Há dois ensaios no livro dedicados aos suicídios de Maiakóviski e Sierguei Iessênin. O professor Romero destaca que foram suicídios por razões pessoais diferentes, mas para Trotski não foram por razões puramente pessoais, mas também devido a um tipo de política de natureza stalinista.

Trotski atribui ao stalinismo os suicídios pós 1924. Esses dois são marcantes porque ambos deram a vida pela revolução, e sem revolução ou com a revolução traída foi como se eles tivessem perdido a razão para viver. Os últimos dias de Maiakóviski foram muito melancólicos, ele parecia o oposto de si mesmo, mal saia de casa.

Esses dois casos não foram únicos, houve uma série de suicídios em boa medida relacionados a traição da revolução. E também houve o caso dos que não se mataram, mas acabaram morrendo no ostracismo.
Trotski coloca que “o desenvolvimento da arte é a maior prova da vitalidade e da importância de cada época […] A cultura alimenta-se na seiva da economia. É preciso, porém, mais que o estritamente necessário à vida para que a cultura se desenvolva e aprimore”. É fundamental construir as condições econômica, sociais e políticas para que a arte se desenvolva.

Em linha geral esses foram os temas abordados no Minicurso, que pode ser assistido na integra:

Links Minicurso Trotski - Literatura e Revolução

Dia 1

Dia 2

Foi a primeira atividade organizada pelo Esquerda Diário e avaliamos que foi um sucesso em termos qualitativos do ponto de vista da iniciativa política, no âmbito acadêmico com uma visão ofensiva do marxismo num momento de crise orgânica no Brasil, econômica, política e social. É muito importante retomar as contribuições de Trotsky trazendo para a análise do cenário político atual e de como intervir na luta de classes, no sentido de construir uma sociedade nova sem explorados, nem exploradores, e para isso a necessidade da construção de partidos revolucionários a nível nacional e internacional, que para nós é a IV Internacional.




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