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Medidas duras de Temer podem trazer melhorias?

Os principais jornais defendem que muitas medidas do governo – como as altas das taxas de juros, e cortes de direitos, privatização de patrimônio público ou demissão de funcionários públicos – são medidas duras, mas necessárias para controlar a inflação e criar vagas de trabalho. Sempre são lembradas como fórmulas que continuariam ou retomando o dito sucesso do Plano Real, implantado nos anos 90 no Brasil. Mas será que essas medidas duras de hoje realmente podem trazer as melhorias prometidas no futuro?

segunda-feira 6 de fevereiro de 2017 | Edição do dia

Fonte: Ipeadata (2014) e http://www.resistir.info/brasil/plano_real_20_anos.html

Os jornais costumam todos os dias divulgar os valores das taxas de inflação, mostrando o quanto o crescimento dos preços aumenta ao longo do tempo.
Sempre é lembrado também que o Plano Real se mostrou para muitos aparentemente eficiente, e a inflação – antes descontrolada - diminuiu. O trabalhador sentia num primeiro momento que o dinheiro que antes se perdia, parecia render mais em sua mão do que comparado no passado próximo de taxas de inflação muito mais elevadas e reajustes semanais elevados e/ou diários nos preços dos produtos da cesta básica.

Mas a grande imprensa, poucas vezes lembra que existem tipos diferentes de inflação. Raras vezes falam que existe a inflação de demanda – causada por uma procura maior do que a quantidade de bens disponíveis – e a de custos – ligados a aumentos dos gastos usados ao longo dos processos de produção.
O Brasil dos anos 90 era – e, em grande medida, ainda é – um país onde a maioria da população vivia para a subsistência. A maioria dos trabalhadores conseguia dos seus salários apenas o suficiente para conseguir ter o que comer, o básico para vestir e ter onde morar no fim de cada mês – sem sobrar quase nada para algo extra.

Assim, o principal problema da inflação no Brasil não era a inflação de demanda.
Entre os fatores que influenciaram a inflação de custo no Brasil, estava a alta taxa de juros da divida publica. A dívida, contraída pela ditadura militar e nunca auditada e passada a limpo, crescia rapidamente e consumia crescentes recursos da economia brasileira. Essa situação não foi modificada significativamente pelas medidas tomadas nos anos 90.

Sendo assim, como o Plano Real conseguiu diminuir a inflação sem diminuir de verdade os juros?

Entre outras ferramentas, o governo tomou medidas para deixar o valor da nova moeda – o Real – com valor nivelado com o dólar, ou em alguns momentos até mais valorizado. Propagandas do governo chegavam a dizer que o novo plano econômico era tão bom que o Real valia mais que a moeda americana. Ao mesmo tempo, foram bastante diminuídas as taxas necessárias de serem pagos para realizar importações.

Como resultado, as prateleiras dos mercados do Brasil foram inundadas por produtos importados – muitos deles vindos de industriais instaladas em países onde trabalhadores tinham muito menos direitos garantidos que no Brasil. E/ou feitos com tecnologia mais elaborada disponível nos países centrais. E o fato do Real ter o mesmo valor que o dólar contribuía que esses produtos chegassem ao Brasil com preços parecidos com que eram vendidos nos seus países de origem. A presença deles pressionava assim para que os preços dos produtos que já se produziam no Brasil fossem reduzidos e não fossem aumentados acima do preço dos importados, diminuindo assim a inflação.

As indústrias e a agricultura instaladas no Brasil para poderem competir com os produtos e alimentos importados que de repente passavam a circular no país em maior quantidade, precisavam baixar custos de alguma maneira. Sem a queda dos juros, um dos caminhos encontrados foi a perda salarial dos trabalhadores, demissão e automação. Perdas de salários que foram em parte mascarada pelas mudanças e transições de moedas, e aparente estabilidade dos preços.

Esses instrumentos adotados – em especial o aumento dos juros da dívida pública e a manutenção por um período longo (até 1998) de valores parecidos para o real e o dólar – eram mantidos de uma maneira bastante artificial, e que consumiam muitos recursos. Somente em 98, se pagava mais de 2 bilhões de dólares por juros da dívida pública por mês no Brasil
A situação explodiu pouco depois das eleições de 1998, quando o governo federal – tendo já garantido a reeleição do presidente da época, FHC (PSDB) – permitiu que o Real, até então artificialmente nivelado com o dólar durante mais de 4 anos, se desvalorizasse de uma só vez. Em poucas semanas um dólar, que até então tinha o mesmo valor que aproximadamente 1 real, passou a ter o mesmo valor que dois reais.

As industriais no Brasil que conseguiram resistir a quebra brusca das barreiras fiscais aos produtos importados, foram prejudicadas mais uma vez por essa mudança. Muitas delas dependiam de importação de matérias-primas e itens do exterior pagos em dólar. Ou mesmo tinham contraído empréstimos em dólar em bancos externos, mas vendendo sua produção exclusivamente no Brasil – onde as pessoas pagavam os produtos apenas com a moeda do Real, agora de repente desvalorizada.

A quebradeira generalizada que se seguiu aumentou em muito o desemprego, que chegou a mais de 10 milhões de desempregados - taxas de desemprego de quase 20%.

Notamos que a ideia de repetir ou intensificar medidas duras do Plano Real dos anos 90 pelo Governo Temer não traz garantias de que se conseguirá melhorar a situação do desemprego. Pelo contrário, as consequências do uso delas no passado foram um grande aumento da crise da falta de vagas de trabalho à época.

Esses danos se misturavam as consequências do grande crescimento da dívida pública, que as vendas das estatais, cortes de direitos como previdência e venda de patrimônio público não serviram para impedir. Problema cujo agravamento ao longo do tempo encontra-se nas raízes da crise atual. Envolviam a crescente ligação das medidas do Plano Real com um conjunto de políticas implantadas ao mesmo tempo em outros países da América Latina, o “Consenso de Washington” – temas que serão discutidos na segunda parte deste texto.




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