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Fábio NunesVale do Paraíba

quinta-feira 28 de abril de 2016 | Edição do dia

Em 2013 fui contratado como auxiliar no setor de logística e desengraxe de peças na autopeças Mecano Fabril, uma importante metalúrgica de Osasco. Em agosto de 2014 passei a trabalhar com o percloroetileno (percloro), um solvente eficaz e econômico para a lavagem de metais. Sem nenhum tipo de treinamento e EPI (Equipamento de Proteção Individual) específicos, inalei percloro durante meses nesta empresa.

Os efeitos eram: dor de cabeça, tremores na perna, ânsia, tontura e sonolência. Eu sentia mas não sabia o motivo. Assim foi meu dia a dia durante alguns meses nesta empresa. Um trabalhador me alertou sobre os riscos do percloro. Me orientou a pesquisar sobre o produto e procurar ajuda médica.

Neste momento me aproximo do Movimento Nossa Classe (MNC), uma agrupação de trabalhadores independentes impulsionada pelo Movimento Revolucionário dos Trabalhadores (MRT). Fomos estudar o percloro e descobrimos que é um solvente altamente tóxico e classificado como "provável cancerígeno" pelo Internacional Agency for Research on Cancer (IARC), órgão com sede na Europa e reconhecido mundialmente pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

O percloro é proibido em países como Inglaterra, França e Argentina, mas no Brasil falta uma definição legislativa. Em 2001 Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) previu a retirada do solvente do mercado e afirmou que o produto pode causar câncer, citando o estudo da OMS. Mas, com a pressão dos industriais, esta posição foi revista e em 2013 eu estava trabalhando com percloro na Mecano Fabril, e que continua sendo usado indiscriminadamente principalmente em tinturarias, fabricante de CFC (clorofluorcarbono), metalúrgicas (desengraxe de metais e fábricas de borracha laminadas.

A partir daí inicia a nossa luta contra o percloro. O Nossa Classe denunciou a utilização deste solvente em seus materiais (artigos, panfletos, etc) e nos locais de trabalho e estudo em que atua. Conversei e repassei material sobre o produto para os companheiros e companheiras de trabalho. Procurei a segurança do trabalho, reclamei dos efeitos e exige EPI mais seguros. O segurança do trabalho não teve uma posição decidida. Eu procurei a chefia e recebi um aumento de cem reais no meu salário. O sindicato me orientou a mudar de função. Minha vida já tinha um preço para a empresa.

A campanha contra o percloro dentro da fábrica cresceu e sensibilizou e revoltou os operários e operárias que passaram a cobrar medidas da patronal. Após longas conversas chegamos a conclusão de que este veneno deveria ser banido.

Mesmo não tendo nenhuma confiança na Justiça, no dia 21 de novembro de 2014 denunciamos a Mecano Fabril para o Ministério Público do Trabalho (MPT). Sem nenhuma confiança nos partidos da ordem, entregamos nossa denúncia a Câmara dos Vereadores de Osasco e na Assembleia Legislativa de Sao Paulo. Panfletei a denúncia dentro da fábrica no dia seguinte e me recusei a trabalhar com o percloro e disse ao chefe que ele seria o próximo denunciado se tentasse me obrigar a trabalhar.

Orientado pelo médico e sociólogo Gilson Dantas fiz o exame que detecta o nível de ácido tricoloroacetico no corpo e descobri que fui contaminado pelo percloroetileno. No outro dia panfletei o resultado do exame dentro da fábrica para quase todos os trabalhadores.

Frente à revolta dos trabalhadores e às denúncias a patronal não teve escolha. Conseguimos barrar o percloro. No começo de 2015 o Ministério Público do Trabalho oficializou a proibição do produto no processo de limpeza das peças nesta metalúrgica de Osasco.

Uma conquista parcial e necessária para a classe trabalhadora. Fruto da organização e da solidariedade dos trabalhadores e trabalhadoras da Mecano Fabril, empresa que nos últimos anos assumiu um discurso de crise financeira profunda para demitir, atrasar salário, retirar direito, precarizar o trabalho e organizar uma possível "falência", crimes cometidos com a convivência da Justiça e dos governos corruptos que governam para os patrões.

Basta de deixarmos nossas vidas nas fábricas!

Basta de trabalhadores contaminados!




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